domingo, 29 de outubro de 2023

POESIA: O CÂNTARO - RENATA PALLOTTINI - COM GABARITO

 Poesia: O Cântaro

             Renata Pallottini

"Então, Jacó beijou Raquel e,
levantando a voz,
chorou."
Gênesis, 20: l l

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi66Pe3OMOkNrsiPH_NOnSgtXhMpNlOpGnskd56Yb827v4gpf28r606mNpFw8nSRjsHDj1x4HTTFat19nj7s5jkwWpe1duAa35FvUoFyKL57A2-vvVfjKMjxwqVJWBW1PqXOMjCp6GrpJSfmjA3WqcBSeNHKzcez9BtFn60T4BlO3r4_Vmka0c3U-lZcfI/s320/CANTARO.jpg



O cântaro poreja a água amena
que do poço brotou, e adoça a areia
e que corre nos ombros, e que enleia
pelas espáduas seu frescor moreno.

O lácteo manto que uma brisa ondeia
desenha formas, cujo talho apenas
a tamareira imita, a flor receia,
o vento afaga e a solidão serena.

Vê-la é um momento, desejá-la um sopro,
ouvir-lhe a voz uma doçura eleita,
roçar-lhe a fronte uma revelação.

O amante, incertas mãos, trêmulo corpo,
beija-lhe os olhos, cuja flor desfeita
catorze anos de vida pagarão.

Renata Pallottini.

Entendendo a poesia:

01 – Qual passagem bíblica é citada no início do poema?

      O poema começa com uma citação de Gênesis 20:11, que diz: "Então, Jacó beijou Raquel e, levantando a voz, chorou."

02 – O que o "cântaro" está fazendo no poema?

      O cântaro está derramando água do poço e refrescando a areia, além de enleiar-se nos ombros de alguém.

03 – Como o poema descreve o efeito da brisa no cenário?

      A brisa desenha formas no manto que uma pessoa usa, e essas formas são imitadas pela tamareira, temidas pela flor, acariciadas pelo vento e trazem serenidade à solidão.

04 – Como o poema descreve a visão da pessoa mencionada?

      A visão da pessoa é descrita como algo fugaz, desejado, e suas formas são comparadas às da tamareira.

05 – Quais são as ações do amante no poema?

      O amante beija os olhos da pessoa mencionada, cuja flor desfeita será paga com catorze anos de vida.

06 – Qual é a tonalidade geral do poema?

      O poema tem uma tonalidade romântica e contemplativa, explorando a beleza fugaz e o desejo apaixonado.

 

 

 

 

POESIA: O PÃO AMARGO - RENATA PALLOTTINI - COM GABARITO

 Poesia: O Pão Amargo

           Renata Pallottini

"Ela foi sentar-se em frente dele a boa distância,
como a de um tiro de arco;
pois disse:
que não veja eu a morte do menino.
Sentada em frente dele,
levantou sua voz e chorou."
Gênesis, 21:16

Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhKU9FBgGKnmuAsYoKgM8xps3-PxpZbtHKWxjhXhC6fc-z3aNOwssEYfarngB-y43v-xODP0WLNJXjWeuBnj3aAVw0y694_jlMi7vGXuirgQ4BumP3NZ41ephAyjc5ticSHJCqL2UgfahP-6jI0zkFDzVi5ubMUtMO6rz0VaKYo6u7lZxsHOnhJwwnNiQo/s1600/PAO.jpg

O pão amargo e a água consumada
do odre seco em cáustico deserto;
sob o mirrado arbusto a esquiva sombra
se nega pela areia e é como um rastro.

Sem planta fresca, a fruta apetecida
traz a longínqua fixação do incerto;
quando a brasa arenosa for alfombra
tornar-se-á carícia o fogo do astro.

Para a criança adormecida ao braço
o olhar alonga, e faz como se fosse
para nos olhos tê-la, traço a traço.

Lembrando a noite aquela e a face gêmea
que lhe roçara a face em mágoa doce,
a escrava chora a condição de fêmea.

Renata Pallottini.

