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domingo, 22 de maio de 2022

ROMANCE: IRACEMA CAPÍTULO XV - JOSÉ DE ALENCAR - COM GABARITO

 Romance: Iracema Capítulo XV          

                 José de Alencar

        [...]

        Nasceu o dia e expirou.

        Já brilha na cabana de Araquém o fogo, companheiro da noite. Correm lentas e silenciosas no azul do céu, as estrelas, filhas da lua, que esperam a volta da mãe ausente.

        Martim se embala docemente; e como a alva rede que vai e vem, sua vontade oscila de um a outro pensamento. Lá o espera a virgem loura dos castos afetos; aqui lhe sorri a virgem morena dos ardentes amores.

        Iracema recosta-se langue ao punho da rede; seus olhos negros e fúlgidos, ternos olhos de sabiá, buscam o estrangeiro e lhe entram n'alma. O cristão sorri; a virgem palpita; como o saí, fascinado pela serpente, vai declinando o lascivo talhe, que se debruça enfim sobre o peito do guerreiro.

        Já o estrangeiro a preme ao seio; e o lábio ávido busca o lábio que o espera, para celebrar nesse ádito d'alma, o himeneu do amor.

        No recanto escuro o velho Pajé, imerso em funda contemplação e alheio às cousas deste mundo, soltou um gemido doloroso Pressentira o coração o que não viram os olhos? Ou foi algum funesto presságio para a raça de seus filhos, que assim ecoou n'alma de Araquém?

        Ninguém o soube.

        O cristão repetiu do seio a virgem indiana. Ele não deixará o rasto da desgraça na cabana hospedeira. Cerra os olhos para não ver; e enche sua alma com o nome e a veneração de seu Deus:

        — Cristo! . . . Cristo! . . .

        Volta a serenidade ao seio do guerreiro branco, mas todas as vezes que seu olhar pousa sobre a virgem tabajara, ele sente correr-lhe pelas veias uma onda de ardente chama. Assim quando a criança imprudente revolve o brasido de intenso fogo, saltam as faúlhas inflamadas que lhe queimam as faces.

        Fecha os olhos o cristão, mas na sombra de seu pensamento surge a imagem da virgem, talvez mais bela. Embalde chama o sono às pálpebras fatigadas; abrem-se, malgrado seu.

        Desce-lhe do céu ao atribulado pensamento uma inspiração.

        — Virgem formosa do sertão, esta é a última noite que teu hóspede dorme na cabana de Araquém, onde nunca viera, para teu bem e seu. Faze que seu sono seja alegre e feliz.

        — Manda; Iracema te obedece. Que pode ela para tua alegria?

        O cristão falou submisso, para que não o ouvisse o velho Pajé:

        — A virgem de Tupã guarda os sonhos da jurema que são doces e saborosos!

        Um triste sorriso pungiu os lábios de Iracema:

        — O estrangeiro vai viver para sempre à cintura da virgem branca; nunca mais seus olhos verão a filha de Araquém, e ele já quer que o sono feche suas pálpebras, e que o sonho o leve à terra de seus irmãos!

        — O sono é o descanso do guerreiro, disse Martim; e o sonho a alegria d'alma. O estrangeiro não quer levar consigo a tristeza da terra hospedeira, nem deixá-la no coração de Iracema!

        A virgem ficou imóvel.

        — Vai, e torna com o vinho de Tupã.

        Quando Iracema foi de volta, já o Pajé não estava na cabana; tirou a virgem do seio o vaso que ali trazia oculto sob a carioba de algodão entretecida de penas. Martim lho arrebatou das mãos, e libou as gotas do verde e amargo licor.

        Agora podia viver com Iracema, e colher em seus lábios o beijo, que ali viçava entre sorrisos, como o fruto na corola da flor. Podia amá-la, e sugar desse amor o mel e o perfume, sem deixar veneno no seio da virgem.

        O gozo era vida, pois o sentia mais forte e intenso; o mal era sonho e ilusão, que da virgem não possuía senão a imagem.

        Iracema afastara-se opressa e suspirosa.

        Abriram-se os braços do guerreiro adormecido e seus lábios; o nome da virgem ressoou docemente.

        A juruti, que divaga pela floresta, ouve o terno arrulho do companheiro; bate as asas, e voa a conchegar-se ao tépido ninho. Assim a virgem do sertão, aninhou-se nos braços do guerreiro.

        Quando veio a manhã, ainda achou Iracema ali debruçada, qual borboleta que dormiu no seio do formoso cacto. Em seu lindo semblante acendia o pejo vivos rubores; e como entre os arrebóis da manhã cintila o primeiro raio do sol, em suas faces incendidas rutilava o primeiro sorriso da esposa, aurora de fruído amor.

