Texto: A PUBLICIDADE NA TV
O pesquisador Jesús Martin Barbero diz
que, através da publicidade, nossa sociedade constrói dia a dia a imagem que
cada um tem de si. Para ele, a publicidade é um espelho, apesar de bem
deformado, pois a imagem do lado de lá é muito mais bela que a imagem do lado
real.
A publicidade, no passado, teve a
função de vender produtos. Era sua razão de ser. Hoje, ela tem outra função
muito especial: a de demonstração de modelo a serem seguidos, isto é, a
apresentação de padrões físicos, estéticos, sensuais, comportamentais, aos
quais as pessoas devem se amoldar. A publicidade dirá regras de reconhecimento
e valorização social. […]
Se no passado ela funcionava como a TV,
as revistas, o cinema, apresentando indiretamente esses modelos estéticos, hoje
a venda de mercadorias – sua aparente razão de ser – tornou-se secundária. Em
primeiro lugar, ela vende, idealiza os modelos estéticos, sexuais e
comportamentais.
Além disso, a publicidade na sociedade
industrial capitalista funciona como um reforço diário das ideologias, do
princípio da valorização das aparências, da promoção de símbolos de status
(carros, roupas, ambientes, bebidas, joias, objetos luxuosos de uso pessoal).
De certa maneira, como no humor, a publicidade reforça também tendências
negativas, encobertas ou disfarçadas, da cultura. Ela confirma diferenças,
segregações, distinções, trabalhando em concordância com os preconceitos
sociais e com as discriminações de toda espécie […]. Em suma, ela é produzida
para estar de acordo e, portanto, para reforçar as desigualdades e os problemas
sociais, culturais, étnicos ou políticos. Essa função reforçadora é seu suporte
para a venda de mercadorias, pois, ao mesmo tempo que incita ao consumo, é o
próprio veículo, o transporte de valores e dos desejos que estão ancorados na
cultura que as consome. As mercadorias trazem em si, incorporado, tudo aquilo
que a sociedade deseja, e por isso são consumidas.
[…]
A publicidade, especialmente a de TV,
veicula valores: a raça branca (dominante) é transmitida, por exemplo, como a
única bela, modelar, válida. No Peru, na África, no Nordeste brasileiro, a
criança branca de olhos azuis, docemente cuidada por sua mãe loira, de cabelos
sedosos e aveludados, é o tipo ideal de publicidade.
A pesquisadora alemã Karin Buselmeler
realizou uma interessante pesquisa sobre a imagem da mulher na televisão. Ela
constatou, em primeiro lugar, que a mistificação do trabalho doméstico ocorre
de forma mais clara na publicidade, colocando os afazeres de casa como um
“trabalho nobre” de mulher. A mulher aparece nesses quadros como a responsável
pela felicidade da família, felicidade só atingível pela aquisição de produtos
oferecidos pela publicidade. O filho teria poucas chances de brincar no parque
infantil se não cuidasse atentamente de seus cabelos; o marido, se não possuir
camisa branca, brilhante, será olhado de modo atravessado pelos colegas. De
tudo isso a mulher tem de cuidar.
[…]
Em resumo, concluímos então que a
publicidade trabalha através da promoção de puras aparências: não se compram
mercadorias por suas qualidades inerentes nem pelo seu valor de uso, mas pela
imagem que o produto veicula no ambiente da vida do consumidor. Nenhuma dessas
mercadorias realiza de fato o que pretende, isto é, nenhum cigarro propicia
aventuras, nenhum carro traz vida luxuosa, nenhum uísque conquista mulheres. Em
todos esses casos, o produto é inteiramente secundário; as pessoas são seduzidas
por alguma coisa que está fora e muito além dele.
Ciro Marcondes Filho.
Televisão – A vida pelo vídeo. São Paulo: Moderna, 1988. p. 77-80.
Fonte: Livro-
PORTUGUÊS: Linguagens – Willian R. Cereja/Thereza C. Magalhães – 7ª Série –
Atual Editora -1998 – p. 163-6.
Entendendo o texto:
01 – No 1° parágrafo, o
texto compara a publicidade a um espelho. Com base na leitura de todo o texto, responda:
a)
Por que a publicidade é comparada a um
espelho?
Porque ela reflete os valores e os comportamentos sociais.
b)
Por que a imagem, nesse espelho, é
distorcida?
Porque o mundo criado pela publicidade é artificial e não traz os
problemas do mundo real.
c)
Destaque do 5° parágrafo um exemplo que
justifique sua resposta anterior.
O caso da criança branca, de olhos azuis, que serve como único
modelo de criança em diferentes países do mundo.
02 – Segundo o texto, no
passado a publicidade se preocupava em promover exclusivamente o produto, com
mensagens diretas como “compre isso”, “leve aquilo”, etc. Hoje, com o aumento
da competição, a promoção do produto é feita indiretamente.
a)
O que, na publicidade atual, ganha mais
importância do que o próprio produto oferecido?
