Poema: Vida obscura
Cruz e Sousa
Ninguém sentiu o teu espasmo obscuro
ó ser humilde entre os humildes seres,
embriagado, tonto de prazeres,
o mundo para ti foi negro e duro.
Atravessaste no silêncio escuro
a vida presa a trágicos deveres
e chegaste ao saber de altos saberes
tornando-te mais simples e mais puro.
Ninguém te viu o sofrimento inquieto,
magoado, oculto e aterrador, secreto,
que o coração te apunhalou no mundo,
Mas eu que sempre te segui os passos
sei que a cruz infernal prendeu-te os braços
e o teu suspiro como foi profundo!
SOUSA, João da
Cruz e. Vida Obscura. In: Obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar,
1995. p. 181.
Fonte: Língua
portuguesa 2 – Projeto ECO – Ensino médio – Editora Positivo – 1ª edição –
Curitiba – 2010. p. 257-8.
Entendendo o poema:
01 – O trocadilho entre
obscuro/escuro indicia para o leitor a temática do poema. Qual é ela?
A obscuridade, ou
seja, o anonimato em que os seres humildes têm que viver. O jogo entre
obscuro/escuro leva à interpretação de que, entre esses seres condenados ao
esquecimento, estariam os homens negros como o próprio poeta.
02 – O eu lírico se dirige,
ao longo do poema, a um interlocutor genérico. Na última estrofe, porém, ele
compara esse interlocutor a uma figura religiosa. Que figura é essa e que
semelhanças permitem ao poeta realizar essa aproximação?
Essa figura seria
Cristo, que carreou uma “cruz infernal”, assim como os pobres e marginalizados
socialmente, que vivem esquecidos. Esse sofrimento e o fato de suportarem
calados o seu fardo aproximaria os marginais da figura de Cristo.
03 – Uma das figuras de
linguagem preferidas pelos simbolistas era a sinestesia, pelo efeito de
sugestão que ela era capaz de impor ao poema. Localize, no poema, a sinestesia
presente.
A
sinestesia encontra-se no primeiro verso da segunda estrofe: silêncio escuro.
Há aí uma mistura entre um sentido que se apreende pela audição – o silêncio –
unido a um sentido que se apreende pela visão – escuro – o que caracteriza o
efeito sinestésico, de mistura de sentidos.
04 – A poesia simbolista,
para alguns críticos literários, é vista como descompromissada com a denúncia
de problemas sociais. Observando o texto, você concorda com essa afirmação ou
discorda dela? Justifique sua resposta.
Resposta pessoal do aluno. Sugestão:
Discordo, porque o texto mostra um poema em que Cruz e Sousa tematiza e discute
o lugar dos pobres na sociedade.
Estou revisitando a obra poética de Cruz e Souza. Pretendo traduzir o soneto "Vida obscura" para o Esperanto. O estudo do poema aqui publicado me auxiliou muito. Vida longa ao seu bonito e interessante blog!
ResponderExcluirGratidão pelas doces palavras de carinho e incentivo.
ResponderExcluir