        A jandaia fugira ao romper d'alva e para não tornar mais à cabana.

        Vendo Martim a virgem unida ao seu coração, cuidou que o sonho continuava; cerrou os olhos para torná-los a abrir.

        A pocema dos guerreiros, troando pelo vale, o arrancou ao doce engano; sentiu que já não sonhava, mas vivia. Sua mão cruel abafou nos lábios da virgem o beijo que ali se espanejava.

        — Os beijos de Iracema são doces no sonho; o guerreiro branco encheu deles sua alma. Na vida, os lábios da virgem de Tupã amargam e doem como o espinho da jurema.

        A filha de Araquém escondeu no coração a sua ventura. Ficou tímida e inquieta, como a ave que pressente a borrasca no horizonte. Afastou-se rápida, e partiu.

        As águas do rio banharam o corpo casto da recente esposa.

        Tupã já não tinha sua virgem na terra dos tabajaras.

        [...].

ALENCAR, José de. Iracema. Porto Alegre: L&PM, 2002.

Fonte: Livro – Viva Português 2° – Ensino médio – Língua portuguesa – 1ª edição 1ª impressão – São Paulo – 2011. Ed. Ática. p. 41-4.

Entendendo o romance:

01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:

·        Arrebóis: os tons avermelhados do céu no amanhecer e no entardecer.

·        Borrasca: temporal com chuvas e ventos intensos.

·        Carioba: espécie de camisa de algodão.

·        Corola: conjunto de pétalas da flor.

·        Entretecida: entrelaçada, intercalada.

·        Espanejar: desabrochar.

·        Fluído: gozado, desfrutado.

·        Jandaia: designação comum a várias aves semelhantes, como papagaios e periquitos.

·        Juruti: designação comum a várias aves semelhantes, como pombas e rolinhas.

·        Libar: beber, sorver; beber mais por prazer do que por necessidade.

·        Pejo: pudor, vergonha.

·        Pocema: grito de guerra.

·        Pungir: começar a apontar, começar a aflorar.

·        Rubor: a cor vermelha nas faces provocada por vergonha.

·        Rutilar: fazer brilhar, resplandecer.

·        Troar: retumbar, trovejar.

·        Viçar: desenvolver-se com força.

02 – Releia:

        “— A virgem de Tupã guarda os sonhos da jurema que são doces e saborosos!

        Um triste sorriso pungiu os lábios de Iracema:

        — O estrangeiro vai viver para sempre à cintura da virgem branca; nunca mais seus olhos verão a filha de Araquém, e ele já quer que o sono feche suas pálpebras, e que o sonho o leve à terra de seus irmãos!”. O que Iracema imaginava que Martim desejava sonhar sob o efeito da bebida da jurema?

      Iracema imaginava que os sonhos de Martim seriam ligados a sua terra (Portugal) e a tudo que deixara por lá.

03 – Diante do desejo de Martim de provar a jurema, um sorriso triste aponta nos lábios da índia. Qual pode ter sido a razão da tristeza de Iracema?

      Ela possivelmente imaginou que, com a proximidade da partida, Martim preferisse ficar mais tempo com ela a sonhar com a mulher branca que deixara em Portugal.

04 – As diversas comparações e metáforas presentes ao longo do romance Iracema são responsáveis pela criação do tom poético da obra, como em:

        “— O sono é o descanso do guerreiro, disse Martim; e o sonho a alegria d'alma. O estrangeiro não quer levar consigo a tristeza da terra hospedeira, nem deixá-la no coração de Iracema!

        Observe a oposição representada pelos termos destacados e complete a frase a seguir no caderno. O elemento, nesse contexto, que poderia corresponder à tristeza da terra hospedeira, aquilo que um sonho bom deveria substituir, é .............

·        A saudade da própria terra, Portugal, que Martim deixou há bastante tempo.

·        A saudade da noiva, que o espera em sua terra de origem.

·        A impossibilidade de ter Iracema, de amá-la.

·        As tristezas e as decepções vividas no Brasil.

·        A melancolia observada em todos os índios da tribo em que estava.

05 – Releia:

        “Agora podia viver com Iracema, e colher em seus lábios o beijo, que ali viçava entre sorrisos, como o fruto na corola da flor. Podia amá-la, e sugar desse amor o mel e o perfume, sem deixar veneno no seio da virgem.”. Se o amor de Martim pela índia era impossível, por que, nesse momento, ele acredita poder “viver com Iracema, e colher em seus lábios o beijo”?

      Porque o efeito da jurema lhe dava a possibilidade de viver em sonho algo que não poderia ser vivido na realidade.

