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quarta-feira, 11 de junho de 2025

CONTO DE ENIGMA: O INCRÍVEL ENIGMA DO GALINHEIRO - MARCOS REY - COM GABARITO

 CONTO DE ENIGMA: O INCRÍVEL ENIGMA DO GALINHEIRO

 

         Isso aconteceu numa época em que o grande detetive Sherlock Holmes estava aposentado e um tanto esquecido. Em Londres, onde morava, ninguém mais o chamava para elucidar mistérios. Conformava-se, dizendo: não se fazem mais bandidos como antigamente. Meu tio Clarimundo, leitor das aventuras de Sherlock, foi quem decidiu contratá-lo. Mas que não trouxesse seu secretário Dr. Watson, que só servia para ouvir no final de cada caso a mesma frase:

“Elementar, Watson”.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgMejgubA-K6xZJz_fe1sLCw2NEwamm7l28F9wv4_aQlfp0zXh8G8-2AcU05bZx0Wr0MZ0LicnOjQa6mc0a-yO-FKN6ptRXsb_3wAOXJLJ2YUqHcjXYex9lPfquOXkqMTu5LfTIz1hllJmZVbP5rS9HXTIbyRGlIZD7xAEq25sz_xV_bHNPwV09y8eJlT8/s320/GALO.jpg


– Mas se trata dum caso tão insignificante – protestou mamãe. – Insignificante?

       Esse enigma está nos pondo malucos.

        Alguém andava assaltando nosso galinheiro. A cada dia sumia uma galinha. Quem faria isso, estando a casa cercada por paredes de imensos edifícios? Não havia muro para saltar. Nem grades para pular. E na casa só morávamos eu, meus pais, tio Clarimundo e Noca, a velha empregada. Um enigma muito enigmático, sim.

        Sherlock Holmes chegou e hospedou-se no quarto dos fundos. Ele, seu boné xadrez, seu cachimbo, lógico, e mais logicamente sua lupa, que aumentava tudo. Chegou anunciando:

        – Chamarei esta aventura “O caso das galinhas desaparecidas”. Ou ficaria melhor “O incrível enigma do galinheiro”?

        – Ambos são bons, mas...

        – Na maior parte das vezes o culpado é o mordomo – informou Sherlock.

        – Onde está o suspeito?

        – Não temos mordomo – lamentou tio Clarimundo.

        – Então me levem à cena do crime.

        Levamos Sherlock ao quintal, pequeno e espremido entre os prédios. Ele tirou a lupa do bolso. Um palito ou folha de árvore, examinava concentradamente. Depois, tomava notas num caderno. Mas, como a viagem o cansara, foi dormir cedo. Na manhã seguinte minha mãe acordou-o com uma informação:

        – Sumiu outra galinha.

       – Esta noite dormirei no galinheiro.

       E dormiu mesmo, sentado numa poltrona. Desta vez eu que o acordei.

       – Mister Holmes, roubaram mais uma galinha.

       A notícia fez com que se decidisse:

       – A história se chamará mesmo “O incrível enigma do galinheiro”.

       – Não estamos preocupados com títulos – rebateu meu tio.

       – Mas meu editor está.

       Neste dia consegui ler o caderno de anotações do detetive. Li: nada, nada, nada. Um nada em cada página. Organizado, não? Também nesse dia Sherlock telefonou a Londres para trocar impressões com o fiel Dr. Watson. Uma fortuninha em chamados internacionais. E as galinhas continuavam desaparecendo, apesar de Sherlock Holmes dormir no galinheiro. Ele já andava falando sozinho.

        – Nem sinal de gato, cachorro, raposa, gambá. Todo o meu prestígio está em jogo. Por fim, restou apenas uma galinha.

        À hora do almoço o famoso detetive, sentindo-se velho e fracassado, sofreu uma crise, chorando na frente de todos. Nós nos comovemos muito com a situação. Um homem daqueles derramar lágrimas... Noca, então, deu um passo à frente e confessou:

       – Eu que roubava as galinhas. Dava às famílias pobres duma favela.

        Sherlock enxugou imediatamente as lágrimas na manga do paletó.

         – Já sabia. Fingi chorar para que ela confessasse.

         – Então desconfiava de Noca? – Perguntou tio Clarimundo. – Encontrei penas de galinha no quarto dela. Elementar, Clarimundo. E o que dizem de comermos a penosa que resta no galinheiro?

         Não sei se foi escrito “O incrível enigma do galinheiro”. Se foi, pobres leitores. Na verdade eu que roubava as galinhas para dar aos favelados. Inclusive quando o detetive dormia no galinheiro. Noca sabia disso e assumiu a culpa em meu lugar.

