domingo, 22 de maio de 2022

POEMA: AMOR - ADÉLIA PRADO - COM GABARITO

 Poema: Amor

           Adélia Prado

A formosura do teu rosto obriga-me
e não ouso em tua presença
ou à tua simples lembrança
recusar-me ao esmero de permanecer contemplável.
Quisera olhar fixamente a tua cara,
como fazem comigo soldados e choferes de ônibus.
Mas não tenho coragem,
olho só tua mão,
a unha polida olho, olho, olho e é quanto basta
pra alimentar fogo, mel e veneno deste amor incansável
que tudo rói e banha e torna apetecível:
caieiras, desembocaduras de esgotos,
ideia de morte, gripe, vestido, sapatos,
aquela tarde de sábado,
esta que morre agora antes da mesa pacífica:
ovos cozidos, tomates,
fome dos ângulos duros de tua cara de estátua.
Recolho tamancos, flauta, molho de flores, resinas,
rispidez de teu lábio que suporto com dor
e mais retábulos, faca, tudo serve e é estilete,
lâmina encostada em teu peito. Fala.
Fala sem orgulho ou medo
que à força de pensar em mim sonhou comigo
e passou um dia esquisito, o coração em sobressaltos à campainha da porta,
disposto à benignidade, ao ridículo, à doçura. Fala.
Nem é preciso que amor seja a palavra.
“Penso em você” – me diz e estancarei os féretros,
tão grande é minha paixão.

Adélia Prado, Terra de Santa Cruz. Rio de Janeiro: Record, 2006.

Fonte: Livro – Viva Português 1° – Ensino médio – Língua portuguesa – 2ª edição 1ª impressão – São Paulo – 2014. p. 227-8.

Entendendo o poema:

01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:

·        Apetecível: apetitoso, desejável.

·        Benignidade: qualidade do que ou de quem é benigno, bondoso.

·        Caieira: forno ou fogueira onde se cozem tijolos.

·        Estancar: fazer parar, deter.

·        Féretro: caixa longa de madeira em que se enterram os mortos.

·        Resina: substância viscosa e odorífera produzida por alguns vegetais.

·        Retábulo: estrutura de madeira ou outro material que fica por trás ou acima de um altar.

02 – Vamos fazer um levantamento de elementos do poema que podem ser percebidos na primeira leitura.

a)   O eu lírico é um homem ou uma mulher? O que lhe permitiu concluir isso?

É uma mulher; o trecho “Quisera olhar fixamente tua cara, / como fazem comigo soldados e choferes de ônibus” e a palavra vestido em “ideia de morte, Gripe, vestido, sapatos” permitem essa conclusão.

b)   A quem o eu lírico se dirige?

À pessoa amada.

c)   O que o eu lírico pede a essa pessoa?

Pede ao amado que diga que pensa nela.

03 – Releia os quatro primeiros versos do poema, pensando no sentido das palavras ousar, esmero e contemplável.

·        Ousar: arriscar-se, atrever-se.

·        Esmero: grande cuidado; apuro.

·        Contemplável: aquilo que se pode contemplar, olhar com admiração; admirável. 

      a)   No contexto do poema, o que é “permanecer contemplável”?

Seria “continuar digna de ser admirada, contemplada”.

b)   Complete no caderno: De maneira bem simplificada, podemos dizer que os quatro primeiros versos revelam que a mulher (o eu lírico) .........

        Se recusa a fazer-se bela para a pessoa amada.

·        Tem necessidade de permanecer bonita, admirável.

c)   Por que o eu lírico não ousa deixar de ser contemplável? Copie no caderno o trecho que confirma sua resposta.

Porque o amado é belo. “A formosura do teu rosto obriga-me [...]”.

04 – Releia o trecho que vai do quinto (Quisera olhar fixamente a tua cara) ao décimo sétimo verso (fome dos ângulos duros de tua cara de estátua). Destaque nesse trecho alguns versos que, em sua opinião, exprimem o amor de uma forma inusitada, surpreendente. Explique por que você os considera surpreendentes.

      Resposta pessoal do aluno. Sugestão: “caieiras, desembocaduras de esgotos, / ideia de morte, gripe, vestido, sapatos,”. Ou, ainda, nos versos “[...] antes da mesa pacífica: / ovos cozidos, tomates, / fome dos ângulos duros de tua cara de estátua.”, em que há uma aproximação das ideias de fome e de desejo (amor), partindo de alimentos reais, prosaicos, “pouco poético”.

05 – Entre o décimo segundo e o décimo quinto versos estão enumeradas coisas que, para o eu lírico, o amor torna apetecíveis, desejáveis.

        Caieiras – vestido – desembocaduras de esgotos – sapatos – ideia de morte – aquela tarde de sábado – gripe – esta (tarde de sábado) que morre.

   a)   Todos esses elementos são normalmente considerados positivos, desejáveis?

Não. 

   b)   Sendo assim, ao dizer que o amor torna esses elementos apetecíveis, o que o eu lírico enfatiza?

Enfatiza a intensidade do amor que sente.

06 – Releia agora do décimo oitavo (“Recolho tamancos [...]”) ao vigésimo primeiro verso (“lâmina encostada em teu peito. Fala.”). Nesse trecho há outra enumeração: tamancos, flauta, molho de flores, resinas, rispidez, retábulos, faca, lâmina.

a)   Todos esses elementos são comuns em poemas de amor? Você espera ver tamancos e resinas, por exemplo, associados ao amor?

Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Essas associações são inusitadas, inesperadas.

b)   Em sua opinião, a enumeração que aparece nesses versos pode representar o uso de recursos diversos para obrigar a pessoa amada a falar aquilo que o eu lírico deseja ouvir? Se sua resposta for sim, comente um desses recursos.

Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Nenhuma palavras, nesse caso, é empregada casualmente, aleatoriamente; o eu lírico sugere diversas formas de chamar a atenção da pessoa amada.

07 – Releia os versos a seguir e complete a frase no caderno.

        “‘Penso em você’ – me diz e estancarei os féretros, tão grande é a minha paixão.” No contexto do poema, “estancar os féretros” pode significar

a)   Enterrar-se, ou seja, desistir.

b)   Deter a morte, ou seja, fazer o impossível.

c)   Fazer o inevitável.

 

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