06 – Complete as frases no caderno. No contexto do trecho: “Podia amá-la, e sugar desse amor o mel e o perfume, sem deixar veneno no seio da virgem”, mel e perfume significam a sensação agradável sentida naquele estado de sonho. A frase “sem deixar veneno no seio da virgem”, portanto, pode significar .........

·        Não permitir que Iracema bebesse o licor de Tupã, bebida destinada apenas aos guerreiros.

·        Viver as delícias do contato com Iracema apenas em sonho, sem de fato consumar o amor, protegendo, assim, a virgindade da índia.

·        Não permitir que Iracema tomasse contato com seus sonhos, seus desejos.

·        Não deixar que, durante seus sonhos, a jurema vertesse sobre o corpo de Iracema.

·        Proteger Iracema de qualquer agressão que pudesse vir dos índios de sua tribo.

07 – A certeza de Martim de que havia estado com Iracema apenas em sonho pode ser comprovada pelo seguinte trecho:

a)   “[...] e colher em seus lábios o beijo, que ali viçava entre sorrisos, como o fruto na corola da flor.”

b)   “O gozo era vida, pois o sentia mais forte e intenso [...]”.

c)   “[...] o mal era sonho e ilusão, que da virgem não possuía senão a imagem”.

08 – É possível, no trecho lido, verificar uma integração entre as ações e descrições das personagens e os elementos da paisagem. Releia:

        “Quando veio a manhã, ainda achou Iracema ali debruçada, qual borboleta que dormiu no seio do formoso cacto. Em seu lindo semblante acendia o pejo vivos rubores; e como entre os arrebóis da manhã cintila o primeiro raio do sol, em suas faces incendidas rutilava o primeiro sorriso da esposa, aurora de fruído amor.”

a)   A manhã que surge ainda encontra a índia junto de Martim. Em seu rosto brilha um sorriso, “o primeiro sorriso da esposa”. A que elemento da paisagem é comparado o sorriso de Iracema?

Ao primeiro raio do sol que cintila entre os arrebóis da manhã.

b)   O que essa comparação revela sobre esse momento da vida de Iracema?

A comparação enfatiza a nova condição de Iracema, que nasce para uma nova vida. Ela não é mais a virgem de Tupã, ela traz agora o “primeiro sorriso da esposa”.

 

 

 

domingo, 8 de agosto de 2021

ROMANCE: A PATA DA GAZELA I (FRAGMENTO) - JOSÉ DE ALENCAR - COM GABARITO

 Romance: A PATA DA GAZELA I (Fragmento)

               José de Alencar

        Estava parada na Rua da Quitanda, próximo à da Assembleia, uma linda vitória, puxada por soberbos cavalos do Cabo.

        Dentro do carro havia duas moças; uma delas, alta e esbelta, tinha uma presença encantadora; a outra, de pequena estatura, muito delicada de talhe, era talvez mais linda que sua companheira.

         Estavam ambas elegantemente vestidas e conversavam a respeito das compras que já tinham realizado ou das que ainda pretendiam fazer.

        — Daqui aonde vamos? perguntou a mais baixa, vestida de roxo-claro.

        — Ao escritório de papai: talvez ele queira vir conosco. Na volta passaremos pela Rua do Ouvidor, respondeu a mais esbelta, cujo talhe era desenhado por um roupão cinzento.

        O vestido roxo debruçou-se de modo a olhar para fora, no sentido contrário àquele em que seguia o carro, enquanto o roupão, recostando-se nas almofadas, consultava uma carteirinha de lembranças, onde naturalmente escrevera a nota de suas encomendas.

        — O lacaio ficou-se de uma vez! disse o vestido roxo com um movimento de impaciência.

        — É verdade! respondeu distraidamente a companheira.

Estas palavras confirmavam o que aliás indicava o simples aspecto da carruagem: as senhoras estavam à espera do lacaio, mandado a algum ponto próximo. A impaciência da moça de vestido roxo era partilhada pelos fogosos cavalos, que dificilmente conseguia sofrear um cocheiro agaloado.

        Depois de alguns momentos de espera, sobressaltou-se o roupão cinzento, e, conchegando-se mais às almofadas, como para ocultar-se no fundo da carruagem, murmurou:

        — Laura!... Laura!...

        E, como sua amiga não a ouvisse, puxou-lhe pela manga.

        — O que é, Amélia?

        — Não vês? Aquele moço que está ali defronte nos olhando.

        — Que tem isto? disse Laura sorrindo.

        — Não gosto! replicou Amélia com um movimento de contrariedade. Há quanto tempo está ali e sem tirar os olhos de mim?

