domingo, 16 de março de 2025

AUTOBIOGRAFIA: A HISTÓRIA DA MINHA VIDA - (FRAGMENTO) - HELEN KELLER - COM GABARITO

 Autobiografia: A história da minha vida – Fragmento

                      Helen Keller

        [...]

        Capítulo IV

        O dia mais importante de que me lembro de toda minha vida é o da chegada de minha professora, Anne Mansfield Sullivan. Fico maravilhada quando penso no imenso contraste entre as duas vidas que esse dia ligou. Estávamos a 3 de março de 1887, três meses antes que eu completasse sete anos.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg8y-g2EA9ubMX12FDP3LdpfflnZWCqoZNwHKJHtOu1k8lRKMX3QMFHsjNDISspFCQ0S7sY0bv6MRjzjFl5GDxJpuGIL7hQWMech6FtCILMOAHxqJIr4cJ35etKtrOckBdnpt_b5yBsc3wV6mEiqI-QX72FkWo5SpUAS9Kyv0Uikz6U_eZzMR8kDllDrB8/s1600/AnneSullivanMacy.jpg


        Na tarde daquele dia agitado, fiquei na varanda, muda, expectante. Pelos sinais de minha mãe e pelo apressado entra-e-sai da casa, adivinhei vagamente que algo pouco usual estava prestes a acontecer; assim, fui para a porta e esperei na escada. O sol da tarde penetrava na massa de madressilvas que cobria a varanda e caía no meu rosto virado para cima. Meus dedos pousavam quase inconscientemente nas folhas e flores familiares que haviam acabado de brotar saudando a doce primavera do Sul. Eu não sabia que maravilhas e surpresas o futuro me guardava. Raiva e amargura haviam continuamente caído sobre mim por semanas, e um profundo langor sucedera-se a essa luta apaixonada.

        Algum dia você já esteve no mar cercado por um denso nevoeiro, como se uma tangível escuridão branca se fechasse sobre você e o grande navio, tenso e ansioso, tateasse em busca do caminho para a costa com uma bola de chumbo e uma sonda e você esperasse com o coração batendo que algo acontecesse? Eu era como aquele navio antes de minha instrução começar, só que não tinha bússola ou sonda, nem meios de saber quão próximo estava o porto. "Luz! Me deem luz!" era o grito sem palavras de minha alma, e a luz do amor brilhou sobre mim naquela mesma hora.

        Senti passos que se aproximavam. Estiquei a mão imaginando que era mamãe. Alguém a pegou e eu fui levantada e abraçada bem apertado pela pessoa que viera revelar todas as coisas para mim e, mais do que todas as coisas, me amar.

        Na manhã seguinte à chegada de minha professora, ela me levou a seu quarto e me deu uma boneca. As criancinhas cegas da Instituição Perkins a tinham enviado e Laura Bridgman a vestira; mas eu só soube disso depois. Quando brinquei com a boneca algum tempo, a srta. Sullivan lentamente soletrou em minha mão a palavra "b-o-n-e-c-a". Fiquei imediatamente interessada nesse jogo com dedos e tentei imitá-lo. Quando finalmente consegui fazer as letras corretamente, fiquei vermelha de prazer e orgulho infantil. Descendo a escada correndo em busca de minha mãe, estendi a mão e imitei as letras para boneca.

        Não sabia que estava soletrando uma palavra ou mesmo que palavras existiam; eu simplesmente estava deixando meus dedos macaquearem uma imitação. Nos dias que se seguiram aprendi a soletrar desse modo incompreensível um grande número de palavras, entre elas alfinete, chapéu, xícara e alguns verbos, como sentar, levantar e andar. Mas só depois de minha professora estar comigo há várias semanas eu entendi que tudo tinha um nome.

        [...]

        Descemos o caminho para a casa do poço, atraídas pela fragrância das madressilvas que a cobriam. Alguém estava tirando água e a srta. Sullivan colocou minha mão sob o jorro da água. Enquanto a fria corrente despejava-se sobre uma de minhas mãos, a srta. Sullivan soletrava na outra a palavra água, primeiro lentamente, depois rapidamente. Fiquei imóvel, com toda a atenção fixada nos movimentos de seus dedos. [...]. Soube então que "á-g-u-a" significava a maravilhosa coisa fresca que fluía sobre minha mão. Aquela palavra viva despertou minha alma, deu-lhe luz, esperança, alegria, enfim, libertou-a! Ainda havia barreiras, é verdade, mas barreiras que poderiam ser varridas com o tempo.

        Eu deixei a casa do poço ansiosa para aprender. Tudo tinha um nome e cada nome fazia nascer um novo pensamento. Enquanto voltávamos para casa, cada objeto que eu tocava parecia estremecer de vida, já que eu via tudo com a nova e estranha visão que chegara a mim. Ao passar pela porta, lembrei da boneca que eu quebrara. Tateei o caminho até a lareira, peguei os pedaços da boneca e tentei em vão juntá-los. Então meus olhos se encheram de lágrimas; pois percebi o que fizera e, pela primeira vez, senti arrependimento e tristeza.

        Aprendi uma grande quantidade de novas palavras naquele dia. Não lembro de todas, mas sei que mãe, pai, irmã, professora estavam entre elas – palavras que deviam fazer o mundo brotar para mim, "como o bastão de Aarão, com flores". Seria difícil achar uma criança mais feliz do que eu no final daquele dia memorável, quando, deitada na minha cama, repassava as alegrias que ele me trouxera. Pela primeira vez na vida ansiei para que um novo dia chegasse.

