Poema: A tecelã
Mauro Mota
Toca a sereia na fábrica
e o apito como um chicote
bate na manhã nascente
e bate na tua cama
no sono da madrugada.
Ternuras de áspera lona
pelo corpo adolescente.
É o trabalho que te chama.
Às pressas tomas o banho,
tomas teu café com pão,
tomas teu lugar no bote
no cais do Capibaribe.
Deixas chorando na esteira
teu filho de mãe solteira.
Levas ao lado a marmita,
contendo a mesma ração
do meio de todo o dia,
a carne-seca e o feijão.
De tudo quanto ele pede
dás só bom dia ao patrão,
e recomeças a luta
na engrenagem da fiação.
Teces tecendo a ti mesma
na imensa maquinaria,
como se entrasses inteira
na boca do tear e desses
a cor do rosto e dos olhos
e o teu sangue à estamparia.
Vestes as moças da tua
idade e dos teus anseios,
mas livres de maldição
do teu salário mensal,
com o desconto compulsório,
com os infalíveis cortes
de uma teórica assistência,
que não chega na doença
nem chega na tua morte.
Com essa policromia
de fazendas, todo dia,
iluminas os passeios,
brilhas nos corpos alheios.
Toca a sereia da fábrica
e o apito como um chicote
bate neste fim de tarde,
bate no rosto da lua.
Vais de novo para o bote.
Navegam fome e cansaço
nas águas negras do rio.
Há muita gente na rua,
parada no meio-fio.
Nem liga importância à tua
blusa rota de operária.
Vestes o Recife e voltas
para casa, quase nua.
Mauro Mota.
Itinerário. Rio de Janeiro, José Olympio, 1975. p. 43-5.
Fonte: Aulas de
Redação – Maria Aparecida Negrinho – 6° série – 8ª edição – editora Ática 1999.
São Paulo – p. 73-6.
Entendendo o poema:
01 – De acordo com o texto,
qual o significado das palavras abaixo:
·
Compulsório: obrigatório.
·
Policromia: multiplicidade de cores.
02 – O texto que você acabou
de ler é um poema. Dê três características que comprovem essa afirmação.
O texto é escrito
em versos, que se agrupam em estrofes; alguns versos apresentam rimas; o uso da
linguagem conotativa, de imagens: “e o apito como um chicote / bate na manhã
nascente / e bate na tua cama / no sono da madrugada”.
03 – Podemos dizer que este
é um poma que apresenta um problema social. Justifique a afirmação.
A vida da tecelã, narrada no poema,
representa a vida de muitas operárias(os) do nosso país.
04 – Que fatos do poema
demonstram que ele possui um tema social?
Ser a tecelã mãe solteira e adolescente,
sua má alimentação, a má remuneração, o desconto para a assistência médica, que
de fato não existe.
05 – Que pode significar o
verso “Teces tecendo a ti mesma”?
É a exploração do
trabalho da tecelã. Sua vida é totalmente consumida pelo trabalho, a ponto de a
tecelã perder o seu valor enquanto gente e se igualar à matéria com que ela
trabalha.
06 – Tente explicar o
significado do verso “Brilhas nos corpos alheios”.
Resposta pessoal
do aluno. Sugestão: O trabalho da tecelã não é valorizado no seu fazer. Ele só
“aparece” nas roupas já tecidas nos corpos das pessoas.
07 – A tecelã sempre volta
tarde para casa. Justifique esta afirmativa com passagens do texto.
“E
o apito como um chicote / bate neste fim de tarde, / bate no rosto da lua”.
08 – Que palavra usada no
poema contrasta com “Vestes o Recife...”?
“Nua”.
09 – Procure explicar estes
versos altamente conotativos: “Navegam fome e cansaço / nas águas negras do
rio”.
Resposta pessoal
do aluno. Sugestão: A fome e o cansaço são tamanhos que se personificam.
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