        — Volta-lhe as costas!

        — Vamos para diante.

        — Como quiseres.

        Avisado o cocheiro, avançou alguns passos, de modo a tirar ao curioso a vista do interior do carro; mas o mancebo não desanimou por isso e, passando de uma a outra porta, tomou posição conveniente para contemplar a moça com uma admiração franca e apaixonada.

        Simples no traje, e pouco favorecido a respeito de beleza; os dotes naturais que excitavam nesse moço alguma atenção eram uma vasta fronte meditativa e os grandes olhos pardos, cheios do brilho profundo e fosforescente que naquele momento derramavam pelo semblante de Amélia.

        [...]

        Notando Amélia a insistência do mancebo, ficou vivamente contrariada. Aquele olhar profundo, que parecia despedir os fogos surdos de uma labareda oculta, incutia nela um desassossego íntimo. Agitava-se impaciente, como uma criatura no meio de um sono inquieto ou mesmo de um ligeiro pesadelo.

        Até que abriu o chapeuzinho-de-sol para interceptar a contemplação apaixonada de que era objeto. Nesta ocasião, Laura, que frequentemente se debruçava para ver quando vinha o lacaio, retraiu o corpo com vivacidade:

        — Enfim; aí vem!

        — Felizmente! disse Amélia.

        O lacaio aproximava-se a passos medidos; trazia na mão um embrulho de papel azul, que o atrito dos dedos e a oscilação dos objetos envoltos desfizera, obrigando o portador a apertá-lo de vez em quando.

        Julgando ao cabo de alguns instantes que o lacaio já tocava o estribo da carruagem, Amélia, tomando um tom imperativo, disse para o cocheiro:

        — Vamos! vamos!

        Ao aceno que lhe fez o cocheiro, o lacaio correu, chegando a tempo de apanhar o carro, que partia ao trote largo da fogosa parelha. Deitar o embrulho na caixa da vitória, rodear em dois saltos e galgar o estribo da almofada, foi para o criado, habituado a essa manobra, negócio de um instante. Não percebera ele, porém, que, abrindo-se o papel com a corrida, um dos objetos nele contidos escorregara e, justamente na ocasião de deitar o embrulho na caixa do carro, caíra na calçada.

        Laura, que se inclinara com vivo interesse para tomar o embrulho das mãos do lacaio, tivera um pressentimento do acidente, ao ver o papel desenrolado. Fechando-o rapidamente e escondendo-o por baixo do assento da vitória, ela debruçou-se ainda uma vez para verificar se com efeito alguma coisa havia caído. Ao mesmo tempo acompanhava o movimento com estas palavras de contrariedade:

        — Como ele manda isto! Por mais que se lhe recomende!

        Laura nada viu, porque já a vitória rodava ligeiramente sobre os paralelepípedos. Nesse momento, porém, dobrando a Rua da Assembleia, se aproximara um moço elegante não só no traje do melhor gosto, como na graça de sua pessoa: era sem dúvida um dos príncipes da moda, um dos leões da Rua do Ouvidor; mas desse podemos assegurar pelo seu parecer distinto que não tinha usurpado o título.

        O mancebo viu casualmente o lacaio quando passara por ele correndo, e percebeu que um objeto caíra do embrulho. 3 Naturalmente não se dignaria abaixar para apanhá-lo, nem mesmo deitar-lhe um olhar, se não visse aparecer ao lado da vitória o rosto de uma senhora, que o aspecto da carruagem indicava pertencer à melhor sociedade.

        Então apressou-se, para ter ocasião de fazer uma fineza e pretexto de conhecer a senhora, que lhe parecera bonita. Os leões são apaixonadíssimos de tais encontros; acham-lhes um sainete que destrói a monotonia das relações habituais.

        Quando o moço ergueu-se com o objeto na mão, já o carro dobrava a Rua Sete de Setembro. Ficou ele um momento indeciso, olhando em torno, como se esperasse alguma informação a respeito da pessoa a quem pertencia o carro. Sem dúvida a senhora era conhecida em alguma loja de fazendas; talvez tivesse aí feito compras.

        Não obtendo, porém, informações, nem colhendo resultado da pergunta que fizera a um caixeiro próximo, resolveu-se a meter o objeto no bolso e seguir seu caminho.

        [...]

                   ALENCAR, José de. A pata da gazela. Disponível em: https://bit.ly/2PP3NCW. Acesso em: 19 set. 2018.

Fonte: Livro – Tecendo Linguagens – Língua Portuguesa – 9º ano – Ensino Fundamental – IBEP 5ª edição – São Paulo, 2018, p. 50-3.

