Crônica: Chapeuzinho Vermelho
de Raiva
Mário Prata
– Senta aqui mais perto, Chapeuzinho.
Fica aqui mais pertinho da vovó, fica.
– Mas vovó, que olho vermelho… E
grandão… Que que houve?
– Ah, minha netinha, estes olhos estão
assim de tanto olhar para você. Aliás, está queimada, heim?
– Guarujá, vovó. Passei o fim de semana
lá. A senhora não me leva a mal, não,
mas a senhora está com um nariz tão grande, mas tão grande! Tá tão esquisito, vovó.
– Ora, Chapéu, é a poluição. Desde que
começou a industrialização do bosque que é um Deus nos acuda. Fico o dia todo
respirando este ar horrível. Chegue mais perto, minha netinha, chegue.
– Mas em compensação, antes eu levava
mais de duas horas para vir de casa até aqui e agora, com a estrada asfaltada,
em menos de quinze minutos chego aqui com a minha moto.
– Pois
é, minha filha. E o que tem aí nesta cesta enorme?
– Puxa,
já ia me esquecendo: a mamãe mandou umas coisas para a senhora. Olha aí:
margarina, Helmmans, Danone de frutas e até uns pacotinhos de Knorr, mas é para
a senhora comer um só por dia, viu?
Lembra da indigestão do carnaval?
– Se lembro, se lembro…
– Vovó, sem querer ser chata.
–
Ora, diga.
– As orelhas. A orelha da senhora está
tão grande. E ainda por cima, peluda. Credo,
vovó!
– Ah, mas a culpada é você. São estes
discos malucos que você me deu. Onde se viu fazer música deste tipo? Um horror!
Você me desculpe porque foi você que me deu, mas estas guitarras, é guitarra
que diz, não é? Pois é; estas
guitarras são muito barulhentas. Não há ouvido que aguente, minha filha. Música
é a do meu tempo. Aquilo sim, eu e seu finado avô, dançando valsas… Ah, esta
juventude está perdida mesmo.
– Por falar em juventude o cabelo da
senhora está um barato, hein?
Todo desfiado, pra cima, encaracolado. Que
qué isso?
– Também tenho que entrar na moda, não
é, minha filha? Ou você queria que eu fosse domingo ao programa do Chacrinha de
coque e com vestido preto com bolinhas brancas?
Chapeuzinho pula para trás:
– E esta boca imensa???!!!
A avó pula da cama e coloca as mãos na
cintura, brava:
– Escuta aqui, queridinha: você veio
aqui hoje para me criticar é?!
Apud S. C. Meserani e
M. Kato. Linguagem: criatividade.
São Paulo: Saraiva,
1978.
Entendendo a crônica:
01 – Você conhece a história
de Chapeuzinho Vermelho? Que diferenças há entre o conto de fadas original e
esse que você acaba de ler?
Resposta pessoal
do aluno. Sugestão: Que a expectativa é frustrada: a vovó que conversa com a
Chapeuzinho é a vovó mesmo, e não o lobo mau disfarçado.
02 – Quando você lê esse
texto em voz alta, tem a impressão de que as personagens estão conversando de verdade? Por quê?
Resposta pessoal do aluno.
03 – No texto, algumas
expressões foram destacadas. São expressões que costumamos utilizar apenas na
linguagem oral (falada), nas nossas conversas. Por isso são chamadas de marcas
de oralidade. Em sua opinião, por que, nesse texto escrito, há tantas marcas da
oralidade?
Porque trata-se
de um texto dialogado, as falas imitam a conversação real e por isso estão
carregadas de marcas da oralidade.
04 – A gíria também é marca
de oralidade. Você consegue identificar alguma gíria no texto e sabe o que ela
significa? A propósito, você sabe o que é gíria?
A gíria que
aparece no texto é “barato”, e pode significar “interessante”, “diferente”,
“divertido”. Resposta pessoal do aluno.
05 – No texto, como essa
gíria aparece escrita? Há algum sinal especial para indica-la?
Aparecem escritas
entre aspas.
06 – Que outras gírias você
conhece? Quais você utiliza para conversar com seus colegas, amigos ou
conhecidos?
Resposta pessoal do aluno.
07 – Das gírias que você
encontrou, quais você não usa ou não usaria? Por quê?
Resposta pessoal
do aluno.
08 – Releia o texto
“Chapeuzinho Vermelho de Raiva” para observar algumas palavras.
a)
Você já sabe que se trata de um diálogo e que
os interlocutores são Chapeuzinho e a vovó. Observe as falas de Chapeuzinho:
que palavras ela utiliza para se dirigir à vovó? E que palavras ela utiliza
para se referir a ela mesma? Copie no caderno trechos do texto que mostram
essas palavras.
Para se referir à vovó: vovó, a senhora; a ela mesma: eu, me.
b)
Que palavras ou expressões a vovó utiliza
para se referir a Chapeuzinho e a ela mesma?
Para se referir a Chapeuzinho: você, minha netinha, minha filha,
queridinha; a ela mesma: eu, me.
c)
Você percebeu que as duas personagens
utilizam as mesmas palavras quando falam sobre si mesmas? Que palavras você
utiliza para se referir a você mesmo(a)?
Eu, me, mim.