Elementar, Mister Sherlock Holmes.

(Marcos Rey, Em Vice-Versa ao Contrário. Org. Heloísa Prieto. São Paulo, Companhia das Letrinhas, 1993.)

 

01. Responda.

a. O que é um enigma?

Um enigma é algo de difícil compreensão, um mistério, um quebra-cabeça ou uma questão que precisa ser decifrada ou resolvida.

b. Qual o mistério que trata o texto?

O mistério que o texto trata é o desaparecimento misterioso de galinhas do galinheiro, sem que se saiba quem as está roubando, dada a dificuldade de acesso ao local.

02. Sobre os Elementos da Narrativa, pergunta-se: O narrador desse texto é

a.  Sherlock Holmes.

b. Tio Clarimundo.

c.  Noca. 

d. Sobrinho do tio Clarimundo.

03. Marque a alternativa que indica o momento de maior tensão na narrativa.

a. À chegada de Sherlock Holmes à casa do narrador.

b.  A crise de choro de Sherlock Holmes e a consequente confissão de Noca.

c. O momento que o narrador revela que ele é o ladrão de galinhas.

d. O momento em que Sherlock decide qual será o título da história.

 04. Quem decide contratar Sherlock Holmes?

     a.  A mãe do narrador.

     b. O narrador.

     c. O tio Clarimundo.

     d.  Noca, a empregada.

05. Qual era o enigma a ser resolvido?

     a. O desaparecimento do mordomo.

     b. O roubo das galinhas.

     c. O título da história.

     d. O choro de Sherlock Holmes.

06. Onde Sherlock Holmes dormiu para tentar solucionar o caso?

     a.  No quarto dos fundos.

     b.  Na sala.

     c.  No quintal.

     d. No galinheiro.

07. Quem confessou ser o ladrão das galinhas?

    a. O narrador.

    b.  O tio Clarimundo.

    c.  Sherlock Holmes.

    d.  Noca.

08. Qual era a justificativa para o roubo das galinhas?

   a. Vender as galinhas.

   b. Alimentar a família.

   c. Dar às famílias pobres de uma favela.

   d.  Fazer um banquete.

domingo, 27 de novembro de 2022

FRAGMENTO DO LIVRO: O MISTÉRIO DO 5 ESTRELAS - MARCOS REY - COM GABARITO

 FRAGMENTO DO LIVRO: O MISTÉRIO DO 5 ESTRELAS

                                            Marcos Rey

                                    O 222

        Leo apertou a campainha do 222, recebera um chamado. Logo se abria um palmo de porta mostrando a cara e o sorriso largo do Barão. Embrulhado num robe azulão, ele parecia ainda mais gordo, mole e displicente.

        — Me traga os jornais de sempre — pediu o hóspede passando ao bellboy uma nota amassada.

        — Esse dinheiro não vai dar, senhor.

        — Tem razão. Um momento.

        Quando abriu o guarda-roupa para apanhar a carteira, Leo viu pelo espelho interno do móvel que o Barão tinha companhia: um homem pequeno, com pinta de índio vestindo roupas civilizadas, lavava concentradamente as mãos na pia do banheiro. Devia ser uma daquelas muitas pessoas que o Barão ajudava, pensou o rapaz.

         O volumoso hóspede do 222 demorava para encontrar a carteira nos bolsos de seus paletós, enquanto o bellboy aspirava vários cheiros do apartamento: o de charutos já fumados e amanhecidos, um mais agradável de lavanda e ainda outro de maçã, sempre vendo pelo espelho o tal homenzinho a lavar as mãos e a enxugá-las em toalhas de papel que ia jogando numa cesta. Depois, com o súbito receio de ser visto pelo espelho do guarda-roupa, fechou a porta do banheiro com uma cotovelada.

         Afinal o Barão reapareceu com mais dinheiro e um novo sorriso.

          — O troco é seu, meu filho. Leo disparou pelos corredores acarpetados do Emperor Park Hotel, esperou e apanhou o elevador e passou pela portaria. Novato ainda no emprego provava com a velocidade das pernas seu interesse pelo trabalho. À entrada do edifício, em seu belo uniforme branco com debruns dourados, viu o Guima (Guimarães), o porteiro, antigo amigo de sua família, a quem devia o salário, aquelas gorjetas todas e a nova profissão.  