Fonte da imagem - https://www.google.com/url?sa=i&url=https%3A%2F%2Fwww.youtube.com%2Fwatch%3Fv%3DvB9pJpQj0Yo&psig=AOvVaw271us3Za4h4aQzAy70Objh&ust=1628538443944000&source=images&cd=vfe&ved=0CAsQjRxqFwoTCOCAguSYovICFQAAAAAdAAAAABAE

Entendendo o romance:

01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:

·        Agaloado: bordado com galões (tiras de tecido bordados com fios dourados).

·        Mancebo: Jovem, moço.

·        Sainete: graça.

·        Sofrear: fazer parar ou diminuir a marcha de um cavalo.

·        Vitória: carruagem para dois passageiros, com quatro rodas e cobertura dobrável.

02 – O fragmento do romance lido indica tratar-se de uma história policial, de aventura, de amor ou de terror?

      Indica tratar-se de uma história de amor.

03 – Qual é o foco narrativo desse romance?

      O romance é narrado em terceira pessoa.

04 – No texto, O narrador apresenta uma minuciosa descrição das personagens. Que elementos nos permitem perceber de que classe social as moças fazem parte?

      A descrição da carruagem; a forma como as moças estavam elegantemente vestidas; a conversa delas sobre as compras que já tinham realizado e as que ainda pretendiam fazer; o criado que esperavam. Tudo isso configura personagens de classe social abastada.

05 – Nesse romance, as roupas das personagens são tão importantes na caracterização delas que o narrador substitui o nome das moças pelo traje que portam. Selecione dois exemplos do texto que ilustram essa afirmação e transcreva-os.

      “O vestido roxo debruçou-se de modo a olhar para fora [...]”; “[...] o roupão, recostando-se nas almofadas, consultava uma carteirinha de lembranças [...]”.

06 – Leia o trecho a seguir, que se refere ao comportamento de Amélia, e responda à questão.

        Notando Amélia a insistência do mancebo, ficou vivamente contrariada. Aquele olhar profundo, que parecia despedir os fogos surdos de uma labareda oculta, incutia nela um desassossego íntimo. [...]”. O que o trecho pode revelar a respeito das características psicológicas da personagem?

      O trecho revela ser a personagem uma moça recatada, de comportamento reservado.

07 – Que atitudes Amélia tomou para se proteger e se esquivar do olhar do rapaz que a admirava?

      Avisou ao cocheiro que avançasse alguns passos, de modo que tirasse o interior do carro da vista do rapaz; abriu o chapeuzinho de sol, para impedir a contemplação apaixonada de que era objeto.

08 – Pelo fragmento lido, é possível identificar a situação-problema que se constrói e será responsável pelo desenvolvimento da história. Indique as alternativas que apresentam os acontecimentos fundamentais que desencadearam essa situação.

a)   O lacaio apressado não percebe que deixa cair, na rua, um objeto do embrulho que carregava.

b)   O cocheiro leva a vitória mais à frente, para tirá-la do foco do olhar do moço apaixonado.

c)   Um jovem interessado apanha o objeto perdido e busca informações sobre sua possível proprietária.

d)   Laura, desconfiada de que algo foi deixado para trás pelo lacaio, olha pela janela da vitória em direção à rua.

e)   O rapaz bem-vestido, não obtendo informações sobre a dona do objeto perdido, guarda-o no bolso.

Alternativas: a, c, d, e.

09 – Que objeto você imagina ter caído do embrulho?

      Resposta pessoal do aluno.

10 – Que ideias e sentimentos você imagina que o jovem bem-vestido terá em relação ao objeto encontrado?

      Resposta pessoal do aluno.

11 – Ao ver o objeto encontrado, o rapaz tirará algumas conclusões sobre sua proprietária. O que você acha que ele pensará sobre ela? Por quê?

      Resposta pessoal do aluno.

