História: O GÊNIO DO CRIME – Fragmento – Capítulos 1 – 2 e 3.
Capítulo 1
Era um mês de outubro em São Paulo,
tempo de flores e dias nem muito quentes nem muito frios, e a criançada só
falava no concurso das figurinhas de futebol.
Deu mania, mania forte, dessas que
ficam comichando o dia inteiro na cabeça da gente e não deixa pensar em mais
nada. Quem enchia o álbum ganhava prêmios bons e jogava-se abafa pela cidade: [...].
Na Escola Primária Três Bandeiras o
sino anunciou o recreio e o Edmundo saiu voando da classe para encontrar o
Pituca no pátio. Os dois estudavam na admissão, mas o Edmundo estava no 5º ano
A e o Pituca no 5º ano B, e não tinham podido conversar ainda naquela manhã.
Edmundo estava aflito: faz dois meses que só faltava o Rivelino para encher o
álbum e poder ir lá na fábrica receber o prêmio. Comprara toneladas de
envelopinhos e o Rivelino não saía [...].
Finalmente o Pituca veio com a
novidade: disseram que no Largo de São Bento tinha um cambista que vendia as
figurinhas abertas; o fulano encomendava a figurinha que queria e no dia seguinte
o cambista trazia. Custava caro mas era garantido. [...] Encontrou o Pituca
risonho embaixo do abacateiro do pátio.
— Como é, encomendou o Rivelino?
— Tive sorte, nem precisou encomendar
para amanhã. Sobrou um de um cliente que não veio buscar e comprei. Está aqui.
— Iupi! — Edmundo deu um pulo. Tirou o
álbum da bolsa e queria colar imediatamente a figurinha. [...].
Capítulo 2
Depois da aula Edmundo e Pituca foram
direto para a fábrica sem nem pensar no almoço. Tomaram o ônibus e desceram
numa praça onde perguntaram ao sorveteiro se sabia o lugar da fábrica. O
sorveteiro não sabia, mas três meninos, que jogavam abafa na calçada, ali
perto, sabiam, e se ofereceram para levar Edmundo e Pituca. No caminho foram
conversando.
— Você vai escolher que camisa?
— Corinthians.
— E depois que entregam o prêmio, eles
ficam com o álbum?
— Não. Tem um velhinho que carimba
todas as figurinhas e devolve.
— Bonito que é o álbum cheio. Vocês
encheram de sociedade?
— É só meu. O Pituca tem o dele, mas
faltam quatro figurinhas.
Quando dobraram a terceira esquina
apareceu a placa vermelha e amarela: FÁBRICA DE FIGURINHAS ESCANTEIO.
Era um prédio velho, de dois andares,
com jardim na frente e um portão de ferro. O jardim estava um ajuntamento de
crianças, para mais de cem, e pareciam desiludidos. Edmundo puxou conversa numa
rodinha e ficou sabendo que a fábrica interrompera a entrega dos prêmios. [...].
Pararam um pouco para pensar,
discutiram, e resolveram ir no advogado. Aquela turminha de álbum na mão encheu
dois ônibus e foram parar na Rua Barão de Itapetininga, subiram no décimo
quinto andar dum arranha-céu, e o que coube entrou na sala do advogado, o resto
ficando na sala de espera e pelo corredor. Contaram o caso e o advogado falou:
— A Fábrica de Figurinhas Escanteio
prometeu um prêmio a quem enchesse o álbum; vocês encheram e ela tem que
cumprir a promessa. A lei obriga as pessoas a cumprirem o que prometem. Vou
fazer uma petição ao juiz; deixem seus nomes e endereços com minha secretária.
Daí a cinco dias todos receberam uma
carta marcando hora para se reunirem no escritório.
— É — disse o advogado. — O caso está
resolvido. Logo que o dono da fábrica soube que ia ser denunciado, veio aqui e
falou que os prêmios estão à disposição de vocês. Podem ir buscar. [...].
Capítulo 3
— Edmundo, desça aqui embaixo que tem
visita para você. Era a voz do pai. Edmundo fechou o caderno de português,
trocou o chinelo pelo sapato e desceu.
— Boas-noites, meu bom menino.
Quem cumprimentou foi um senhor baixo
gordo careca sentado no sofá e que fumava um charuto comprido. Edmundo não
conhecia.
— Sou o seu Tomé, dono da Fábrica de
Figurinhas Escanteio. Descobri seu endereço pela relação do advogado.
— Muito prazer. — Assisti aquela
bagunça da janela do segundo andar; se não fosse você incendiavam minha
fábrica.
Seu Tomé contou o reboliço para seu
Cláudio e dona Elvira e elogiou muito a coragem do Edmundo, [...].
