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domingo, 8 de junho de 2025

CRÔNICA: DESISTINDO DO NATAL - MOACYR SCLIAR - COM GABARITO

 Crônica: Desistindo do Natal

              Moacyr Scliar

        Prezado Papai Noel: há uma semana eu lhe mandei uma carta com a lista dos meus pedidos para o Natal. Agora estou mandando esta outra carta para dizer que mudei de ideia. Não vou querer nada. Ontem o papai nos avisou que não tem dinheiro para as compras do fim de ano. Papai está desempregado há mais de um ano. A gente mora numa cidade pequena do interior, muito pobre. No Natal passado, o prefeito anunciou que tinha um presente para a população: uma grande fábrica viria se instalar aqui, dando emprego para muitas pessoas. Meu pai ficou animado. Ele é um homem trabalhador, sabe fazer muitas coisas e achou que com isso o nosso problema estaria resolvido. Agora, porém, o prefeito teve de dizer que a fábrica não vem mais. Não entendo dessas coisas, mas parece que a situação está difícil.

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEioDU0H6v7zGlv-pF698B9HdiBFC27e6jVRPQJP2WtWqIh_qvhIUFZjeRrXI9-tEjI-_wfm_HvemhoVJiXzXrgaxPYsnn8Ko7Jt0V42T5Ara7r7zoNcOD6zgWh0dRiU7NI8n5Vu5jJc2wKoaRx2k5BLNTN2Tw-aVuxvGy0xkmSyFiZ7E9OUrtVgpGEpYqE/s320/Jonathan_G_Meath_portrays_Santa_Claus.jpg


        Portanto, Papai Noel, peço-lhe desculpas se o senhor já encomendou as coisas, mas infelizmente vou ter de desistir. Para começar, não quero aquela bonita árvore de Natal de que lhe falei -até mandei um desenho, lembra? Nada de pinheirinho, nada de luzinhas, nada de bolinhas coloridas. A verdade, Papai Noel, é que essas coisas só gastam espaço e, como disse a mamãe, gastam muita luz.

      E nada de ceia de Natal, Papai Noel. Nada de peru. Como eu lhe disse, nunca comi peru na minha vida, mas acho que não vai me fazer falta. Se tivesse peru, eu comeria tanto que decerto passaria mal. Portanto, nada de peru. Aliás, se a gente tiver comida na mesa, já será uma grande coisa.

        Nada de presentes, Papai Noel. Não quero mais aquela bicicleta com a qual sonho há tanto tempo. Bicicletas custam caro. E, além disso, é uma coisa perigosa. O cara pode cair, pode ser atropelado por um carro... Nada de bicicleta.

        Nada de DVD, Papai Noel. Afinal, a gente já tem uma TV (verdade que de momento ela está estragada e não temos dinheiro para mandar consertar), mas DVD não é coisa tão urgente assim.

        Também quero desistir da roupa nova que lhe pedi e dos sapatos. A minha roupa velha ainda está muito boa, e a mamãe vai fazer os remendos nos rasgões. E sapato sempre pode dar problema: às vezes ficam apertados, às vezes caem do pé... Prefiro continuar com meus tênis e o meu chinelo de dedo.

        Ou seja: nada de Natal, Papai Noel. Para mim, nada de Natal. Agora, se o senhor for mesmo bonzinho e quiser nos dar algum presente, arranje um emprego para o meu pai. Ele ficará muito grato e nós também. Desejo ao senhor um Feliz Natal e um próspero Ano Novo.

Moacyr Scliar. Folha de São Paulo.

Entendendo a crônica:

01 – Qual o motivo que leva o narrador, uma criança, a escrever uma segunda carta para o Papai Noel, cancelando seus pedidos?

      O narrador cancela seus pedidos porque seu pai está desempregado há mais de um ano e não há dinheiro para as compras de fim de ano.

02 – Que promessa feita pelo prefeito da cidade havia animado o pai do narrador, e por que ela não se concretizou?

      O prefeito havia prometido que uma grande fábrica seria instalada na cidade, gerando muitos empregos. No entanto, a promessa não se concretizou porque a "situação está difícil" e a fábrica não virá mais.

03 – De que forma o narrador "desiste" de elementos tradicionais do Natal, como a árvore e a ceia?

      Ele desiste da árvore de Natal (pinheirinho, luzinhas, bolinhas) por gastarem espaço e luz. Da ceia, ele diz que não precisa de peru, contentando-se em ter apenas "comida na mesa".

04 – O que o narrador argumenta para justificar a desistência dos presentes que havia pedido, como a bicicleta e o DVD?

      Para a bicicleta, ele argumenta que custa caro e é perigosa (pode cair ou ser atropelado). Para o DVD, ele diz que a TV da família já está estragada e que DVD não é algo urgente.

05 – Mesmo desistindo de tudo, o narrador expressa um único pedido final ao Papai Noel. Qual é ele?

      O único pedido final do narrador é que o Papai Noel arranje um emprego para o pai dele.

06 – Qual é a principal emoção ou sentimento que a crônica busca transmitir ao leitor através da carta da criança?

      A crônica busca transmitir um sentimento de tristeza, resignação e maturidade precoce por parte da criança, que compreende a dura realidade financeira da família e abre mão dos seus desejos infantis em prol de uma necessidade básica.