          Ao entrar pela primeira vez com o Guima, há dois meses, no imenso e rico saguão do Park, como o chamavam simplesmente os funcionários, Leo ficou deslumbrado. No seu mundo da Bela Vista, o bairro do Bexiga, onde nascera e morava, jamais pisara num ambiente tão bonito, moderno e fofo. "Isso que é um cinco estrelas", explicou o porteiro com orgulho de proprietário. "Mas o que é um cinco estrelas?" Guima olhou-o como se sua ignorância lhe fizesse pena e disse que a qualidade dos hotéis é medida pela quantidade de estrelas que ostenta. Cinco é o máximo, só para estabelecimentos de nível internacional.

         Era uma sexta-feira; na segunda, já fardado e registrado, Leo começava a trabalhar no Emperor Park Hotel como bellboy, mensageiro, das 8 às 18 horas, quando voltava para casa, jantava às pressas e corria para a escola noturna. O horário era puxado e o serviço de cansar as pernas, mas as gratificações compensavam. Recebia gorjetas inclusive em dinheiro estrangeiro. Logo conheceu a cor do dólar, da libra, do peso, do franco, da peseta, que trocava por cruzeiros lá mesmo na casa de câmbio do Park.

         Leo precisou de um mês para percorrer os vinte e tantos andares do hotel, sem contar os subterrâneos destinados às garagens, lavanderia, depósito de gêneros alimentícios, adega, almoxarifados, um labirinto frio e deserto em muitas horas do dia.

        Não era, porém, no proletário subsolo que o rapaz da Bela Vista encontrava satisfações e interesses. Gostava de vagar pelo saguão, sempre cheio de hóspedes que chegavam ou partiam, numa confusão de malas, rótulos e idiomas, de espiar a piscina, no quarto andar, com suas águas muito cloradas, dum verde para ricos, o restaurante, com seus odores caprichados, a luxuosa boate, o imponente salão de convenções, o tropical garden, pequena floresta onde serviam gelados e sanduíches, a sauna, que vendia calor e fumaça, a quadra de shopping, com suas lojas sofisticadas, e no alto, lá em cima, o belo bar-terraço, coisa de cinema, com pista de dança, solário e um mirante envidraçado para se ver São Paulo inteira, à luz do sol, elétrica ou de vela em jantares ou ocasiões especiais.

        A maioria dos hóspedes do Park também parecia ter cinco estrelas estampadas na testa: gente importante, preocupada com telefonemas internacionais, políticos, desportistas e artistas famosos que recebiam jornalistas ou deles fugiam, evitando fotos e entrevistas. Logo na primeira quinzena de Park Leo esteve a dois metros de distância de Vera Stuart, atriz do cinema norte-americano, carregou as malas dum automobilista francês de Fórmula 1, e levou uma garrafa de mineral ao apartamento de um dos reis do petróleo do Oriente Médio, vestido em trajes típicos.

         Havia, ainda, hóspedes que moravam no hotel: dona Balbina, viúva rica e solitária, Mister O'Hara, que embora muito idoso e doente dirigia uma grande empresa quase sem sair do apartamento, o anão Jujuba, ídolo infantil da televisão, e o Barão. Certamente Barão era apenas apelido do homem gordo que mandou Leo comprar jornais, conhecido benemérito, protetor de inúmeras instituições assistenciais.

         Leo voltou com os jornais e tocou a campainha do 222. Desta vez o hóspede não abriu de imediato a porta. Antes que o fizesse, o bellboy ouviu ruídos.

           — Quem é? — perguntou o Barão, o que nunca fazia.

           — Sou eu, o bellboy. Trouxe os jornais. A porta abriu pouco e lentamente, o suficiente apenas para mostrar o rosto do hóspede. O Barão muito pálido, como um doente, teimava em sorrir, mas não devia estar bem porque suas mãos, trêmulas, deixaram cair os jornais. Leo abaixou-se para apanhá-los quando viu, sob a cama, dois pés calçados, apontando para a porta. Pegou os jornais e ao levantar-se notou que havia uma mancha vermelha, provavelmente de sangue, no robe do gordo do 222.

          — Obrigado — disse o Barão, segurando confusamente os jornais e apressando-se em fechar a porta.

           Mesmo diante da porta fechada, Leo deteve-se ainda um momento para relembrar e fixar na memória a cena que acabara de ver. Daí por diante começariam seus problemas.

                      GUIMA, SABE O QUE EU VI?

            Leo desceu para o saguão desejando que ninguém o chamasse. Precisava contar ao Guima o que vira no 222. O porteiro, na rua, parava um táxi para um casal de hóspedes estrangeiros. Ele era bastante considerado pela gerência porque falava um pouco diversos idiomas, até japonês.

           Guima, assim que o viu, aproximou-se:

           — Diga a dona Iolanda que domingo passo lá pra filar macarronada.

