terça-feira, 16 de janeiro de 2024

CRÔNICA: A ESCOLA DA VILA - VIRIATO CORRÊA - COM GABARITO

 Crônica: A escola da vila

             Viriato Corrêa

        Para quem já tivesse visto o mundo, a vila do Coroatá devia ser feia, atrasada e pobre. Mas, para mim, que tinha vindo da pequeninice do povoado, foi um verdadeiro deslumbramento.

Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEghDYAgrrfZFy5rgc_kwLI_-63w_rJhR3gy1qvaNxhA4A3SkxcNb5bgh_lyDR-N6t3jjwnODKedIP2lJOfw2zduKuMZS6CHpoNznWR7bVaww4EnXunyobVhOEqr_hsNf9nVxe9E9OHmbwKo4FqUpdqJX_GSswRvhdnH5oOe15-_o1eIVpHV41APCMWeVMY/s320/ESCOLA%20ANTIGA.jpg


        As quatro ou cinco ruas, com a maioria de casas de telha; os três ou quatro sobradinhos; as casas comerciais sempre cheias de mercadorias e de gente; as missas aos domingos; a banda de música de dez figuras; as procissões de raro em raro, eram novidades que me deixaram maravilhado.

        A igreja acanhadinha e velha, onde os morcegos voejavam, tinha aos meus olhos um esplendor estonteante.

        A Casa da Câmara, acaçapada e pesadona, com o vasto salão onde, às vezes, se realizavam festas, parecia-me um palácio.

        O que mais me encantou foi a escola.

        Quando chegamos à vila, já haviam acabado as férias. Durante os quinze dias em que fiquei em casa curando-me das febres, eu via, da janela, as crianças passarem em grandes bandos, à hora em que terminavam as aulas. A vontade de ficar bom para misturar-me com aquela meninada alegre apressou a minha cura.

        A escola funcionava num velho casarão de vastas salas, que devia ter mais de meio século.

        Quando lá entrei, no primeiro dia, levado pela mão de meu pai, senti no peito o coração bater jubilosamente.

        Dona Janoca, a diretora, recebeu-me com o carinho com que se recebe um filho. Os meninos e as meninas, que me viram chegar, olharam-me risonhamente, como se já tivessem brincado comigo.

        Eu, que vinha do duro rigor da escola do povoado, de alunos tristes e de professor carrancudo, tive um imenso consolo na alma.

        A escola da vila era diferente da escolinha da povoação como o dia o é da noite.

        Dona Janoca tinha vindo da capital, onde aprendera a ensinar crianças.

        Era uma senhora de trinta e cinco anos, cheia de corpo, simpática, dessas simpatias que nos invadem o coração sem pedir licença.

        Havia nas suas maneiras suaves um quê de tanta ternura que nós, às vezes, a julgávamos nossa mãe.

        A sua voz era doce, dessas vozes que nunca se alteram e que mais doces se tornam quando fazem alguma censura.

        Mostrava, sem querer, um grande entusiasmo pela profissão de educadora: ensinava meninos porque isso constituía o prazer de sua vida.

        Se um aluno adoecia, ela, apesar dos afazeres, encontrava tempo para lhe levar uma fruta, um biscoito, um remédio.

        Vivia arranjando livros, papel e lápis nas casas comerciais para os meninos paupérrimos. Se um pai se recusava a mandar o filho à escola, corria a convencê-lo de que o pequeno nada seria na vida se não tivesse instrução.

        Quando chegou da capital para dirigir o grupo escolar da vila, o prédio em que as aulas funcionavam estava em ruínas e o mobiliário, de tão velho e maltratado, já não servia para nada.

        Era preciso dar àquilo um jeito de coisa decente. Mas não havia vintém.

        Ela trazia, como auxiliares, as suas irmãs Rosinha e Nenén, ambas moças.

        E as três deixaram o povo surpreendido: saíram de casa em casa a pedir auxílio para as obras, fizeram rifas, organizaram festas, leilões, bazares de sorte, tudo enfim que pudesse render dinheiro.

        E a vila, cochilona e desacostumada a novidades, viu, com pasmo, Dona Janoca e as irmãs, de broxa e pincel nas mãos, caiando e pintando paredes.

        E a velha casa, de mais de meio século, ressuscitou maravilhosamente, como os palácios surgem nos contos de fada.

        Os salões, amplos e claros, abriam-se de um lado e de outro do vasto corredor, com filas de carteiras escolares, vasos de plantas, aqui e ali, e jarras de flores sobre as mesas.

        As paredes, por si sós, faziam as delícias da pequenada. De alto a baixo uma infinidade de quadros, bandeiras, mapas, fotografias, figuras recortadas de revistas, retratos de grandes homens, coleções de insetos, vistas de cidades, cantos e cantinhos do Brasil e do mundo.

        E tudo aquilo me encantava de tal maneira que eu, às vezes, deixava de brincar todo o tempo do recreio, para ficar revendo paisagem por paisagem, mapa por mapa, figurinha por figurinha.

Viriato Corrêa. Cazuza. 27. ed. São Paulo: Nacional, 1997. p. 16-7.

Entendendo a crônica:

01 – O que encantou o narrador ao chegar à vila de Coroatá?

      A escola da vila foi o que mais encantou o narrador.

02 – Como o narrador descreve a escola da vila em comparação com a escola do povoado de onde ele veio?

      O narrador descreve a escola da vila como muito diferente da escola do povoado, destacando a diferença entre a alegria e suavidade da escola da vila em comparação com o rigor e tristeza da escola do povoado.

03 – Quem era Dona Janoca e qual era a sua importância na escola?

      Dona Janoca era a diretora da escola da vila, uma senhora simpática de trinta e cinco anos, cheia de entusiasmo pela profissão de educadora. Ela desempenhava um papel fundamental na transformação da escola.

04 – Quais eram as características marcantes de Dona Janoca que conquistaram o narrador e os alunos?

      Dona Janoca era descrita como uma mulher simpática, cheia de ternura, com uma voz doce que nunca se alterava, e demonstrava grande entusiasmo pela profissão de educadora. Sua preocupação com os alunos ia além da sala de aula, incluindo gestos como levar frutas, biscoitos e remédios para alunos doentes.

05 – Como Dona Janoca e suas irmãs conseguiram melhorar as condições da escola, mesmo com recursos limitados?

      Dona Janoca e suas irmãs conseguiram melhorar as condições da escola através de atividades como rifas, festas, leilões, bazares de sorte, entre outras, para arrecadar dinheiro. Elas também realizaram obras físicas, caiando e pintando as paredes da escola.

06 – Como a velha casa da escola foi transformada pela iniciativa de Dona Janoca e suas irmãs?

      A velha casa da escola, que estava em ruínas, foi transformada através do esforço de Dona Janoca e suas irmãs. Elas realizaram trabalhos de caiar e pintar as paredes, organizaram eventos para arrecadar fundos e conseguiram revitalizar o prédio, tornando-o mais apropriado para o ambiente educacional.

07 – Quais elementos decoravam as salas da escola e como esses elementos afetavam o narrador?

      As salas da escola eram decoradas com uma variedade de elementos, como quadros, bandeiras, mapas, fotografias, figuras recortadas de revistas, retratos de grandes homens, coleções de insetos, vistas de cidades, cantos e cantinhos do Brasil e do mundo. Esses elementos encantavam o narrador, a ponto de ele deixar de brincar durante o recreio para apreciá-los.

 

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