07 – De que forma esta crônica reflete as dificuldades econômicas e sociais que muitas famílias enfrentam?

      A crônica é um retrato sensível das dificuldades econômicas, como o desemprego do pai e a falta de recursos para o básico (comida, conserto de TV). Ela também ilustra a falta de perspectivas em cidades pequenas e como a crise afeta diretamente o universo e os sonhos das crianças.

 

 

 

quarta-feira, 4 de junho de 2025

CRÔNICA: A IMPETUOSA TORRENTE - MOACYR SCLIAR - COM GABARITO

 Crônica: A impetuosa torrente

              Moacyr Scliar

        “Querida professora:

        Já faz muito tempo que aquilo aconteceu, mas lembro como se tivesse sido ontem. Essas coisas marcam, a senhora sabe. E eu fiquei muito marcado pelo acontecimento. Tanto que estou lhe escrevendo.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh6VBhRssR1lEtK4CfNT6dyCcosG8GGPRa16NOQd2KwpRG330wZg9ifLZftb44TDBKoNqVccyBqhoKkF4DTEKHLUqjfuThY71P1kmjW7P1KiGC2lQPT2VBBJ2Gbtf5CW-bMzo0PAcKMbmd-mygPHU_-4bkTuFBnxL4ZjBmmU_-pdTXkRecrDAfvxkHYahw/s320/territorio-da-emocao.jpg


        Talvez a senhora não recorde da aula que a senhora deu naquele dia. Por isso, vou refrescar um pouco a sua memória. A senhora estava falando sobre o rio Amazonas e seus afluentes. A senhora, aliás, falava muito bem, era uma excelente professora. A senhora descrevia o grande rio, aquela gigantesca massa d’água fluindo, ora majestosa, ora irada pela pororoca: água, muita água.

        Eu estava apertado, professora. Eu queria fazer xixi. E quanto mais a senhora falava nas águas, mais vontade me dava de ir ao banheiro. Eu me torcia todo, chegava a ficar roxo com o esforço, mas nada. Quando a senhora fez uma pausa, para entrar na lista dos afluentes, eu aproveitei e pedi para ir lá fora.

        A senhora ficou indignada. Bem agora, a senhora disse, que eu ia falar dos afluentes do Amazonas, os da margem esquerda e os da margem direita, você quer sair! E aí a senhora me passou uma descompostura. Imagine, a senhora disse, se um dia você for à Amazônia e não souber nada dos afluentes, como é que fica?

        Fiquei mal. Porque acabei me urinando. E que quantidade de urina, professora! Eu tinha um Amazonas inteiro na bexiga. O pessoal me olhava, todo molhado e ria sem parar.

        Nunca fui à Amazônia, professora. Nunca vi o grande rio. Mas ultimamente, por causa da próstata, comecei a reter urina. A mesma aflição que senti em sua aula.

        Tenho repetido, baixinho, os nomes dos afluentes do Amazonas: Javari, Juruá, Purus, Madeira, Tapajós, Xingu... Como se fosse um exorcismo, a senhora sabe? Como se fosse uma reza, dessas que curam doença. Claro que não funciona. Mas pelo menos ajuda a matar as saudades. E, ah, professora, que saudades eu tenho, da aurora da minha vida. E daqueles afluentes que, por ela, não passam mais.”

MOACYR SCLIAR. Folha de São Paulo.

Entendendo a crônica:

01 – Qual o motivo que leva o narrador a escrever para sua antiga professora?

      O narrador escreve para sua antiga professora porque um acontecimento marcante da infância, relacionado a uma aula sobre o rio Amazonas e seus afluentes, o deixou profundamente marcado.

02 – Qual era a situação embaraçosa que o narrador vivenciou durante a aula sobre o rio Amazonas?

      O narrador estava muito apertado para fazer xixi, e a professora, ao falar das águas do rio Amazonas, intensificava sua vontade. Ele acabou por se urinar na frente da turma, o que o deixou envergonhado.

03 – Como a professora reagiu ao pedido do aluno para ir ao banheiro e qual foi o argumento dela?

      A professora ficou indignada com o pedido, argumentando que ele queria sair justo quando ela falaria dos afluentes do Amazonas, e questionou como ele se viraria se um dia fosse à Amazônia e não soubesse nada sobre eles.

04 – Que problema de saúde o narrador enfrenta na vida adulta que o faz reviver a aflição da infância?

      Na vida adulta, o narrador tem problemas de próstata, que o fazem reter urina e sentir a mesma aflição de quando criança.

05 – Qual é o desfecho da crônica e que sentimento ele evoca no narrador?

      No desfecho, o narrador, ao repetir os nomes dos afluentes do Amazonas como um "exorcismo" ou "reza", expressa uma profunda saudade da infância ("aurora da minha vida") e dos tempos em que essa aflição não era um problema de saúde, mas sim um momento inocente, embora embaraçoso, de sua vida.

