quarta-feira, 24 de janeiro de 2024

CRÔNICA: O IMPÉRIO DO SILICONE - WALCYR CARRASCO - COM GABARITO

 Crônica: O Império do Silicone

                Walcyr Carrasco

ANDO ESPANTADO com o número de pessoas que vem fazendo plástica e lipoaspiração. Conheço uma senhora que deve ter sido pioneira das operações. Pelos meus cálculos, tem uns setenta anos. A aparência é absolutamente indefinível:

— Quando sua família veio do Japão? — perguntei gentilmente, dia

desses.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiBc72udDfx3NwnOpzFNV80hVaQjIMJAOVjAWG_VWgJFtGs10xmgOGQnuCpytrc5BOkwk2ftPAO22WU9KDhOFFbL2FupYEas9BITKd7cV22A94-hR8cVbIRQgxRPzqjEgX4Vj3W6F9YPSPydNejsFgtxyVhxXttd2hSX8NKiUAfNGNsIUAyVdwMC-T7WEo/s320/SILICONE.jpg


Momento constrangedor.

.— Sou quatrocentona — respondeu. — Não há um oriental em minha

família!

Seus olhos são tão puxados que eu juraria... Faz parte da época em que se esticava tudo. Os olhos chegavam às orelhas. Uma atriz, certa vez, ficou sem fechar os olhos seis meses. De tão esticada, não conseguia. Dormia com máscara. Atualmente a plástica avançou. É mais sutil. Mas no passado, tudo isso era feito discretamente. Senhoras de mais idade se recusam a confessar as plásticas.

— Nunca precisei — garante minha conhecida, embora suas orelhas, de

tão puxadas, já estejam se encontrando atrás da cabeça.

O grande fenômeno dos últimos tempos não está na medicina, mas na sociedade. Tornou-se chique falar em botar silicone, fazer lipo. As mais famosas anunciam aos quatro ventos:

-— Vou fazer o peito, o braço, os joelhos, as coxas...

Tornou-se maravilhoso ser transformado em uma experiência cibernética! Meu vizinho já entrou na lipo umas seis vezes.

Arranca as adiposidades. Mal convalesce, vai na churrascaria. Enche o bucho com quindins. Dali a pouco, a calça não fecha de novo.

— Está na hora de fazer uma recauchutagem — avisa. 

Aconselho:

— Lipo não é para emagrecer. Só deve ser feita depois do regime!

Ele concorda, sorrindo. E se interna no dia seguinte.

Claro que não resisti. Fui fazer uma consulta. Tirei a camisa e mostrei a

barriga. Parecia um barril. Mas a plástica não faz milagres?

-— Quero ficar mais ou menos como o Reynaldo Gianechini — expliquei.

O médico me observou. Por um instante, pensei que fosse prescrever uma camisa-de-força. Apalpou-me.

— Bem que eu gostaria de tirar sua barriga — explicou. — Nesse caso saberia o que fazer com a minha, que é bem pior.

Abriu a camisa. O umbigo derramou-se para fora. Oh, horror!

Explicou que temos o mesmo tipo de abdome, com gordura espalhada. Lipo não adiantava. Só uma operação. A barriga ficaria esticadíssima. Eu teria de ficar dobrado em dois durante alguns meses, até a barriga recuperar a flexibilidade.

— Tem garantia contra torresmos? — perguntei.

Olhou-me dolorosamente. Não, não havia. Bastavam algumas picanhas bem gordurosas para eu voltar a ser o que sou!

       Fui visitar uma amiga, conhecida pelos decotes. Estava murcha.

— Tirei o silicone -— revelou.

— Por quê?

— É mais ou menos como mudar de corte de cabelo. Uma hora a gente põe, outra hora tira. A semana que vem, faço o rosto.

  Tenho um crédito. Qualquer hora boto os seios de novo!

Um amigo trouxe a solução definitiva para minha barriga. Uma prótese. Inventaram placas para ser colocadas no peito e no abdome. A do tórax simula músculos de atleta. A outra faz a gente ficar com barriga de tanquinho, como qualquer surfista.

— Mas escute... e minhas medidas? A tal barriga de tanquinho vai ser projetada para a frente. Vai ficar parecendo uma máquina de lavar.

Silêncio. Ninguém havia pensado nisso.

Desisti. Será que daqui a alguns anos vamos esquecer como eram os narizes, as orelhas, o jeito do rosto, antes de todo mundo querer atingir determinado padrão de beleza? Orelhas grandes não têm charme? Nariz torto? Tudo bem, querer ficar mais bonito. Mas ainda não consigo entender por que as pessoas andam fazendo tanta plástica. O que era segredo, tornou-se motivo de ostentação.     

 Entendendo o texto

01. Qual é o assunto central da crônica "O Império do Silicone" de Walcyr Carrasco?

      a) Medicina avançada.
      b) Cirurgias plásticas.
      c) Estilo de vida saudável.
      d) Beleza natural.

02. Quem é o narrador na crônica?

      a) Primeira pessoa.
      b) Segunda pessoa.
      c) Terceira pessoa.
      d) Narrador onisciente.

03. Onde o narrador percebe o fenômeno da sociedade em relação à cirurgia plástica?

      a) No hospital.
      b) Na escola.
      c) Na academia.
      d) Na sociedade em geral.

04. Qual é a marca de subjetividade presente na crônica?

      a) Imparcialidade.
      b) Objetividade.
      c) Neutralidade.
      d) Opinião pessoal.

05. O que o vizinho do narrador faz após as sessões de lipoaspiração?

     a) Faz dieta rigorosa.
     b) Vai à academia.
     c) Frequenta a churrascaria.
     d) Faz sessões de bronzeamento.

06. Qual é o conselho do narrador ao vizinho sobre a lipoaspiração?

     a) Fazer a lipo antes do regime.
     b) Não fazer a lipo após o regime.
     c) Não fazer a lipo para emagrecer.
     d) Fazer a lipo mesmo sem fazer regime.

07. O que o médico diz sobre a barriga do narrador?

     a) Recomenda uma dieta.
     b) Sugere uma nova técnica de lipoaspiração.
     c) Afirma que a lipo não é suficiente.
     d) Propõe um tratamento não cirúrgico.

08. Por que a amiga do narrador tirou o silicone?

      a) Por razões de saúde.
      b) Por mudança de moda.
      c) Por recomendação médica.
      d) Por arrependimento.

09. O que o amigo do narrador sugere como solução definitiva para a barriga?

      a) Lipoaspiração.
      b) Prótese.
      c) Dieta.
      d) Exercícios físicos.

10. O que o narrador questiona no final da crônica sobre as cirurgias plásticas?

      a) A eficácia dos procedimentos.
      b) A naturalidade da beleza.
      c) A busca por padrões de beleza.
     d) A importância da saúde.

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