            Leo estava agora mais assustado do que no momento em que vira os pés debaixo da cama.

             — Guima, sabe o que eu vi?

             O porteiro sentiu que o rapaz estava sob forte tensão e ficou muito preocupado. Para um bellboy não era interessante ver certas coisas. Aliás, o perfeito mensageiro não tem olhos nem ouvidos: apenas pernas e cortesia.

              — Alguma mulher sem roupa?

              — Não, acho que vi um cadáver.

              [...]

 Fonte: Maxi: ensino fundamental 2:multidisciplinar:6 º ao 9º ano/obra coletiva: Thais Ginicolo Cabral. 1.ed. São Paulo: Maxiprint,2019.7º ano Caderno 4 p.66 a 71.

 INTERAGINDO COM O TEXTO

01. Em geral, as histórias de detetive apresentam ao leitor algumas informações relacionadas ao espaço da narrativa.

a)   Identifique, no texto, o espaço em que os fatos narrados acontecem. Faça uma breve descrição desse espaço.

Os fatos narrados acontecem no Emperor Park Hotel, um cinco estrelas bonito, moderno e requintado.

b)   Há outros espaços mencionados na história. Identifique-os e explique por que eles são citados.

A Bela Vista, no bairro do Bixiga, é mencionada por ser o lugar onde Leo nasceu e morava.

c)   Você já ouviu falar sobre esses lugares? Esses lugares são fictícios, ou seja, foram inventados pelo autor? Justifique sua resposta.

Resposta pessoal.

Sugestão: Esses lugares não são fictícios. Bela Vista é um distrito situado na região central da cidade de São Paulo, onde fica localizado o bairro conhecido como Bixiga.

02. A descrição é um recurso que permite melhor visualização dos elementos que compõem a narrativa. Assim, aponte características que descrevem:

a)   o Hotel Emperor Park:

O saguão do hotel estava sempre cheio de hóspedes, a piscina tinha um verde para ricos, a boate era luxuosa, havia um imponente salão de convenções, quadra de shopping com lojas sofisticadas, um belo terraço-bar, etc.

b)   a maioria dos hóspedes do hotel:

Os hóspedes eram pessoas importantes, como atrizes de cinema, automobilistas, reis do petróleo, etc.

c)   os hóspedes que moravam no hotel:

Uma viúva rica e solitária; um idoso, que era diretor de uma grande empresa; um anão, ídolo infantil da televisão, etc.

03. Entre os personagens comuns nas narrativas de detetive estão a vítima, o(s) suspeito(s) e o detetive, ou alguém que desempenha o papel de esclarecer o mistério.

a)   É possível identificar esses personagens no trecho que você leu? Explique sua resposta.

Sim, provavelmente, o homem que Leo viu pelo reflexo do espelho é a vítima, o Barão e o suspeito e Leo é o personagem encarregado de esclarecer o mistério.

b)   Como esses personagens são caracterizados no texto?

O homem que Leo viu refletido no espelho era pequeno, tinha a aparência de índio vestindo roupas civilizadas; o Barão é descrito como gordo, mole e displicente, prestava assistência a inúmeras instituições; Leo nasceu e morava no Bela Vista, trabalhava como mensageiro no hotel das 8h às 18h e estudava à noite, demonstrava interesse pelo trabalho.

c)   O autor de histórias de detetive costuma deixar traços e pistas ao longo da história a fim de fazer revelações ou confundir o leitor, conduzindo a narrativa a um final quase sempre surpreendente. Que informações no texto permitiram que você identificasse esses personagens? Explique sua resposta.

Quando Leo bate à porta, atendendo ao chamado do Barão, é recebido com um sorriso largo, e o homem pequeno com aparência de índio, pelo reflexo do espelho, fecha a porta do banheiro com uma cotovelada, com receio de ser visto. Quando Leo bate à porta novamente para entregar os jornais, o Barão pergunta quem é, o que nunca fazia, demora para atende-lo e, ao abrir a porta, o que faz pouco e lentamente, mostra-se pálido, teimando em sorrir. Não parecia bem, pois suas mãos estavam trêmulas, deixando cair os jornais. Leo, então, abaixa-se para apanhá-los, quando vê, sob a cama, dois pés calçados apontando para a porta, pega os jornais e, ao se levantar, nota que havia uma mancha vermelha no robe do Barão, provavelmente de sangue.

04. Outro elemento que caracteriza as histórias de detetive é um crime ou um mistério a ser desvendado. Identifique esse elemento no trecho lido.