 

 

quarta-feira, 2 de abril de 2025

CRÔNICA: OS COMÍCIOS DOS ADOLESCENTES - MOACYR SCLIAR - COM GABARITO

 Crônica: Os comícios dos adolescentes

               Moacyr Scliar

        No Hyde Park, em Londres, existe um lugar chamado Speaker's Corner, onde, segundo a tradição, qualquer pessoa pode fazer discursos, criticando até a família real (o que atualmente não é muito difícil) desde que falando do alto de um estrado ou mesmo de um caixote; isto é, sem pisar solo inglês. Atualmente os oradores que lá vão são muito chatos, e frequentemente falam apenas para impressionar os turistas, mas há uma fase na vida em que o mundo como um todo é para nós um Speaker's Corner, e a nossa família é mais acatável que a família real inglesa: a adolescência é uma fase de comícios.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjxpMa6HH8moKDb7tP7Z9szC2ej1LY8bRRZBHqKqV7oePAkItxGcG-Oa0RpFBWmKwcqjlS68xwyajGu2fnGqczIdm860ans5_D2XjvNUUiqw-L2_lvZZ7vAemLLOj01B6UIUbxkVaKqLKFx7_feobg9n1Z6v3xOZAvh6MinoU70hR7Lcy0mXiIagZ76zm4/s320/artworks-O9G0l77rq6dG3zel-1o1j3A-t500x500.jpg


        Adolescentes são oradores prodigiosos. Energia é o que não lhes falta; a intensa quantidade de alimentos que ingerem precisa ser queimada de alguma maneira, e esportes, games ou fantasias não são suficientes. daí os discursos, que se sucedem num ritmo implacável: não há almoço nem jantar em que os pais não ouçam peças de inflamada oratória. Os adolescentes, principalmente os de classe média, consideram-se oprimidos; não fazem parte de nenhuma Frente de Libertação, mesmo porque a vida de guerrilheiro não tem moleza, não dá para acordar ao meio-dia; mas desenvolvem uma invencível tática de guerrilha verbal , baseada em acusações clássicas: os pais são quadrados, os pais não compreendem as necessidades dos filhos, os pais são insensíveis, os pais não compram isto, os pais não compram aquilo ("me compra" é a reivindicação mais ouvida). É um estado de comício permanente, como parlamento algum jamais viu. Aliás, e diferente dos nossos deputados, os adolescentes jamais se ausentam do plenário; mas, como os deputados, sempre acham que estão ganhando pouco.

        De uma coisa, porém, podemos estar certos: não existirá um Partido de Adolescentes enquanto não se formar um Partido dos Pais. E Partido dos Pais jamais se formará. Como a Teresa Batista, de Jorge Amado, que estava cansada de guerra, pais – por definição – são pessoas cansadas de comícios.

Um país chamado infância. São Paulo: Ática, 1999, p. 51-52 (Coleção para gostar de ler, v. 18)

Fonte: Português. Uma proposta para o letramento. Magda Soares – 8º ano – 1ª edição. Impressão revista – São Paulo, 2002. Moderna. p. 9-10.

Entendendo a crônica:

01 – Qual é a metáfora central utilizada por Moacyr Scliar na crônica?

      Moacyr Scliar compara a adolescência a um grande comício, onde os jovens, assim como oradores no Hyde Park, expressam suas opiniões e críticas com fervor.

02 – Por que os adolescentes são descritos como "oradores prodigiosos"?

      Eles possuem grande energia e necessidade de expressar suas opiniões, o que resulta em discursos frequentes e apaixonados, especialmente em relação aos pais.

03 – Quais são as principais "acusações clássicas" dos adolescentes contra seus pais?

      As acusações incluem os pais serem "quadrados", não compreenderem suas necessidades, serem insensíveis e não comprarem o que desejam.

04 – Como a crônica aborda a relação entre pais e filhos durante a adolescência?

      A crônica retrata a adolescência como um período de conflito e negociação, onde os jovens buscam afirmar sua independência e os pais, muitas vezes cansados, tentam manter a ordem.

05 – Por que, segundo o autor, é improvável a formação de um "Partido dos Pais"?

      Moacyr Scliar argumenta que os pais, ao contrário dos adolescentes, estão "cansados de comícios" e preferem evitar confrontos, tornando improvável a organização de um partido.

06 – Qual a relação da crônica com o "Speaker's Corner" citado no início do texto?

      O "Speaker's Corner" serve como uma metáfora para o espaço onde os adolescentes expressam suas opiniões, assim como os oradores em Londres, com a diferença de que, os adolescentes tem seu espaço de fala, dentro de suas casas.

07 – Qual é o tom geral da crônica de Moacyr Scliar?

      O tom é humorístico e irônico, com uma pitada de compreensão pelas dificuldades tanto dos adolescentes quanto dos pais durante essa fase da vida.

 

quinta-feira, 6 de março de 2025

CONTO: PAUSA - (FRAGMENTO) - MOACYR SCLIAR - COM GABARITO

 Conto: Pausa – Fragmento

           Moacyr Scliar

        Às sete horas, o despertador tocou. Samuel saltou da cama, correu para o banheiro, fez a barba e lavou-se. Vestiu-se rapidamente e sem ruído. Estava na cozinha, preparando sanduíches, quando a mulher apareceu, bocejando:

        -- Vais sair de novo, Samuel?

