Artigo: NA TRASEIRA DO CAMINHÃO
Drauzio Varella
Na minha infância era moda na minha rua
chocar caminhão: pendurar-se na traseira do veículo e saltar na virada da
esquina. Veja artigo do dr. Drauzio.
Quando eu tinha 7, 8 anos, virou moda
na minha rua chocar caminhão: pendurar-se na traseira do veículo e saltar na
virada da esquina. Uma vez, choquei o caminhão de lixo e quando pulei na frente
de casa, meu pai, que chegava do trabalho, estava parado no portão com cara de
quem não gostou da gracinha. Recebi o mais detestável dos castigos: domingo
inteiro de pijama na cama.
Cabeça-dura, repeti a façanha outras
vezes, até que decidi chocar a caminhonete do seu Germano, o alemão da fábrica
em frente, só para me exibir para os meninos, que morriam de medo dele. Sentei
na calçada ao lado da caminhonete. Dois operários puseram umas caixas na
carroceria. Seu Germano, saindo para o almoço, deu a partida. Eu pendurado
atrás. Infelizmente, na esquina, em vez de diminuir a velocidade ele acelerou,
e me faltou coragem para pular.
Fomos na direção do largo Santo
Antônio, cada vez mais depressa, eu com os ossos batendo na lataria, morto de
medo de cair. Ao chegar no largo, duas senhoras me viram naquela velocidade e
gritaram para parar. Seu Germano nem ouviu. Com os braços cansados, fiz um
esforço para saltar para dentro da carroceria, mas a caminhonete pulava feito
cavalo bravo nos paralelepípedos da rua e eu não consegui. Tentei de novo e não
deu. Mais uma vez, pior ainda. Então, fiquei apavorado. Achei que ia morrer e
que meu pai ia ficar muito triste, porque ele sempre dizia: “Deus me livre,
perder um de vocês”.
Talvez o medo da morte tenha me dado
força na quarta tentativa: esfolei a canela inteira, mas consegui passar a
perna e impulsionar o corpo para dentro. Caí no meio das caixas, com o coração
disparado, e chorei. Quando a caminhonete parou na porta do seu Germano, achei
melhor ficar quietinho entre as caixas, até ele voltar para a fábrica depois do
almoço. Também não deu certo: ele resolveu descarregar a caminhonete e me
encontrou escondido. Tomou um susto tão grande que até pulou para trás:
— Menino dos infernos! Como veio parar
aqui?
No caminho, ele me deu conselhos e me
contou do pai. Achei que os castigos do pai dele eram muito piores. O meu nunca
tinha me trancado no guarda-roupa a noite inteira.
Expliquei que só queria chocar até a
esquina, mas a velocidade tinha sido tanta… Ele ficou enfezado e disse que ia
contar para o meu pai. Pedi para não fazer isso porque eu ia apanhar, mas ele
não se importou, falou que era merecido até. Mostrei as pernas esfoladas, ele
não se comoveu. Por fim, contei dos domingos de castigo na cama. Nesse momento,
brilhou um instante de compaixão no olhar dele:
— Seu pai deixa você de pijama, deitado
o domingo inteiro?
— Só quando eu desobedeço muito.
— Está louco! Teu pai é severo como o
meu, na Alemanha. Entre na caminhonete que eu te levo de volta.
No caminho, ele me deu conselhos e me
contou do pai. Achei que os castigos do pai dele eram muito piores. O meu nunca
tinha me trancado no guarda-roupa a noite inteira. Seu Germano concordou em
manter segredo, desde que eu prometesse nunca mais chocar veículo nenhum. Desde
então, apesar do jeito bravo, ele ficou meu amigo. Quando me encontrava, às
vezes dizia:
— Não vá esquecer: menino que cumpre a
palavra merece respeito.
Drauzio Varella. 16 de maio de 2011. Revisado em 6 de março
de 2018.
Entendendo o artigo:
01 – O que o autor fazia na
sua infância que era moda na sua rua?
Na sua infância,
o autor costumava pendurar-se na traseira de caminhões e saltar na virada da
esquina.
02 – Qual foi a reação do pai
do autor quando ele chocou o caminhão de lixo?
O pai do autor
não gostou da gracinha e o castigou com um domingo inteiro de pijama na cama.
03 – Por que o autor decidiu
chocar a caminhonete de seu Germano?
O autor decidiu
chocar a caminhonete de seu Germano para se exibir para os meninos que tinham
medo dele.
04 – O que aconteceu quando o
autor tentou pular da caminhonete do seu Germano na esquina?
Na tentativa de
pular da caminhonete do seu Germano na esquina, o autor não conseguiu devido à
velocidade do veículo e ao medo de cair.
05 – Por que o autor ficou
apavorado durante essa experiência?
O autor ficou
apavorado porque pensou que poderia morrer e que seu pai ficaria triste, já que
costumava dizer: "Deus me livre, perder um de vocês".
06 – Qual foi a reação de seu
Germano ao encontrar o autor na caminhonete?
Seu Germano ficou surpreso e chocado ao
encontrar o autor na caminhonete e afirmou: "Menino dos infernos! Como
veio parar aqui?"
07 – Como a relação entre o
autor e seu Germano mudou após esse incidente?
Apesar do susto
inicial, seu Germano concordou em manter segredo e se tornou amigo do autor,
aconselhando-o a cumprir sua palavra e a não chocar mais veículos.