Crônica: A Vida no Mato
Walcyr Carrasco
REALIZEI UM SONHO! Tenho uma casa de campo. É
cercada de árvores enormes, restos de uma floresta! Uma delícia, é o que diz
quem me visita.
Bem... às vezes! Mal comprei, ordenei ao
recém-contratado caseiro.
— Erga aquele pedaço da cerca e jogue aquele monte
de madeira velha.
Depois, desocupe as caixas da mudança.
— Sim, senhor.
Voltei no fim de semana. A cerca igual, as
caixas fechadas e a madeira apodrecendo. Suspirei. Três semanas depois, uma
camada de poeira se depositava sobre as caixas. Cogumelos cresciam na madeira,
e a cerca caiu de vez. Formigas passeavam no sofá. Rugi. Surpreendeu-se.
— Mas o senhor não disse que tinha pressa.
Partiu bravíssimo! Veio um novo. Rapaz jovem,
paranaense. Um dia cheguei, ele não estava. Liguei para uma conhecida.
— Ah, falei com ele. Saiu para cortar o cabelo.
Reapareceu três dias depois, surpreso com meu
nervosismo.
— E que aproveitei para comprar cigarros.
Deve haver algum tratado de psicologia que
ensine a entender a mente dos caseiros. Mais alguns dias, ele me telefonou.
— Ganhei um galo e uma galinha!
Sorri. Imaginei minha futura granja. Eu,
cercado por cestas de ovos brancos e pintinhos piando. Tudo começaria com o
casal! Seria o Rei do Frango! Fui ver as duas preciosidades.
Estavam trancadas na lavanderia. Meu cachorro
husky uivava do outro lado da porta. A máquina de lavar tinha virado poleiro!
São assim os cães caçadores! Ficam pirados com o cheiro das penas.
De madrugada acordei com o interminável canto
do galo. Adeus, Rei do Frango!
— Bote os dois na panela! — uivei.
Decepcionado, meu ex-futuro sócio, o caseiro,
depenou galo e galinha.
Dois dias depois, apareceu com um vira-lata
filhote.
—
Deixaram aqui em frente, em uma caixinha. Fiquei com dó.
Eu queria ter a mesma capacidade de sedução de
um cachorro! Bastou ele lamber minhas mãos, e me apaixonei. Botei no colo e
assumi a paternidade! No dia seguinte, senti coceiras. Carrapatos! Chamei o
veterinário, que examinou o cãozinho inocente. Tinha tudo que se pode imaginar.
— Vou botar um remédio, e ele vai ficar livre
de pulgas e carrapatos!
— Seu veterinário, o senhor não pode me tratar
também?
Rejeitado, dedetizei a casa de campo e o apartamento.
— Agora estou livre?
— Carrapatos ficam na grama — explicou o dono
da dedetizadora, depois de receber o pagamento.
Passei semanas indo ao campo, mas andando de
botas, meias e calças compridas. Belo jeito de aproveitar o verão! Mas,
enfim... a paz!
Paz? Acordei com os ganidos lancinantes do
husky. Havia atacado um porco-espinho. Nunca tinha, visto esses espinhos de
perto. Que farpas! Nem se via o focinho do cachorro, pois parecia uma almofada
de alfinetes! Prendi a boca do bicho, segurei a lanterna e o caseiro foi
retirando espinho por espinho com um alicate enquanto o herói da noite tentava
escapar e nos morder! .
A luz já acabou por conta das chuvas, o
transformador da rua estourou e arrasou com vários aparelhos, o telefone ficou
com chiado, o cabo da parabólica arrebentou, a bomba do poço fundiu, o motor da
piscina deu problema, e a água parada quase criou dengue... enfim, tudo rotina!
A cada item, o fornecedor da hora me consola:
— Pelo menos agora está tudo novo. Nunca mais
vai dar problema!
Finalmente, tudo arrumado! De preocupação, só a
mania do husky de nadar na piscina e deixar flocos de pêlo boiando. Sento-me
para ouvir as cigarras ao entardecer. Começa uma ensurdecedora música caipira.
E o caseiro do vizinho. Aproveita para botar o
rádio no último volume quando os patrões estão fora! Respiro fundo! E digo:
— Ah, como é bom estar no mato!
Dá para acreditar?
Entendendo o texto
01. Qual é o tema central abordado na crônica "A
Vida no Mato" de Walcyr Carrasco?
a) A vida no campo.
b) As dificuldades com caseiros.
c) As aventuras de ter uma casa de campo.
d) Os animais de estimação do autor.
02. Quem é o narrador da crônica "A Vida no
Mato"?
a) Um observador externo.
b) O caseiro do autor.
c) O autor, Walcyr Carrasco.
d) Um visitante da casa de campo.
03. Qual é a função social do caseiro na crônica?
a) Cuidar dos animais.
b) Manter a casa de campo em ordem.
c) Ser sócio do autor.
d) Plantar na horta.
04. O que o caseiro faz com o galo e a galinha que
ganha?
a) Coloca na granja.
b) Vende para o autor.
c) Os depena para o autor.
d) Oferece como presente.
05. O que acontece com o cachorro filhote que o caseiro
encontra?
a) É adotado pelo autor.
b) É devolvido ao dono.
c) Fica na rua.
d) É doado para o veterinário.
06. Por que o autor decide dedetizar a casa de campo?
a) Por causa das formigas.
b) Por causa dos carrapatos.
c) Por causa das abelhas.
d) Por causa dos mosquitos.
07. O que o veterinário diz sobre os problemas do
cachorro filhote?
a) Está saudável.
b) Precisa de cirurgia.
c) Tem pulgas e carrapatos.
d) Está comendo demais.
08. Qual é a rotina de problemas enfrentada pelo autor
na casa de campo?
a) Falta de água.
b) Chuvas intensas.
c) Danos em aparelhos.
d) Todas as opções acima.
09. O que o fornecedor da hora consola o autor?
a) Pela falta de luz.
b) Pelos problemas com o cachorro.
c) Pelos danos nos aparelhos.
d) Pela necessidade de dedetização.
10. Como o autor conclui a crônica "A Vida no
Mato"?
a) Agradecendo ao caseiro.
b) Expressando seu amor pela vida no campo.
c) Lamentando as cigarras e o rádio do caseiro.
d) Celebrando a tranquilidade do ambiente.
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