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEidZjDqOTVkadhNh5FpPXg9MH9Yk09spvcFbbAg9uS5pFVMGKG-nSSiY7LApvak4nTvA8v-AzL5kEza284x5HrwZSFcbAX042NvICZzimMQ2oTLMGNSgPyaQQlg4oXnFffvvO9-29Cb22wqRH704oh7Cc0ww0KYYQQpkPdpq4NVjxkQ8UQTtTFzD8AxzO8/s320/SANDUBA.jpg


        Fez que sim com a cabeça. Embora jovem, tinha a fronte calva; mas as sobrancelhas eram espessas, a barba, embora recém-feita, deixava ainda no rosto uma sombra azulada. O conjunto era uma máscara escura.

        -- Todos os domingos tu sais cedo – observou a mulher com azedume na voz.

        -- Temos muito trabalho no escritório – disse o marido, secamente.

        Ela olhou os sanduíches:

        -- Por que não vens almoçar?

        -- Já te disse: muito trabalho. Não há tempo. Levo um lanche.

        A mulher coçava a axila esquerda. Antes que voltasse à carga, Samuel pegou o chapéu:

        -- Volto de noite.

        [...]

Moacyr Scliar. O Carnaval dos Animais. Porto Alegre, Ed. Movimento, 1963.

Fonte: Português – Novas Palavras – Ensino Médio – Emília Amaral; Mauro Ferreira; Ricardo Leite; Severino Antônio – Vol. Único – FTD – São Paulo – 2ª edição. 2003. p. 556.

Entendendo o conto:

01 – Qual o horário em que Samuel acorda no domingo?

      Samuel acorda às sete horas da manhã.

02 – O que Samuel faz logo após acordar?

      Ele rapidamente se prepara, fazendo a barba, lavando-se e se vestindo, demonstrando pressa.

03 – Qual a justificativa de Samuel para sair cedo de casa aos domingos?

      Ele alega ter muito trabalho no escritório, o que o impede de almoçar em casa.

04 – Como a esposa de Samuel reage à sua saída dominical?

      Ela demonstra azedume e descontentamento, questionando a rotina do marido.

05 – Quais as características físicas de Samuel mencionadas no texto?

      O texto descreve Samuel como um homem jovem com a fronte calva, sobrancelhas espessas e uma sombra azulada da barba recém-feita.

06 – O que Samuel leva para comer, já que não almoçará em casa?

      Ele prepara sanduíches para levar como lanche.

07 – Qual a última frase de Samuel antes de sair de casa?

      Volto de noite.

 

quarta-feira, 5 de março de 2025

CONTO: E A HISTÓRIA ERA ASSIM.... MOACYR SCLIAR - COM GABARITO

 Conto: E a história era assim...

           Moacyr Scliar

        Em todos os tempos, sempre existiram guerreiros para defender reinos, territórios e países. Na Idade Média (500-1540), os guerreiros mais corajosos recebiam do rei o título de “cavaleiro”.

        Para ser cavaleiro, era preciso saber lutar com várias armas: espada, escudo, lança, clava e punhal. Os cavaleiros enfrentavam seus inimigos montados a cavalo e vestidos com armaduras e capacetes. Como esses equipamentos eram pesados, eles viajavam acompanhados de ajudantes: os pajens e escudeiros.

 FONTE:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjpTcsWRMjgNeT1QgyNptUWOhB1cGyrpM-F4M3DukUzpmHfXlt-vS0EBPsTeWB-azOIC8woGehH9-4OeNqMoTWLOcb7Di-OiY_EvKBLK3KPlO7JtZ4ape2ymSqXPhEQhBAtgvXNmOCVrlUgrqZSgTgRZqaezL5K0L02PT36UXQtAeaiP9SeBsPgt9B-1KY/s1600/CAVLEIRO.jpg


        O dever de todo cavaleiro era proteger crianças, mulheres e pobres, obedecendo a um código de honra chamado de “leis de cavalaria”. Também caçavam e participavam de torneios, lutas organizadas nobres e reis.

        No século XVII, época em que Dom Quixote foi escrito, histórias de cavaleiros estavam na moda. Eram os romances de cavalaria.

        Na Inglaterra, quase todos conheciam “Os feitos do rei Arthur e os cavaleiros da Távola Redonda”. Na Alemanha, havia a lenda de Rolando, o valoroso cavaleiro, e, na Espanha e na França, as aventuras de Carlos Magno, o rei guerreiro.

        Os heróis dessas aventuras eram homens maravilhosos que nasciam em lugares maravilhosos e que se apaixonavam por mulheres ainda mais maravilhosas. Possuíam armas e inimigos fantásticos, como dragões, bruxos e gigantes.

        Mas Dom Quixote era um cavaleiro trapalhão. Seu cavalo de batalha, Rocinante, era velho e magro. Seu escudeiro, Sancho Pança, não era nobre nem jovem e, ainda por cima, viajava montado num pequeno burro. Nada era mágico ou maravilhoso na vida de Dom Quixote.

        Quando ele saiu de sua casa para viajar pelo mundo em busca de aventura, tudo deu errado. Em sua primeira aventura, confundiu uma comitiva de cavalariços com guerreiros inimigos e os atacou. Foi derrotado e humilhado. Libertou, por engano, um grupo de ladrões e avançou contra moinhos de vento pensando que fossem gigantes.

