Notícia: CLONAGEM TERAPÊUTICA
A crer em sinais emitidos por senadores
envolvidos nos debates sobre a clonagem terapêutica, a Câmara Alta do
Parlamento deverá permitir pesquisas com células-tronco, uma promessa da
ciência para curar doenças degenerativas e até para restaurar órgãos e tecidos
avariados. Pelo consenso que se vai formando, o Senado Federal autorizaria
investigações científicas com culturas de células obtidas a partir de embriões
congelados por mais de três anos em clínicas de fertilização.

Se for de fato essa a posição do
Senado, estará configurado um avanço em relação ao projeto de lei tal como saiu
da Câmara dos Deputados, que, na prática, vetava a clonagem terapêutica. Mas
uma eventual modificação pelos senadores levaria o texto de volta à Câmara,
onde é especialmente forte a influência do lobby evangélico-católico,
responsável pela primeira vitória do obscurantismo.
Vale notar que mesmo a proposta em
cogitação no Senado está longe de poder ser considerada uma lei avançada. Ela
apenas evitaria que o Brasil fosse condenado a um atraso científico do qual
seria difícil se recuperar. O projeto autoriza cientistas a pesquisar sem
entretanto dar-lhes as condições ideais para fazê-lo.
Na verdade, os senadores apenas
impediriam que se consumasse o absurdo maior, que seria deixar de utilizar, em
pesquisas com potencial para salvar inúmeras vidas, embriões – na verdade
blastocistos, isto é, emaranhados de uma centena de células – que sobraram de
tratamentos de fertilização e que nunca seriam implantados num útero para
originar uma gravidez.
Outra falha na proposta em debate no
Senado é que ela proibiria a produção de embriões especificamente para a
pesquisa ou tratamento. Por enquanto essa limitação não oferece maiores
problemas. Enquanto as investigações no campo das células-tronco são
incipientes, experimentos podem ser realizados com umas poucas linhagens. No
futuro, porém, se surgirem os resultados esperados, o veto à geração de
embriões retiraria da clonagem terapêutica uma grande vantagem, que é a
capacidade de produzir células a partir do DNA do próprio paciente, o que
eliminaria completamente, acredita-se, o fenômeno da rejeição.
O lobby evangélico-católico que se opõe
à clonagem terapêutica merece, no que toca às suas crenças, profundo respeito,
mas isso não significa que seus valores devam ditar as regras de uma República
pluralista, laica e que valoriza a vida efetiva, atual, mais do que a mera
possibilidade de vida contida num blastocisto – que, de resto, se encontra não
numa trompa ou num útero, mas num tubo de ensaio, sem a menor possibilidade,
portanto, de dar origem a um feto. Além disso, só se submeteriam a um
tratamento que envolva células-tronco obtidas a partir de embriões pessoas que não
fizessem objeções morais a essa técnica, o que basta para preservar os direitos
daqueles que não a admitem.
Viver numa sociedade multifacetada e
complexa como a brasileira é administrar conflitos. Todos têm direito a suas
crenças, mas as crenças de alguns não podem condenar o país ao atraso em áreas
tão relevantes como a clonagem terapêutica.
Folha de São Paulo,
6/6/2004.
Fonte: Livro –
Português: Linguagem, 8ª Série – William Roberto Cereja, Thereza Cochar
Magalhães, 4ª ed. – São Paulo: Atual Editora, 2006. p. 208.
Entendendo a notícia:
01 – Qual a principal promessa
da clonagem terapêutica, segundo a notícia?
A clonagem
terapêutica promete curar doenças degenerativas e restaurar órgãos e tecidos
avariados, utilizando células-tronco obtidas de embriões.
02 – Qual a diferença entre a
proposta da Câmara dos Deputados e a do Senado em relação à clonagem
terapêutica?
A Câmara dos
Deputados, influenciada pelo lobby evangélico-católico, vetava a clonagem
terapêutica. O Senado, por outro lado, sinaliza uma abertura para pesquisas com
células-tronco obtidas de embriões congelados.
03 – Qual a crítica da notícia
à proposta em debate no Senado?
A notícia critica
a proposta por considerá-la limitada, já que proíbe a produção de embriões
especificamente para pesquisa ou tratamento. Essa restrição pode prejudicar o
desenvolvimento da clonagem terapêutica no futuro, impedindo a produção de
células a partir do DNA do próprio paciente, o que evitaria a rejeição.
04 – Qual o argumento utilizado
para defender a clonagem terapêutica, apesar da oposição de grupos religiosos?
A notícia
argumenta que, em uma república pluralista e laica, os valores religiosos de
alguns não devem ditar as regras para toda a sociedade, especialmente em áreas
de grande potencial para salvar vidas. Além disso, defende que apenas pessoas
sem objeções morais se submeteriam a tais tratamentos.
05 – O que são blastocistos, e
qual a sua importância no debate sobre clonagem terapêutica?
Blastocistos são
emaranhados de cerca de cem células, embriões em estágio inicial de
desenvolvimento. A notícia destaca que os embriões utilizados em pesquisas são
blastocistos que sobraram de tratamentos de fertilização e que nunca seriam
implantados em um útero, ou seja, não tem a possibilidade de gerar um feto.
06 – Qual o risco de o Brasil
não avançar nas pesquisas com clonagem terapêutica, segundo a notícia?
O risco é que o
Brasil fique para trás no desenvolvimento científico, dificultando a
recuperação do atraso em relação a outros países que já investem nessas
pesquisas.
07 – Qual a questão sobre a
rejeição de órgãos que a clonagem terapêutica ajuda a resolver?
A clonagem
terapêutica ajuda a resolver o problema da rejeição de órgãos transplantados,
pois permite a produção de células a partir do DNA do próprio paciente,
eliminando a incompatibilidade imunológica.
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