Conto: Um talento para os negócios
Mark Twain
Sábado estava um dia lindo. Mas Tom
tinha de trabalhar. Na calçada, com um balde de tinta branca e um pincel na
mão, olhou a cerca à sua espera para ser pintada e desanimou. Achou a vida
horrível. Molhou o pincel e começou a passá-lo pela primeira tábua. Repetiu
tudo outra vez e mais outra. Precisava dar três demãos para o serviço aparecer.
Ia levar a vida toda naquilo. Viu Jim passar carregando água, tarefa que sempre
achara detestável e agora lhe parecia bem melhor. Propôs:
- Eu vou buscar água para você.
Enquanto isso, me dá uma mãozinha aqui.
O outro hesitou, Tom insistiu e lhe
ofereceu uma bola de gude. Jim ia aceitar, mas tia Polly surgiu, e o negócio
não foi adiante. Tom foi de novo caiar a cerca, pensando nas coisas
maravilhosas que podia estar fazendo. Logo os outros meninos passariam por ali
a caminho de brincadeiras. Iam rir dele. Tinha vontade de sumir. Pensou em tudo
o que tinha nos bolsos e que poderia usar para sugerir trocas. Muito pouco. Não
ganharia mais de meia hora de liberdade.
De repente, teve uma ideia. Pegou o
pincel e voltou ao trabalho. Bem na hora em que apareceu Ben Rogers, o mais
gozador de todos. Vinha alegre, com uma maçã na mão, brincando de navio. Apitava,
manobrava, fazia os sons do Grande Missouri, o maior barco que navegava pelo
rio. O menino era ao mesmo tempo o navio, o capitão e as sinetas. Ao chegar
perto de Tom, passou a andar mais devagar.
- Diminuir a velocidade! Parar!
Ding-a-ling-ling! Encostar no cais! Piuííí! Parar as máquinas! Chit-chit-chit!
Tom ignorou as manobras de
aproximação e a atracação do barco. Continuou entretido com a cerca, dando uns
retoques. Ben perguntou:
- Você está de castigo, é? Tem de
trabalhar enquanto a gente vai nadar?
- Trabalhar? Como assim?
- Bom, isso que você está fazendo...
- Tudo bem, se acha que é
trabalho, pode achar. Eu estou me divertindo.
- Essa não... Para cima de mim? Ninguém gosta
disso.
O pincel não parava, para cima e
para baixo na tábua.
- Não sei por que não ia gostar.
Não é todo dia que um menino tem a chance de pintar uma cerca.
Ben não tinha pensado nisso.
Mordeu a maçã, ficou vendo Tom se afastar ligeiramente, pincel na mão, para
examinar mais de longe o efeito da pintura.
- Deixa eu pintar um pouquinho,
Tom...
- Não posso, Ben. Para pintar
bem, precisa ser artista. Tia Polly é muito exigente, você sabe. Se fosse na
cerca dos fundos, tudo bem. Mas, aqui na rua, tem de ficar bem feito. Aposto que
só um menino entre mil consegue. Talvez um entre dois mil.
- E quem disse que eu não consigo?
- Não sou eu, Ben, é a tia
Polly. Jim quis pintar, ela não deixou. Sid também. Tenho medo de que ela se
zangue.
- Eu sou cuidadoso, Tom,
garanto. Olhe aqui, te dou o final da minha maçã.
De coração contente e
expressão relutante, Tom passou o pincel. O “ex-Grande Missouri” ficou suando
debaixo do sol enquanto o artista descansava na sombra, sentado num barril,
comendo maçã e planejando novos negócios.
Os meninos vinham passando, um
a um, paravam para uma gozação, e pronto! Quando Ben cansou, Tom deu uma chance
a Billy em troca de uma pipa nova. Depois, Johnny ofereceu um rato morto e
ganhou direito de pintar por uma hora. No fim do dia, Tom já estava na maior
riqueza – tinha bolas de gude, uma gaita, um pedaço de vidro azul, um carretel,
uma chave, um soldadinho de chumbo, um casal de sapos, um gato caolho, uma
maçaneta, uma coleira de cachorro (sem cachorro), o cabo de uma faca, quatro
cascas de laranja. A cerca estava pintada, com quatro demãos de tinta. Se a
tinta não acabasse, Tom levaria à falência todos os meninos da cidade.
- Tia Polly nem acreditou. Um trabalho
perfeito. E tão rápido!
- Viu só? Quando quer fazer uma coisa
bem-feita, é uma maravilha. Pode ir brincar, você merece. Mas não perca a hora
do jantar. E tome um prêmio.
Levou-o até a despensa para ele
escolher uma maçã (e pegar uma rosca sem ela notar).
[...]
TWAIN,Mark.
As aventuras de Tom Sawyer. Adaptação de Ana Maria Machado. 1 ed. São Paulo:
Scipione, 2005.
Fonte: Maxi: ensino fundamental
2:multidisciplinar:6 º ao 9º ano/obra coletiva: Thais Ginicolo Cabral. 1.ed.
São Paulo: Maxiprint,2019.7º ano Caderno 2 p.48-51.
Interagindo
com o texto
01.
Em uma narrativa de aventura, o protagonista é
corajoso, astucioso e inteligente. Identifique o protagonista da história e dê exemplos
de como essas características aparecem no texto.
É Tom Sawyer. Ele se mostra muito inteligente e astucioso, pois teve
uma ótima ideia para se livrar do castigo.
02.
Uma narrativa de aventura costuma apresentar
vários personagens. Identifique os personagens do texto.
Tia Polly, Ben Rogers, Sid, Billy e Johnny.
03.
Qual foi a primeira ideia que Tom teve para se
livrar do trabalho que sua tia lhe dera? Ele conseguiu o que queria? Explique o
que aconteceu.
Tom tentou trocar de trabalho com Jim, que hesitou. Diante disso,
Tom lhe ofereceu bolas de gude, quando Jim ia aceitar, a tia Polly apareceu.
04.
Em que Tom pensou que o fez querer sumir?
Os outros meninos logo passariam
por ele a caminho de brincadeiras e iam rir dele.
05.
O texto apresenta algumas onomatopeias.
a)
Identifique-as, escrevendo o trecho em que elas
aparecem.
As onomatopeias são: “Din-a-ling-ling!” “Piuííí!” e “Chit-chit-chit!”.
b)
Cite em que momento elas aparecem e explique o
som que elas reproduzem.
Ben Rogers estava
brincando de navio. Assim, apitava, manobrava e fazia sons do Grande Missouri.
06.
Explique como Tom convenceu Ben de que não
estava de castigo.
Tom disse que estava se divertindo, argumentando que não era todo
menino que tinha chance de pintar a cerca.
07.
No trecho “De coração contente e expressão
relutante, Tom passou a pincel”, o que a expressão em destaque sugere?
Mesmo estando feliz por ter conseguido convencer Ben Rogers; Tom não
pode demonstrar esse sentimento, assim fingia resistência para deixar o amigo
pintar a cerca.
08.
Explique o título do texto: “Um talento para os
negócios”.
Todos os meninos que paravam para zombar de Tom eram convencido por
ele de que se tratava de uma diversão.
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