        Dom Quixote, o Cavaleiro da Triste Figura, jamais conseguiu ser um herói como os dos romances que leu. E, talvez por ter sido apenas um homem simples, cheio de boas intenções e uma coragem que raramente usou, tornou-se uma das personagens mais encantadoras de toda a literatura ocidental, transformando seu criador, Miguel de Cervantes, num escritor de uma história clássica.

Scliar, Moacyr. Vice-versa ao contrário. São Paulo, Companhia das Letrinhas, 2001, p. 19.

Fonte: Linguagem Nova. Faraco & Moura. 5ª série – 17ª ed. 3ª impressão – São Paulo – Editora Ática – 2003. p. 16.

Entendendo o conto:

01 – Qual era o título dado aos guerreiros mais corajosos na Idade Média?

a) Soldado.

b) Cavaleiro.

c) General.

d) Escudeiro.

02 – Quais armas um cavaleiro precisava saber usar?

a) Espada, escudo, lança, clava e punhal.

b) Arco e flecha, espada, lança.

c) Espada, escudo, arco e flecha.

d) Lança, clava, arco e flecha.

03 – Quem acompanhava os cavaleiros em suas viagens?

a) Soldados e generais.

b) Pajens e escudeiros.

c) Reis e rainhas.

d) Magos e bruxos.

04 – Qual era o dever de todo cavaleiro?

a) Proteger o rei.

b) Proteger crianças, mulheres e pobres.

c) Conquistar novos territórios.

d) Caçar dragões.

05 – O que eram os romances de cavalaria?

a) Histórias sobre reis e rainhas.

b) Histórias sobre cavaleiros e suas aventuras.

c) Histórias sobre magos e bruxos.

d) Histórias sobre dragões e gigantes.

06 – Qual era a lenda conhecida na Alemanha?

a) Rei Arthur e os cavaleiros da Távola Redonda.

b) Rolando, o valoroso cavaleiro.

c) As aventuras de Carlos Magno.

d) Dom Quixote.

07 – Como era o cavalo de batalha de Dom Quixote?

a) Forte e rápido.

b) Velho e magro.

c) Pequeno e ágil.

d) Grande e poderoso.

08 – Quem era o escudeiro de Dom Quixote?

a) Rolando.

b) Sancho Pança.

c) Carlos Magno.

d) Rei Arthur.

09 – O que Dom Quixote confundiu com guerreiros inimigos em sua primeira aventura?

a) Um grupo de ladrões.

b) Moinhos de vento.

c) Uma comitiva de cavalariços.

d) Dragões.

10 – Por que Dom Quixote se tornou uma das personagens mais encantadoras da literatura ocidental?

a) Por ser um herói perfeito.

b) Por ser um homem simples, cheio de boas intenções e coragem.

c) Por derrotar todos os seus inimigos.

d) Por possuir armas mágicas.

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2025

CRÔNICA: TROFÉU E SONHO - MOACYR SCLIAR - COM GABARITO

Crônica: Troféu e sonho

               Moacyr Scliar

        Endividados, clubes penhoram até taça. A crise financeira por que passa o futebol brasileiro leva os principais clubes do país a ter parte dos bens penhorada. O Flamengo disponibilizou troféus ganhos nos últimos anos para diversos credores.

Folha Esporte, 5.out.03

        A mansão, ainda que luxuosa, é de um mau gosto extremo. Não há muito o que ver, mas o dono faz questão de levar os visitantes a uma sala que chama de "meu templo"; ali, em uma espécie de vitrine, iluminada por fortes lâmpadas, está um troféu, uma taça destas que os clubes ganham em campeonatos. E, sem que lhe peçam, ele conta a história dessa taça.

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhbykhaj-l8j70DsTZRwuWSJKl-QCSvjQQVxGnhx1Co68CqY-Um4hYvmmXCrk7TF_FVsCelVDL8OjBTfCi2AkQp5lKCqkoVoOLtRZWFO-DjIv7kzmU6RLALCwo-Uy9yoZ2BsDhVvEC5qCSNQJP2InbUuGlkb_fpSWFdyUgngDMiBgEbzcQ_OlcE3O3pvWs/s1600/TROFEU.jpg


        Tudo começou quando era um rapaz pobre, morando em uma pequena cidade do interior. Lugar modorrento, onde nada acontecia. Assim, foi grande a surpresa quando se anunciou a chegada, ali, de um grande time de futebol: nada menos que o Flamengo, do Rio de Janeiro. Notícia que o deixou excitadíssimo porque, em primeiro lugar, era fã de futebol – jogava razoavelmente bem – e, mais importante, era um ardoroso torcedor do rubro-negro. Que viria ali para disputar um torneio regional, no qual participavam o time da cidade e mais alguns outros clubes de localidades vizinhas.

        Na véspera do grande jogo, nem conseguiu dormir, tão ansioso estava. No dia seguinte, foi o primeiro a chegar ao pequeno e precário estádio. Aos poucos as arquibancadas foram se enchendo. Todos miravam-no com irritação. Explicável: ele vestia uma camisa do Flamengo e agitava uma bandeira do clube: decidira assumir a sua condição de torcedor e o fazia com orgulho. Aplaudiu com entusiasmo o rubro-negro, quando este entrou em campo.