        Capítulo VI

        [...]

        Lembro-me da manhã em que perguntei pela primeira vez o significado da palavra "amor". Isso foi antes que eu conhecesse muitas palavras. Eu encontrara algumas violetas precoces no jardim e as trouxera para a srta. Sullivan. Ela tentou me beijar mas naquela época eu não gostava que ninguém me beijasse, exceto minha mãe. A srta. Sullivan me abraçou gentilmente e soletrou na minha mão:

        -- Eu amo Helen.

        -- O que é amor? – perguntei.

        Ela me puxou mais para perto e disse:

        -- Está aqui – apontando para o meu coração, de cujas batidas tive consciência pela primeira vez.

        [...]

        Capítulo VII

        [...]

        Assim, aprendi da própria vida. No início eu era apenas uma pequena massa de possibilidades. Foi minha professora quem as desdobrou e desenvolveu. Quando ela veio, tudo em torno de mim passou a exalar amor e alegria e se tornou cheio de significado. Desde então ela nunca deixou passar uma oportunidade de ressaltar a beleza que há em tudo, nem cessou de tentar em pensamentos, ações e exemplos tornar minha vida doce e útil.

        Foi o gênio de minha professora, sua rápida solidariedade, seu amoroso tato que tornaram tão bonitos os primeiros anos de minha instrução. Foi o fato de ela capturar o momento certo para partilhar conhecimento que o fez tão agradável e aceitável para mim. Ela percebeu que a mente de uma criança é como um riacho raso que ondula e dança alegremente sobre o curso pedregoso de sua educação, refletindo aqui uma flor, ali uma moita, mais além uma nuvem fugidia, e tentou guiar minha mente nesse caminho, sabendo que, como um riacho, essa mente devia ser alimentada pelas correntes da montanha e fontes escondidas até se alargar num rio profundo, capaz de refletir em sua plácida superfície as colinas ondulantes, as sombras luminosas das árvores e os céus azuis, assim como o suave rosto de uma flor.

        [...]

        A srta. Sullivan está tão próxima de mim que eu mal me penso à parte dela. Quanto de meu encantamento com todas as coisas belas é inato e quanto é devido à influência de minha professora, jamais poderei saber. Sinto que seu ser é inseparável do meu e que os passos de minha vida estão na dela, O melhor de mim pertence a ela – não há um talento, uma aspiração ou uma alegria em mim que não tenha sido despertado por seu toque amoroso.

        [...]

Helen Keller. A história da minha vida. Trad. Myriam Campello. Rio de Janeiro: José Olympio, 2008. p. 19-22.

Fonte: Português. Vontade de Saber. 6º ano – Rosemeire Alves / Tatiane Brugnerotto – 1ª edição – São Paulo – 2012. FTD. p. 237-239.

Entendendo a autobiografia:

01 – Qual a importância da chegada de Anne Mansfield Sullivan para Helen Keller?

      A chegada de Anne Mansfield Sullivan foi um marco na vida de Helen Keller, marcando o início de sua educação e a descoberta de um mundo novo.

02 – Como Helen Keller descreve a sensação de estar perdida antes da chegada de sua professora?

      Helen Keller compara sua sensação de estar perdida a um navio em um denso nevoeiro, sem bússola ou sonda, ansiando por luz.

03 – Qual foi a primeira palavra que Anne Sullivan ensinou a Helen Keller?

      A primeira palavra que Anne Sullivan ensinou a Helen Keller foi "boneca" (b-o-n-e-c-a).

04 – Como Helen Keller aprendeu a se comunicar?

      Helen Keller aprendeu a se comunicar através do método de soletrar palavras na palma de sua mão, ensinado por Anne Sullivan.

05 – Qual foi o momento em que Helen Keller compreendeu que tudo tinha um nome?

      O momento em que Helen Keller compreendeu que tudo tinha um nome foi quando Anne Sullivan soletrou a palavra "água" enquanto ela sentia a água fluindo sobre sua mão.

06 – Como a natureza é retratada na autobiografia de Helen Keller?

      A natureza é retratada como uma fonte de inspiração e descoberta para Helen Keller, desde a fragrância das madressilvas até a sensação da água fluindo.

07 – Qual a importância da professora Anne Sullivan na vida de Helen Keller?

      Anne Sullivan foi fundamental na vida de Helen Keller, abrindo as portas para o conhecimento, o amor e a alegria, e moldando sua vida de forma profunda e duradoura.

08 – Como Helen Keller descreve a palavra "amor"?

       Helen Keller descreve o amor como algo que está presente no coração, uma força que a conecta com o mundo e com as pessoas ao seu redor.

09 – Qual a comparação que Helen Keller faz com a mente de uma criança?

      Helen Keller compara a mente de uma criança a um riacho raso, que precisa ser alimentado por conhecimento e experiências para se tornar um rio profundo.

10 – Qual o sentimento de Helen Keller em relação a sua professora?

      Helen Keller sente uma profunda gratidão e admiração por sua professora, reconhecendo que grande parte de sua felicidade e realizações são fruto do amor e da dedicação de Anne Sullivan.

 

 

 

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