terça-feira, 23 de agosto de 2022

CORDEL: O DINHEIRO OU O TESTAMENTO DO CACHORRO - (FRAGMENTO) - LEANDRO GOMES DE BARROS - COM GABARITO

 Cordel: O dinheiro ou O testamento do cachorro – Fragmento

             Leandro Gomes de Barros

[...]

Um inglês tinha um cachorro

De uma grande estimação

Morreu o dito cachorro

E o inglês disse então:

-- Mim enterra essa cachorra

Inda que gaste um milhão!

 

Foi ao vigário e disse:

-- Morreu cachorra de mim

E urubu do Brasil

Não poderá dar-lhe fim

-- Cachorro deixou dinheiro?

Perguntou vigário assim.

 

-- Mim quer enterrar cachorra!

Disse o vigário: – Ó inglês

Você pensa que isto aqui

É o país de vocês?

Disse o inglês: – O cachorra

Gasta tudo desta vez.

 

-- Ele antes de morrer

Um testamento aprontou

Só quatro contos de réis

Para o vigário deixou!

Antes do inglês findar

O vigário suspirou:

 

-- Coitado!, disse o vigário

De que morreu este pobre?

Que animal inteligente

Que sentimento tão nobre

Antes de partir do mundo

Fez-me presente do cobre!

 

-- Leve-o para o cemitério

Que o vou encomendar

Isto é, traga o dinheiro

Antes dele se enterrar!

Estes sufrágios fiados

É factível não salvar.

 

E lá chegou o cachorro

O dinheiro foi na frente

Teve momento o enterro

Missa de corpo presente

Ladainha e seu rancho

Melhor do que certa gente.

 

Mandaram dar parte ao bispo

Que o vigário tinha feito

O enterro do cachorro

Que não era de direito

O bispo aí falou muito

Mostrou-se mal satisfeito.

 

Mandou chamar o vigário

Pronto, o vigário chegou:

-- Às ordens, sua excelência!

O bispo lhe perguntou:

-- Então que cachorro foi

Que Seu vigário enterrou?

 

-- Foi um cachorro importante

Animal de inteligência

Ele antes de morrer

Deixou a Vossa Excelência

Dois contos de réis em ouro

Se errei, tenha paciência!

 

-- Não foi erro, Seu vigário

Você é um bom pastor

Desculpe eu incomodá-lo

A culpa é do portador

Um cachorro como este

Já vê que é merecedor!

[...]

BARROS, Leandro Gomes de. O dinheiro. Recife: [s. n.], 1909. Folheto de Cordel. Disponível em: http://docvirt.com/docreader.net/docreader.aspx?bib=RuiCordel&pasta=&pesq=LC6074&pagfis=348. Acesso em: 1° jul. 2020.

Fonte: Língua Portuguesa – Estações – Ensino Médio – Volume Único. 1ª edição, São Paulo, 2020 – editora Ática – p. 100-1. Fragmento.

Entendendo o cordel:

01 – Qual é a situação apresentada nesse trecho do cordel?

      No trecho do cordel, participam da cena o inglês, dono do cachorro falecido, o vigário e o bispo. Na cena, o inglês vai ao vigário pedir que seu cachorro seja enterrado como se fosse gente. O vigário rechaça o pedido, até que o inglês lhe oferece dinheiro. O Vigário é denunciado ao bispo, que vai tomar satisfação com ele, mas a reprimenda só dura até o momento em que o padre oferece dinheiro ao superior.

02 – Como se pode interpretar o “suspiro” do vigário na quarta estrofe?

      O suspiro indica uma falsa expressão de resignação do padre, que, na verdade, estava aliviado em saber que receberia dinheiro do inglês para realizar o enterro do cachorro.

03 – O bispo muda de opinião sobre o enterro do cachorro no decorrer do texto. No que consiste essa mudança?

      O bispo começa achando um absurdo realizar o enterro do cachorro, pois não estaria de acordo com os dogmas da Igreja, mas, quando entende que haverá um bom pagamento pelo “serviço”, ele muda de tom e enaltece o cachorro, deixando claro que o animal merece esse tipo de tratamento.

04 – O que há de ridículo e engraçado nessa situação descrita no cordel?

      O ridículo está no fato de o cachorro ser enterrado “melhor do que certa gente”, isto é, melhor do que os mais pobres, que não têm como pagar os serviços da Igreja. Outro fato é o padre aceitar fazer o enterro por dinheiro e o bispo concordar. O humor aparece exatamente ao mostrar essas personagens nessas situações ridículas.

05 – A sátira é um procedimento em que se ridicularizam os vícios ou as imperfeições de determinado indivíduo ou instituição, geralmente como forma de denúncia. Nesse cordel, a sátira é feita em relação a que instituição?

      Ao ridicularizar o padre e o bispo, o cordel acaba fazendo uma crítica à Igreja, denunciando a corrupção presente na instituição.

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário