Notícia: Os reflexos da violência urbana no comportamento das famílias
Não se pode mais sair sozinho à noite
em segurança. Não se pode mais tirar dinheiro do banco e carregá-lo na
carteira. Não se pode mais deixar o carro estacionado em local aberto sem
alarme. Não se pode mais permitir que as crianças brinquem na rua sem medo de
que algo aconteça.
[...]
O medo da violência é uma realidade que
tem mudado vidas. O temor de ser assaltado, sequestrado ou agredido se tornou
uma marca nas grandes cidades – ainda que nem nas menores haja paz. Na falta de
atuação do poder público, as pessoas acabam se acostumando a buscar a proteção
como for possível: evitando lugares vazios, guardando pertences com cadeados,
vivendo vigiadas por câmeras, rodeadas de muros, entre grades.
– Infelizmente, não há como negar que a
sensação coletiva de medo tem bases concretas hoje em dia. Ela não é fruto de
uma ficção. A criminalidade cotidiana assusta – explica a socióloga Letícia
Maria Schabbach, integrante do Grupo de Pesquisa Violência e Cidadania da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Quem está crescendo sob o espectro da
violência, ainda que nunca tenha sido vítima de algum ataque, acaba tendo de se
adaptar a uma vida em que tudo o que não está sob o próprio controle ou dos
familiares mais próximos pode ser temido. Não sem razão.
– Desde as eras antigas o ser humano
vive em estado de medo. A grande questão é que, na modernidade, o medo se
tornou totalitário. A perpetuação desse estado de medo, quando se considera que
nada é digno de confiança, que o mal está espalhado por toda parte e que as
ameaças estão nos espreitando mesmo nas situações mais sutis, é preocupante –
acredita o doutor em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ) Renato Nunes Bittencourt.
[...]
Conviver sob constante medo tornou-se
padrão – uma adaptação necessária para preservar a vida diante da escalada da
violência. Passou a ser comum ter que trancar portas e janelas, optar por
locais movimentados, andar sem carregar objetos que possam motivar um assalto.
Não é assim que deveria ser, mas tamanhas precauções são hoje tão
"normais" que sequer parecem um ponto fora da curva no comportamento
humano.
[...]
É nessa tentativa de fugir da
insegurança que as crianças têm sido criadas em um estado de eterna vigilância.
Psicólogos e psiquiatras explicam que a constante preocupação com a
sobrevivência, evidenciada pelo medo, não é peculiar à atualidade, mas há pelo
menos uma característica que diferencia a sociedade contemporânea de outras:
esse sentimento está sempre presente, já condicionado em hábitos destinados a
proteger os pequenos e evitar a exposição ao perigo.
– Buscamos proteções para nos sentirmos
mais seguros, para vivermos com mais qualidade de vida. O risco, porém, é que
elas tenham um efeito oposto, de nos enjaular, contribuindo para o próprio
aumento do medo – pondera Denise Regina Quaresma da Silva, professora de
Psicologia na Universidade Feevale.
Famílias
têm medo de se expor
Com medo de serem identificadas,
diversas famílias contatadas pela reportagem optaram por não terem imagens suas
e dos locais onde moram divulgadas. Temem ser reconhecidos, mostrar os filhos,
abrir margem para assaltos. Tamanha é a preocupação com a segurança que
qualquer possível brecha, para elas, torna-se um problema.
Mãe de uma criança de um ano e cinco
meses, uma jovem de Porto Alegre relata que passou a temer ainda mais pela segurança
da família quando foi vítima de um assalto a banco. Passando por terapia, ela
prefere não comentar o caso com pessoas de fora de seu convívio social, mas
conta que teve sua rotina alterada na tentativa de se expor menos à violência.
– Passei a ter muito mais cautela,
principalmente por causa do meu filho. Hoje em dia, não temos mais certeza, ao
sairmos de casa, se poderemos voltar em segurança. Estou muito mais cautelosa,
e penso em como será para ele crescer em um mundo assim – diz a bancária, que
prefere não ser identificada.
[...]
Como possíveis efeitos, a psicóloga
clínica Elisa Steinhorst Damasceno aponta uma maior propensão a doenças
decorrentes do estresse e da ansiedade, por exemplo, além do desenvolvimento de
transtornos psíquicos. Mas a principal consequência, segundo ela, seria a
criação de uma geração mais temerosa, menos disposta a tomar riscos, menos
aberta ao convívio com pessoas e em locais diferentes – uma geração confinada.
– Penso que uma das consequências do
medo é uma atitude conservadora em relação à sociedade em geral e à mudança.
