Poema: Meu pensamento é um rio subterrâneo
Fernando Pessoa
Meu pensamento é um rio
subterrâneo.
Para que terras vai e donde vem?
Não sei... Na noite em que o meu
ser o tem
Emerge dele um ruído subitâneo
De origens no Mistério extraviadas
De eu compreendê-las...,
misteriosas fontes
Habitando a distância de ermos
montes
Onde os momentos são a Deus
chegados...
De vez em quando luze em minha
mágoa
Como um farol num mar
desconhecido
Um movimento de correr, perdido
Em mim, um pálido soluço de
água...
E eu relembro de tempos mais
antigos
Que a minha consciência da
ilusão
Águas divinas percorrendo o chão
De verdores uníssonos e amigos,
E a ideia de uma Pátria anterior
À forma consciente do meu ser
Dói‑me no que desejo, e vem
bater
Como uma onda de encontro à
minha dor.
Escuto‑o... Ao longe, no meu
vago tacto
Da minha alma, perdido som
incerto,
Como um eterno rio indescoberto,
Mais que a ideia de rio certo e
abstrato...
E p'ra onde é que ele vai, que
se extravia
Do meu ouvi‑lo? A que cavernas
desce?
Em que frios de Assombro é que
arrefece?
De que névoas soturnas se
anuvia?
Não sei... Eu perco‑o... E outra
vez regressa
A luz e a cor do mundo claro e
atual,
E na interior distância do meu
Real
Como se a alma acabasse, o rio
cessa...
Obra Poética e em Prosa. Vol. I. Fernando Pessoa. (Introdução,
organização, biobibliografia e notas de António Quadros e Dalila Pereira da
Costa.) Porto: Lello, 1986. - 1093.
Entendendo o poema:
01
– Qual a principal metáfora utilizada no poema e o que ela representa?
A principal
metáfora é a comparação do pensamento a um rio subterrâneo. O rio simboliza o
fluxo inconsciente dos pensamentos, suas origens misteriosas e seu destino
desconhecido. Ele representa a profundidade e a complexidade da mente humana,
bem como a busca por respostas a questões existenciais.
02
– Qual a relação entre o pensamento e o tempo no poema?
O pensamento é apresentado
como um fluxo contínuo, que transcende o tempo presente. Ele se conecta a um
passado remoto, a um "tempo mais antigo", e se projeta para um futuro
incerto. Essa relação com o tempo confere ao pensamento um caráter atemporal e
eterno.
03
– Qual o papel do mistério e da incerteza no poema?
O mistério e a
incerteza são elementos fundamentais do poema. O eu lírico busca compreender a
origem e o destino de seus pensamentos, mas encontra apenas perguntas sem
respostas. Essa busca por respostas insondáveis intensifica a experiência
poética e nos convida a refletir sobre a natureza da consciência.
04
– Qual a importância da natureza para a expressão dos sentimentos do eu lírico?
A natureza,
representada pelo rio, pelos montes e pelas águas, serve como um espelho para
os sentimentos do eu lírico. As imagens da natureza ajudam a expressar a
profundidade e a complexidade das emoções, como a melancolia, a nostalgia e a
busca por sentido.
05
– Qual a relação entre o pensamento e a identidade do eu lírico?
O pensamento é
parte intrínseca da identidade do eu lírico. Ele é o que o define, o que o move
e o que o conecta com o mundo. Ao explorar as profundezas de seu pensamento, o
eu lírico busca uma compreensão mais profunda de si mesmo.
06
– Qual o significado da "Pátria anterior" mencionada no poema?
A "Pátria
anterior" pode ser interpretada como um estado de consciência
pré-racional, um lugar de origem onde os pensamentos fluem livremente, sem as
limitações da razão. Essa pátria representa a busca por uma identidade mais
autêntica e profunda.
07
– Qual a atmosfera geral criada pelo poema?
O poema cria uma
atmosfera de mistério, melancolia e introspecção. A imagem do rio subterrâneo
evoca um sentimento de profundidade e de busca interior. A linguagem poética,
rica em imagens e metáforas, contribui para a criação de um mundo interior rico
e complexo.