Notícia: Piratas no comércio – Fragmento
No verso improvisado de um cantador, um
assunto que muita gente conhece bem. Afinal, quem nunca foi passado para trás?
"O nosso Brasil brasileiro está cheio de caloteiro enganando o
companheiro", canta o repentista. A zona franca da enganação está perto
dos repentistas. No Centro de São Paulo, na região da Rua 25 de Março,
prosperam as vendas de produtos falsificados, contrabandeados e roubados.

"A Barbie custa R$ 9", diz
uma ambulante. A boneca é falsa. Na loja, a original custa entre R$ 29 e R$
100, dependendo do modelo. A vendedora reconhece que o produto não é exatamente
o mesmo, mas pelo preço... "Elas estão muito bem acabadinhas, bem
montadas. Estão bonitinhas, têm brinquinho. O pessoal traz da China. O carrinho
eu faço por R$ 10. Com pilhas, ele levanta os olhinhos e faz barulho",
conta a ambulante.
[...]
Cara a cara com o camelô, nem tudo é o
que parece. Camisa da seleção, jura uma vendedora, igualzinha à usada por
Robinho, sai a preço de uniforme de time de várzea. Nos camelódromos do país
vende-se a aparência. [...]
"Tênis, brinquedos, peças de
automóveis, peças de avião, lubrificantes de carros, medicamentos. Tudo que
você imagina é vendido falsificado", conta José Henrique Werner, da
Comissão Antipirataria da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio de Janeiro
(OAB-RJ).
Tênis de marca é sonho de consumo dos
adolescentes. Os piratas sabem disso e aproveitam a ansiedade dos jovens para
inundar os camelôs com cópias grosseiras e malfeitas. Acredita no vendedor quem
quiser.
"Isso aqui é primeira linha.
Paraguai não vende mais tênis. É quente, custa R$ 100. Na loja está à venda por
R$ 300. O preço é tão diferente porque eles não têm que correr igual a
gente", justifica um vendedor ambulante.
Loja cheia. Depósito da polícia lotado.
Só a pirataria de óculos, brinquedos, roupas e tênis rouba dos brasileiros R$ 9
bilhões por ano, diz uma pesquisa feita pelo Ibope e encomendada pelas
indústrias. Daria para cobrir 20% do rombo nas contas da Previdência Social.
No meio da pilha de produtos piratas
tirados de circulação, lá está um tênis igualzinho ao que foi visto pela equipe
do Globo Repórter na barraca de um camelô.
"O tênis original é testado até a
exaustão. O falsificado, obviamente, não é. É mais barato, mas com certeza a
pessoa vai ter que pagar um médico depois para consertar a coluna", diz
José Henrique Werner.
Um depósito guarda o resultado de
várias apreensões feitas nos últimos quatro anos de tênis falsificados. Dentro
de pacotes estão 50 mil pares, quantidade que daria para calçar jogadores de
4,5 mil times de futebol. Alguns são contrabandeados, vêm do exterior. Mas a
maioria é feita no Brasil. As falsificações nacionais são praticamente
idênticas aos modelos legítimos.
[...]
Cerco
à falsificação
Todos – compradores e vendedores –
sabem que estão em um território fora da lei. A informação acaba de chegar pelo
rádio da polícia, os agentes correm para o Centro da cidade. Mais um
laboratório de cópias ilegais de CDs vai ser fechado no Rio de Janeiro.
Dois meses de investigações levaram os
policiais a um apartamento no Centro do Rio de Janeiro. O que não foi nenhuma
surpresa para os investigadores, que já sabem: a grande maioria dos
laboratórios de cópias piratas de CD funciona na casa de pessoas atraídas pelas
quadrilhas de distribuição ilegal de CDs e que, com a ilusão da impunidade,
acabam transformando o próprio lar em local controlado pelo crime.
[...]
[...] O telefone não para de tocar. Se
existe CD pirata, é porque tem quem compre. Um cliente ligou para a loja e o
repórter Flávio Fachel atendeu:
Cliente: Eu queria comprar um DVD.
Flávio Fachel, repórter: Você prefere
original ou cópia?
Cliente: Prefiro a cópia, porque é mais
barata.
Flávio Fachel: Só tem um problema: a
polícia acabou de fechar a loja e todos foram presos.
Cliente: É mesmo?!
Fim da operação. Mais caixas de CDs
apreendidos. Os policiais, com suas sirenes, vão embora. Mas o camelódromo,
reino encantado da pirataria, esse não para.
"O original é muito mais
caro", ressalta uma vendedora ambulante.
Brincadeira
ameaçada
O perigo também está escondido em
brinquedos vendidos nas ruas. Uma boneca e um carrinho comprados pela equipe do
Globo Repórter em um camelô foram levados para um laboratório especializado em
analisar a segurança de brinquedos.
Qual a criança que nunca quebrou um
brinquedo? O problema é que os pedacinhos podem fazer um estrago grande.