        A partida começou e logo duas coisas ficaram claras; primeiro, que os donos da casa não eram adversários para o Flamengo; segundo, que o time carioca estava com muito azar. Jogador após jogador se lesionava e tinha de ser substituído. Lá pelas tantas, o insólito; mais um lesionado – e já não havia reservas no banco. O que gerou um impasse. A partida foi paralisada, enquanto juiz e dirigentes deliberavam.

        -- Foi aí – conta ele – que eu tive uma inspiração. Levantei-me e, da arquibancada, gritei que jogaria pelo Flamengo. Os dirigentes olharam-me com espanto, mas decidiram aceitar a proposta. Rapidamente assinei um contrato e no instante seguinte estava no campo. Num instante, apossei-me da bola, driblei um, driblei o segundo, chutei forte no canto esquerdo – gol! Gol da vitória! O Flamengo ganhou a taça. Que os dirigentes, em sinal de gratidão, me ofereceram.

        Esta é a história que o homem conta. Na qual ninguém acredita: todos sabem que comprou a taça, por bom dinheiro, de um credor do Flamengo. Mas também ninguém o desmente. Afinal, quem compra um troféu compra junto o sonho que esse troféu representa.

Moacyr Scliar escreve às segundas-feiras, nesta coluna, um texto de ficção baseado em matérias publicadas no jornal. Folha de São Paulo, 13/10/2003, p. C2.

Fonte: livro Português: Língua e Cultura – Carlos Alberto Faraco – vol. único – Ensino Médio – 1ª edição – Base Editora – Curitiba, 2003. p. 212.

Entendendo a crônica:

01 – Qual é a situação apresentada no início da crônica em relação aos clubes de futebol brasileiros?

      A crônica inicia mostrando a difícil situação financeira dos clubes de futebol brasileiros, que estão chegando ao ponto de penhorar seus bens, incluindo troféus, para saldar dívidas.

02 – Qual é o objeto central da narrativa e qual o seu significado para o dono da mansão?

      O objeto central da narrativa é um troféu, uma taça de campeonato. Para o dono da mansão, esse troféu representa a realização de um sonho de infância, a glória de ter jogado pelo Flamengo e conquistado um título.

03 – Qual é a história contada pelo dono da mansão sobre como ele ganhou o troféu?

      O dono da mansão conta que, quando era jovem e morava no interior, o Flamengo foi jogar um torneio na cidade. Durante o jogo, vários jogadores do Flamengo se machucaram e não havia mais reservas. Ele, então, se ofereceu para jogar, marcou o gol da vitória e ganhou o troféu como reconhecimento.

04 – Qual é a reação das pessoas ao ouvirem a história do dono da mansão?

      Ninguém acredita na história contada pelo dono da mansão. Todos sabem que ele comprou a taça de um credor do Flamengo.

05 – Qual é a principal crítica presente na crônica de Moacyr Scliar?

      A crônica critica a obsessão pelo sucesso e pela fama, mostrando como as pessoas são capazes de inventar histórias e comprar troféus para alimentar seus egos e suas fantasias.

06 – Qual é a reflexão proposta por Moacyr Scliar ao final da crônica?

      Scliar nos leva a refletir sobre a importância dos sonhos e como as pessoas podem distorcer a realidade para alcançar seus objetivos. Ele mostra que, muitas vezes, o que importa não é a verdade, mas sim a história que contamos para nós mesmos e para os outros.

07 – Qual é a relação entre o título da crônica, "Troféu e Sonho", e o seu conteúdo?

      O título "Troféu e Sonho" resume a essência da crônica. O troféu representa o objeto de desejo, o símbolo da vitória e do sucesso. O sonho, por sua vez, representa a fantasia, a história inventada para justificar a posse do troféu. A crônica mostra como o sonho pode se tornar mais importante do que a realidade, a ponto de a pessoa comprar um troféu e criar uma história para dar sentido a ele.

 


domingo, 30 de junho de 2024

CONTO: O MISTÉRIO DA CASA VERDE - (FRAGMENTO 3) - MOACYR SCLIAR - COM GABARITO

 Conto: O mistério da casa verde – Fragmento 3

            Moacyr Scliar

        No qual eles se apresentam ao hóspede da Casa Verde

        O dia seguinte foi difícil para os quatro. Pedro Bola foi tirado da cama à força pelo irmão mais velho, mas adormeceu de novo na mesa do café. Arturzinho cochilou três vezes nas aulas da manhã e teve de ser advertido pelos professores. André movia-se como um zumbi. Mesmo o dedicado Leo teve dificuldade em fazer o exame de inglês, no qual habitualmente se saía bem. Por tudo isso, quando se encontraram, à noite, estavam num péssimo humor. Pedro Bola queria mesmo desistir daquela história: é muito trabalho para arranjar um clube. Além disso, a ideia de enfrentar de novo o maluco — seu diagnóstico já estava feito — não lhe agradava em nada. Em vão Arturzinho tentava animar os companheiros. Leo, ainda que cansado, o acompanharia. Mas Pedro Bola e André, irritados, relutavam em entrar na casa. Por fim Arturzinho saiu-se com uma fórmula conciliadora: — Eu e o Leo entramos, vocês esperam aqui. Se tudo der certo com o homem, chamamos vocês, continuamos com nosso plano. Se não der certo, desistimos.


