Relato/poema: O
sonho
José Paulo Paes
Alguns anos atrás tive um sonho
estranho com a casa de Taquaritinga onde vivi até os 11 anos. Sonhei que era um
menino voador que fora pousar, feito passarinho, no teto da velha casa, para de
lá ficar espiando o que se passava dentro dela. Escrevi então um poema a que
dei o título de “A casa”.
Vendam logo esta casa, ela está
cheia de fantasmas.
Na livraria, há um avô que
faz cartões de boas-festas com corações de purpurina.
Na tipografia, um tio que
imprime avisos fúnebres e programas de circo.
Na sala de visitas, um pai
que lê romances policiais até o fim dos tempos.
No quarto, uma mãe que está
sempre parindo a última filha.
Na sala de jantar, uma tia
que lustra cuidadosamente o seu próprio caixão.
Na copa, uma prima que passa
a ferro todas as mortalhas da família.
Na cozinha, uma avó que
conta noite e dia histórias do outro mundo.
No quintal, um preto velho
que morreu na Guerra do Paraguai rachando lenha.
E no telhado um menino
medroso que espia todos eles; só que está vivo: trouxe-o até ali o pássaro dos
sonhos.
Deixem o menino dormir, mas
vendam a casa, vendam-na depressa.
Antes que ele acorde e se
descubra também morto.
O sonho só me deu a base e a atmosfera
fantasmagórica do poema; para o resto, recorri às lembranças que tinha dos meus
familiares, quase todos mortos àquela altura. A velha casa de Taquaritinga estava,
abandonada havia anos, arruinando-se.
Quem, eu? – Um poema como
outro qualquer. São Paulo, Atual, 1996.
Fonte: Livro – Ler,
entender, criar – Português – 6ª Série – Ed. Ática, 2007 – p. 115-6.
Fonte da imagem- https://www.google.com/url?sa=i&url=https%3A%2F%2Fwww.lpm-blog.com.br%2F%3Fp%3D7411&psig=AOvVaw0tWCGdMA-L-6dGqf5fw1oO&ust=1611609935150000&source=images&cd=vfe&ved=0CAIQjRxqFwoTCJCXiIXBte4CFQAAAAAdAAAAABAO
Entendendo o relato/poema:
01 – O texto “O sonho” faz
parte da autobiografia de José Paulo Paes de onde foi tirado também o texto “A
casa”. Quando o autor teve o sonho descrito e quando escreveu o poema: na
infância ou na idade adulta?
Na idade adulta.
02 – Quem são os fantasmas
da casa e o menino que os espia mencionados no poema?
Os fantasmas são
os familiares do autor, já mortos, e o menino é o próprio poeta, quando
criança.
03 – Quais das personagens
mencionadas no poema já haviam aparecido em “A casa”?
O avô, o pai, a tia, a avó, o menino (o
próprio poeta).
04 – No poema, as
personagens aparecem caracterizadas da mesma forma como o foram no trecho
escrito em prosa? Aponte semelhanças e/ou diferenças.
Não. A
caracterização no texto em prosa é mais detalhada e desenvolvida. No poema, é
sintética e simbólica, havendo uma redução: cada personagem aparece no lugar da
casa ao qual o poeta a associava, realizando apenas uma ação, a que ficou na
memória do poeta (a mãe, no quarto, parindo; o pai, na sala de visitas, lendo,
etc.).
05 – Leia:
“Vendam
logo esta casa, ela está cheia de fantasmas”.
“Deixem
o menino dormir, mas vendam a casa, vendam-na depressa”.
a)
Em que tempo estão os verbos destacados? O
que eles exprimem?
No imperativo afirmativo. Exprimem ordem ou pedido.
b)
Identifique no texto os advérbios e as
locuções adverbiais que manifestam a urgência do menino em que a casa seja
vendida.
Logo, depressa, antes que.
06 – Exceto o primeiro e os
dois últimos versos, os outros escrevem ações dos familiares mortos e do
menino. Identifique e copie no caderno os verbos empregados nesses versos. Em
que tempo eles estão?
Há, faz, imprime,
lê, lustra, passa, conta, espia, está: presente do indicativo; morreu:
pretérito perfeito; está parindo e (está) rachando: locuções verbais com o
verbo auxiliar estar no presente e o verbo principal no gerúndio.
07 – Vimos que no texto “A
casa” o tempo verbal predominante era o pretérito. No poema, o autor emprega
principalmente o presente. Por quê?
Na autobiografia ele narrava fatos
antigos, de sua infância. No poema, descreve as cenas como se as estivesse
visualizando no momento em que escreve.
08 – Reúna-se com um colega
e escrevam no caderno um parágrafo explicando como vocês interpretam os
sentimentos do poeta nos versos seguintes:
“Deixem o menino dormir, mas vendam a
casa, vendam-se depressa.
Antes que ele acorde e se descubra
também morto”.
Resposta pessoal do aluno.