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segunda-feira, 11 de novembro de 2024

CRÔNICA: A REGREÇÃO DA REDASSÃO - CARLOS EDUARDO NOVAES - COM GABARITO

 Crônica: A REGREÇÃO DA REDASSÃO 

             Carlos Eduardo Novaes

        Semana passada recebi um telefonema de uma senhora que me deixou surpreso. Pedia encarecidamente que ensinasse seu filho a escrever.

        -- Mas, minha senhora – desculpei-me –, eu não sou professor.

        -- Eu sei. Por isso mesmo. Os professores não têm conseguido muito.

        -- A culpa não é deles. A falha é do ensino.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEia17G1ryFrFi2nWLQRORAzYYM3QijRm3sZ-iQ6R5KzeuQJTqBYvtoz06PoRfyqeNRmA6Xwvd0_fdYiqCNKtVnBQpJhRbb41-RemE-h4jOBCNz6WBY0cXIFhn7U1LhfQ1vcvVZPi-0fT3x8aShr__WxTgarfDxfuFYGI2QpCGj4wWg8lZI5Lc7DHK8lhv8/s320/REGRE%C3%87AO.jpg


        -- Pode ser, mas gostaria que o senhor ensinasse o menino. O senhor escreve muito bem.

        -- Obrigado – agradeci –, mas não acredite muito nisso. Não coloco vírgulas e nunca sei onde botar os acentos. A senhora precisa ver o trabalho que dou ao revisor.

        -- Não faz mal – insistiu –, o senhor vem e traz um revisor.

        -- Não dá, minha senhora – tornei a me desculpar –, eu não tenho o menor jeito com crianças.

        -- E quem falou em crianças? Meu filho tem 17 anos.

        Comentei o fato com um professor, meu amigo, que me respondeu: “Você não deve se assustar, o estudante brasileiro não sabe escrever”. No dia seguinte, ouvi de outro educador: “O estudante brasileiro não sabe escrever”. Depois li no jornal as declarações de um diretor da faculdade: “O estudante brasileiro escreve muito mal”. Impressionado, saí à procura de outros educadores. Todos me disseram: acredite, o estudante brasileiro não sabe escrever. Passei a observar e notei que já não se escreve mais como antigamente.

        Ninguém mais faz diário, ninguém escreve em portas de banheiros, em muros, em paredes.

        Não tenho visto nem aquelas inscrições, geralmente acompanhadas de um coração, feitas em casca de árvore. Bem, é verdade que não tenho visto nem árvore.

        -- Quer dizer – disse a um amigo enquanto íamos pela rua – que o estudante brasileiro não sabe escrever? Isto é ótimo para mim. Pelo menos diminui a concorrência e me garante emprego por mais dez anos.

        -- Engano seu – disse ele. – A continuar assim, dentro de cinco anos você terá que mudar de profissão.

        -- Por quê? – espantei-me. – Quanto menos gente sabendo escrever, mais chance eu tenho de sobreviver.

        -- E você sabe por que essa geração não sabe escrever?

        -- Sei lá – dei com os ombros –, vai ver que é porque não pega direito no lápis.

        -- Não senhor. Não sabe escrever porque está perdendo o hábito da leitura. E quando o perder completamente, você vai escrever para quem?

        Taí um dado novo que eu não havia considerado. Imediatamente pensei quais as utilidades que teria um jornal no futuro: embrulhar carne? Então vou trabalhar num açougue. Serviria para fazer barquinhos, para fazer fogueira nas arquibancadas do Maracanã, para forrar sapato furado ou para quebrar um galho em banheiro de estrada? Imaginei-me com uns textos na mão, correndo pelas ruas para oferecer às pessoas, assim como quem oferece hoje bilhete de loteria:

        -- Por favor amigo, leia – disse, puxando um cidadão pelo paletó.

        -- Não, obrigado. Não estou interessado. Nos últimos cinco anos a única coisa que leio é a bula de remédio.

        -- E a senhorita não quer ler? – perguntei, acompanhando os passos de uma universitária. – A senhorita vai gostar. É um texto muito curioso.

        O senhor só tem escrito? Então não quero. Por que o senhor não grava o texto? Fica mais fácil ouvi-lo no meu gravador.

        E o senhor, não está interessado nuns textos?

        -- É sobre o quê? Ensina como ganhar dinheiro?

