Poema: Folhas Caídas Cap. XVI – Os cinco sentidos
Almeida Garrett
São belas – bem o sei, essas
estrelas,
Mil cores – divinais têm essas
flores;
Mas eu não tenho, amor, olhos
para elas:
Em toda a natureza
Não vejo outra beleza
Senão a ti – a ti!

Divina – ai! sim, será a voz
que afina
Saudosa – na ramagem densa,
umbrosa.
Será; mas eu do rouxinol que
trina
Não oiço a melodia,
Nem sinto outra harmonia
Senão a ti – a ti!
Respira – n’aura que entre as
flores gira,
Celeste – incenso de perfume
agreste.
Sei... não sinto: minha alma
não aspira,
Não percebe, não toma
Senão o doce aroma
Que vem de ti – de ti!
Formosos – são os pomos saborosos,
É um mimo – de néctar o
racimo:
E eu tenho fome e sede ... sequiosos,
Famintos meus desejos
Estão... mas é de beijos,
É só de ti – de ti!
Macia – deve a relva luzidia
Do leito – ser por certo em
que me deito.
Mas quem, ao pé de ti, quem
poderia
Sentir outras carícias,
Tocar noutras delícias
Senão em ti – em ti!
A ti!, ai, a ti só os meus
sentidos,
Todos num confundidos,
Sentem, ouvem, respiram;
Em ti, por ti deliram.
Em ti a minha sorte,
A minha vida em ti;
E quando venha a morte,
Será morrer por ti.
Almeida Garrett. In:
Alexandre Pinheiro Torres, org. Antologia da poesia portuguesa. Porto: Lello
& Irmão, 1997. v. 2. p. 755-756.
Fonte: Livro –
Português: Linguagens, 2ª Série – Ensino Médio – William Roberto Cereja,
Thereza Cochar Magalhães, 9ª ed. – São Paulo: Saraiva Editora, 2013. p. 38.
Entendendo o poema:
01 – Qual é o tema central do
poema e como ele se relaciona com o título "Os cinco sentidos"?
O tema central
do poema é a intensa paixão e a completa absorção do eu lírico pela pessoa
amada, a ponto de seus sentidos se tornarem indiferentes a todas as outras
belezas e estímulos do mundo exterior. O título "Os cinco sentidos"
ironicamente destaca como esses sentidos, normalmente voltados para diversas
experiências, estão agora unicamente focados na amada.
02 – Identifique e explique
dois exemplos de elementos da natureza mencionados no poema que o eu lírico
afirma não perceber ou apreciar.
Dois exemplos
são:
-- As estrelas e as flores: O eu lírico
reconhece a beleza e as cores divinas das estrelas e das flores ("São
belas – bem o sei, essas estrelas, / Mil cores – divinais têm essas flores;"),
mas declara não ter olhos para elas, pois sua atenção está totalmente voltada
para a amada.
-- O canto do rouxinol: O eu lírico
admite a melodia saudosa do rouxinol ("Divina – ai! sim, será a voz que
afina / Saudosa – na ramagem densa, umbrosa. / Será; mas eu do rouxinol que
trina"), mas afirma não ouvi-la, pois a única harmonia que sente é a
presença da amada.
03 – Como o sentido do olfato
é apresentado no poema e qual a sua relação com a amada?
O sentido do
olfato é apresentado através da imagem do "celeste incenso de perfume
agreste" que emana da aura que gira entre as flores. No entanto, o eu
lírico afirma não sentir esse perfume, pois sua alma só aspira e percebe o
"doce aroma / Que vem de ti – de ti!". A amada se torna a única fonte
de um perfume que realmente o atrai.
04 – De que "fome e
sede" o eu lírico se declara sequioso e faminto? Qual sentido está
associado a essa metáfora?
O eu lírico se declara sequioso e faminto
de "beijos". Essa metáfora está associada ao sentido do paladar,
embora transcenda o alimento físico. O desejo de contato íntimo e afetuoso com
a amada é apresentado como uma necessidade vital, superior a fome e à sede
literais.
05 – Como o sentido do tato é
abordado no poema e qual a comparação estabelecida pelo eu lírico?
O sentido do tato
é abordado através da imagem da relva macia como um possível leito confortável
("Macia – deve a relva luzidia / Do leito – ser por certo em que me
deito."). No entanto, o eu lírico questiona quem poderia sentir outras
carícias ou tocar em outras delícias estando perto da amada, indicando que o
toque dela é a única experiência tátil que lhe importa.
06 – Qual a intensidade da
paixão expressa no poema no que se refere à união dos sentidos na amada?
A paixão expressa
é de uma intensidade avassaladora. O eu lírico afirma que todos os seus
sentidos se confundem e se unem na amada ("A ti! ai, a ti só os meus
sentidos, / Todos num confundidos, / Sentem, ouvem, respiram; / Em ti, por ti
deliram."). Isso demonstra uma completa obsessão e dependência emocional
da presença da pessoa amada.
07 – Como o poema conclui em
relação à vida e à morte do eu lírico e qual a importância da amada nesse
contexto?
O poema conclui
com a afirmação de que a sorte e a vida do eu lírico estão inteiramente na
amada ("Em ti a minha sorte, / A minha vida em ti;"). Ele chega ao
ponto de declarar que, se a morte vier, será "morrer por ti",
elevando a amada à condição de razão de sua existência e até mesmo de seu
último suspiro. Isso reforça a ideia de uma paixão totalizante e incondicional.