Os modelos ou valores estéticos, sexuais e comportamentais.
b)
Dos slogans publicitários que seguem, quais
se identificam mais com a publicidade antiga, que promovia diretamente o
produto, e quais se identificam com a publicidade “moderna”, que veicula
valores? Justifique sua resposta.
·
“Wellaton. Ponha isso na sua cabeça”.
·
“Use Vidrex e você vai ver como esse negócio
vicia”.
·
“Se você é dono de seu nariz, cuide bem dele.
Bom ar, Sachet e Aerossol”.
·
“A fama se identifica para que você não se
misture”.
Em todos os itens se vê algum componente a mais do que a mera
promoção do produto; porém o 3° e o 4° itens envolvem explicitamente valores:
ser “dona de seu nariz” sugere que a consumidora é uma mulher independente e
moderna; “para que você não se misture” sugere exclusivamente e destaque
social.
03 – Você já reparou como na
publicidade se repetem certos comportamentos sociais tidos como modelos? As
mulheres estão sempre encontrando soluções para administrar a casa com menor
esforço (anúncios de bancos, por exemplo) e carros. De acordo com o texto:
a)
Por que é necessário lançar mão desses papéis
sociais para vender produtos?
Porque, para vender produtos, a publicidade necessita reproduzir a
ideologia vigente, isto é, os símbolos, valores e comportamentos sociais,
inclusive com suas desigualdade e preconceitos.
b)
Como reforço das ideologias, a publicidade
tem cumprido um papel conservador ou
transformador em relação aos valores
da sociedade? Por quê?
Um papel conservador, porque ela não questiona nem discute esses
valores, simplesmente os reproduz.
04 – Na fase final do 4°
parágrafo – “As mercadorias trazem em si, incorporado, tudo aquilo que a
sociedade deseja, e por isso são consumidas” – o autor destacou a expressão por isso em virtude de uma das
justificativas seguintes. Qual é ela?
a)
Ele quer dizer que o consumidor atual não se
contenta em saber das qualidades do produto, mas é levado a compra-lo quando a
publicidade é criativa.
b)
Ele quer dizer que atualmente o
consumidor compra um produto não apenas por causa de suas qualidades, mas
também porque vê projetados nele os valores e os desejos sociais.
05 – De acordo com o
penúltimo parágrafo do texto:
a)
A publicidade veicula uma imagem de que os
afazeres domésticos da mulher são “nobres”. Na sua opinião, por que a
publicidade mistifica a figura feminina?
Porque leva em conta que a mulher é uma grande consumidora e muitas
vezes a compradora oficial para toda a família.
b)
Compare o penúltimo parágrafo ao texto a
seguir, da pesquisadora Nelly de Carvalho:
Possuir objetos passa a ser sinônimo de
alcançar a felicidade: os artefatos e produtos proporcionam a salvação do homem,
representam bem-estar e êxito. Sem a auréola que a publicidade lhes confere,
seriam apenas bens de consumo; mas mistificados, personalizados, adquirem
atributos da condição humana.
Publicidade
– A linguagem da sedução, cit. p. 13.
Os dois textos apresentam
semelhanças quando discutem a forma como a publicidade relaciona produtos de consumo com felicidade. Qual é essa semelhança?
Ambos os textos
demonstram que a publicidade transmite a ideia de que só obtendo os produtos
que ela oferece é possível alcançar a felicidade.
06 – Leia esta análise de
Jair F. dos Santos, sobre anúncios de iogurte:
Veja um close do iogurte Danone em
revistas ou na TV. Sua superfície é enorme, lustrosa, sedutora, tátil – dá água
na boca. O Danone verdadeiro é um alimento mixuruca, mas seu simulacro
hiper-realizado (imagem ampliada do objeto) amplifica, satura sua realidade.
Com isso, somos levados a exagerar nossas expectativas e modelamos nossa
sensibilidade por imagens sedutoras.
O
que é pós-moderno. São Paulo: Brasiliense. p. 13.
Compare esse texto ao último
parágrafo de Ciro Marcondes, que afirma: “o produto é inteiramente secundário:
as pessoas são seduzidas por alguma
coisa que está fora e muito além dele”. Como se vê, ambos os autores
mencionam a sedução como meio de
estimular o consumidor. De acordo com os textos:
a)
Por que o produto, com suas qualidades, não é
suficiente para convencer o consumidor, havendo necessidade da sedução?
Porque, atualmente, o que leva o consumidor a comprar o produto é o
conjunto de significados que o acompanham, criados pela publicidade.
b)
No anúncio do iogurte mencionado por Jair F.
dos Santos, o que estaria fora do próprio iogurte e seria responsável pela sedução
do consumidor?
Sua imagem ampliada e lustrosa, que sugere um alimento saboroso.
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