        -- E o senhor, vai? Leva três e paga um.

        -- Deixa eu ver o tamanho – pediu ele. 

        Assustou-se com o tamanho do texto:

        -- O quê? Tudo isso? O senhor está pensando que sou vagabundo? Que tenho tempo para ler tudo isso? Não dá para resumir tudo em cinco linhas?

Carlos Eduardo Novaes.

Fonte: Português – José De Nicola – Ensino médio – Volume 1 – 1ª edição, São Paulo, 2009. Editora Scipione. p. 177.

Entendendo a crônica:

01 – No diálogo entre a mãe e o autor do texto, percebe-se uma crítica velada a respeito dos professores no Brasil. Identifique a crítica.

      A mãe procurou uma pessoa que não era professor porque os professores de seu filho não conseguiam ensiná-lo a escrever, o que foi justificado pelo autor que não era culpa deles, dos professores, mas por causa da falha do ensino. Ora se o ensino é falho (tem defeitos) e é realizado por professores, então a culpa é daquele que provoca essa falha, isto é, dos professores. O ensino em si não é autónomo, mas é o resultado da ação de alguém.

02 – O texto apresenta a causa porque os estudantes brasileiros não sabem escrever. Qual é?

      Porque não leem.

03 – Se os estudantes brasileiros, segundo o autor, não sabem escrever porque não leem, qual deve ser a estratégia que os professores devem utilizar para reverter essa situação?

      Resposta pessoal do aluno.

04 – Para você. Que outras causas podem contribuir para que o estudante brasileiro tenha dificuldades para escrever?

      Respostas pessoal do aluno.

05 – Por que o autor utilizou a grafia errada nas palavras do título do texto?

      Porque naturalmente ele quis chamar a atenção do leitor para o assunto do seu texto: a dificuldade dos estudantes brasileiros de escrever em português.

06 – O autor se valeu dos fonemas e suas representações gráficas em português, para chamar a atenção do leitor. Algumas palavras, em português, podem ter o seu sentido alterado (ou não) em razão da sua representação gráfica. No caso do título do texto, houve alteração de sentido? Justifique.

      Não. Se forem pronunciadas, essas mesmas palavras terão o mesmo som: regressão/regreção – redação/redassão.

 

 

quarta-feira, 21 de junho de 2023

CRÔNICA: O MARRECO QUE PAGOU O PATO - CARLOS EDUARDO NOVAES - COM GABARITO

 CRÔNICA: O MARRECO QUE PAGOU O PATO

                    Carlos Eduardo Novaes

 Semana passada, São Paulo, apesar de toda fama de que não pode parar, parou. E não foi num congestionamento. Parou para discutir o caso do marreco Quércia e sua marreca Amélia, presos e engaiolados durante 24 horas sob a acusação de poluírem o meio ambiente. Diante do fato eu fico aqui pensando que os paulistas já devem ter resolvido todos os seus grandes problemas urbanos. Sim, claro: quando um povo começa a prender marrecos é porque não tem mais nada para fazer.

  

Fonte da imagem - https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh2KIYLsOBW0u5H8Qv_dhMSPgOI_s2N-RL9Xl_kzcxusrDVScW807vN-S_HI0WHoZS_3Q2D28Dqi5m2_wjSx4ltt5ps31e2e1c2A8sMEHnNrOPqVux550E84wdLbItBhjxPYqOMmbT6q9-doljoa_-Ly0PVLYwx_LW97KjgvZjxfVO7tLAW0GEsZTuUL-g/s320/Marreco.jpg

O marreco Quércia - deixa-me explicar - ganha a vida honestamente como relações-públicas da casa Agro Dora, na Rua da Consolação, 208. Em seu trabalho passa os dias inteiros circulando pela calçada e atraindo fregueses para a loja. Na segunda-feira o gerente da loja foi surpreendido com a presença de um fiscal, que muito compenetrado perguntou se o marreco era de sua propriedade. Diante da resposta positiva, virou-se para o gerente e pediu:

"Seus documentos?". Leu atentamente um por um, devolveu-os e disse: "Agora deixe-me ver os documentos do marreco".

- O marreco não tem documentos - respondeu o gerente.

- Nenhum? Nem título de eleitor? Certificado de reservista? Nada? Então eu acho que vou ter que prender o seu marreco.

