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terça-feira, 10 de abril de 2018

CONTO: JARDIM MORTO - FREDERICO GARCIA LORCA - COM GABARITO

CONTO: JARDIM MORTO
                 Frederico Garcia Lorca

    Cai chuvosa a manhã sobre o jardim... No final duma ladeira lamosa e junto de uma cruz, verde e negra de umidade, está a porta de madeira carcomida que dá entrada ao recinto abandonado. Mais além há uma ponte de pedra cinzenta e na distância brumosa uma montanha nevada. No fundo do vale e entre penhas corre o rio manso cantarolando sua velha canção.
 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi_jyQUH-tc_WsB-VKGG1ryYxgz6WxBZbrVOhkjWwMfeCNPnUrUPeWxpgiYD3CZf2y_5WCwIV3_7MZTUEDIzY96Fv8yrWvllYG4lhXNePm13lgD3RhazvmC0QNbc2wKxRNQf7pux-EqhBENoI_pXkpSyjo2Aa2h9zuCdXxbC3-aAtZ0gegmaVt4wI1F5AA/s320/Jardim%20Sem%20Vida.jpg



        Em um nicho negro que há junto da porta, dois velhos com capas rasgadas aquecem-se ao lume de uns tições mal acesos... O interior do recinto é angustioso e desolado. A chuva acentua mais esta impressão. Escorrega-se com facilidade. No chão, há grandes troncos mortos... Os muros, altos e amarelos, estão cruzados de gretas enormes, pelas quais saem as lagartixas, que passeiam formando com seus corpos arabescos indecifráveis. No fundo há um resto de claustro com heras e flores secas com as colunas inclinadas. Nas fendas das pedras desmoronadas há flores amarelas cheias de gotas de chuva; nos chãos há charcos de umidade entre as ervas...
        Não restam mais do que as altas paredes onde houve claustros soberbos que viram procissões com custódias de ouro entre a magnifica seriedade dos tapetes...
        Uma coluna ruiu sobre a fonte, e ao celebrar suas bodas de pedra o musgo amoroso cobriu-as com seus finos mantos. Pelos vazios de um capitel jacente assomam ervas miúdas de verde luminoso.
        Abrem-se as plantas umas com outras, a hera cobre as velhas colunas que ainda se têm de pé, a água que transborda da fonte lambe o solo de pedra que há em seu redor e depois se entrega à terra, que a bebe com repugnância... A restante se perde por um buraco negro, que a bebe com avidez.
        (...)
        A chuva aumenta e cai sobre o jardim produzindo ruído surdo e apagado... Umas folhas grandes estremecem suavemente e entre elas assoma com sua cabeça achatada um grande lagarto... que sai correndo a esconder-se entre umas pedras. Deixa a cauda de fora e depois se introduz de todo... As ervas que o peso do lagarto inclinou voltam preguiçosamente a ocupar sua primitiva posição... Com o vento, todas as flores amarelas tremem e se sacodem da água que têm entre suas pétalas... Há caramujos pregados aos muros... O tempo foi desapiedado para com este jardim: Secou seus rosais e cinamomos e, em troca, deu vida a plantas traidoras e mal olentes...
        Não para a chuva de cair.

                          Garcia Lorca, Frederico. Prosa viva/Ideário coligido.
          Trad. Oscar Mendes. Rio de Janeiro. J. Aguilar. 1975. p. 18-9.

Entendendo o texto:
01 – “Cai chuvosa a manhã sobre o jardim...” (primeiro parágrafo) e “Não para a chuva de cair” (último parágrafo). De que forma essas duas frases colaboram para criar a impressão dominante que o texto nos transmite?
     Abrindo e fechando o texto, essas frases instauram e sintetizam o clima de melancolia e degradação criado pelo texto. A palavra mais apropriada para condensar o estado de espírito desenvolvido no texto é deliquescente.

