Debate: Programa Roda Viva – Parte 1
Paulo Markun: Boa noite. O relatório da ONU sobre as mudanças no clima colocou a humanidade contra a parede. Os níveis do dióxido de carbono na atmosfera são os maiores já registrados e o aquecimento global é um fato irreversível. A culpa é do homem. As consequências, já manifestadas, podem piorar: mais chuvas, mais seca, furacões e tempestades mais intensos e invernos mais quentes. Podemos entrar em uma era de extremos, com danos pesados para o meio ambiente, agricultura e a vida no planeta. Os estudos que levam a essas previsões são mais precisos do que os anteriores. Foram feitos com mais tecnologia e melhores recursos, o que aumentou o grau de certeza sobre os efeitos do aquecimento da Terra, das mudanças do clima e da influência humana nesse processo. O desafio que isso representa é o tema do Roda Viva de hoje. Reunimos uma bancada de cientistas e especialistas que têm se dedicado à questão, e vamos discutir com eles a dimensão do diagnóstico feito pela ONU, e também, como e quando essas consequências poderão chegar até nós. O relatório feito pelo painel de cientistas, organizado pela ONU, comprova que o aquecimento global é causado por atividades humanas e que se tornou um desafio sério, que deve influenciar bastante o debate político e econômico no planeta. Esse diagnóstico assustou e chegou a ser chamado de alarmista, mas foi também anunciado como um relatório mínimo, já que representa o consenso entre cientistas de todo o mundo. Para eles, as consequências do aquecimento da Terra foram, até agora, subestimadas. O clima mudou muito mais do que se previa e muito antes do que se imaginava.
[...] Para o debate neste Roda Viva
especial nós convidamos Eduardo Giannetti, economista, sociólogo e professor do
Ibmec São Paulo; convidamos também Paulo Artaxo, professor do Instituto de
Física da USP e membro do IPCC, o Painel Intergovernamental para Mudanças
Climáticas; está aqui também Ricardo de Camargo, professor de meteorologia do
IAG-USP, Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP;
Ilana Wainer, coordenadora do Laboratório de Oceanografia, Física e Clima do
Instituto Oceanográfico da USP; Marcelo Furtado, diretor de campanhas do
Greenpeace [Organização global e independente que atua na defesa do meio
ambiente e na promoção da paz, conscientizando as pessoas para mudarem atitudes
e comportamentos, além de investigar, expor e confrontar crimes ambientais,
desafiando tomadores de decisão a reverem suas posições e mudarem seus
conceitos]; José Antônio Marengo, pesquisador climatologista do Cptec-Inpe,
Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos, no Intituto de Pesquisas
Espaciais e também membro do IPCC, Painel Intergovernamental sobre Mudanças
Climáticas.(...) Então, o que eu queria começar a questionar é o seguinte: em
que medida esse documento divulgado pelos cientistas muda alguma coisa na
percepção que a sociedade tem do problema, e mais ainda, em que medida ele muda
o conhecimento que a gente tem sobre este problema? Começamos pela Ilana.
Ilana
Wainer: Eu vou tentar responder do ponto de vista dos oceanos, que é a
minha especialidade. Eu acho que esse relatório coloca uma importância grande
do papel dos oceanos nas mudanças climáticas. Uma delas é a capacidade que o
oceano tem de armazenar e redistribuir esse calor. Então, o oceano tem um
papel, funciona como um refrigerador no planeta. Ele recebe o excesso de calor
das regiões tropicais, que é redistribuído para as regiões de déficit, as
regiões polares, e através de correntes muito profundas, ocorre uma
redistribuição, resfria-se o planeta levando essas correntes mais densas e
frias para a região tropical. O que acontece é que com o aquecimento do planeta
– não vou entrar em detalhes desses processos agora – essa corrente acaba se
desintensificando, ela fica menos intensa, redistribui-se menos excesso de
calor para as regiões de déficit, e, consequentemente, aumentam os contrastes
de temperatura. [...].
Paulo
Artaxo: Evidentemente esse relatório é um marco no conhecimento científico
sobre a questão de mudanças climáticas globais. Porque até o momento, quer
dizer, os modelos não davam as respostas em que os cientistas confiariam o
suficiente para dar um recado importante para o planeta como um todo. Esse
relatório muda esse patamar porque ele dá um nível de confiabilidade muito
grande e as previsões hoje do relatório, das quais algumas delas foram feitas
na introdução do programa, são realmente importantes do ponto de vista das
alterações do clima físico e vão ter consequências importantes do ponto de
vista socioeconômico e político para o nosso planeta. E a repercussão dessas
conclusões foram muito importantes, não só no Brasil, como no mundo todo.
Marcelo
Furtado: E acho que vale a pena, Markun, a gente colocar um ponto
importante, que é a dimensão política disso. Esse documento foi feito para
tomadores de decisão. [...]
José
Antônio Marengo: Eu acho que é importante considerar que esse é um
relatório do grupo 1, que é o relatório científico, e como o Marcelo
mencionou, é o chamado “Sumário para tomadores de decisão”, um documento curto.
O relatório 1 possivelmente tem 1500 páginas. Então, eu concordo com
Artaxo, é um marco épico para nós, meteorologistas, se comparado àquele
relatório publicado em 2001, o terceiro relatório. Em 2001 se falava que o
aquecimento chegaria a 5,8°, agora se fala em 4° ou 4,5°; melhores modelos,
melhores apresentações, melhores observações e técnicas estatísticas, o que
é importante, talvez. Em 2001 se falava que a conclusão principal era: o
aquecimento global não é unicamente consequência de variação natural do clima.