— Os senhores não imaginam o que está
acontecendo comigo. Esta vida; vemos as desgraças acontecerem aos outros e não
imaginamos que um dia. . . bom, vamos ao assunto: existe por aí uma fábrica
clandestina falsificando minhas figurinhas difíceis. Fazem exatamente iguais às
minhas e vendem para a criançada.
Fez uma pausa olhando a subida da
fumaça do charuto.
— No meu, como em qualquer concurso, o
número de prêmios deve ser limitado — não poderia entregar um jogo de camisas a
cada colecionador. Por isso as figurinhas difíceis são produzidas em menor
quantidade. Mas agora, com esse derrame de figurinhas falsas, o número de
álbuns cheios ficou maior que a minha capacidade de comprar prêmios.
— Compreendo por que havia tantos
meninos com álbuns cheios — disse seu Cláudio.
— Aí é que está. Tive que tomar
dinheiro emprestado para comprar os prêmios que entreguei. A senhora vê, o
senhor vê, passar esta vergonha na minha idade, ser chamado de caloteiro, o que
que é.
A empregada serviu um cafezinho na
bandeja e, ao pegar o pires, viram que seu Tomé estava muito nervoso, com a mão
tremendo; a xícara deu três pulinhos e quase derrama. Tomou o café e continuou.
— Os falsários vendem as figurinhas
abertas, não tem nem graça, cada um encomenda a que quer. Vendem caro, levam o
dinheiro e quem paga o prêmio sou eu. E são perfeitas, é impossível
diferenciá-las das de verdade. Vou é à falência, não aguento mais.
— Vamos seu Tomé — disse seu Cláudio. —
A polícia há de prender esses falsários.
— Não adianta, já tentei. As figurinhas
falsas são vendidas por cambistas, no centro da cidade. . .
— O Pituca comprou no Largo de São
Bento — interrompeu Edmundo. — Lá tem um cambista.
Seu Tomé prosseguiu:
— A polícia já prendeu três cambistas.
No dia seguinte aparece outro vendendo figurinha em lugar diferente.
— Os cambistas presos podem ser
forçados a dar o endereço da fábrica clandestina.
— Impossível. Nenhum deles nunca viu a
fábrica clandestina e nem o seu dono.
— E onde vão buscar as figurinhas que
vendem?
— Recebem-nas por sistemas diferentes,
é uma coisa muito bem feita. O cambista não vê a pessoa que lhe entrega a
figurinha e nem a que recebe o dinheiro. E, cada vez que um cambista é preso,
mudam o sistema. Topei com um gênio do crime, um supercérebro. [...].
MARINHO, João Carlos. O
gênio do crime. São Paulo: Global, 2019, p. 15-23.
Entendendo a história:
01 –
Qual era o principal assunto entre as crianças no início do livro?
As crianças
estavam obcecadas com o concurso de figurinhas de futebol, onde quem
completasse o álbum ganhava prêmios.
02
– Por que Edmundo estava tão ansioso no primeiro capítulo?
Edmundo estava
ansioso porque só faltava a figurinha do Rivelino para completar seu álbum e
ganhar o prêmio.
03
– Como Edmundo conseguiu a figurinha que faltava para completar seu álbum?
Pituca comprou a
figurinha de um cambista no Largo de São Bento, que vendia figurinhas abertas.
04
– Por que Edmundo e Pituca foram até a fábrica de figurinhas?
Eles foram até a
fábrica para receber o prêmio por terem completado o álbum de figurinhas.
05
– O que Edmundo e Pituca encontraram ao chegar na fábrica de figurinhas?
Encontraram um
grupo de mais de cem crianças desiludidas porque a fábrica havia interrompido a
entrega dos prêmios.
06
– Como o advogado ajudou as crianças que tinham completado o álbum?
O advogado disse
que a fábrica era obrigada a cumprir a promessa e fez uma petição ao juiz. Após
isso, o dono da fábrica se comprometeu a entregar os prêmios.
07
– Quem visitou Edmundo em sua casa no capítulo 3?
Seu Tomé, o dono
da Fábrica de Figurinhas Escanteio, visitou Edmundo.
08
– Qual foi a preocupação de Seu Tomé ao visitar Edmundo?
Seu Tomé estava
preocupado porque uma fábrica clandestina estava falsificando suas figurinhas
difíceis, o que estava arruinando sua fábrica.
09
– O que Seu Tomé explicou sobre as figurinhas difíceis no concurso?
Ele explicou que
as figurinhas difíceis eram produzidas em menor quantidade para limitar o
número de prêmios, mas a fábrica clandestina estava fazendo cópias perfeitas
dessas figurinhas, prejudicando o concurso.
10
– Por que a polícia não conseguia acabar com a fábrica clandestina?
A polícia já
havia prendido cambistas, mas a organização criminosa era muito sofisticada,
mudava de método a cada vez, e os cambistas não conheciam o dono ou a
localização da fábrica clandestina.
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