- O senhor não pode fazer uma coisa dessas - ponderou o gerente. - Não há nenhuma lei que obrigue marrecos a ter documento.

- Não há? - desconfiou o fiscal. - Então espere um momentinho.

Foi ao telefone e ligou para o chefe da repartição: "Alô, chefe? Encontrei um marreco passeando pela rua sem documento".

- Que está esperando? - vociferou o chefe. - Prenda-o por vadiagem.

- Mas, chefe, é um marreco. Precisamos de uma lei para enquadrá-lo. O senhor sabe qual é o número dessa lei?

- Não tenho a menor ideia.

- Então pergunta se alguém aí sabe.

 - Alguém aí sabe - perguntou o chefe, voltando-se para os funcionários da repartição - quais são os documentos que um marreco necessita para transitar livremente pelas ruas?

Não. Ninguém sabia. O chefe então sugeriu que o fiscal procurasse outro motivo para prender o marreco. "Mas que motivo?", perguntou o fiscal, que era meio duro de imaginação.

- O marreco está nu? - Indagou o chefe. - Então prenda-o por atentado ao pudor.

O fiscal parou um pouco, pensou e não se lembrou de ter visto jamais um marreco vestido. Não, essa era demais. O chefe, já pensando no almoço de domingo, insistiu: "O marreco está parado em cima da calçada?".

- Está.

- Então prenda-o por estacionar em local proibido.

"Boa ideia", pensou o fiscal. Voltou ao gerente, que estava parado na calçada ao lado do marreco, disfarçou, disse que iria perdoar, disse que iria perdoar a falta de documentos, "mas infelizmente tenho que levar o seu marreco por estar parado em local não permitido".

- Esta certo - concordou, irritado, o gerente -, mas então chama o guincho.

- Pra que guincho?

- Meu marreco só sai daqui rebocado.

Formou-se a maior confusão em torno do marreco. O fiscal querendo levá-lo de qualquer maneira, e o gerente, apoiado por dezenas de populares, defendendo a inocência do marreco. Nisso, chegou um segundo fiscal pouquinha coisa mais inteligente que o primeiro e decretou: "O marreco não pode ficar solto, é um agente da poluição".

- Agente de quem? - espantou-se um balconista da loja. - Garanto que não.

O Quércia trabalha aqui há mais de dois anos.

- E daí? - interveio um popular que estava do lado do fiscal. - Ele pode ter dois empregos. Vai ver que quando sai daqui faz um bico em alguma agência.

- E você acha que o marreco, com esse bico, ainda precisa fazer outro?

- A acusação é injusta - interrompeu o gerente -, o marreco não pode ser acusado de poluir. Se eu tivesse aqui um elefante soltando fumaça pela tromba está certo, mas o Quércia nem fuma.

- Não interessa - afirmou o segundo fiscal, meio agressivo -, isso o senhor explica lá para o chefe.

O marreco entrou na sede da Administração Regional da Sé cheia de ginga.

Imediatamente o chefe destacou um funcionário para qualificá-lo: nome, endereço, estado civil, essas coisas.

De gravata e camisa de manga curta, o burocrata sentou-se à máquina e começou: "Nome?". O gerente com o marreco no colo respondeu: "Quércia".

- Quércia de quê?

- De nada.

- Como de nada? Ele não tem família?

- Tem. É da família dos anatídeos.

- Então - prosseguiu o funcionário batendo na máquina -, Quércia Anatídeo.

Terminada a ficha o burocrata abriu uma gaveta e, enquanto procurava o material para tirar as impressões digitais, disse ao gerente:

- Me dá aí o polegar do marreco.

- O marreco não tem polegar - desculpou-se o gerente.

- Não? - disse o funcionário já contrariado porque não encontrava as almofadas para carimbos. - Então me dá o indicador.

- O marreco também não tem indicador.

- E o anular, tem?

- Também não, senhor.

- Poxa - chateou-se o burocrata -, então me dá aí qualquer dedo que estiver sobrando.

O gerente precisou explicar que marreco não tinha dedo. Tinha pata. Ainda assim o funcionário já meio perturbado entendeu que o gerente se referia à companheira do marreco e perguntou: "Uma pata?".

- Não. Duas.

- E ele vive bem com as duas?

Custou pouco para desfazer a confusão. Encerrada essa fase, o funcionário encaminhou-se para outra sala, onde o marreco teria que tirar umas fotos três por quatro de identificação.