O enigma a ser desvendado é se os pés visto sob a cama eram do homem visto anteriormente no quarto, descobrir se ele realmente está morto e, em caso afirmativo, descobrir onde está o corpo e provar quem o matou.

 

 

 

 

 

sábado, 9 de julho de 2022

CONTO: PEGA LADRÃO, PAPAI NOEL! - MARCOS REY - COM GABARITO

 CONTO: Pega ladrão, Papai Noel!

                 Marcos Rey

Ele não era bem um Papai Noel, pois trabalhava numa grande loja, a Emperor, aquela grande, da avenida. Consta, inclusive, que fez um curso de seis semanas para testar e aperfeiçoar sua tendência vocacional, obtendo boa nota. Mas seu visual, mesmo sem uniforma, impressionou favoravelmente a banca examinadora: era gordo, como convém a um Papai Noel; tinha olhos da cor do céu e a capacidade de sorrir durante horas inteiras sem nenhum motivo aparente. Aliás, um Papai Noel é isto: uma mancha vermelha que sabe rir e às vezes fala.

         -Você está ótimo! – disse-lhe o chefe da seção de brinquedos. – As crianças vão adorá-lo!

Era véspera de Natal e a loja andava preocupadíssima com as vendas, inferiores ao ano anterior. E preocupada com outra coisa, ainda: o incrível número de furtos, razão por que o Papai Noel além de sorrir e estimular as vendas teria que ser também um olheiro, um insuspeito fiscal de seção.

Ele passeava pelo atraente departamento de brinquedos eletrônicos, juntamente com seu sorriso, e acabara de passar a mão nos cabelos louros de um garotinho, quando viu. Viu o quê? Um homem, e mais que ele, sua mão surrupiando um trenzinho de pilha, imediatamente metido nua bolsa. Interrompendo em meio seu sorriso, Papai Noel deu um passo firme, fez voz de vigia:

          -Por favor, me deixe ver essa bolsa!

Nem todo susto é paralisante: o homem, sem largar a bolsa, saiu em disparada pela seção de brinquedos, empurrando pessoas, chutando coisas, derrubando e pisando em brinquedos. Atrás desse furacão, seguia outro furacão, este encarnado, o Papai Noel, que repetia em cores mais vivas os desastres provocados pelo primeiro. A cena prosseguiu com mais dramaticidade e ruídos na escadaria da loja, pois a seção de brinquedos era no sexto andar. No quarto pavimento, Papai Noel chegou a grampear o ldrão pelo braço, mas este conseguiu escapar, livrando oito degraus entre o quarto e o segundo andares, Aí, novamente, Papai Noel pôs a mão enluvada no fugitivo, mas um grupo de pessoas que saía do elevador poluiu a imagem e ele tornou a ganhar distância.

Na avenida a perseguição teve novos aspectos e emoções. A pista era melhor para corridas, mas ainda maior o número de pessoas e obstáculos. O ladrão, logo à saída da loja, chocou-se com uma mulher que carregava mil pacotes, pacotinhos e pacotões. Foram todos para o chão. Um propagandista de longas pernas de pau fez uma aterrissagem forçada, que o aeroporto de Congonhas teria desaconselhado devido ao mau tempo. O Papai Noel também empurrava, esbarrava e derrubava, aduzindo ao seu esforço o clássico “pega ladrão!”, um refrão tão comum na cidade que não entendo como ainda não musicaram. Na primeira esquina, quase... Um carro bloqueou a fuga do homem, que ficou hesitante enquanto seu colorido perseguidor se aproxima em alta velocidade.

Consta que Papai Noel perseguiu o ladrão inclusive no Minhocão, de ponta a ponta, onde é proibida a circulação de pedestres. Também sem resultado.

A história, que nem história é, podia acabar aqui, mas prefiro que acabe lá.

Lá, onde?

Naquele quarto de subúrbio.

Aquela noite, o ladrão, à meia-noite em ponto, deu para o filho o belo presente das lojas Emperor, o trenzinho de pilha, que tinha luzes diversas e até apitava, excessivamente incrementado para qualquer garoto pobre.

O menino, que sabia dos apuros do pai, não recebeu alegremente a maravilha eletrônica.

-Papai, o senhor não devia ter comprado.

- Mas não comprei.

- Ahn?

- Ganhei.

- De quem?

               - De Papai Noel, ora. Bom cara. Nem precisei pedir, Ele correu atrás de mim e me deu o presente. Disse que a pilha dura três meses. Legal, não?