Agora já se fala claramente: é estatisticamente significativa a ação humana.
[...]
Ricardo
de Camargo: A questão das incertezas terem diminuído, como foi
mencionado, e termos colocado nesse patamar de um panorama de certo risco,
e o aumento da certeza de que realmente tem uma parcela humana nisso, e
mesmo minimizado, seja para os tomadores de decisões, ou porque não é em todos
os lugares que os aumentos vão ser tão grandes, seja do nível do mar, seja
das temperaturas, seja das chuvas, eu acho que o marco foi realmente
alcançado, não no sentido do alarmismo que se fez na população mundial, mas que
realmente é o momento em que individualmente, localmente, regionalmente,
países, nações se unam para combater esse aspecto nada favorável para nós.
[...]
*Na transcrição do debate,
o negrito foi empregado para destacar o nome dos participantes e o nome do
programa.
Programa Roda Viva.
Debate aquecimento global. Disponível em (programa na íntegra): www.rodaviva.fapesp.br/mteria/297/entrevistados/debate_aquecimento_global_2007.htm. Acesso em: 20 jan. 2016.
Fonte: Livro Língua Portuguesa
– Trilhas e Tramas – Volume 1 – Leya – São Paulo – 2ª edição – 2016. p. 307-10.
Entendendo o debate:
01 – De acordo com o texto,
qual o significado da palavra Mitigação?
Significa
atenuação.
02 – Qual foi o fato gerador
desse debate?
A divulgação do
relatório da ONU que apresentou dados mais precisos que os anteriores sobre as
mudanças no clima, as causas e consequências do aquecimento global, indicando
que o aquecimento é causado por atividades humanas.
03 – Qual é o objetivo do
debate?
No debate, os participantes
apresentam diferentes opiniões que circulam na sociedade a respeito da questão
discutida. Trata-se de um momento privilegiado para que se tome consciência da
pluralidade de opiniões e da importância de respeitar posições divergentes.
Geralmente abordando um tema
controverso, o debate não tem como objetivo a tomada de decisão, mas a
apresentação de diferentes posições com a finalidade de influenciar a posição
do outro ou a própria.
Discutir a seguinte questão: em que
medida o documento da ONU muda a percepção que a sociedade tem do problema que
é o aquecimento global e que medidas serão tomadas.
04 – Que critérios foram
usados para selecionar os debatedores?
Eles são especialistas no assunto
debatido: pesquisadores e especialistas envolvidos no estudo do aquecimento
global e suas consequências.
05 – Mediador ou moderador é
a pessoa que coordena um debate. É seu papel indicar a vez de falar de
cada um, controlar o tempo da fala, interferir quando sentir que é
necessário pedir novos esclarecimentos, acrescentar um novo
questionamento. Qual foi o objetivo da fala inicial do mediador do
Programa Roda Viva, Paulo Markun?
Cumprimentar a
audiência; contextualizar o assunto, fazer uma breve exposição a respeito
de um relatório feito pelo painel de cientistas, organizado pela ONU,
que comprova que o aquecimento global é causado por atividades humanas e que o
clima “mudou muito mais do que se previa e muito antes do que se imaginava”;
apresentar os debatedores e dirigir a 1ª pergunta a uma debatedora.
06 – Em um debate, é comum a
divergência de opiniões, já que os participantes expõem pontos de vista
diferentes. Esse trecho da transcrição do debate que você leu revela mais
divergência ou convergência de pontos de vista em relação ao relatório?
Justifique com trechos do texto.
Convergência em
relação à importância do relatório. Exemplos: Ilana Wainer: “Eu acho que esse relatório coloca uma
importância grande do papel dos oceanos nas mudanças climáticas.” Paulo Artaxo: “Evidentemente esse
relatório é um marco no conhecimento científico sobre a questão de mudanças
climáticas globais.” Marcelo
Furtado: “E acho que vale a pena, Markun, a gente colocar um
ponto importante, que é a dimensão política disso.” José Antônio Marengo: “Então, eu concordo com Artaxo, é
um marco épico para nós, meteorologistas, se comparado àquele relatório
publicado em 2001, o terceiro relatório.”
07 – Pelo que você lê,
estuda e observa, responda:
a) Os problemas climáticos expostos no debate foram atenuados ou agravados? Explique.
Os alunos devem perceber, de acordo com a fala do mediador e dos
participantes, que os problemas climáticos no planeta vêm se agravando.
b) Em sua opinião, a sociedade, especialmente os jovens, está mais consciente e comprometida com a resolução desse problema? Explique.
Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Leve os alunos a argumentarem
embasando seus pontos de vistas a partir de leituras e do conhecimento de mundo
adquirido sobre o tema.
08 – Explique a que se
refere o uso da primeira pessoa do plural, nós,
e sua variante informal, a gente,
nos seguintes trechos do debate:
a) [Paulo Markun:] Para o debate neste Roda Viva especial nós convidamos [...]
A primeira pessoa do plural refere-se à equipe responsável pelo
programa em que se inclui o mediador.
b) [Paulo Markun:] [Nós] Começamos pela Ilana.
Refere-se a si mesmo e todos os que participantes do debate.
c) [Marcelo Furtado] E acho que vale a pena, Markun, a gente colocar um ponto importante, que é a dimensão política disso.
A gente refere-se a todos os participantes do debate.
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