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        Todos de acordo, Arturzinho e Leo embrenharam-se de novo no matagal. Quando chegaram aos fundos da casa, uma surpresa: a abertura que tinham feito na noite anterior estava fechada com tábuas. Colocadas sem dúvida pelo estranho morador.

        — Está certo — observou Arturzinho. — O homem tem o direito de se proteger. Experimentou as tábuas: não estavam fixas. Sem muito esforço, conseguiu afastá-las, empurrando-as junto com os tijolos que as calçavam. Leo olhava-o, sem dizer nada.

        Arturzinho hesitou; agora também ele estava obviamente apreensivo. Mas não era de desistir:

        — Que diabos — gritou —, já que chegamos até aqui vamos em frente. E meteu-se pelo buraco na parede. Leo seguiu-o.

SCLIAR, Moacyr. O mistério da casa verde. São Paulo: Editora Ática, 2000. p. 25.

Entendendo o conto:

01 – Quais foram as dificuldades enfrentadas pelos quatro personagens no dia seguinte?

      Pedro Bola foi tirado da cama à força pelo irmão mais velho, mas adormeceu de novo na mesa do café. Arturzinho cochilou três vezes nas aulas da manhã e foi advertido pelos professores. André movia-se como um zumbi. Leo teve dificuldade em fazer o exame de inglês, no qual habitualmente se saía bem.

02 – Qual foi a reação de Pedro Bola ao encontro com o hóspede da Casa Verde?

      Pedro Bola queria desistir da história, achando que era muito trabalho para arranjar um clube, e a ideia de enfrentar o homem, que ele considerava um maluco, não lhe agradava.

03 – Como Arturzinho tentou resolver a relutância de Pedro Bola e André em entrar na casa?

      Arturzinho propôs uma fórmula conciliadora: ele e Leo entrariam na casa, enquanto Pedro Bola e André esperariam. Se tudo corresse bem, eles chamariam os outros; caso contrário, desistiriam.

04 – O que os meninos encontraram quando chegaram aos fundos da casa?

      Eles descobriram que a abertura que haviam feito na noite anterior estava fechada com tábuas, provavelmente colocadas pelo estranho morador.

05 – Qual foi a reação de Arturzinho ao ver que a abertura estava fechada?

      Arturzinho observou que o homem tinha o direito de se proteger e, ao perceber que as tábuas não estavam fixas, conseguiu afastá-las e abrir a passagem novamente.

06 – Como Leo reagiu durante a tentativa de Arturzinho de abrir a passagem?

      Leo observava Arturzinho sem dizer nada, acompanhando suas ações.

07 – Qual foi a atitude de Arturzinho após conseguir abrir a passagem?

      Arturzinho, mesmo apreensivo, decidiu continuar e entrou pelo buraco na parede, seguido por Leo.

sexta-feira, 17 de novembro de 2023

CONTO: CEGO E AMIGO GEDEÃO À BEIRA DA ESTRADA - MOACYR SCLIAR - COM GABARITO

 Conto: Cego e amigo Gedeão à beira da estrada

            Moacyr Scliar

        — Este que passou agora foi um Volkswagen 1962, não é, amigo Gedeão?

        — Não, Cego. Foi um Simca Tufão.

        — Um Simca Tufão? … Ah, sim, é verdade. Um Simca potente. E muito econômico. Conheço o Simca Tufão de longe. Conheço qualquer carro pelo barulho da máquina.

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        Este que passou agora não foi um Ford?

        — Não, Cego. Foi um caminhão Mercedinho.

        — Um caminhão Mercedinho! Quem diria! Faz tempo que não passa por aqui um caminhão Mercedinho. Grande caminhão. Forte. Estável nas curvas. Conheço o Mercedinho de longe… Conheço qualquer carro. Sabe há quanto tempo sento à beira desta estrada ouvindo os motores, amigo Gedeão? Doze anos, amigo Gedeão. Doze anos.

        É um bocado de tempo, não é, amigo Gedeão? Deu para aprender muita coisa. A respeito de carros, digo. Este que passou não foi um Gordini Teimoso?

        — Não, Cego. Foi uma lambreta.

        — Uma lambreta… Enganam a gente, estas lambretas. Principalmente quando eles deixam a descarga aberta.

        Mas como eu ia dizendo, se há coisa que eu sei fazer é reconhecer automóvel pelo barulho do motor. Também, não é para menos: anos e anos ouvindo!

        Esta habilidade de muito me valeu, em certa ocasião… Este que passou não foi um Mercedinho?

        — Não, Cego. Foi o ônibus.

        — Eu sabia: nunca passam dois Mercedinhos seguidos. Disse só pra chatear. Mas onde é que eu estava? Ah, sim.

        Minha habilidade já me foi útil. Quer que eu conte, amigo Gedeão? Pois então conto. Ajuda a matar o tempo, não é? Assim o dia termina mais ligeiro. Gosto mais da noite: é fresquinha, nesta época. Mas como eu ia dizendo: há uns anos atrás mataram um homem a uns dois quilômetros daqui. Um fazendeiro muito rico. Mataram com quinze balaços. Este que passou não foi um Galaxie?

        — Não. Foi um Volkswagen 1964.

