segunda-feira, 25 de novembro de 2024

CONTO: O PLANTADOR DE ÁRVORES - LEONARDO FRÓES - COM GABARITO

 Conto: O plantador de árvores

           Leonardo Fróes

        Ninguém sabia o nome verdadeiro de Camelo Guo. Tinham lhe posto esse apelido, já conhecido em toda a vizinhança, por ele ser muito corcunda e seu defeito assumir avantajado relevo quando andava. Sem se importar, o homem adotou a alcunha e como tal passou a apresentar-se, nunca lhe ocorrendo dizer o antigo nome.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgCz8LHO7tzaf2T83jZHwT7zBvKj64ZJeKfgm3nw0rMLEyQ-4NVM4L8m0PUB7-Pv7FkRnsK3g5fUN60Tl2zcxdOBDrjuAejp03qfPzonWQ-gfcVJSDiFPyVap4h6brdhu_ypHSF9yPQW-cd5wm47fR8-qxk4pK9_vEd7oLd7tIOZ4JUOR2e7Dq7jdPrPgI/s1600/CAMELO.jpg


        Morava ele no distrito de Fengle, a oeste de Chang-na, e vivia de plantar árvores. Todos os ricos moradores, que adoravam jardins, e todos os que cultivavam pomares, dependendo das boas safras para fazer boas vendas, tentavam contatar seus serviços, pois árvores plantadas por ele floresciam com exuberância e davam frutas precoces, sempre em quantidade notável. Outros jardineiros, observando-o, tentavam imitar seus métodos, mas nenhum obtinha o mesmo sucesso. Um dia alguém lhe perguntou seu segredo.

        “Não tenho receitas mágicas”, respondeu Camelo Guo. “Simplesmente respeito a natureza das árvores, para obter de cada uma o melhor. As raízes necessitam de espaço, por onde crescer com o tempo, e não podem ficar embaraçadas; a terra deve ser velha, curtida e bem socada ao redor. Nunca mexa na muda, depois de plantá-la, nem a cerque de atenções. Vá cuidar de sua vida e não fique ali vigiando-a. Na hora de plantar, trate-a como um filho; depois, deixe-a em paz, porque assim ela se desenvolverá como é, para chegar à plenitude a seu modo. Eu apenas me refreio de interferir com o crescimento da árvore. Não a faço florir, muito menos amadurecer com presteza, apenas me abstenho de estragar seus frutos. Nem todos os jardineiros são assim. Muitos usam terra nova, a mais ou a menos, e deixam que as raízes se embolem. Quando não cometem tais erros, mexem na árvore e se preocupam demais com ela, contemplando-a de dia e tateando-a de noite, indo toda hora até lá para lhe dar uma olhada. Alguns chegam até a arranhar sua casca, para saber se ainda está viva, ou a puxá-la pelas raízes, para verificar se já se firmaram. A planta, incomodada sem descanso, murcha cada vez mais. Quem assim procede, embora diga amar as árvores, na verdade as mata. E está lhes causando dano, quando julga se redobrar em cuidados. É nisso que se distinguem de mim. Mas o que mais posso dizer?”

        “Seu método poderia aplicar-se à arte de governar?”, perguntou outro.

        “Só entendo do plantio de árvores”, respondeu Camelo Guo. “Governar não é comigo. Porém, vivendo aqui no campo, vejo que as autoridades, como se tomassem a peito o bem-estar do povo, estão sempre ditando novas ordens, das quais, porém, só resultam novas desgraças. Dia a dia seus emissários vêm e gritam: ‘De ordem superior, lavrem a terra! Plantem, colham! Sejam rápidos, não se atrasem na produção de seda! Teçam! Cuidem bem de seus filhos! Muita atenção com a alimentação dos porcos e galinhas!’ Para convocar as pessoas, os homens do governo batem seus ruidosos tambores, e nós, largando nossas tarefas para ouvir tais discursos, passamos horas sem comer. Contudo, se não tivermos um tempo para nós, como poderemos nos desenvolver e viver em paz? Em vez disso, o cansaço nos toma, e é assim que chegamos à exaustão. Nesse sentido, sim, concordo, a arte de governar tem algo a ver com o plantio de árvores”.

        Os outros acharam graça.

Leonardo Fróes, baseado em texto do autor chinês Liu Zongyuan. In: Contos orientais. Rio de Janeiro: Rocco, 2003, p. 163-164.

Fonte: Linguagem em Movimento – língua Portuguesa Ensino Médio – vol. 1 – 1ª edição – FTD. São Paulo – 2010. Izeti F. Torralvo/Carlos A. C. Minchillo. p. 230-231.

Entendendo o conto:

01 – Qual o segredo do sucesso de Camelo Guo como plantador de árvores?

      O segredo de Camelo Guo reside em sua paciência e respeito pela natureza das árvores. Ele entende que cada árvore tem seu próprio ritmo de crescimento e que interferências excessivas podem prejudicá-las. Ao contrário dos outros jardineiros, ele não força o desenvolvimento das plantas, mas sim cria as condições ideais para que elas floresçam naturalmente.

02 – Qual a crítica implícita à figura do governante na história?

      A figura do governante é comparada à de um jardineiro que interfere excessivamente no crescimento das árvores. A história critica a prática de governos que impõem regras e regulamentações excessivas à população, impedindo que as pessoas se desenvolvam de forma natural e autônoma.

03 – Qual a relação entre a natureza e a condição humana na história?

      A história estabelece uma analogia entre o crescimento das árvores e o desenvolvimento humano. Assim como as árvores precisam de espaço e tempo para crescer de forma saudável, os seres humanos também precisam de liberdade e autonomia para se desenvolverem plenamente.

04 – Qual a importância do apelido "Camelo Guo" para a caracterização da personagem?

      O apelido "Camelo Guo" serve para destacar a diferença de Camelo Guo em relação aos outros. Ele se torna uma marca registrada, identificando-o como um homem simples e humilde, que não se importa com aparências e que possui um conhecimento profundo sobre a natureza.

05 – Qual a mensagem principal do conto?

      A mensagem principal do conto é a importância de respeitar a natureza e os processos naturais. A história nos ensina que a interferência excessiva pode trazer mais danos do que benefícios e que a melhor forma de alcançar um resultado positivo é permitir que as coisas se desenvolvam em seu próprio ritmo.

06 – Como a história se relaciona com a filosofia oriental?

      A história apresenta elementos da filosofia oriental, como a valorização da natureza, a busca pela simplicidade e a importância da não interferência. A ideia de que a natureza deve seguir seu próprio curso e que o homem deve se adaptar a ela é um princípio fundamental em muitas filosofias orientais.

07 – Qual o papel do humor na história?

      O humor está presente na história através da ironia e da sátira. Ao comparar os governantes com jardineiros que estragam as plantas, o autor cria uma situação cômica que serve para enfatizar a crítica social. O humor também contribui para tornar a história mais leve e agradável de ler.

 

 

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