Nos tornamos medrosos, intimidados, por causa do medo – completa Ben Highmore,
professor do centro de estudos culturais na Universidade de Sussex, no Reino
Unido, que tem como principal linha de pesquisa a relação entre medo e
segurança.
Há também quem cogite que conviver com
a insegurança pode ser um processo adaptativo. Se, nos primórdios, a humanidade
escolhia entre lutar ou correr quando diante de um predador, pode ser que a
violência seja hoje esse predador. O risco talvez esteja em não ter mais
escolha além de se esconder.
Fonte: Elisa Steinhorst
Damasceno, da Wainer Psicologia Cognitiva
JUSTINO, Guilherme.
Os reflexos da violência urbana no comportamento das famílias. GaúchaZH, Porto
Alegre, 21 jul. 2016. Disponível em: https://bit.ly/2MjrkWo.
Acesso em: 25 set. 2018.
Fonte: Livro – Tecendo Linguagens – Língua Portuguesa – 9º
ano – Ensino Fundamental – IBEP 5ª edição – São Paulo, 2018, p. 140-2.
Entendendo a notícia:
01 – Qual a principal ideia desenvolvida nesse texto?
O texto fala sobre a mudança no comportamento das
famílias em decorrência do medo, da violência e da falta de segurança nos
centros urbanos.
02 – Você se vê como parte de “uma geração mais temerosa, menos disposta
a tomar riscos, menos aberta ao convívio com pessoas e em locais diferentes –
uma geração confinada”? Explique.
Resposta pessoal do aluno.
03 – Copie as conjunções coordenativas que nos trechos a seguir
introduzem orações e indique a relação que estabelecem entre essas orações.
a)
Não se pode
mais tirar dinheiro do banco e carrega-lo na carteira.
E: relação de adição, acréscimo.
b)
Psicólogos e
psiquiatras explicam que a constante preocupação com a sobrevivência,
evidenciada pelo medo, não é peculiar à atualidade, mas há pelo menos uma
característica que diferencia a sociedade contemporânea de outras: esse
sentimento está sempre presente, já condicionado em hábitos destinados a
proteger os pequenos e evitar a exposição ao perigo.
Mas: relação de oposição.
c)
Passando por
terapia, ela prefere não comentar o caso com pessoas de fora de seu convívio
social, mas conta que teve sua rotina alterada na tentativa de se expor menos à
violência.
Mas: relação de oposição.
d)
Estou muito
mais cautelosa, e penso em como será para ele crescer em um mundo assim [...].
E: relação de adição, acréscimo.
04 – A seguir, foram colocados alguns pares de orações. Reescreva essas
orações formando um único período e estabelecendo entre elas a relação de
sentido indicada nos parênteses. Na reescrita, empregue a conjunção e a
pontuação adequadas.
a) A sensação coletiva de medo tem bases concretas hoje em dia. / A sensação coletiva de medo não é fruto de uma ficção. (Relação de conclusão).
A sensação coletiva de medo tem bases concretas
hoje em dia, portanto não é fruto de uma ficção.
b) Desde as eras antigas o ser humano vive em estado de medo. / Na modernidade, o medo se tornou totalitário. (Relação de adversidade).
Desde as eras antigas o ser humano vive em estado
de medo, mas/contudo/porém/todavia, na modernidade, o medo se tornou
totalitário.
c) Trancamos portas e janelas. / Corremos o risco de sermos roubados. (Relação de alternância).
Ou trancamos portas e janelas ou corremos o risco
de sermos roubados.
d) Mãe de uma criança de um ano e cinco meses passou a temer ainda mais pela segurança da família. / Mãe de uma criança de um ano e cinco meses foi vítima de um assalto a banco. (Relação de explicação).
Mãe de uma criança de um ano e cinco meses passou a
temer ainda mais pela segurança da família, porque foi vítima de um assalto a
banco.
e) Famílias têm medo de se expor. / Famílias têm medo de serem identificadas. (Relação de explicação).
Famílias têm medo de se expor, porque têm medo de
serem identificados.
05 – Releia este trecho:
“–
Buscamos proteções para nos sentirmos mais seguros, para vivermos com mais
qualidade de vida. O risco, porém, é que elas tenham um efeito oposto, de nos
enjaular, [...]”. Tanto as conjunções coordenativas quanto as
subordinativas contribuem para que as partes e as informações do texto possam
ser articuladas e relacionadas, além de permitir que o texto avance e novas
informações sobre o tema sejam acrescentadas. De que forma a conjunção porém contribui para a coesão
sequencial no trecho acima?
A conjunção porém
introduz uma ideia que se contrapõe ao que foi mencionado anteriormente e
possibilita a introdução de uma nova informação no período.
Muito obrigado,tem como coloca a ativada da pagina 143 é 144 1 e 2
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