"Depois de um ensaio de impacto, o brinquedo quebrou, dividindo-se em
partes pequenas e formando pontas. Isso não é normal. Há plásticos que você
pode jogar 20 vezes e não acontece nada", diz a técnica de laboratório
Luciana Arantes.
E uma peça dessas na garganta? A boneca
também tem armadilhas no cabelo e na roupa. "A embalagem do produto
deveria ter uma rotulagem advertindo que contém partes pequenas", avalia
Luciana.
Os resultados dos testes químicos são
mais assustadores. A tinta do carrinho tinha chumbo e antimônio em quantidade
bem acima do nível seguro para o organismo.
"O importante nos metais pesados é
o efeito cumulativo no organismo. Ele não é eliminado, vai sendo somado sempre.
Cada vez que a criança tem contato com um material desses vai acumulando no
organismo – nos ossos, no sistema nervoso, nos rins", explica o engenheiro
químico Mariano de Araújo Bacellar Neto.
O risco não é só para a saúde do corpo.
Um produto pirateado também ameaça à saúde da economia. Como a indústria e o
comércio que pagam impostos vendem menos, também contratam menos gente. É menos
emprego com carteira assinada, menos funcionários no chão da fábrica. Aliás,
muitas vezes, essa concorrência desleal pode fazer desaparecer uma empresa
inteira.
O dinheiro que o Brasil perde todos os
anos com a pirataria faz falta para muita gente. Com R$ 9 bilhões dá para
construir 300 mil casas populares, ou então, distribuir mais de 51 milhões de
cestas básicas. É mesmo muito dinheiro perdido.
Globo Repórter, 21 out.
2005. Disponível em: http://grep.blobo.com/Globoreporter/0,19125,VGCo-2703-6946-2,00.html.
Acesso em: 10 mar. 2015.
Entendendo a notícia:
01 – Onde a pirataria é mais
evidente, de acordo com a notícia?
A pirataria é
especialmente evidente no Centro de São Paulo, na região da Rua 25 de Março, e
em camelódromos por todo o país. Além disso, a notícia menciona que muitos
laboratórios de cópias piratas de CD funcionam na casa de pessoas atraídas por
quadrilhas de distribuição ilegal.
02 – Que tipos de produtos são
mais comumente falsificados ou contrabandeados?
Praticamente tudo
que se pode imaginar é vendido falsificado. A notícia menciona especificamente:
bonecas (como a Barbie), carrinhos de brinquedo, camisas de seleção, tênis,
peças de automóveis e avião, lubrificantes, medicamentos e CDs/DVDs.
03 – Qual é a principal
justificativa dos vendedores ambulantes para o preço mais baixo dos produtos
piratas?
Os vendedores
ambulantes justificam o preço mais baixo dos produtos piratas afirmando que não
têm os mesmos custos operacionais e impostos que as lojas tradicionais. Por
exemplo, um vendedor de tênis diz: "O preço é tão diferente porque eles
não têm que correr igual a gente".
04 – Quais são os riscos para
a saúde e segurança associados aos produtos piratas, segundo a reportagem?
Os produtos
piratas apresentam diversos riscos à saúde e segurança. Brinquedos falsificados
podem quebrar facilmente em partes pequenas, formando pontas que representam
risco de engasgamento. Além disso, a tinta de brinquedos pode conter metais
pesados como chumbo e antimônio em níveis perigosos, que se acumulam no
organismo, afetando ossos, sistema nervoso e rins. No caso de tênis
falsificados, a falta de testes e qualidade pode levar a problemas de coluna.
05 – Qual o impacto econômico
da pirataria para o Brasil?
A pirataria de
óculos, brinquedos, roupas e tênis rouba R$ 9 bilhões por ano dos brasileiros,
de acordo com uma pesquisa do Ibope. Esse valor daria para cobrir 20% do rombo
nas contas da Previdência Social, construir 300 mil casas populares, ou
distribuir mais de 51 milhões de cestas básicas. Além disso, a concorrência
desleal leva a menos empregos formais e pode até mesmo fazer empresas legítimas
desaparecerem.
06 – Como a polícia atua no
combate à pirataria, conforme descrito na notícia?
A polícia realiza
apreensões de produtos piratas e fecha laboratórios de cópias ilegais. A
notícia descreve uma operação em que, após dois meses de investigação,
policiais fecham um apartamento no Centro do Rio de Janeiro que funcionava como
laboratório de cópias piratas de CDs. As apreensões resultam em depósitos
lotados de produtos falsificados.
07 – Por que as pessoas
continuam comprando produtos piratas, mesmo cientes dos riscos e da
ilegalidade?
As pessoas
continuam comprando produtos piratas principalmente pelo preço
significativamente mais baixo em comparação com os produtos originais. A
reportagem mostra um cliente que prefere a cópia de um DVD "porque é mais
barata", e uma vendedora ambulante que ressalta que "o original é
muito mais caro". A ilusão da impunidade também atrai pessoas para a
produção ilegal.
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