domingo, 20 de outubro de 2019

ROMANCE: O GUARANI - FRAGMENTO - JOSÉ DE ALENCAR - COM GABARITO

Romance: O Guarani – Fragmento
            VII PELEJA – Jose de Alencar

       Quando a família de D. Antônio de Mariz gozava dos primeiros momentos de tranquilidade que sucediam a tantas aflições, soou um grito na escada de pedra.
        Cecília levantou-se estremecendo de alegria e felicidade; tinha reconhecido a voz de Peri.
        No momento em que ia correr ao encontro do seu amigo, mestre Nunes já tinha abaixado uma prancha que servia de ponte levadiça, e Peri chegava à porta da sala. D. Antônio de Mariz, sua mulher e sua filha ficaram mudos de espanto e terror; Isabel caiu fulminada, como se a vida lhe faltasse de repente.
        Peri trazia nos seus ombros o corpo inanimado de Álvaro; e no rosto uma expressão de tristeza profunda. Atravessando a sala, depôs sobre o sofá o seu fardo precioso, e olhando o rosto lívido daquele que fora seu amigo, enxugou uma lágrima que lhe corria pela face. Nenhuma das pessoas presentes se animava a quebrar o silêncio solene que envolvia aquela cena lúgubre; os aventureiros que haviam acompanhado Peri quando passara no meio deles correndo, pararam na porta, tomados de compaixão e respeito por aquela desgraça. Cecília nem pôde gozar da alegria de ver Peri salvo; seus olhos, apesar dos sofrimentos passados, ainda tinham lágrimas para chorar essa vida nobre e leal que a morte acabava de ceifar. Quanto a D. Antônio de Mariz, sua dor era de um pai que havia perdido um filho; era a dor muda e concentrada que abala as organizações fortes, sem contudo abatê-las.
        Depois dessa primeira comoção produzida pela chegada de Peri, o fidalgo interrogou o índio e ouviu de sua boca a narração breve dos acontecimentos, cuja peripécia tinha diante dos olhos.
        Eis o que havia passado. Partindo na véspera, no momento em que começava a sentir os primeiros efeitos do veneno terrível que tomara, Peri ia cumprir a promessa que tinha feito a Cecília. Ia procurar a vida em um contraveneno infalível, cuja existência só era conhecida pelos velhos pajés da tribo, e pelas mulheres que os auxiliavam nas suas preparações medicinais. Sua mãe, quando ele partira para a primeira guerra, lhe tinha revelado esse segredo que devia salvá-lo de uma morte certa no caso de ser ferido por alguma seta ervada. Vendo o desespero de sua senhora, o índio sentiu-se com forças de resistir ao torpor do envenenamento que começava a ganhar-lhe o corpo, e ir ao fundo da floresta e procurar essa erva poderosa que devia restituir-lhe a saúde, o vigor e a existência. Contudo, quando atravessava a mata parecia-lhe às vezes que já era tarde, que não chegaria a tempo: então tinha medo de morrer longe de sua senhora, sem poder volver para ela o seu último olhar. Arrependia-se quase de ter partido de casa e não deixar-se ficar aos pés de Cecília até exalar o seu último suspiro; mas lembrava-se que a menina o esperava, lembrava-se que ela ainda precisava de sua vida e criava novas forças. Peri entranhou-se no mais basto e sombrio da floresta, e aí, na sombra e no silêncio passou-se entre ele e a natureza uma cena da vida selvagem, dessa vida primitiva, cuja imagem nos chegou tão incompleta e desfigurada. O dia declinou: veio a tarde, depois a noite, e sob essa abóbada espessa em que Peri dormia como em um santuário, nem um rumor revelara o que ai se passou. Quando o primeiro reflexo do dia purpureou o horizonte, as folhas se abriram, e Peri exausto de forças, vacilante, emagrecido como se acabasse de uma longa enfermidade. Saiu do seu retiro. Mal se podia suster, e para caminhar era obrigado a sustentar-se aos galhos das árvores que encontrava na sua passagem: assim adiantou-se pela floresta, e colheu alguns frutos, que lhe restabeleceram um tanto as forças. Chegando à beira do rio, Peri já sentiu o vigor que voltava, e o calor que começava a animar-lhe o corpo entorpecido; atirou-se à água e mergulhou. Quando voltou à margem, era outro homem; uma reação se havia operado; seus membros tinham adquirido a elasticidade natural; o sangue girava livremente nas veias. Então tratou de recuperar as forças que havia perdido, e tudo quanto a floresta lhe oferecia de saboroso e nutriente serviu a este banquete da vida, em que o selvagem festejava a sua vitória sobre a morte e o veneno. O sol tinha raiado havia horas; Peri, acabada a sua refeição, caminhava pensativo, quando ouviu uma descarga de armas de fogo, cujo estrondo reboou pelo âmbito da floresta. Lançou-se na direção dos tiros, e a pouca distância, num claro da mata, descobriu um espetáculo grandioso. Álvaro e os seus nove companheiros divididos em duas colunas de cinco homens, com as costas apoiadas às costas uns dos outros, estavam cercados por mais de cem Aimorés que se precipitavam sobre eles com um furor selvagem. Mas as ondas dessa torrente de bárbaros que soltavam bramidos espantosos, iam quebrar-se contra essa pequena coluna, que não parecia de homens, mas de aço; as espadas jogavam com tanta velocidade que a tornavam impenetrável; no raio de uma braça o inimigo que se adiantava caia morto.
        Havia uma hora que durava esse combate, começado com armas de fogo; mas os Aimorés atacavam com tanta fúria, que breve tinham chegado a luta corpo a corpo e à arma branca.
        No momento em que Peri assomava à margem da clareira, um incidente veio modificar a face do combate.
        O aventureiro que dava as costas a Álvaro, levado pelo ardor da peleja, adiantou-se alguns passos para ferir um inimigo; os selvagens o envolveram, deixando a coluna interrompida e Álvaro sem defesa. Entretanto o valente cavalheiro continuava a fazer prodígios de valor e de coragem; cada volta que descrevia sua espada era um inimigo de menos, uma vida que se extinguia a seus pés num rio de sangue. Os selvagens redobravam de furor contra ele, e cada vez o seu braço ágil movia-se com mais segurança e mais certeza, fazendo jogar como um raio a lamina de aço que mal se via brilhar nas suas rápidas evoluções.
        Desde porém que os Aimorés viram o moço sem defesa pelas costas, e exposto aos seus golpes, concentraram-se nesse ponto; um deles adiantando-se, ergueu com as duas mãos a pesada tangapema e atirou-a ao alto da cabeça de Álvaro.
        O moço caiu; mas na sua queda a espada descreveu ainda um semicírculo e abateu o inimigo que o tinha ferido à traição; a dor violenta dera a esse último golpe uma força sobrenatural.
        Quando os índios iam precipitar-se sobre o cavalheiro, Peri saltou no meio deles, e agarrando a espingarda que estava a seus pés, fez dela uma arma terrível uma clava formidável, cujo poder em breve sentiram os Aimorés. Apenas se viu livre do turbilhão dos inimigos, o índio tomou Álvaro nos seus ombros, e abrindo caminho com a sua arma temível, lançou-se pela floresta e desapareceu.
        Alguns o seguiram; mas Peri voltou-se e fê-los arrepender-se de sua ousadia; livrando-se do peso que levava, carregou a espingarda com as munições que Álvaro trazia e mandou uma bala àquele que o perseguia mais de perto; os outros, que já o conheciam pelo combate da véspera, retrocederam.
        A ideia de Peri era salvar Álvaro, não só pela amizade que lhe tinha, como por causa de Cecília, que ele supunha amar o cavalheiro; vendo porém que o corpo continuava inanimado, acreditou que Álvaro estava morto.
        Apesar disto não desistiu do seu propósito; morto ou vivo devia levá-lo àqueles que o amavam, ou para o restituírem à vida, ou para derramarem sobre o seu corpo o pranto da despedida.