        — Ah, um Volkswagen… Bom carro. Muito econômico. E a caixa de mudanças muito boa. Mas, então, mataram o fazendeiro. Não ouviu falar? Foi um caso muito rumoroso. Quinze balaços! E levaram todo o dinheiro do fazendeiro. Eu, que naquela época j á costumava ficar sentado aqui à beira da estrada, ouvi falar no crime, que tinha sido cometido num domingo. Na sexta-feira, o rádio dizia que a polícia nem sabia por onde começar. Este que passou não foi um Candango?

        — Não, Cego, não foi um Candango.

        — Eu estava certo que era um Candango… Como eu ia contando: na sexta, nem sabiam por onde começar.

        Eu ficava sentado aqui, nesta mesma cadeira, pensando, pensando… A gente pensa muito. De modos que fui formando um raciocínio. E achei que devia ajudar a polícia. Pedi ao meu vizinho para avisar ao delegado que eu tinha uma comunicação a fazer. Mas este agora foi um Candango!

        — Não, Cego. Foi um Gordini Teimoso.

        — Eu seria capaz de jurar que era um Candango. O delegado demorou a falar comigo. De certo pensou: “Um cego? O que pode ter visto um cego?” Estas bobagens, sabe como é, amigo Gedeão. Mesmo assim, apareceu, porque estavam tão atrapalhados que iriam até falar com uma pedra. Veio o delegado e sentou bem aí onde estás, amigo Gedeão. Este agora foi o ônibus?

        — Não, Cego. Foi uma camioneta Chevrolet Pavão.

        — Boa, esta camioneta, antiga, mas boa. Onde é que eu estava? Ah, sim. Veio o delegado. Perguntei:

        “Senhor delegado, a que horas foi cometido o crime?”

        — “Mais ou menos às três da tarde, Cego” — respondeu ele. “Então” — disse eu. — “O senhor terá de procurar um Oldsmobile 1927. Este carro tem a surdina furada.

        Uma vela de ignição funciona mal. Na frente, viajava um homem muito gordo. Atrás, tenho certeza, mas iam talvez duas ou três pessoas.” O delegado estava assombrado. “Como sabe de tudo isto, amigo?” — era só o que ele perguntava. Este que passou não foi um DKW?

        — Não, Cego. Foi um Volkswagen.

        — Sim. O delegado estava assombrado. “Como sabe de tudo isto?” — “Ora, delegado” — respondi. — “Há anos que sento aqui à beira da estrada ouvindo automóveis passar. Conheço qualquer carro. Sem mais: quando o motor está mal, quando há muito peso na frente, quando há gente no banco de trás. Este carro passou para lá às quinze para as três; e voltou para a cidade às três e quinze.” — “Como é que tu sabias das horas?” — perguntou o delegado. — “Ora, delegado” — respondi. — “Se há coisa que eu sei — além de reconhecer os carros pelo barulho do motor — é calcular as horas pela altura do sol.” Mesmo duvidando, o delegado foi… Passou um Aero Willys?

        — Não, Cego. Foi um Chevrolet.

        — O delegado acabou achando o Oldsmobile 1927 com toda a turma dentro. Ficaram tão assombrados que se entregaram sem resistir. O delegado recuperou todo o dinheiro do fazendeiro, e a família me deu uma boa bolada de gratificação. Este que passou foi um Toyota?

        — Não, Cego. Foi um Ford 1956.

O texto acima foi publicado no livro “Para Gostar de Ler — Volume 9 — Contos”, Editora Ática — São Paulo, 1984, pág. 26.

Entendendo o conto:

01 – Quem são os personagens principais no conto?

      Cego e seu amigo Gedeão são os protagonistas.

02 – Qual é a habilidade peculiar do Cego no conto?

      Ele consegue identificar os carros que passam pela estrada apenas pelo som dos motores.

03 – Quantos anos o Cego passou sentado à beira da estrada?

      O Cego passou doze anos sentado à beira da estrada.

04 – O que aconteceu nas proximidades da estrada há alguns anos, conforme mencionado no conto?

      Um fazendeiro muito rico foi assassinado com quinze tiros e roubaram todo o seu dinheiro.

05 – Como o Cego ajudou a resolver o crime do assassinato do fazendeiro?

      Ele usou sua habilidade de reconhecer carros pelo som do motor e calcular horas pela posição do sol para identificar o veículo envolvido no crime, um Oldsmobile 1927.

06 – Qual foi a reação do delegado ao ouvir as informações precisas do Cego sobre o crime?

      Ele ficou surpreso e assombrado, duvidando das habilidades do Cego.

07 – Como o Cego explicou sua capacidade de saber a hora do crime?

      Além de reconhecer carros pelo som do motor, ele afirmou que sabia calcular as horas pela posição do sol.

08 – Qual foi o desfecho do conto após a resolução do crime?

      O delegado encontrou o veículo envolvido e recuperou o dinheiro roubado, e o Cego recebeu uma gratificação da família do fazendeiro.

09 – O que o Cego pensava sobre a noite e o dia?

      Ele preferia a noite por ser fresca, mas acreditava que contar histórias ajudava a passar o tempo mais rapidamente.

10 – O que o Cego dizia sobre sua habilidade de reconhecer carros e o que isso lhe valeu?

      Ele afirmava conhecer qualquer carro pelo barulho do motor, e essa habilidade lhe foi útil para resolver o crime do fazendeiro.