O fotógrafo, repetindo gestos tão automáticos quanto a máquina, mandou o marreco subir na cadeira, esticar bem o pescoço, olhar para a frente e não se mexer. O marreco, mesmo sem entender nada, seguiu as instruções do fotógrafo. Quando enfiou a cabeça por debaixo do pano preto - a máquina era daquelas antigas -, observou pelo visor que alguma coisa estava errada. Tornou a levantar a cabeça e indagou do funcionário: "Nós vamos fotografá-lo assim?.

- Assim como? - indagou o funcionário sem entender.

- Sem gravata?

- Não sei - disse o funcionário meio reticente -, mas eu acho que marreco não precisa botar gravata.

- Acho melhor botar uma gravata nele - retrucou o fotógrafo -, você sabe como é o chefe: já disse que foto só de gravata.

O funcionário tirou sua gravata, pediu um paletó emprestado a um datilógrafo, tiraram as fotos necessárias e depois engaiolaram o marreco. E não é que no dia seguinte a poluição em São Paulo diminuiu sensivelmente...

NOVAES, Carlos Eduardo. A cadeira do dentista e outras crônicas. São Paulo: Ática, 1995. p. 77-81.

Fonte: Livro – Português – Conexão e Uso -7º Ano – Dileta Delmanto/Laiz B. de Carvalho, Editora Saraiva, 1ª ed., São Paulo, 2018.p 188-193.

Vocabulário

compenetrado: concentrado.

certificado de reservista: documento utilizado para comprovar

que o cidadão prestou serviço às Forças Armadas do Brasil.

ponderou: considerou, expôs com prudência e calma.

vociferou: berrou, reclamou aos gritos.

transitar: percorrer, caminhar.

atentado ao pudor: ato ofensivo à decência, honra, dignidade de alguém.

ginga: movimento de balançar o corpo de um lado para outro, expressão corporal de quem caçoa.

qualificar: avaliar, emitir opinião a respeito de algo.

burocrata: (pejorativo) pessoa que, por achar de grande prestígio seu cargo burocrático, exorbita de suas funções e assume atitudes intoleráveis no desempenho dessas funções.

anatídeos: família de aves que inclui patos, marrecos, cisnes.

reticente: que hesita ou age com cautela.

retrucou: respondeu de modo imediato.

ENTENDENDO O TEXTO

01. Essa crônica foi escrita por Carlos Eduardo Novaes, conhecido cronista brasileiro.

         a) Qual é a finalidade da crônica de Carlos Eduardo Novaes?

             Despertar reflexões e divertir o leitor.

         b) Qual é o assunto da crônica?

              A história de um marreco que foi preso sem motivo algum.

         c) Sua hipótese sobre o assunto da crônica foi confirmada? Explique.

             Resposta pessoal.

      02. O cronista narra um evento, um pequeno acontecimento, tomando o tema para discutir:

          a) a situação dos patos que são utilizados em atividades comerciais.

          b) a burocracia que leva a situações absurdas no dia a dia das pessoas.

         c) o envolvimento de pessoas estranhas ao caso no desenrolar do conflito.

     03. Converse com os colegas e verifique quais afirmações a seguir se referem adequadamente à crônica lida.

a) Trata-se de uma história curta, com narrador, personagens, tempo e espaço.

         b) Leva à reflexão sobre um problema social.

         c) Faz crítica por meio do humor.

         d) Apresenta trechos narrativos, mas não é considerada como narrativa por apresentar diálogos e descrições.

         e) Trata de um tema atual.

         f) Tem como ponto de partida uma cena ou uma questão do cotidiano.

  04. “O marreco que pagou o pato” é uma crônica narrativa, pois apresenta uma história com começo, meio e fim e tem elementos próprios das narrativas (personagens, tempo, espaço, narrador), assim como acontece no conto, na fábula, no causo, etc.

a) O cronista escolheu o ponto de vista da 3a pessoa. É um narrador que apenas observa e conta o que viu ou parece conhecer os sentimentos dos personagens? Identifique um trecho que exemplifique sua resposta.

Ele parece saber o que se passa no interior dos personagens. Possibilidades: “O fiscal parou um pouco, pensou e não se lembrou de ter visto jamais um marreco vestido.” / “’Boa ideia’, pensou o fiscal.”

b) As narrativas costumam organizar-se nestas partes, que você já conhece.

