Conto: O MENINO E O CEDRO
Adonias Filho Era de fato maior que um gigante, dez
vezes gigante, de tão alto que, no outono, se encontrava com as nuvens.
Duzentos metros, a altura. O tronco, de casca cheia de rugas, com as raízes no
coração da terra, daria madeira para cem casas. Os galhos imensos, sempre com
enormes flores brancas, carregados de folhagem, sombreavam a mata embaixo.
[...]
A guerra, entre Nico e o Vermelho,
ainda não terminara. Grilim, quatro dias depois, saberia que o pai não se
renderia com facilidade. Nico esperou que o sol subisse no céu e, quando
esquentou de alimentar uma queimada, voltou ao cedro. Levou, desta vez, uma
enxada e uma garrafa de querosene. Conseguiria com o fogo o que não conseguiria
com o machado. Capinou em volta do cedro e, feito o pequeno aceiro, envolveu-o
com gravetos que embebeu no querosene. Riscou o fósforo e a fogueira logo
cresceu a queimar o cedro por baixo. Não havia como salvar-se e, em um ou dois
dias, sem qualquer suporte, cairia. Vendo o fogo tão aceso que já comia o
tronco, a fumaça subindo, retornou a casa para esperar o barulhão da queda.
–– Peça para mil estacas – disse à
mulher, já em casa, a lavar as mãos.
Uma hora depois, sempre a primeira a
descobrir as coisas, Manió apurou o faro e sentiu o cheiro da fumaça. Latiu alto
e, a saltar, puxou Grilim pelo braço como a mostrar a fumaça que vinha do
cedro. Ambos correram, o menino e a cachorra, e viram a fogueira que acabaria
por derrubar o Vermelho. O pai, trabalho do pai, o pai sabia como vencer as
árvores! Ele, Grilim, não podia permitir aquilo e nem deixar que o cedro
caísse. Tinha, pois, que apagar o fogo.
–– Apagar o fogo, e depressa! – disse,
a gritar, para que Manió ouvisse. [...]
Grilim contornou o oitão da casa para
alcançar o rio e, alcançando-o, apanhou o balde que ali ficava, sobre as
pedras, onde a mãe lavava a roupa. E, com ele cheio, retornou ao cedro e
derramou a água no fogo. Repetiu o trabalho inúmeras vezes, até que viu o fogo
esmorecer, enfraquecendo, e apagar-se de uma vez.
Nico, ao regressar das plantações, foi
direto ao cedro. Queria calcular o tempo que o fogo gastaria para jogá-lo no
chão. E, dando com o fogo gastaria para jogá-la no chão. E, dando com o fogo
apagado, logo achou que aquilo fosse serviço de Grilim. Não pensou um segundo
para concluir que um motivo bastante forte prendia o filho ao cedro. Não pedira
e não insistira para que não o derrubasse e não fizesse as estacas? A tristeza
que dele se apossara, quando decidira derrubar o Vermelho, parecia coisa de
feitiço. Não devia, pois, contrariar a vontade do mundo. A alegria do filho,
embora precisasse de dinheiro, valia muito mais que todas as moedas de ouro.
Percebeu, ao entrar em casa, que
Grilim, de tão desconfiado, se escondia pelos cantos. [...]
–– Grilim!
O menino, muito pálido, se voltou para
o pai. Era certo, como a luz do candeeiro, que a bronca explodiria. Manió
também se voltou, a cabeça baixa, fingindo que estava assustada. A pergunta de
Nico veio em voz leve:
–– Por que você apagou o fogo?
–– O Vermelho, pai, é nosso amigo ––
Grilim disse, perdendo o medo, a explicar. –– Vosmecê, pai, ainda não entendeu.
Ele conhece a gente e ouve tudo o que se fala.
–– O Vermelho vai ficar ali, de pé, até
que Deus assim queira. — E, com a voz um pouco emocionada, pediu: –– Amanhã,
logo cedo, diga a ele que peço desculpas.
Grilim levou a mão aos olhos para
enxugar as lágrimas. Não sabia o que dizer e como agradecer. Pensou apenas que
o pai era o melhor de todos os homens. Recuou um passo e, com suavidade agora
no semblante, recuou outro passo. E, finalmente, disse:
–– Vamos dormir, Manió.
FILHO, Adonias. O
menino e o cedro. São Paulo: FTD, 1993.
Fonte: Língua
Portuguesa. Entre palavras – Edição renovada. Mauro Ferreira. 5ª série. Ed. FTD
– São Paulo – 1ª edição – 2002. P. 44-7.
Entendendo o conto:
01 – O texto é contado por
um narrador ou por um narrador-personagem? Justifique.
É contado por um
narrador, pois ele não participa dos acontecimentos; ele não é nenhuma das
personagens que aparecem na história.
02 – Reescreva os
acontecimentos na ordem em que ocorrem no texto.
(7) Grilim chorou de emoção ao saber
que o cedro não seria cortado.
(3) Manió sentiu o cheiro de fumaça e
avisou Grilim.
(1) Nico foi ao cedro levando uma
enxada e uma garrafa de querosene.
(5) Nico concluiu que Grilim gostava
muito do cedro.
(4) Grilim apagou o fogo carregando
água do rio com um balde.
(6) Nico disse a Grilim que o cedro
não seria cortado.
(2) Nico juntou gravetos ao redor do
cedro, jogou querosene e pôs fogo.
03 – Na seção ouvir, você
aprendeu que o cedro é uma árvore que pode ter até trinta metros de altura.
a)
Leia novamente o primeiro parágrafo do texto
“O menino e o cedro” e retire dele as afirmações exageradas.
“Maior que um gigante, dez vezes gigante”; “Tão alto que [...] se
encontrava com as nuvens”; “duzentos metros, a altura”; “madeira para cem
casas”.
b)
Esses exageros revelam as impressões de quem
em relação à altura da árvore: do narrador ou do próprio Grilim?
As impressões são do próprio Grilim, que, por ser ainda criança e
admirar o tamanho do cedro, pensava que a árvore era muito maior do que na
realidade.
04 – Nico, enquanto lavava
as mãos, disse à mulher: “— Peça para mil estacas”. O que ele estava querendo dizer
com isso?
Ele estava
dizendo à mulher que o cedro era muito grande e que, com a madeira dele, seria
possível fazer mil estacas.
05 – Grilim ficou surpreso
com o modo como o pai reagiu ao que ele havia feito?
Grilim pensou que
o pai ficaria bravo; no entanto aconteceu algo oposto: Nico falou com calma,
prometeu não cortar o Vermelho e aceitou a justificativa do menino.
06 – Que justificativa o
menino usou para tentar convencer o pai a não cortar o Vermelho?
Grilim disse ao
pai que o Vermelho era amigo deles, que os conhecia e ouvia tudo o que diziam.
07 – Costuma-se dizer que as
situações difíceis e problemáticas que acontecem em nossa vida nos ajudam a
crescer, porque nos tornam mais experientes, mais capazes de entender e
resolver outras situações.
a)
Na sua opinião, Grilim e Nico cresceram com o
conflito que aconteceu entre eles? Por quê?
Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Sim, porque Nico concluiu que a
felicidade do menino era mais importante que o dinheiro.
b)
Procure recordar-se de uma situação que você
tenha vivido e que o (a) ajudou a crescer. Conte-a aos colegas.
Resposta pessoal do aluno.
08 – Quando um escritor cria
uma história, procura despertar no leitor certas reações (riso, alegria,
esperança, medo, etc.). Como você se sentiu ao terminar a leitura desse texto?
Por quê?
Resposta pessoal
do aluno.