In: Antônio de AlcântArA MAchAdo et al. De conto em conto. São Paulo: Ática, 2006. p. 42-46. (Coleção Quero Ler: Contos).

http://biaatividades.blogspot.com/2013/01/texto-pega-ladrao-papai-noel.html

Desvendando o texto

01. Por que o homem roubou o trenzinho de pilha?

      Para presentear seu filho na noite de Natal.

02. O que você acha da atitude do ladrão?

      Responda pessoal.

03. Você acha que o presente é o que mais importa no Natal?

       Resposta pessoal.

04. Relacione o texto com a frase: “Os fins não justificam os meios”.

      O fato de ele querer dar um presente para seu filho, não ter como comprar e por isso roubar. Nada justifica esta atitude.

05. O conto se inicia com a apresentação de um personagem: um Papai Noel recém-contratado.

a) Que características tornavam aquele homem ideal para o cargo?

     Era gordo, como convém a um Papai Noel; tinha olhos da cor do céu e a capacidade de sorrir durante horas inteiras sem nenhum motivo aparente.

b) Além das habituais funções, esse Papai Noel teria um trabalho especial. Qual? Por que ele havia se tornado necessário?

Um olheiro, um insuspeito fiscal de seção, porque aumentou o número de furtos no departamento de brinquedos eletrônicos.

06. Releia o seguinte trecho. “Ele passeava pelo atraente departamento de brinquedos eletrônicos, juntamente com seu sorriso, e acabara de passar a mão nos cabelos louros de um garotinho, quando viu. Viu o quê?”

Um homem, e mais que ele, sua mão surrupiando um trenzinho de pilha.

a)    A expressão “juntamente com seu sorriso” contribui para a impressão de que o Papai Noel age de modo simpático, divertido ou fingido? Por quê?

Para que ninguém suspeite que também está fiscalizando o departamento.

b)    Por que você acha que o narrador usou a expressão “quando viu. Viu o quê?” em lugar de contar diretamente o que foi visto?

Resposta pessoal.

c)     O que o Papai Noel fez depois de ter visto o que viu? Por que ele agiu assim?

Papai Noel deu um passo firme e fez voz de vigia:

 - Por favor, me deixe ver essa bolsa!

07. A partir do sexto parágrafo, a narrativa começa a ficar parecida com cenas de filmes de ação.

a) Por que temos essa impressão?

    Porque o ladrão corre e o Papai Noel o persegue incansavelmente, sem se importar com as pessoas nas ruas.

   b) A relação com o cinema é explorada pelo próprio narrador no oitavo parágrafo. Que palavras ou expressões do texto se referem a essa arte?

         A história, que nem história é, podia acabar aqui, mas prefiro que acabe lá.”

c)   A narrativa se passa em São Paulo. Quais características dessa cidade contribuem para a construção das cenas de perseguição? 

 O aeroporto de Congonhas, a   galeria da Barão e o  Minhocão.

08. O final da história surpreende o leitor.

       A história se passa em uma época específica do ano. Como ela ajuda a justificar a ação do personagem?

    A época é Natal. Nesse tempo as pessoas ficam mais sensíveis, porque comemora o nascimento do menino Jesus.

09. Releia um dos parágrafos do final do conto. “A história, que nem história é, podia acabar aqui, mas prefiro que acabe lá.”

 a) A que se refere o termo ?

      Refere-se a criança recebendo o presente de Natal.

b) Se a história terminasse aqui, falaria de um roubo. O que muda quando o narrador dá continuidade a ela.

     Muda o espaço onde a história se passa, pois agora já é o ambiente da casa, onde a criança recebe o presente.

10- Durante a perseguição, você torcia pela captura do ladrão? Por quê?

     Resposta pessoal.

11.  Enumere os fatos na ordem em que apareceram no texto:

     ( 3  ) A fuga e a perseguição

     (  5  )  A entrega do presente

     (  1  )  A apresentação do Papai Noel

     (  4  ) A interferência do narrador

     (  2  )  O roubo e o flagrante

12.  “Ele não era bem um Papai Noel, pois trabalhava numa grande loja.”

      Por essa passagem, entende-se que:

     a) Não existe Papai Noel de verdade.

     b)   O verdadeiro Papai Noel não precisa trabalhar em lugar nenhum.

     c)   Há muitas pessoas que se fazem passar pelo bom velhinho.

     d)  As lojas enganam os seus compradores com falsos velhinhos.

    e)   Nem todo Papai Noel gosta do seu trabalho.  