Situação inicial        Desenvolvimento (ações)      Complicação

Clímax (o ponto mais tenso)           Desfecho

Indique  que momento da narrativa corresponde à complicação e ao desfecho.

Complicação: Os marrecos são presos.

Desfecho: O marreco é fichado como se fosse um criminoso.

 05.Releia estes trechos.

Nisso, chegou um segundo fiscal [...] e decretou: “o marreco não pode ficar solto, é um agente da poluição”.

O funcionário tirou sua gravata, pediu um paletó emprestado a um datilógrafo, tiraram as fotos necessárias e depois engaiolaram o marreco. E não é que no dia seguinte a poluição em São Paulo diminuiu sensivelmente...

a)    Em sua opinião, o narrador acredita que a poluição tenha diminuído depois da prisão do marreco? Explique sua resposta.

Não, ele está zombando da atitude dos burocratas.

b)    Além do contexto, no segundo trecho, qual é a expressão que confirma sua resposta?

Espera-se que os alunos percebam que é a expressão “não é que”, que indica suposta surpresa.

Recursos expressivos

01. A história é narrada em 3a pessoa.

a)   Quem poderia ser esse narrador?

Uma pessoa que teria presenciado os acontecimentos.

b)   Como você o imagina?

Resposta pessoal. Possibilidade: Uma pessoa crítica, irônica e bem-humorada.

c)   Você acha que o narrador poderia ter mesmo presenciado tudo que narra? Explique.

Resposta pessoal.

02. As crônicas podem apresentar uma mistura de trechos narrativos, expositivos (em que se expõem informações para explicar algo), descritivos e opinativos. Indique no caderno se os trechos a seguir são narrativos, expositivos, descritivos ou opinativos.

a)   O marreco Quércia — deixa-me explicar — ganha a vida honestamente como relações públicas da casa A. D. [...]. expositivo

b)   Foi ao telefone e ligou para o chefe da repartição [...].

narrativo

c)    Formou-se a maior confusão em torno do marreco.

narrativo

d)   Sim, claro: quando um povo começa a prender marrecos é porque não tem mais nada para fazer.

opinativo

e)   Nisso, chegou um segundo fiscal pouquinha coisa mais inteligente que o primeiro [...].

opinativo

03. O fiscal e os policiais queriam que o marreco seguisse uma série de normas. Indique algumas dessas normas.

Sugestões: O marreco não pode andar sem documentos, a ave não deveria andar sem roupas nem estacionar em local proibido, o marreco não pode ficar solto, é um agente de poluição.

04. Há momentos em que o narrador conversa diretamente com o leitor, tornando o texto mais informal. Localize um deles.

“O marreco Quércia — deixa-me explicar — ganha a vida honestamente como relações públicas [...].”

domingo, 9 de maio de 2021

CRÔNICA: A IDADE DA PEDRA - CARLOS EDUARDO NOVAES - COM GABARITO

 CRÔNICA: A IDADE DA PEDRA 

     Carlos Eduardo Novaes

         A juventude parece ter descoberto algo de que sempre desconfiei: a vida é um recreio. Como disse uma gatinha de 17 anos entrevistada por um semanário: "só há duas coisas na vida: som e patins". Sendo assim, a juventude Zona sul vai em frente exibindo o seu invejável realce existencial. "O mundo seria muito mais saudável", afirma outra gatinha, "se os nossos governantes andassem de tênis e camiseta". Infelizmente, porém, a terra dos adultos continua sendo aquela coisa árida, sinistra e plúmbea. E é nesta praia que a garotada vai acabar desembarcando quando terminar a pilha da juventude. Tenho certeza de que esse é o momento mais difícil na vida de um jovem de hoje: atravessar a fronteira da juventude para a idade adulta, duas terras que nunca estiveram tão distantes. Sei que a experiência é traumatizante porque tenho um amigo que a viveu com seu filho de 20 anos. O garotão, Otávio, tinha trancado matrícula na faculdade havia dois anos e não queria nem saber: vivia na dele, curtindo adoidado um rock, praia, windsurf, patinação, gatinha, invariavelmente metido dentro do uniforme oficial dos gatões, jeans, camisetas e tênis. O mundo para ele era do tamanho de uma lantejoula. No dia em que fez 21 anos, o pai o chamou para uma conversa.

