Conto: Os bichos da minha casa – Fragmento
Clarice Lispector.
Antes de começar, quero que vocês
saibam que meu nome é Clarice. E vocês, como se chamam? Digam baixinho o nome
de vocês e o meu coração vai ouvir.
Peço que leiam esta história até o fim.
Vou contar umas coisas: minha casa tem bichos naturais. Bichos naturais são
aqueles que a gente não convidou nem comprou. Por exemplo, nunca convidei uma
barata para lanchar comigo.
Minha casa tem muitos bichos naturais,
menos ratos, graças a Deus, porque tenho medo e nojo deles. Quase todas as mães
têm medo de rato. Os pais não: até gostam porque se divertem caçando e matando
esse bicho que detesto. Vocês têm pena de rato? Eu tenho porque não é um bicho
bom pra gente amar e fazer carinho. Vocês fariam carinho num rato? Vai ver
vocês nem tem medo e em muitas coisas são mais corajosos do que eu.
Tenho um amigo que, quando era menino,
criou um rato branco. Fiquei com tanto nojo que só quero apertar a mão de meu
amigo quando passar o susto. Seu rato era, na verdade, uma rata e se chamava
Maria de Fátima.
Maria de Fátima morreu de um modo
horrivelzinho (eu digo horrivelzinho porque no fundo estou bem contente): um
gato comeu ela com a rapidez com que comemos um sanduíche
Como eu ia dizendo, os bichos naturais
de minha casa não foram convidados. Apareceram assim, sem mais nem menos.
Por exemplo: tenho baratas. E são
baratas muito feias e muito velhas que não fazem bem a ninguém. Pelo contrário,
elas até roem a minha roupa que está no armário. [...]
Barata é outro bicho que me causa pena.
Ninguém gosta dela, e todos querem matá-la. Às vezes o pai da criança corre
pela casa toda com um chinelo na mão, até pegar uma e bate com o chinelo em cima
até ela morrer. Tenho pena das baratas porque ninguém tem vontade de ser bom
com elas. Elas só são amadas por outras baratas. Não tenho culpa: quem mandou
elas virem? Eu só convido os bichos que eu gosto. E, é claro, convido gente
grande e gente pequena.
Sabem de uma coisa? Resolvi agora mesmo
convidar meninos e meninas para me visitarem em casa. Vou ficar tão feliz que
darei a cada criança uma fatia de bolo, uma bebida bem gostosa, e um beijo na
testa.
Outro bicho natural de minha casa é... adivinhem!
Adivinharam? Se não adivinharam não faz mal, eu digo a vocês. O outro bicho
natural de minha casa é a lagartixa pequena. São engraçadas e não fazem mal
nenhum. Pelo contrário: elas adoram comer moscas. E mosquitos, e assim limpam
minha casa toda. [...]
O que eu não entendo é o paladar
horrível que a lagartixa tem por moscas e mosquitos. Mas é claro: como não sou
lagartixa, não gosto de coisas que ela gosta, nem ela gosta de coisas que eu
gosto. [...]
Agora vou falar de bichos convidados,
igual ao meu convite para vocês. Às vezes não basta convidar: tem-se que
comprar.
Por exemplo, convidei dois coelhos para
morar com a gente e paguei um dinheiro ao dono deles. Coelho tem uma história
muito secreta, quero dizer, com muitos segredos.
Eu até já contei a história de um
coelho num livro para gente pequena e para gente grande. Meu livro sobre
coelhos se chama assim: O Mistério do Coelho Pensante. Gosto muito de
escrever histórias para crianças e gente grande. Fico muito contente quando os
grandes e os pequenos gostam do que escrevi.
Se vocês gostam de escrever ou desenhar
ou dançar ou cantar, façam porque é ótimo: enquanto a gente brinca assim, não
se sente mais sozinha, e fica de coração quente.
Clarice Lispector. A
mulher que matou os peixes. 13. Ed. Rio de Janeiro: Rocco, 1999. (Fragmento
adaptado).
Fonte: Coleção Desafio
Língua Portuguesa – 5° ano – Anos Iniciais do Ensino Fundamental – Roberta
Vaiano – 1ª edição – São Paulo, 2021 – Moderna – p. MP090-MP093.
Entendendo o conto:
01 – Leia três vezes as
palavras do quadro abaixo para aprimorar sua leitura.
Horrivelzinho – sozinha –
contrário – segredos – lagartixa – rapidez – carinho – sanduiche – secreta –
engraçadas – chinelo – corajosos.
a) Leia em voz alta estas palavras, observando as letras destacadas.
Lagartixa – chinelo – sanduiche.
· O que essas palavras têm em comum?
Tem o mesmo som produzidos por x e ch.
· O que elas têm de diferente?
A maneira de escrever. Apesar de terem o mesmo som na pronúncia.
b) Agora, observe a escrita destas palavras, observando as letras destacadas.
Chinelo
– sanduiche – sozinha.
· O que essas palavras têm em comum?
Elas possuem duas letras para representar um único som.
c) Volte ao quadro acima em negrito e circule outras palavras com dígrafos formados com a letra h na escrita.
Horrivelzinho, carinho.
02 – Logo no início do texto,
percebe-se a intenção da narradora de estabelecer um diálogo com o leitor.
Copie um trecho que comprove essa afirmação.
“E vocês, como se
chamam?”.
· Em sua opinião, qual é a importância desse recurso para a construção do texto?
Resposta pessoal do aluno. Sugestão: O recurso garante o
envolvimento do leitor, que é convocado a partilhar dos pensamentos e dos
sentimentos da narradora.
03 – A narradora afirma que
gosta de escrever para crianças e gente grande. Para quem você acha que ela
escreveu essa história? Por quê?
Resposta pessoal
do aluno. Sugestão: Escreveu para criança, pelo jeito como escreve e pela
maneira como procura se aproximar dos leitores.
04 – Nesse texto, a narradora
conta para o leitor a diferença entre ter bichos naturais e bichos convidados.
a)
Pinte de azul os bichos naturais e de verde
os bichos convidados.
Rato – barata – cachorro
– gato – passarinho
– pulga – coelho – hamster
– formiga – lagartixa.
b) Explique a diferença entre esses tipos de bicho.
Bicho naturais é o “que a gente não convidou nem comprou”; bichos
convidados é o que se adquire por vontade própria.
c) Você tem ou conhece alguém que tenha bichos convidados? Conte sobre eles.
Resposta pessoal do aluno.
05 – Ratos e baratas provocam
na narradora três sensações: medo, nojo e pena. Como ela explica essas
sensações contraditórias?
Ela sente pena,
porque o rato “não é um bicho bom para a gente amar e fazer carinho”; quanto à
barata, “ninguém gosta dela, e todos querem matá-la.
06 – Qual a vantagem, segundo
o texto, de se ter lagartixa em casa?
Elas são
engraçadas e não fazem mal nenhum, e limpam minha casa toda comendo as moscas e
mosquitos.
07 – Por que você acha que a
narradora convidou dois coelhos para morar com ela?
Resposta pessoal
do aluno.
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