Soneto: ENQUANTO
QUIS FORTUNA QUE TIVESSE
Luiz Vaz
de Camões
Enquanto quis Fortuna que tivesse
Esperança de algum contentamento,
O gosto de um suave pensamento
Me fez que seus efeitos escrevesse.
Porém, temendo Amor que aviso desse
Minha escritura a algum juízo isento,
Escureceu-me o engenho co tormento,
Pera que seus enganos não dissesse.
Ó vós que Amor obriga a ser sujeitos
A diversas vontades! Quando lerdes
Num breve livro casos tão diversos,
Verdades puras são e não defeitos;
E sabei que, segundo o amor tiverdes,
Tereis o entendimento de meus versos.
Luís de Camões. Lírica Completa –
II Lisboa: IN-CM, 1994. p. 12
Entendendo o poema:
01 – De que fala o soneto?
Faz uma reflexão sobre os efeitos avassaladores do Amor.
02 – Nos dois quartetos do
soneto acima, duas divindades são contrapostas por exercerem um poder sobre o
eu lírico. Identifique as duas divindades e explique o poder que elas exercem
sobre a experiência amorosa do eu lírico.
As divindades são
Fortuna e Amor. Tais entes modulam a apreensão amorosa no poema. Por um lado,
enquanto Fortuna permitiu, o eu lírico pôde ter “esperança de algum
contentamento”. Por outro lado, Amor “escureceu-me o engenho com tormento”. Dessa
forma, essas alusões mitológicas geram o conflito entre forças opostas no qual
o eu lírico está imerso.
03 – Um soneto é uma
composição poética composta de 14 versos. Sua forma é fixa e seus últimos
versos encerram o núcleo temático ou a ideia principal do poema. Qual é a ideia
formulada nos dois últimos versos desse soneto de Camões, levando-se em
consideração o conjunto do poema?
A ideia contida
nos dois últimos versos é a de experiência comum entre eu lírico e o leitor, já
que, depois de o leitor experimentar o amor, ele poderia compreender melhor os
conflitos amorosos do eu lírico.
04 – Nos sonetos de Camões,
inclusive no soneto apresentado acima, é frequente que substantivos que, em
circunstâncias normais da língua, são reconhecidos como substantivos comuns
apareçam nos poemas como substantivos próprios. No soneto acima, as
palavras “Fortuna” e “Amor” aparecem como substantivos próprios, e esse fato é
importante para a interpretação do texto. Assinale a alternativa correta, que
leva esse fato em consideração:
a)
A “Fortuna” e o “Amor” são representados como
força que agem desde fora do sujeito, influindo-lhe atitudes contraditórias e
limitando o domínio total de sua própria liberdade individual.
b)
A “Fortuna” e o “Amor” são
representados como personagens de ficção, participando da ação dramática de
modo dinâmico por meio de falas entre si.
c)
No poema de Camões, apesar de “Fortuna” e
“Amor” aparecerem como substantivos próprios, isso não tem nenhuma consequência
drástica para a interpretação do texto. Ao escrever substantivos como iniciais
maiúsculas, o objetivo do autor é apenas realçar sua importância na economia do
texto.
d)
No poema de Camões, a “Fortune” e o “Amor”
são representados como estados psicológicos do eu lírico, que se sucedem no
desenrolar do poema para lhe incutir sentimentos diferentes diante da mesma
experiência.
05 – Podemos dizer que o poema põe em evidência:
a) Apenas o amor a as armadilhas que este cria para o sujeito.
b) Somente
a inocência daqueles que amam cegamente.
c)
Principalmente a ausência de amor, que faz
com que não se compreenda o que o poeta diz.
d)
A arte literária que estabelece um vínculo
entre o escritor e o leitor por meio das experiências de ambos.
e)
A ambiguidade da mulher que, representada
pelo Amor, é vista como um ser que engana.
06 – Descreva a Fortuna na 1ª estrofe.
Ela é destino ou
entidade mística e espera que o poeta escreva os efeitos dela: a “esperança de
algum contentamento” e “o gosto de um suave pensamento”.
07 – Já na 2ª estrofe, o que a voz poética introduz?
Outra entidade
mística: o Amor.
08 – O Amor busca impedir o eu lírico de quê?
De advertir
aqueles que não amam, sobre os perigos desse sentimento.
09 – De que forma é mostrada
a força do Amor nas 3ª e 4ª estrofes?
Do Amor que submete os amantes a seu
domínio. E quando os amantes lerem sobre casos de amor, entenderão os versos do
eu poemático de acordo com o tipo de amor a que estão submetidos.