-- Escuta, filho, nós precisamos conversar. 

O garotão deslizava na sala de um lado para o outro experimentando seus novos patins. Nem era com ele. 

-- Escuta, filho -- repetia o pai, falando como se assistisse a um jogo de tênis: cabeça pra lá, cabeça pra cá --, nós precisamos ter uma conversinha. Você afinal está fazendo 21 anos e....

Otávio continuava patinando como se estivesse sozinho na sala. 

-- Filho, eu já estou ficando tonto. Quer fazer o favor de...

O garotão parou a um canto, fechou os olhos e começou a se contorcer, como se acompanhasse alguma música. O pai olhou à volta, apurou o ouvido e não escutou nada. A mulher entrou na sala. 

-- Cristina, ou o teu filho tá maluco ou eu tô ficando surdo. Olha só o jeitão dele...

A mãe foi ao filho, determinada, e tirou-lhe o headphone dos ouvidos. 

-- Tatá. escuta o  seu pai que ele tem uma coisa muito importante para lhe dizer.

O garotão deu um muxoxo e fez uma expressão de "que saco!"

-- Escuta, filho, eu não sei como lhe dizer... você está fazendo 21 anos... sei que é duro, mas... mas a vida é assim mesmo e...

-- Desembucha logo, coroa. Qual é? Hiiiiii...

-- O que quero lhe dizer, meu filho, é que agora... agora você já é um... como direi?... um adulto! 

A face de Otávio se contraiu como se tivesse recebido a pior notícia do mundo. Seus lábios ficaram brancos, os olhos arregalaram. Botou as mãos na cabeça e caiu num pranto convulso.

-- Não! Não! -- berrava. -- Um adulto, não! Eu não quero ser adulto. Eu não quero! Mamãe, eu não quero.

Correu para os braços da mãe e começou a chorar em seu ombro.

-- Eu lhe disse, Alfredo -- resmungou a mãe acariciando o filho soluçante. -- Você tinha que dar a notícia com cuidado... você traumatizou o garoto. 

-- Algum dia ele teria que saber, Cristina. 

-- Mas não é assim. Você tinha que ir preparando o garoto aos poucos. Você pensa que é fácil para um jovem que vê o mundo de um ringue de patinação, de cima de uma prancha de windsurf, de repente ouvir que já é um adulto? Saber que vai ter de votar? Preencher declaração de Imposto de Renda? Trabalhar? É duro, Alfredo, é duro... 

-- Mãe, eu não quero -- disse Otávio enxugando as lágrimas --, eu ainda não tô preparado para ser um adulto... deixa eu ficar mais uns cinco anos com a minha juventude... aos 26 eu prometo que serei um adulto... juro que serei um adulto... e dos bons. 

O pai foi inflexível.

-- Não, filho. Você tem que conhecer o outro lado da vida... A vida não é só som e patins. Eu arranjei um emprego. 

-- Um emprego? Mas pra quê, pai? Você ainda está trabalhando... Você ainda goza de boa saúde. Nós temos sido tão felizes assim: você e mamãe trabalhando e eu me divertindo. Alguém precisa se divertir nessa casa. 

-- Sinto muito, filho, mas não vou ficar sustentando um marmanjo de 21 anos. 

-- Por que não? -- esbravejou o garotão. -- Você me botou no mundo. Eu não tive escolha. Agora aguenta. Além do mais, você devia se sentir orgulhoso de financiar a minha vida: sou o melhor patinador que tem no Roller. 

O pai, um economista influente, disse que ele iria trabalhar no gabinete da presidência da Petrobrás. Acrescentou que começaria hoje no trabalho, portanto deveria tirar o calção e vestir uma roupa para se apresentar ao chefe do gabinete. Otávio, sem conseguir esconder o pânico por ter virado adulto, foi ao quarto e voltou de jeans, camiseta e um tênis todo sujo. 

-- É assim que você tá pensando em se apresentar na Petrobrás?

-- Por que não? Vou assim a todos os lugares. Nunca usei outra roupa.

-- Escuta, filho -- disse o pai tentando manter a calma --, você ia assim a todos os lugares quando era jovem. Agora você é um adulto...

-- Não precisa me lembrar isso toda hora, pai -- respondeu Otávio ameaçando chorar novamente. 