13.  Observando o primeiro parágrafo, pode-se afirmar que um Papai Noel deve ter todas estas características, exceto:

     a) doçura no olhar

     b)  sorriso constante

     c)  aparência favorável

     d)   voz forte e imponente

     e)  vocação para o papel

14.  A relação causa-consequência se encontra incorreta em:

       a)   A loja vendera pouco. X Contrataram o Papai Noel.

       b)   Havia muitos furtos na loja. X O Papai Noel deveria fiscalizar os compradores.

       c)  O Papai Noel viu um homem roubando um brinquedo. X O homem fugiu, levando o que roubara.

       d)   Havia muitos obstáculos dentro e fora da loja. X Papai Noel não conseguia alcançar o ladrão.

       e)  Papai Noel entendeu o motivo de o homem ter roubado o trenzinho. X  Papai Noel desistiu da perseguição.

 15. Todos os motivos contribuíram para o insucesso do papai Noel, exceto:

     a)  A localização da seção de brinquedos.

    b)   O peso do próprio corpo.

    c)   A agilidade do homem “ladrão”.

    d)   O movimento de clientes dentro da loja.

    e)   O trânsito confuso =nas avenidas por onde passaram.

16.  A partir do sexto parágrafo, a narrativa começa a ficar parecida com cenas de filmes de ação.

      a) Por que temos essa impressão?

      (  ) porque narra a passagem de um furacão devastando uma loja de brinquedos.

     (  ) porque narra detalhes de um desastre e suas dificuldades.

     (  ) porque narra o drama de um ladrão.

    (x ) porque narra uma perseguição, com momentos em que o ladrão é quase capturado.

      b) A relação com o cinema é explorada pelo próprio narrador no oitavo parágrafo. Que palavras ou expressões do texto se referem a essa arte?

      (  ) ladrão, brinquedo, galeria.

      (  ) Papai Noel, brinquedo, bom velhinho.

      (x ) espectadores, câmera 2, fotogramas ( ) impressão, milhas, quilômetros.

     c) A narrativa se passa em São Paulo. Quais características dessa cidade contribuem para a construção das cenas de perseguição?

      (x ) cidade populosa e movimentada.

      (  ) cidade com poucos habitantes.

     (  ) cidade tranquila e sem movimento.

     (  ) cidade pequena e sem conflitos.

 

 

quinta-feira, 10 de março de 2022

CRÔNICA: AQUI NÃO FALTA NADA - MARCOS REY - COM GABARITO

 Crônica: AQUI NÃO FALTA NADA

            Marcos Rey

        Carta

        TCHAU, MÃE:

        Estou me mandando.

        Vou pra São Paulo mas não esquente não. Já sei me virar e estou levando todo o dinheiro que guardei.

        Vila Grande não dá mais pé pra mim. Não pela cidade, que é bacana, mas por tudo que anda acontecendo. Você sabe, eu e o padrasto, a gente não se dá muito bem. Aquilo de estudar contabilidade podia ser bom pra empresa dele, pra sua frota de caminhões, não pra mim. Não nasci pra fazer contas. E um cano.

        Outro que me enche é o filho dele, o Silvano. Um chato, vive implicando comigo, provocando. Quem ele pensa que é?

        O jeito que encontrei pra me livrar disso tudo foi esse: dar o fora daqui, cair no mundo.

        Sei que você vai chorar, mas logo passa.

        Papai vai ser meu anjo da guarda, sempre por perto, aconselhando. E tudo acabará numa boa, como nos filmes de cinema.

Tchau, mãe!

Toni

Texto

        Dona Amélia entrou no quarto do filho, viu a carta sobre o travesseiro e adivinhou do que se tratava. As coisas em casa andavam tensas. Depois de ler o que Toni havia escrito, ela foi abrir o guarda-roupa do rapaz. Felizmente, ele levara as roupas de inverno. São Paulo é uma cidade fria.

        Na sala, fez uma ligação telefônica:

        — Me chamem o Antero, urgente.

        Um segundo e ouviu a voz do marido, sempre bronqueado, como Toni dizia.

        — Que aconteceu?

        — O Toni...

        — O que foi desta vez?

        — Fugiu de casa.

        — Ah...

        — Meu filho foge de casa e você só diz “ah...”?

        — O que quer que eu diga? Juízo ele nunca teve mesmo. Mas não se aflija, ele volta.

        — Acha que volta?

        — Acho sim. Vai ser uma lição para ele. Voltará dando mais valor ao que tinha aqui. Depois a gente conversa. Preciso despachar um caminhão.

        Dona Amélia saía da sala quando entrou o enteado, Silvano, recém-formado em administração de empresas, sempre bem-vestido e um tanto pretensioso. Com a madrasta era apenas educado e mais nada.

        — Toni fugiu — ela disse.