      ALENCAR, José de. “O Guarani”. 11. ed. São Paulo, Ática, 1984. p. 191-3.
Fonte: Livro- Português – Série – Novo Ensino Médio – Vol. único. Ed. Ática – 2000- p.224-5.

Entendendo o texto:
01 – De acordo com o texto, o que significa a palavra tangapema?
      É o nome da arma tacape.

02 – Que característica da casa de D. Antônio de Mariz nos lembra um castelo medieval?
      O fato de ter uma ponte levadiça.

03 – Como pode ser caracterizado o sentimento de Peri em relação à morte de Álvaro? Justifique sua resposta com duas citações do texto.
      O sentimento de Peri era de tristeza profunda, conforme as passagens: “no rosto uma expressão de tristeza profunda” e “enxugou uma lágrima”.

04 – O que pretendeu o narrador ao demonstrar ao leitor o caráter extremamente humano e sentimental de Peri?
     Em princípio, pode-se afirmar que o narrador procurou demonstrar que não havia diferenças marcantes entre os sentimentos dos chamados civilizados e os sentimentos dos selvagens, igualando Peri aos fidalgos.

05 – Apesar de se inscrever na temática indianista, o narrador focaliza personagens do início da nossa colonização. Que caráter isso dá ao texto?
      Um caráter histórico.