-- O mundo dos adultos é diferente -- prosseguiu o pai explicativo. -- Para você poder entrar, ele exige traje passeio completo. Vai lá dentro e bota o terno que sua mãe comprou. 

Mas eu nunca botei um terno... Por quê? Por que tem que ser de terno? Eu não entendo... por quê? 

-- Porque é assim que os adultos andam, filho. Os adultos são pessoas sérias, honestas, incorruptíveis, democráticas, pacifistas... devem usar roupas adequadas...

-- Ou será que os adultos usam essas roupas exatamente para dar a impressão de que eles são tudo aquilo que não são?

-- Vai, vai, filho. Depois nós conversamos sobre isso. Vamos ter muito que conversar. Você é um recém-chegado no mundo dos adultos. Está confuso, ainda tem muito que aprender. Vá botar o terno.

Novamente o filho foi e voltou. Finalmente estava tudo no seu lugar, apesar de o garotão andar todo torto. 

-- Excelente, filho. Agora estou orgulhoso de você, você tá com cara de adulto. Pode ir para o seu trabalho... e boa sorte. 

O garotão saiu caminhando todo duro. O pai foi ao seu quarto, colocou um tênis, uma camiseta, um jeans, pegou os patins de Otávio e foi saindo de mansinho. A mulher flagrou-o da porta da cozinha. 

-- Que é isso, Alfredo? Aonde é que você vai assim? 

-- Cristina, alguém precisa se divertir nessa casa. 

                                                                 (Carlos Eduardo Novaes)

 Entendendo o texto

1)   Numere as colunas de acordo com os significados das palavras destacadas nas frases:

(1)”...a terra dos adultos continua sendo aquela coisa árida, sinistra e plúmbea.”

(2)”Sei que a experiência é traumatizante porque tenho um amigo que a viveu com seu filho de 20 anos”.

(3)”A face de Otávio se contraiu como se tivesse recebido a pior notícia do mundo”.

(4)”Botou as mãos na cabeça e caiu num pranto convulso.”

(5)”O pai foi inflexível”.

(  5   )    resistente                    ( 1  ) perturbadora

(   2  )    apertou                       (  4  ) cinzenta

(   3  )    nervoso

2)   Segundo o autor, existem algumas diferenças entre o mundo dos jovens e dos adultos: Identifique três delas.

No mundo adulto, tem-se que votar, preencher declarações de imposto de renda e trabalhar duro.

3)   O “uniforme oficial” do jovem simboliza para a juventude...

·        Marque (x) as alternativas CORRETAS:

(A)   a liberdade de ser o que quer;

(B)   uma convenção social;

(C)    o desejo de ser diferente;

(D)    a descontração necessária às suas ações;

(E)   uma forma de rebeldia.

4)   A crônica apresenta certos exageros que a tornam um texto humorístico. Relacione três fatos que justifiquem a afirmativa.

O filho afirma que o pai deveria sentir orgulho em financiá-lo; o filho se arruma de jeans e tênis para se apresentar no trabalho; o pai resolve se divertir nos patins do filho.

5)   Explique a dificuldade do Otávio de atender ao pedido do pai em relação à sua aparência na hora de ir à Petrobrás para ser entrevistado.

Otávio, até então, nunca havia vestido um terno na vida e não conseguia entender o motivo de ter que se apresentar assim para o trabalho.

6)   “Novamente o filho foi e voltou. Finalmente estava tudo no seu lugar”.

·        Marque (x) nas respostas CORRETAS:

Em relação à mudança sofrida pelo jovem...

(A) Ele já estava preparado para o novo emprego;

(B) Ele parecia um peixe fora d’água;

( C)Ele apenas correspondia aos interesses do mundo adulto;

     (D)Ele necessitava de um tempo para se adaptar.

     (E)Ele já estava pronto para enfrentar a vida adulta.

  7) Marque a melhor resposta.

·        O comportamento do pai no final do texto demonstra:

(A)O cansaço do pai em ser tão responsável e adulto;

(B)Os adultos gostariam de viver como os jovens sem grandes obrigações;

(C)                Trocou-se para ir ao supermercado;

(D)                Usou uma roupa descontraída porque ficaria em casa mesmo;

(E)O quanto a vida adulta exige responsabilidades.

 

8)Explique a metáfora contida na primeira frase do texto: “a vida é um recreio”.

A vida é vista como um período de diversão, lazer.