Reportagem: Criada a Membros Cia. de Dança – Fragmento
Criada
há 10 anos em Macaé, a Membros Cia. De Dança. Traz linguagem política para os
palcos em três espetáculos
Por Letícia de Souza
Nenhum passo da companhia de dança
Membros é em falso. Cada movimento no palco assume uma dimensão política, seja
para contestar um preconceito, para levantar questões sociais importantes – que
merecem ser vistas sob outros ângulos –, seja para mostrar um novo horizonte a
quem não tinha perspectiva. Talvez por isso o grupo criado em Macaé, no Rio de
Janeiro, tenha tanta visibilidade no exterior. A companhia já se apresentou em
mais de 100 cidades de 20 países e desembarca em Brasília com um projeto inédito
no Brasil: a trilogia Membros, o corpo político que dança, que havia sido
levada somente à Áustria.

Composto pelos espetáculos Raio X,
Febre e Medo, que abordam a violência, o projeto pode ser conferido neste fim
de semana no Teatro da Caixa. Apesar de formarem um conjunto, eles são
apresentados em dias diferentes, de forma sequencial, com o objetivo de sugerir
um aprofundamento do tema. Raio X
entra em cena hoje, Febre, amanhã, e
Medo, no domingo. O público,
contudo, não perde o fio da meada se assistir a apenas uma das narrativas.
Raio
X é baseado nos conflitos típicos do sistema carcerário brasileiro.
“Buscamos estudos de literatura marginal, que são livros escritos por detentos
ou por pesquisadores desse campo de investigação”, conta Paulo Azevedo, diretor
artístico da companhia. Em Febre, o
grupo utiliza a figura do menino em situação de risco como metáfora para tratar
as “doenças” da sociedade. Na última narrativa, a violência se projeta no corpo
feminino, numa perspectiva que flerta com a prostituição. A intenção é romper o
rótulo de fragilidade do gênero.
A Membros Cia. de Dança foi fundada por
Paulo Azevedo e pela coreógrafa Taís Vieira em 1999. Na época, eles
apresentaram a jovens de escolas públicas de Macaé a dança a partir da cultura
do hip hop. A iniciativa foi tão bem sucedida que surgiu uma escola de
formação. Nas apresentações em Brasília, sobem ao palco 12 intérpretes (como
são chamados os dançarinos) e todos se profissionalizaram dentro da própria
companhia.
Três
perguntas – Paulo Azevedo
Vocês
são uma companhia reconhecida por tratar a dança como manifestação política. O
que isso significa?
Significa que nos amparamos no
principal referencial que entendemos como político, que é o corpo. Então, no
momento em que esse corpo refaz o seu papel enquanto instrumento político, seja
ele em forma de manifestação, protesto, silêncio, torna-se para a gente um
referencial de pesquisa.
Por
que a opção por retratar a violência?
De forma geral, a primeira violência
que a gente constata é sobre gente mesmo. Vivemos em uma cidade cujo
referencial é apenas o petróleo. Para a comunidade de uma forma geral, o
imaginário de sucesso é quando um jovem da região consegue um emprego em uma
firma que presta serviço para a Petrobras ou na própria Petrobras. As famílias
dificilmente vão enxergar o processo artístico desses jovens como algo exitoso.
Então, a primeira violência que surgiu para a gente foi a de colocarem que não
era possível acreditar nos nossos projetos, fazer tudo o que a gente acabou
conseguindo fazer.
Qual
é a linguagem do espetáculo?
O hip hop a dança contemporânea talvez
sejam mais fáceis de identificar. Mas, se fossem enquadrar a gente, acho que
fazemos uma dança política. Também trazemos elementos da capoeira. [...]
Correio Brasiliense, em
30 de out. de 2009.
Fonte: Arte em
Interação – Hugo B. Bozzano; Perla Frenda; Tatiane Cristina Gusmão – volume
único – Ensino médio – IBEP – 1ª edição – São Paulo, 2013. p. 282-283.
