Mostrando postagens com marcador CATULO DA PAIXÃO CEARENSE. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador CATULO DA PAIXÃO CEARENSE. Mostrar todas as postagens

domingo, 15 de maio de 2022

POEMA: O MARRUÊRO - CATULO DA PAIXÃO CEARENSE - VARIEDADE LINGUÍSTICA - COM GABARITO

 Poema: O Marruêro

         Catulo da Paixão Cearense

[...]


Lá, pras banda onde eu nasci,

Já se falava do amô:

todas as boca dizia

que era farso e matadô!

[...]

Nas marvadage do Amô

não hay cabra que não caia,

quando o diabo tira a roupa,

tira o chifre e tira o rabo

pra se visti c’uma saia!

 

Se adisfoiando no samba,

cantando uma alouvação,

eu vi a frô dos caborge

das morena do sertão!

 

Trazia dento dos oio

istrepe e mé, cumo a abeia!

Oiou-me cumo uma onça!...

E, ao despois, cumo uma oveia!

 

Aqueles oio xingoso,

eu confesso a vasmincê,

ruía a gente pru dento

que nem dois caxinguelê!

[...]

Pru mode daqueles oio,

dois marvado mucuim,

um violero, afulemado,

partiu pra riba de mim!

 

Temperei minha viola,

intrei logo a puntiá,

e ambos os dois se peguemo,

n’um disafio, ao luá!

[...]

Só despois que nestas corda

fiz pinto cessá xerém,

vi que o bichão se chamava:

— Manué Joaquim do Muquém!

 

Manué Joaquim era um cabra

naturá de Piancó!...

Quando gimia no pinho,

chorava, cumo um jaó!

 

Eu, marruêro, arrespundia

nestas corda de quandu,

e os acalanto se abria,

cumo as frô do imbiruçu!

 

Foi despois do disafio,

quando eu saí vencedô,

que os canto e os gemê dos pinho

n’um turumbamba acabou!!

 

Inquanto nós dois cantava,

sem ninguém tê dado fé,

tinha fugido a caboca

cum o Pedro Cachitoré!!!

[...]

Tinha fugido, marruêro,

aquela frô dos meus ai,

cumo uma istrela que foge,

sem se sabê pra onde vai!!!

[...]

Alegre, passava um bando

das verde maracanã!...

Fermosa, cumo a caboca,

vinha rompendo a minhã!

[...]

Eu tinha o corpo fechado

pra tudo o que é marvadez!

Só de surucucutinga

eu fui murdido três vez!...

 

Tando cum o corpo fechado,

pras feitiçage do Amô,

pensei que eu tava curado!

[...]

Pra riba de mim, Deus pode

mandá o que ele quizé!

O mundo é grande, marruêro!...

Grande é o amô!... Grande é a fé!...

 

Grande ó o pudê de Maria,

isposa de São José!...

O Diabo, o Anjo mardito,

foi grande!... Cumo inda é!!

 

Mas porém, nada é mais grande,

mais grande que Deus inté,

que uma chifrada, marruêro,

dos oio d’uma muié!!!

                CEARENSE, Catulo da Paixão. Meu sertão. 15. ed. Rio de Janeiro: A Casa do Livro, 1967. p. 61-71.

Fonte: Livro – Viva Português 1° – Ensino médio – Língua portuguesa – 2ª edição 1ª impressão – São Paulo – 2014. p. 79-81.

Entendendo o poema:

01 – No caderno, responda: Qual é o assunto do texto lido?

      Sofrimento por um amor não correspondido.

02 – Considerando apenas o eu lírico desse texto, explique como ele é?

      O eu lírico é um homem, um violeiro apaixonado.

03 – O eu lírico do texto poético de Catulo da Paixão Cearense se dirige a um amigo usando qual pessoa gramatical? Justifique com palavras do texto.

      Usa a 2ª pessoa do plural – vasmincê.

04 – Ao dirigir-se a seu interlocutor, o eu lírico do texto lido faz uma evocação. Escreva as palavras, ou a expressão, usadas para fazê-la em cada texto.

      Senhor Fremosa, Marruêro, vasmincê.

05 – Há no texto palavras que são grafadas de acordo com o modo como são faladas em diferentes regiões do país. O autor rima-as entre si ou com palavras grafadas tal qual a variedade-padrão da língua. Cite pelo menos três casos dessas ocorrências.

      Amô/matado; abeia/oveia; vasmincê/caxinguelê; puntiá/luá; malvadez/vez; quizé/fé; inté/muié.

06 – O texto poético de Catulo da Paixão Cearense, escrito no século XX, tem semelhanças com as cantigas do século XIII, ligando-se a elas por diversas tradições populares. Você diria que a linguagem usada nele pode ser vista apenas como uma forma incorreta de se escrever? Explique a importância dessas questões para o texto poético.

      Resposta pessoal do aluno. Sugestão: A linguagem de Catulo é bastante rica e adequada ao contexto em que é utilizada. Sua ligação com as cantigas demonstra um grande valor cultural não desfeito pelo tempo. A relação entre a grafia das palavras do poema e as normas urbanas de prestígio tem pouco ou nenhum valor, pois o uso dessa grafia no texto é adequado e significativo como recurso sonoro e lírico, elementos característicos dessa poesia popular, mostrando a riqueza expressiva com que o tema é tratado.