02 – Releia atentamente o texto e elabore um esquema que mostre a sequência seguida pelo autor para apresentar o jardim morto.
     1º parágrafo: visão geral, situando o jardim na paisagem ampla.
     2º parágrafo: Passa-se pela porta e penetra-se no jardim, fornecendo-se uma primeira impressão geral do mesmo.
     Parágrafos seguintes: particularizam-se alguns detalhes do jardim, como as ruínas dos claustros, a coluna “abraçada” com a fonte, o fluxo de água, o lagarto entre as plantas.

03 – Quais sentidos foram sensibilizados pela imagem do jardim?
     Visão: (por exemplo, “verde e negra”).
     Audição: (“cantarolando sua velha canção”).
     Tato: (“escorrega-se com facilidade”) e
     Olfato: (“mal olentes”).

04 – Em vários pontos do texto, o autor atribui vida e sentimento a seres inanimados, utilizando uma figura de linguagem chamada prosopopeia ou personificação. Aponte passagens do texto em que isso ocorre.
     Por exemplo; “a água... lambe o solo de pedra...”; “a água... se entrega à terra, que a bebe...”; “... um buraco negro, que a bebe...”; “... o rio manso cantarolando...”; “... claustros soberbos que viram...”; “... musgo amoroso...”, etc.

05 – Na sua opinião, o autor faz uma descrição objetiva ou subjetiva do jardim? Ele aponta tudo o que vê ou seleciona o que mais o sensibiliza? Há emoção da parte de quem descreve? Comente.
     A descrição é subjetiva: Além de selecionar aquilo que mais o sensibiliza, o autor incorpora ao que vê aquilo que está sentindo (por exemplo, “O interior do recinto é angustioso e desolado.”), num depoimento emocionado sobre a decadência e a ruína.

06 – O jardim descrito teve alguma relação com atividades religiosas? Por quê?
     SIM. O terceiro parágrafo é esclarecedor.


07 – Associe as colunas pelo significado:
(1) “...distância brumosa ...”, linha 3.              (2) rochas
(2) “...entre penhas...”, linha 3.                        (3) cavidade
(3) “Em um nicho ...”, linha 5.                          (6) cheirosas
(4) “...com heras e flores...”, linha 9.                (1) nevoenta
(5) “...resto de claustro”, linhas 8/9.                 (4) trepadeiras
(6) “...plantas mal olentes”, linha 23.                (5) pátio interior.
A sequência correta, de cima para baixo, é:
A) 3-2-6-1-4 -5
B) 2-3-6-1-4 -5
C) 2-6-3-4-1-5
D) 6-5-3-1-2-4.

08 – Não se relaciona, semanticamente, com a palavra “chuvosa”, linha 1:
A) lamosa
B) umidade
C) brumosa
D) carcomida.

09 – Há no texto uma predominância de elementos:
A) narrativos
B) descritivos
C) dissertativos
D) argumentativos.

10 – Encerra opinião do autor:
A) “A chuva aumenta e cai sobre o jardim...”, linha 18
B) “... assoma com sua cabeça achatada um grande lagarto...”, linha 19
C) “Com o vento, todas as flores amarelas tremem e se sacodem...”, linha 21
D) “O tempo foi desapiedado para com este jardim...”, linha 22

11 – Em várias passagens do texto, como “...claustros soberbos que viram procissões...” e “a água que transborda da fonte lambe o solo...”, o autor dá vida a seres inanimados. Tal processo é chamado de:
A) metonímia
B) metáfora
C) catacrese
D) prosopopeia.

12 – Flexionam-se no plural, respectivamente, como “procissões” e “chãos” os substantivos:
A) folião e cidadão
B) escrivão e faisão
C) cidadão e cristão
D) tabelião e capelão.

13 – O “SE” aparece como índice de indeterminação do sujeito na opção:
A) “... dois velhos com capas rasgadas aquecem-se...”, linha 5
B) “Escorrega-se com facilidade.”, linhas 6/7
C) “Abrem-se as plantas umas com as outras...”, linha 15
D) “A restante se perde por um buraco negro...”, linha 17.

14 – Aponte a passagem do texto em que o autor revela explicitamente o que pensa sobre o jardim descrito.

      “O tempo foi desapiedado para com este jardim: secou seus rosais e cinamomos e, em troca, deu vida a plantas traidoras e mal olentes...”.