segunda-feira, 1 de abril de 2019

TEXTO: AMOR À PRIMEIRA VISTA - IRACEMA - CAP. II - JOSÉ DE ALENCAR - COM GABARITO

Texto: Amor à primeira vista – Iracema cap. II
             
                                José de Alencar

        Além, muito além daquela serra, que ainda azula no horizonte, nasceu Iracema.
        Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha os cabelos mais negros que a asa da graúna e mais longos que seu talhe de palmeira.
        O favo da jati não era doce como seu sorriso; nem a baunilha recendia no bosque como seu hálito perfumado.
        Mais rápida que a ema selvagem, a morena virgem corria o sertão e as matas do Ipu?" onde campeava sua guerreira tribo da grande nação tabajara, o pé grácil e nu, mal roçando alisava apenas a verde pelúcia que vestia a terra com as primeiras águas.
        Um dia, ao pino do sol, ela repousava em um claro da floresta. Banhava-lhe o corpo a sombra da oiticica, mais fresca do que o orvalho da noite. Os ramos da acácia silvestre esparziam flores sobre os úmidos cabelos Escondidos na folhagem os pássaros ameigavam o canto
        Iracema saiu do banho; o aljôfar d'água ainda a roreja, como à doce mangaba que corou em manhã de chuva Enquanto repousa, empluma das penas do gará as flechas de seu arco, e concerta com o sabiá da mata, pousado no galho próximo, o canto agreste
        A graciosa ará, sua companheira e amiga, brinca junto dela.  Às vezes sobe aos ramos da árvore e de lá chama a virgem pelo nome; outras remexe o uru te palha matizada, onde traz a selvagem seus perfumes, os alvos fios do crautá, as agulhas da juçara com que tece a renda, e as tintas de que matiza o algodão.
        Rumor suspeito quebra a doce harmonia da sesta. Ergue a virgem os olhos, que o sol não deslumbra; sua vista perturba-se.
        Diante dela e todo a contemplá-la, está um guerreiro estranho, se é guerreiro e não algum mau espírito da floresta. Tem nas faces o branco das areias que bordam o mar; nos olhos o azul triste das águas profundas. Ignotas armas e tecidos ignotos cobrem-lhe o corpo.
        Foi rápido, como o olhar, o gesto de Iracema. A flecha embebida no arco partiu Gotas de sangue borbulham na face do desconhecido.
        De primeiro ímpeto, a mão lesta caiu sobre a cruz da espada, mas logo sorriu. O moço guerreiro aprendeu na religião de sua mãe, onde a mulher é símbolo de ternura e amor. Sofreu mais d'alma que da ferida.
        O sentimento que ele pôs nos olhos e no rosto, não o sei eu. Porém a virgem lançou de si o arco e a uiraçaba, e correu para o guerreiro, sentida da mágoa que causara.
        A mão que rápida ferira, estancou mais rápida e compassiva o sangue que gotejava. Depois Iracema quebrou a flecha homicida: deu a haste ao desconhecido, guardando consigo a ponta farpada.
        O guerreiro falou:
        — Quebras comigo a flecha da paz?
        — Quem te ensinou, guerreiro branco, a linguagem de meus irmãos? Donde vieste a estas matas, que nunca viram outro guerreiro como tu?
        — Venho de bem longe, filha das florestas. Venho das terras que teus irmãos já possuíram, e hoje têm os meus.
        — Bem-vindo seja o estrangeiro aos campos dos tabajaras, senhores das aldeias, e à cabana de Araquém, pai de Iracema.

                       ALENCAR, José de. Iracema. São Paulo: Moderna.
Entendendo o texto:

01 – “Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha os cabelos mais negros que a asa da graúna e mais longos que seu talhe de palmeira.” Observe que, para realçar a beleza de Iracema, o autor compara seu corpo a elementos da natureza brasileira. Essa forma de descrever Iracema é usada em outras passagens do texto. Aponte-as.
      Por exemplo: “O favo do jati não era doce como seu sorriso, nem a baunilha recendia no bosque como seu hálito perfumado.”

02 – Iracema é colocada num cenário natural de grande beleza, estando perfeitamente integrada nesse meio, pois a própria natureza parece rodeá-la de cuidados e carinhos. Destaque pelo menos uma passagem do texto em que isso se observa.
      “Banhava-lhe o corpo a sombra da oiticica, mais fresca do que o orvalho da noite. Os ramos da acácia silvestre esparziam flores sobre os úmidos cabelos.”

03 – Que fato vem quebrar “a doce harmonia da sesta”?
        A chegada do desconhecido guerreiro branco de estranha aparência.

04 – Como se explica a reação violenta de Iracema?
      Ele sentiu-se ameaçada com a chegada do estranho guerreiro.

05 – Que fato revela o caráter nobre de Martim?
      O fato de não ter reagido; o respeito à mulher foi mais forte que a dor e o impulso de revidar a agressão.

06 – Que gesto de Iracema também revela sua nobreza de caráter?
      O gesto de estancar o sangue que sua flecha fizera correr.

07 – Transcreva fala de Martim em que ele revela ser um inimigo da tribo de Iracema.
      “Venho das terras que teus irmãos já possuíram, e hoje têm os meus.”

08 – O que teria feito com que Iracema se arrependesse de haver atirado a flecha?
      O sentimento expresso no rosto e através dos olhos de Martim.