Entendendo a reportagem:
01 – Qual é a principal
característica e o propósito da Membros Cia. de Dança, e como isso se manifesta
em suas apresentações?
A principal
característica da Membros Cia. de Dança é sua linguagem política, onde cada
movimento no palco assume uma dimensão de crítica social. O propósito da
companhia é usar a dança para contestar preconceitos, levantar questões sociais
importantes e oferecer novas perspectivas. Isso se manifesta em suas
apresentações através da abordagem de temas como a violência, explorando
conflitos do sistema carcerário, a figura do menino em situação de risco como
metáfora para doenças sociais, e a violência projetada no corpo feminino,
buscando romper o rótulo de fragilidade. Para o diretor Paulo Azevedo, o corpo
em si é um instrumento político, e sua pesquisa se baseia nesse referencial.
02 – Descreva a trilogia
"Membros, o corpo político que dança", mencionando seus espetáculos
constituintes e a temática central de cada um.
A trilogia
"Membros, o corpo político que dança" é um projeto inédito no Brasil,
que havia sido apresentado somente na Áustria. Ela é composta por três
espetáculos: "Raio X", "Febre" e "Medo". A
temática central que permeia os três é a violência, com o objetivo de
aprofundar a discussão sobre o tema ao longo das apresentações sequenciais.
"Raio
X" é baseado nos conflitos típicos do sistema carcerário brasileiro,
utilizando estudos de literatura marginal.
"Febre"
emprega a figura do menino em situação de risco como uma metáfora para as
"doenças" da sociedade.
"Medo"
projeta a violência no corpo feminino, explorando uma perspectiva que flerta
com a prostituição, com a intenção de romper o rótulo de fragilidade do gênero.
03 – Como a Membros Cia. de
Dança foi fundada e qual a relevância de sua escola de formação para os
dançarinos?
A Membros Cia. de
Dança foi fundada em 1999 por Paulo Azevedo e pela coreógrafa Taís Vieira, em
Macaé, Rio de Janeiro. Inicialmente, eles apresentaram a dança a partir da
cultura do hip hop para jovens de escolas públicas da cidade. A iniciativa foi
tão bem-sucedida que culminou na criação de uma escola de formação. A
relevância dessa escola é que ela permitiu que todos os 12 intérpretes (como
são chamados os dançarinos) que sobem ao palco nas apresentações em Brasília se
profissionalizassem dentro da própria companhia. Isso demonstra um modelo de
desenvolvimento e capacitação interna, valorizando e formando talentos a partir
de suas próprias bases.
04 – De acordo com Paulo
Azevedo, por que a companhia optou por retratar a violência em suas obras?
Segundo Paulo
Azevedo, a opção por retratar a violência surgiu de uma constatação sobre a primeira
violência que o grupo enfrentou: a descrença em seus projetos artísticos.
Vivendo em uma cidade como Macaé, cujo referencial econômico é majoritariamente
o petróleo, o imaginário de sucesso para a comunidade estava centrado em
empregos na Petrobras ou em empresas ligadas ao setor. As famílias, de forma
geral, tinham dificuldade em enxergar o processo artístico como algo exitoso ou
viável. Portanto, a violência inicial que a companhia buscou abordar foi a de
ser desacreditada em sua capacidade de alcançar o sucesso por meio da arte,
transformando essa experiência em um pilar para suas criações.
05 – Qual é a linguagem de
dança predominante nos espetáculos da Membros Cia. de Dança, e o que mais a
caracteriza?
A linguagem de dança predominante nos
espetáculos da Membros Cia. de Dança é o hip hop e a dança contemporânea, que
são as mais fáceis de identificar. No entanto, Paulo Azevedo ressalta que a
companhia faz uma "dança política", o que a caracteriza de forma mais
abrangente. Além disso, a companhia também incorpora elementos da capoeira em
suas coreografias. Essa fusão de estilos, combinada com a forte dimensão
política de seus movimentos, define a identidade artística da Membros Cia. de
Dança.
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