Entendendo a poesia:

01 – Qual é a referência bíblica mencionada no início da poesia?

      A referência bíblica mencionada é Gênesis 21:16.

02 – Como a poesia descreve o ambiente em que se passa a cena?

      A poesia descreve um ambiente árido e deserto, onde a comida e a água são escassas.

03 – O que a autora sugere sobre a sombra sob o "mirrado arbusto"?

      A autora sugere que a sombra sob o "mirrado arbusto" é evasiva e difícil de encontrar devido à escassez de vegetação.

04 – Como a poesia descreve a esperança da personagem em relação à fruta apetecida?

      A poesia descreve a esperança como uma "fixação do incerto," sugerindo que a personagem anseia por algo distante e incerto.

05 – Qual é o simbolismo por trás da descrição da brasa arenosa como "carícia"?

      O simbolismo sugere que o calor escaldante do deserto, representado pela "brasa arenosa," se transformará em algo suave e reconfortante, como uma "carícia," quando a noite chegar.

06 – O que a escrava chora no final da poesia e por quê?

      A escrava chora a "condição de fêmea" no final da poesia, possivelmente expressando o sofrimento e a vulnerabilidade de sua posição como mulher naquele contexto. Ela também pode estar relembrando uma experiência dolorosa, mencionada na referência bíblica do início da poesia.

 

CONTO: A MENINA ENTERRADA VIDA - LUÍS DA CÂMARA CASCUDO - COM GABARITO

 Conto: A MENINA ENTERRADA VIVA

           Luís da Câmara Cascudo

        Era um dia um viúvo que tinha uma filha muito boa e bonita. Vizinha ao viúvo residia uma viúva, com outra filha, feia e má. A viúva vivia agradando a menina, dando presentes e bolos de mel. A menina ia simpatizando com a viúva, embora não se esquecesse de sua defunta mãe que a acariciava e penteava carinhosamente. A viúva tanto adulou, tanto adulou a menina que esta acabou pedindo que seu pai casasse com ela.

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjjJAB2h0oeP8aHV2lp9Lp9GT0fFTSzb8WOgo5NddTh9NNJdxNx_Fos40qaQt3tTFr2LEXfUSVOWR0Nr1SWgRX5uEoYHNFPbi-WZyzt2Efjb1pg3gpDyY4vgomZLD0wGYzFMdht4udlBxWQZ0ICA6ailjIkDMoS43-8JGh1g19Pxrp9hhQiQI_V5AmPCVk/s1600/cascudo.jpg


        – Case com ela, papai. Ela é muito boa e me dá mel!

        – Agora ela lhe dá mel, minha filha, amanhã lhe dará fel! – respondia o viúvo.

        A menina insistiu e o pai, para satisfazê-la, casou com a vizinha. Obrigado por seus negócios, o homem viajava muito e a madrasta aproveitou essas ausências para mostrar o que era. Ficou arrebatada, muito bruta e malvada, tratando a menina como se fosse a um cachorro. Dava muito pouco de comer e a fazia dormir no chão em cima de uma esteira velha. Depois mandou que a menina se encarregasse dos trabalhos mais pesados da casa. Quando não havia coisa alguma que fazer, a madrasta não deixava a menina brincar. Mandava que fosse vigiar um pé de figos que estava carregadinho, para os passarinhos não bicarem as frutas.

        A pobre da menina passava horas e horas guardando os figos e gritando – chô! passarinho! quando algum voava por perto. Uma tarde estava tão cansada que adormeceu e quando acordou os passarinhos tinham picado todos os figos. A madrasta veio ver e ficou doida de raiva. Achou que aquilo era um crime e no ímpeto do gênio matou a menina e enterrou-a no fundo do quintal. Quando o pai voltou da viagem a madrasta disse que a menina fugira de casa e andava pelo mundo, sem juízo. O pai ficou muito triste.

        Em cima da sepultura da órfã nasceu um capinzal bonito. O dono da casa mandou que o empregado fosse cortar o capim. O capineiro foi pela manhã e quando começou a cortar o capim, saiu uma voz do chão, cantando:

               Capineiro de meu pai!

