quinta-feira, 3 de outubro de 2024

POEMA: VEM SENTAR-TE COMIGO, LÍDIA, À BEIRA DO RIO - RICARDO REIS - COM GABARITO

 Poema: Vem sentar-te comigo, Lídia, à beira do rio

              Ricardo Reis

Vem sentar-te comigo, Lídia, à beira do rio.
Sossegadamente fitemos o seu curso e aprendamos
Que a vida passa, e não estamos de mãos enlaçadas.
                (Enlacemos as mãos).

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhPqb1svjJvJvbyUwat04U6gPQkj3HOBvxXXal-q0pkEuqIrbT2rmgg8i6fQcDCvxuSbPZMS45GG5o04jI6jwXdBkErEqQMRgLN4MF7y9ODH6FlyreiZJDo593XZbEH5cK_G62TpHkrUKPXL2M6xsEprwiqfCvBXYi-9csI0i48VLZo6aH_kN9nV1z8BQI/s1600/CASAL.png


Depois pensemos, crianças adultas, que a vida
Passa e não fica, nada deixa e nunca regressa,
Vai para um mar muito longe, para ao pé do Fado,
                Mais longe que os deuses.

Desenlacemos as mãos, porque não vale a pena cansarmo-nos.
Quer gozemos, quer não gozemos, passamos como o rio.
Mais vale saber passar silenciosamente
                E sem desassossegos grandes.

Sem amores, nem ódios, nem paixões que levantam a voz,
Nem invejas que dão movimento demais aos olhos,
Nem cuidados, porque se os tivesse o rio sempre correria,
                E sempre iria ter ao mar.

Amemo-nos tranquilamente, pensando que podíamos,
Se quiséssemos, trocar beijos e abraços e caricias,
Mas que mais vale estarmos sentados ao pé um do outro
                Ouvindo correr o rio e vendo-o.

Colhamos flores, pega tu nelas e deixa-as
No colo, e que o seu perfume suavize o momento —
Este momento em que sossegadamente não cremos em nada,
                Pagãos inocentes da decadência.

Ao menos, se for sombra antes, lembrar-te-ás de mim depois
Sem que a minha lembrança te arda ou te fira ou te mova,
Porque nunca enlaçamos as mãos, nem nos beijamos
                Nem fomos mais do que crianças.

E se antes do que eu levares o óbolo ao barqueiro sombrio,
Eu nada terei que sofrer ao lembrar-me de ti.
Ser-me-ás suave à memória lembrando-te assim — à beira-rio,
                Pagã triste e com flores no regaço.

Fernando Pessoa, Poemas Completos de Ricardo Reis.

Fonte: livro Língua e Literatura – Faraco & Moura – vol. 3 – 2º grau – Edição reformulada 9ª edição – Editora Ática – São Paulo – SP. p. 328.

Entendendo o poema:

01 – Qual a principal temática abordada no poema?

      A principal temática do poema é a passagem do tempo, a finitude da vida e a importância de viver o presente de forma serena e contemplativa. O poeta convida a amada a refletir sobre a efemeridade da existência e a aceitar a morte como parte natural do ciclo da vida.

02 – Qual o papel do rio como metáfora no poema?

      O rio simboliza o fluxo contínuo da vida, que segue seu curso inexorável. Ele representa a passagem do tempo, a inevitabilidade da morte e a impossibilidade de voltar atrás. O rio também simboliza a serenidade e a tranquilidade que o poeta busca para si e para sua amada.

03 – Qual a proposta de relacionamento entre o eu lírico e Lídia?

      O eu lírico propõe um relacionamento tranquilo e sereno, baseado na amizade e na cumplicidade. Ele não busca paixões intensas ou posses, mas sim um amor maduro e consciente da finitude da vida. A proposta é viver o momento presente de forma intensa, mas sem apegos excessivos.

04 – Qual a importância da natureza para o eu lírico?

      A natureza, representada pelo rio e pelas flores, serve como cenário para a reflexão sobre a vida e a morte. Ela proporciona um ambiente tranquilo e inspirador, convidando à contemplação e à serenidade. A natureza também simboliza a beleza e a simplicidade da existência.

05 – Qual a visão de morte presente no poema?

      A morte é vista como parte natural do ciclo da vida, um destino inevitável para todos. No entanto, o poeta não a teme, mas a aceita com serenidade. A morte é vista como uma libertação dos sofrimentos e das paixões, um retorno à natureza e à eternidade.

06 – Qual o papel da memória na relação entre o eu lírico e Lídia?

      A memória é importante para o eu lírico, pois ele deseja que Lídia se lembre dele com carinho, mas sem sofrimento. Ele busca uma lembrança serena e tranquila, que o associe à natureza e à simplicidade.

07 – Qual a influência da cultura clássica no poema?

      O poema apresenta diversas referências à cultura clássica, como a menção ao Fado e a figura do barqueiro sombrio (Caronte). Essa influência confere ao poema um tom atemporal e universal, conectando-o às grandes questões da existência humana. Além disso, a valorização da serenidade, da contemplação e da aceitação do destino são características típicas da filosofia estoica, que teve grande influência na cultura clássica.

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário