Crônica: Choro, vela e cachaça
Stanislaw Ponte Preta
Enterro de pobre tem sempre cachaça. É para ajudar a velar pelo falecido.
Sabem como é; pobre só tem amigo pobre e, portanto, é preciso haver um incentivo qualquer para a turma subnutrida poder aguentar a noite inteira com o ar compungido que o extinto merece.
Enfim, a cachacinha é inevitável, seja numa favela carioca, seja num bairro pobre da cidade do interior.
Agora mesmo, em Minas, me contaram, morreu um tio de um tal de Belarmino. Houve velório com a melhor cachaça daquelas bandas, uma chamada "Suor de Virgem". Quando um desgraçado que não tinha sido convidado pro velório do tio de Belarmino soube que fora servida a cachaça "Suor de Virgem" saiu em procura do sobrinho do extinto e, ao encontrá-lo, lascou a ameaça:
— Belarmino, eu soube que tinha "Suor de Virgem" no velório de seu tio e você não me convidou. Mas num há de ser nada. Faço fé em Deus que inda morra alguém na minha família, que é pra eu gastar um desperdício de "Suor de Virgem" e num convidar safado nenhum da sua.
São fatos como os citados que provam a importância da cachaça nas exéquias de quem morre teso, embora — às vezes — a cachaça, ao invés de ajudar, atrapalhe.
Foi o que aconteceu agora em Ubá (MG), terra do grande Ari Barroso. Morreu lá
um tal de Sô Nicolino, numa indigência que eu vou te contar. Segundo o
telegrama vindo de Ubá, alguns amigos de Sô Nicolino compraram um caixão e
algumas garrafas de cangibrina, levando tudo para o velório.
Passaram a noite velando o morto e entornando a cachaça. De manhã, na hora do
enterro, fecharam o caixão e foram para o cemitério, num cortejo meio
ziguezagueado e num compasso mais de rancho que de féretro. Mas — bem ou mal —
lá chegaram, lá abriram a cova e lá enterraram o caixão.
Depois voltaram até a casa do morto, na esperança de ter sobrado alguma
cachacinha no fundo da garrafa. Levaram, então, a maior espinafração da vizinha
do pranteado Sô Nicolino.
É que os bêbados fecharam o caixão, foram lá enterrar, mas esqueceram o
falecido em cima da mesa.
Entendendo o texto
01. Qual é o tema central abordado na crônica
"Choro, vela e cachaça" de Stanislaw Ponte Preta? a) Tradições
funerárias em comunidades pobres.
b) O hábito de consumir cachaça em velórios.
c) Enterros improvisados.
d) A importância da cachaça nas exéquias de pessoas pobres.
02. Quem é o narrador na crônica?
a)
Terceira pessoa.
b) Um amigo de Sô Nicolino.
c) Primeira pessoa.
d) Um observador externo.
03. O que justifica a presença de cachaça em enterros
de pessoas pobres, segundo o texto?
a)
É uma tradição
antiga.
b) Ajuda os amigos a aguentarem a noite de velório.
c) É uma oferta para os falecidos.
d) Todas as opções acima.
04. O que aconteceu no velório do tio de Belarmino em
Minas Gerais?
a)
Houve uma briga por
causa da herança.
b) Alguém não convidado reclamou por não ter sido
servido com a cachaça "Suor de Virgem".
c) O caixão desapareceu misteriosamente.
d) Todos os convidados ficaram embriagados.
05. O que os amigos de Sô Nicolino esqueceram de fazer
durante o enterro?
a) Fechar do caixão.
b) Levar o caixão até o cemitério.
c) Velar o morto.
d) Enterrar o caixão.
06. O que os amigos de Sô Nicolino foram fazer após o
enterro? a) Voltaram para casa de Sô Nicolino.
b) Procuraram mais garrafas de cangibrina.
c) Foram celebrar em um bar.
d) Todos os convidados foram embora.
07. Qual foi a reação da vizinha de Sô Nicolino após o
enterro?
a) Elogiou a organização do velório.
b) Agradeceu pela presença dos amigos.
c) Criticou os bêbados por esquecerem o falecido em
cima da mesa.
d) Ofereceu mais cachaça.
08. O que
prova a importância da cachaça nas exéquias de quem morre teso, segundo o
autor?
a) A
cachaça ajuda a preservar o corpo do falecido.
b) Os amigos se reúnem apenas
por causa da cachaça.
c) A cachaça pode atrapalhar em
alguns casos.
d) Os
enterros são mais animados com a presença da cachaça.
09. Onde
acontecem os velórios mencionados na crônica?
a)
Em grandes cidades.
b) Em favelas cariocas.
c) Em bairros nobres.
d) Em
comunidades rurais.
10. Qual é
a marca de subjetividade presente na crônica?
a) A visão humorística e irônica do autor em relação aos hábitos
funerários.
b) A
tristeza e melancolia expressas pelos personagens.
c) A
neutralidade do autor ao relatar os eventos.
d) A
crítica direta à tradição de consumir cachaça em velórios.