terça-feira, 23 de janeiro de 2024

CRÔNICA: A RAÇA SUPERIOR - WALCYR CARRASCO - COM GABARITO

Crônica: A Raça Superior

                Walcyr Carrasco

A ESPÉCIE HUMANA ACREDITA ser a única inteligente. Puro engano. Há tempos imemoriais nós, os humanos, fomos derrotados por uma raça superior, muito mais esperta. Mais que derrotados, fomos domesticados. Pelos cachorros. De fato, sob qualquer índice de avaliação, a raça canina se mostra superior. Quem convive com um cão gosta de dizer que é "dono". Como acreditar, se tudo prova que o cachorro é dono do homem? Na questão da alimentação, por exemplo. Qualquer pessoa gasta dinheiro e tempo para comprar ração. Analisa os vários tipos e até experimenta uns pedacinhos para avaliar o sabor. Corre atrás de ossos para proporcionar tardes de degustação ao cachorro. Compra imitações de borracha. Indústrias pesquisam novas rações nutritivas. Gastam uma fábula em propaganda. Ou seja: sem levantar uma pata, o cachorro faz com que os seres humanos trabalhem torrando neurônios, tempo e dinheiro simplesmente para alimentá-los! Certa vez tive uma cachorrinha que só podia comer arroz com cenoura e carne moída. Estava sem empregada. Durante um mês levantava uma hora antes, preparava a comida e saía para trabalhar. Ao voltar, servia uma nova refeição e lavava o prato. Em troca, ela me lambia os dedos. Eu me sentia no cúmulo da felicidade só de receber essas lambidinhas! Seja dita a verdade: quem era dono de quem?

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjdbBaWaEsU7PULB844Cut0XVsTl2nJF4NpFajdmbcUtz_-AlSBrh9R5qjV91eL8Nq_CN0w-o6IC1XUNJwIFVnY5xgpronVsiLyA-_XA58xsrQRUtUEHq-KVRiUwzXs12zZTfgFkk4gYddIJjPZv1VwJpRFNSzPYEEnqyMSPA4rPzRt6Qm92g-w2LVUkaY/s320/AU%20AU.jpg


E na questão amorosa? Quando gosta, de alguém, o cão abana o rabo. Pode ser um desconhecido. Gostou, abanou. Quando está a fim, deita-se de patas para cima e lança um olhar bem pidoncho. Até o coração mais duro não resiste a dar carinho, cocar as orelhas, fazer uns afagos. Eu, não. Nunca me deitei de barriga para ficar me oferecendo. Vontade não faltou, mas e a coragem? Nós, seres humanos, usamos artifícios. Gastamos dinheiro em perfumes, em cabeleireiros, em dermatologistas. Vamos a happy hours, jantares, festas, barzinhos da moda, entramos em chats da internet, só para achar quem nos coce as orelhas. Se alguém faz festa para todo mundo que conhece, rebolando como um cãozinho, vem o veredicto:  

— Ih! Está com carência afetiva.

Toca a procurar terapeuta. Horas e horas dedicadas a analisar a pura vontade de buscar amor! Revistas dedicam quilômetros de papel a práticas de sedução. Como olhar de lado, como sorrir, como se oferecer sem dar na vista. Mais: como ter coragem de expressar os sentimentos. Cachorro, não. Abana o rabo e pronto. Muitas vezes, com ciúme, já tive vontade de morder alguém. Ao contrário, sorri simpaticamente enquanto o sangue fervia. Cães não possuem esse tipo de constrangimento. Atiram-se em cima do rival. Mordem a mão de quem acaricia. Até conseguirem seu quinhão de afeto. Mas também não guardam raiva. Depois de rosnarem um para o outro, dois cães saem pulando e brincando juntos. Que espécie sabe lidar melhor com as próprias emoções?

A questão da pele também é importante. Criamos indústrias do vestuário porque não estamos satisfeitos com a própria pele, e inventamos estratagemas para cobri-la. Boa parte da humanidade se dedica a fabricar tecidos, a inventar e a vender roupas. Qualquer pessoa ambiciona se vestir bem. Fortunas são despendidas em novos guarda-roupas. A moda vira, e toca a gastar tudo outra vez. Cachorro, não. Nasce vestido. Imagine-se quanto delírio, quanta mão-de-obra seria evitada se o ser humano tivesse a mesma tranquilidade a respeito da própria aparência. 

Chegamos ao X da questão. Criamos filosofias, escrevemos livros. Há quem faça ioga, meditação. Tudo para aprender a aceitar o fardo da existência. O cão já nasce aceitando. A vida é e não é, deve pensar o cão, com a, sabedoria de um mestre zen. É o que constato todo dia ao chegar em casa exausto do trabalho, de mau humor com o chefe, com a fatura do cartão de crédito prestes a me degolar, o cheque especial batendo as folhas em torno de minhas orelhas como uma ave de rapina.

Sento na varanda e meu cachorro se aproxima: Sem nenhuma preocupação na vida. Deita-se aos meus pés e prepara-se para receber sua dose cotidiana de carinho. Eu me submeto. Raça superior é isso aí. 

 Entendendo o texto

01. Quem é considerado a "raça superior" na crônica "A Raça Superior"?

a) Os humanos.

b) Os cachorros.

c) Os gatos.

d) Os pássaros.

02. Qual é o argumento do narrador sobre a superioridade dos cachorros na questão alimentar?

         a) Os cachorros escolhem sua própria comida.

         b) Os humanos trabalham para alimentar os cachorros.

         c) Os cachorros são mais seletivos na escolha da comida.

         d) Os humanos gastam dinheiro e tempo para comprar ração para os cachorros.

03. Como o narrador se sente ao receber lambidas dos dedos de sua cachorrinha?

a) Desprezado.

b) No cúmulo da felicidade.

c) Envergonhado.

d) Indiferente.

   04. Na questão amorosa, como o narrador compara o comportamento humano e canino?

         a) Humanos são mais diretos que os cachorros.

         b) Cachorros abanam o rabo quando gostam de alguém.

         c) Humanos usam artifícios para atrair amor.

         d) Cachorros são mais tímidos em expressar afeto.

05. O que os cachorros fazem quando estão com ciúmes?

         a) Choram.

         b) Mordem.

         c) Sorriem simpaticamente.

         d) Ficam indiferentes.

  06. O narrador menciona a questão da pele como importante. Como os cachorros lidam com isso?

         a) Eles usam roupas para cobrir a pele.

         b) Eles nascem vestidos.

         c) Eles criam indústrias do vestuário.

         d) Eles são indiferentes à própria aparência.

07. O que é destacado como X da questão na crônica?

        a) A alimentação dos cachorros.

        b) A questão amorosa entre humanos e cachorros.

        c) A aceitação da vida pelos cachorros.

        d) A criação de filosofias pelos humanos.

08. Como o narrador se sente ao chegar em casa exausto do trabalho e encontrar seu cachorro?

        a) Irritado.

        b) Indiferente.

        c) Feliz.

        d) Surpreso.

09. O que o narrador observa ao chegar em casa e interagir com seu cachorro?

        a) O cachorro está preocupado com problemas.

        b) O cachorro está ansioso.

        c) O cachorro está relaxado e sem preocupações.

        d) O cachorro está triste.

10. Qual é a conclusão do narrador sobre a raça superior no final da crônica?

        a) Os humanos são superiores aos cachorros.

        b) Os cachorros são superiores aos humanos.

        c) Não há uma raça superior.

        d) Os gatos são mais superiores que cachorros e humanos.

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário