Poema: Da calma e do silêncio
Conceição Evaristo
Quando eu morder
a palavra,
por favor,
não me apressem,
quero mascar,
rasgar entre os dentes,
a pele, os ossos, o tutano
do verbo,
para assim versejar
o âmago das coisas.
Quando meu olhar
se perder no nada,
por favor,
não me despertem,
quero reter,
no adentro da íris,
a menor sombra,
do ínfimo movimento.
Quando meus pés
abrandarem na marcha,
por favor,
não me forcem.
Caminhar para quê?
Deixem-me quedar,
deixem-me quieta,
na aparente inércia.
Nem todo viandante
anda estradas,
há mundos submersos,
que só o silêncio
da poesia penetra.
Conceição Evaristo.
Da calma e do silêncio. In: Poemas da recordação e outros movimentos. Belo
Horizonte: Nandyala, 2008.
Fonte: Língua Portuguesa
– Estações – Ensino Médio – Volume Único. 1ª edição, São Paulo, 2020 – editora
Ática – p. 62-3.
Entendendo o poema:
01 – Que sensações a leitura
do poema despertou em você?
Resposta pessoal do aluno.
02 – Releia a primeira
estrofe do poema.
a) Explique a metáfora presente nos versos “quero mascar, / rasgar entre os dentes, / a pele, os ossos, o tutano / do verbo”.
O eu lírico compara a palavra ao corpo de um animal ou de um ser
humano. Pois tem pele, ossos e tutano. Compara ainda o fazer poético, o “versejar”,
ao ato de morder, mascar, rasgar esse corpo entre os dentes.
b) Qual é a função dessa metáfora no poema? Que efeito de sentido ela gera?
Por meio dessa metáfora, o eu lírico intensifica o sentido de
profundidade da palavra poética, atribuindo a ela um caráter visceral,
orgânico, vivo. Ao mascar, morder, a palavra, quer alcançar, ou “versejar”, “o
âmago das coisas”, o que é comparável à expressão “chegar ao tutano do osso”.
03 – Na segunda estrofe, o
eu lírico pede que não seja despertado. Por quê?
Porque ele está
olhando para o vazio, num estado de contemplação, reflexão, necessário ao seu
fazer poético. Ele busca olhar para o exterior para captá-lo e internalizá-lo.
04 – Para você, o que
representa a imagem da caminhada presente na última estrofe? Explique sua
interpretação com base no texto.
Resposta pessoal do aluno.
05 – Como o título, “Da
calma e do silêncio”, se relaciona com o caráter metalinguístico do poema?
O título
sintetiza os elementos necessários para a poeta desenvolver seu trabalho
artístico. Ela precisa da calma e do silêncio.
06 – Compare agora o fazer
poético de Conceição Evaristo ao de Fernando Pessoa e ao de Manoel de Barros.
Eles se aproximam ou se distanciam? Explique.
Conceição Evaristo entende o fazer
poético como um processo visceral, que é possível por meio de uma viagem
interior, de autoconhecimento. Assim, distancia-se do fazer poético de Fernando
Pessoa, pois não explicita a racionalidade do processo criativo, e aproxima-se,
em “Da calma e do silêncio”, do fazer poético de Manoel de Barros em “O
apanhador de desperdícios”, que afirma usar a palavra para compor seus
silêncios. O caráter introspectivo está presente em ambos. Do mesmo modo,
também se aproxima desse poeta por preferir um ritmo mais lento para a
composição e para a vida.
07 – Com quais poemas você
se identifica mais? Compartilhe suas impressões com os colegas e o professor.
Resposta pessoal
do aluno.
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