domingo, 22 de outubro de 2023

TEXTO: HOMENAGEM À LÍNGUA PORTUGUESA - EDUARDO AFFONSO - COM GABARITO

 Texto: Homenagem à Língua Portuguesa

           Eduardo Affonso

        Volta e meia alguém olha atravessado quando escrevo “leiaute”, “becape” ou “apigreide” – possivelmente uma pessoa que não se avexa de escrever “futebol”, “nocaute” e “sanduíche”.

Fonte:  https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj3LPZ4yaKbxi61Y4Zbu_rdkr0lGCTjTexCyGBF44b2wEmzEV-wkGDCrWvKLnm5YROr5KeclO8vJVpens404gdh9nz18N1spnMKdrDOlZCdzLDhZ6BnQTmVfKcDcJJshAJjT9jM5KbFbeIGHwdH4LcwqXNCCo1IMBT7lLkx9Yg5wwk5fKbJwkhrcRGFxBY/s320/LINGUA.jpg


        Deve se achar um craque no idioma, me esnobando sem saber que “craque” se escrevia “crack” no tempo em que “gol” era “goal”, “beque” era “back” e “pênalti” era “penalty”. E possivelmente ignorando que esnobar venha de “snob”.

        Quem é contra a invasão das palavras estrangeiras (ou do seu aportuguesamento) parece desconsiderar que todas as línguas do mundo se tocam, e que falar seja um enorme beijo planetário.

        As palavras saltam de uma língua para outra, gotículas de saliva circulando em beijos mais ou menos ardentes, dependendo da afinidade entre os falantes. E o português é uma língua que beija bem.

        Quando falamos “azul”, estamos falando árabe. E quando folheamos um almanaque, procuramos um alfaiate, subimos uma alvenaria, colocamos um fio de azeite, espetamos um alfinete na almofada, anotamos um algarismo.

        Falamos francês quando vamos ao balé usando um paletó marrom, quando fazemos um croqui ou uma maquete com vidro fumê; quando comemos uma omelete ou pedimos na boate um champanhe ao garçom; quando nos sentamos no bidê, viajamos na maionese, ou quando um sutiã (sob o edredom) provoca uma gafe – ou um frisson.

        Falamos tupi ao pedir um açaí, um suco de abacaxi ou de pitanga; quando vemos um urubu ou um sabiá, ficamos de tocaia, votamos no Tiririca, botamos o braço na tipoia, armamos um sururu, comemos mandioca (ou aipim), regamos uma samambaia, deixamos a peteca cair. Quando comemos moqueca capixaba, tocamos cuíca, cantamos a Garota de Ipanema.

        Dá pra imaginar a Bahia sem a capoeira, o acarajé, o dendê, o vatapá, o axé, o afoxé, os orixás, o agogô, os atabaques, os abadás, os babalorixás, as mandingas, os balangandãs? Tudo isso veio no coração dos infames “navios negreiros”.

        As palavras estrangeiras sempre entraram sem pedir licença, feito um tsunami. E muitas vezes nos pegando de surpresa, como numa blitz.

        Posso estar falando grego, e estou mesmo. Sou ateu, apoio a eutanásia, gosto de metáforas, adoro bibliotecas, detesto conversar ao telefone, já passei por várias cirurgias. E não consigo imaginar que palavras usaríamos para a pizza, a lasanha, o risoto, se a máfia da língua italiana não tivesse contrabandeado esse vocabulário junto com a sua culinária.

        Há, claro, os exageros. Ninguém precisa de um “delivery” se pode fazer uma “entrega”, ou anunciar uma “sale” se se trata de uma “liquidação”. Pra quê sair pra night de bike, se dava tranquilamente pra sair pra noite de bicicleta?

        Mas a língua portuguesa também se insinua dentro das bocas falantes de outros idiomas. Os japoneses chamam capitão de “kapitan”, copo de “koppu”, pão de “pan”, sabão de “shabon”. Tudo culpa nossa. Como o café, que deixou de ser apenas o grão e a bebida, para ser também o lugar onde é bebido. E a banana, tão fácil de pronunciar quanto de descascar, e que por isso foi incorporada tal e qual a um sem-fim de idiomas. E o caju, que virou “cashew” em inglês (eles nunca iam acertar a pronúncia mesmo).

        “Fetish” vem do nosso fetiche, e não o contrário. “Mandarim”, seja o idioma, seja o funcionário que manda, vem do portuguesíssimo verbo “mandar”. O americano chama melaço de “molasses”, mosquito de “mosquito” e piranha, de “piranha” – não chega a ser a conquista da América, mas é um começo.

        Tudo isso é a propósito do 5 de maio, Dia da Língua Portuguesa, cada vez mais inculta e nem por isso menos bela. Uma língua viva, vibrante, maleável, promíscua – vai de boca em boca, bebendo de todas as fontes, lambendo o que vê pela frente.

        Mais de oitocentos anos, e com um tesão de vinte e poucos.

Fonte: https://www.facebook.com/eduardo22affonso/

Entendendo o texto:

01 – Qual é o autor do texto?

      O autor do texto é Eduardo Affonso.

02 – O que o autor menciona sobre as palavras estrangeiras na língua portuguesa?

      O autor menciona que as palavras estrangeiras sempre entraram na língua portuguesa sem pedir licença, assim como um tsunami.

03 – De acordo com o autor, o que acontece quando as palavras saltam de uma língua para outra?

      O autor descreve esse processo como gotículas de saliva circulando em beijos mais ou menos ardentes, dependendo da afinidade entre os falantes.

04 – O que o autor destaca sobre a língua portuguesa no contexto de sua relação com outras línguas?

      O autor destaca que a língua portuguesa é uma língua que "beija bem" no sentido de absorver palavras de outras línguas e incorporá-las.

05 – Quais são alguns exemplos de palavras estrangeiras que foram incorporadas à língua portuguesa mencionadas no texto?

      Alguns exemplos mencionados no texto incluem "delivery", "sale", "pizza", "risoto", "lasanha", "café", "banana", e "caju".

06 – Que evento o autor menciona no texto em relação à língua portuguesa?

      O autor menciona o "5 de maio" como o "Dia da Língua Portuguesa".

07 – Como o autor descreve a língua portuguesa no texto?

      O autor descreve a língua portuguesa como "uma língua viva, vibrante, maleável, promíscua", com mais de oitocentos anos de história e com um grande vigor.

 

 

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