        Silvano não esboçou a menor reação. Com cara de quem um dia ia ser patrão, nunca se surpreendia.

        — Deve ter ido atrás de sua garota.

        — Garota? Que garota?

        — Lembra aquela que morava na esquina?

        — Uma que o pai trabalhava numa firma estrangeira?

        — Ele foi transferido e se mudou com a família pra São Paulo.

        — Toni não fugiria de casa por causa duma namorada — replicou dona Amélia, como se tivesse acabado de ouvir um absurdo.

        Silvano sentiu que poderia complicar a situação de Toni. Não suportava o meio-irmão nem à distância.

        — Que outro motivo Toni poderia ter, dona Amélia? Ele tinha a vida que pediu a Deus. Por acaso falta alguma coisa aqui?

        Era verdade, admitiu dona Amélia para si mesma. Durante o primeiro casamento e, depois, quando viúva, ela e o filho só conheceram aperturas. José, o falecido, jornalista de cidade pequena, nunca pôde dar conforto à família e, ao morrer, deixara uma sequência de zeros na conta bancária. Dona Amélia reconhecia que, com o segundo marido, Antero, próspero comerciante, a situação era outra, muito melhor.

        — Não, Silvano, aqui não falta nada — respondeu, dando as costas para o rapaz. Ela queria ficar sozinha para reler a carta de Toni. 

Marcos Rey. Na rota do perigo. São Paulo, Ática, 1993. p. 9-11.

Fonte: Português – Linguagem & Participação, 6ª Série – MESQUITA, Roberto Melo/Martos, Cloder Rivas – Ed. Saraiva, 1ª edição – 1998, p. 77-80.

Entendendo a crônica:

01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:

·        Afligir-se: preocupar-se.

·        Despachar: enviar.

·        Pretencioso: vaidoso, convencido, presunçoso.

·        Esboçar: entremostrar, manifestar.

·        Absurdo: algo sem sentido, que não se compreende.

·        Sequência: série, sucessão.

·        Próspero: bem-sucedido, afortunado.

02 – Toni é um adolescente e por isso usa uma linguagem cheia de gírias em sua carta. Além disso, como escreve para a mãe, usa a linguagem informal, um tratamento bem coloquial. Vamos transferir sua fala para a norma culta, formal.

a)   Estou me mandando.

Estou indo embora.

b)   Vou pra São Paulo mas não esquenta não.

Vou para São Paulo, mas não precisa se preocupar.

c)   Vila Grande não dá mais pé pra mim.

Não dá mais para ficar em Vila Grande / Não me e possível viver mais em Vila Grande.

d)   E tudo acabará numa boa, como nos filmes de cinema.

E tudo acabará bem, como nos filmes do cinema.

e)   A gente não se dá muito bem.

Nós não nos damos bem.

f)    Vou dar o fora daqui, cair no mundo.

Vou embora daqui, procurar novos lugares.

03 – O texto pode ser dividido em duas partes. Justifique.

      A primeira parte do texto é a carta de despedida da personagem Toni. A segunda é a narração da história.

04 – Quais as razões que levaram Toni a deixar a casa da mãe?

      Toni tem um relacionamento problemático com o padrasto e também com o filho deste. Silvano. Querem que ele estude contabilidade, e o rapaz não quer.

05 – Como é Antero, o padrasto de Toni?

      Seu Antero, segundo marido de D. Amélia, é dono de uma empresa de transporte. É uma pessoa que revela apenas interesses materiais, como preocupação em ganhar dinheiro, em manter a firma, etc.

06 – Explique esta afirmação, com relação ao texto: “Aqui não falta nada”:

      Silvano quis dizer que não faltava nada de material na casa. Isso soa como ironia, pois ali não havia amor, tranquilidade, respeito pelas pessoas.

07 – Qual a situação econômica de Dona Amélia?

      Dona Amélia passou por muitas dificuldades econômicas durante o primeiro casamento. Agora, economicamente, sua situação melhorou.

08 – O que podemos inferir do diálogo entre Dona Amélia e Antero?

      Pelo diálogo, percebe-se que Antero não gosta de Toni e não dá grande importância a Amélia. Para ele, o importante é despachar o caminhão, ganhar dinheiro.

09 – A personagem Toni é apresentada ao leitor do ponto de vista de Antero e de Silvano. O que ambos pensam dele?

      Antero acha que Toni não tem juízo, que não dá valor ao que te. Silvano não suportava o meio-irmão.

10 – Seu Antero quer que o enteado estude contabilidade para trabalhar na firma dele. Qual sua opinião sobre essa atitude?

      Resposta pessoal do aluno.