               Não me cortes os cabelos…

               Minha mãe me penteou,

               Minha madrasta me enterrou,

               Pelo figo da figueira

               Que o passarinho picou…

               Chô! passarinho!

        O capineiro deu uma carreira, assombrado, e foi contar o que ouvira. O pai veio logo e ouviu as vozes cantando aquela cantiga tocante. Cavou a terra e encontrou uma laje. Por baixo estava vivinha, a menina. O pai chorando de alegria abraçou-a e levou-a para casa. Quando a madrasta avistou de longe a enteada, saiu pela porta afora, e nunca mais deu notícias se era viva ou morta.

        O pai ficou vivendo muito bem com sua filhinha.

           Luís da Câmara Cascudo.

Entendendo o conto:

01 – Quem são os personagens principais do conto?

      Os personagens principais são o viúvo, sua filha boa e bonita, a viúva vizinha com sua filha feia e má, e a madrasta.

02 – O que a madrasta faz para agradar a filha do viúvo?

      A madrasta dá presentes e bolos de mel para a filha do viúvo.

03 – Por que a filha do viúvo pede ao pai para casar com a viúva?

      A filha do viúvo pede ao pai para casar com a viúva porque a madrasta a estava agradando com presentes e mel.

04 – Como o viúvo reage ao pedido da filha para casar com a viúva?

      O viúvo responde que a madrasta pode dar mel agora, mas no futuro poderia dar fel.

05 – Como a madrasta trata a filha do viúvo após o casamento?

      Após o casamento, a madrasta trata a filha do viúvo de maneira cruel, fazendo-a passar por privações e trabalho duro.

06 – Por que a madrasta manda a filha vigiar o pé de figos?

      A madrasta manda a filha vigiar o pé de figos para evitar que os passarinhos comam as frutas.

07 – O que acontece quando a filha adormece enquanto vigia os figos?

      Quando a filha adormece, os passarinhos picam todos os figos.

08 – Como a história da menina termina?

      A história da menina termina com a madrasta matando-a e enterrando-a no quintal, alegando que a menina havia fugido.

09 – O que cresce em cima da sepultura da menina?

      Um capinzal bonito cresce em cima da sepultura da menina.

10 – Como a menina é finalmente resgatada?

      A menina é resgatada quando um capineiro vai cortar o capim em cima da sepultura e ouve a voz da menina cantando uma canção. Seu pai a encontra, tira-a da sepultura e a leva para casa, enquanto a madrasta desaparece da história.

 

 

quinta-feira, 26 de outubro de 2023

CONTO: NENHUM, NENHUMA - JOÃO GUIMARÃES ROSA - COM GABARITO

 Conto: NENHUM, NENHUMA

           JOÃO GUIMARÃES ROSA

        No conto Nenhum, Nenhuma, a indefinição do espaço se articula com a questão do tempo, na medida em que todas as referências a espaços indefinidos misturam-se à memória perdida
que o narrador tenta recuperar; o que ele talvez resuma da seguinte forma: As lembranças são outras distâncias….

        A narrativa inicia com o trecho: Dentro da casa-de-fazenda, achada, ao acaso de outras várias e recomeçadas distâncias, passaram-se e passam, na retentiva da gente, irreversos grandes fatos – reflexos, relâmpagos, lampejos – pesados em obscuridade.

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg35hjUNDj9_RExItAcP66p8p7BJ6k_E_K8A8evTs1ZeMVTrLqzt936F9qColgbGFd2R5vc3b66Sc11ByVVL3VqSrSNt87SMqiO5A3HYvMzhqEFmKDT0ufyuL_Zu7nzBu1ABWE5ONgehBRfN7jzNyBGUs_bMBOL-8NT9WpRc5XBqOh4GTyKpx6ypMEjv1M/s320/casa-de-fazenda-2.jpg


        A procura pelos fatos da infância que “passaram e passam-se” constitui uma tentativa de descobrir uma verdade misteriosa e inacessível, que se articule e modifique o presente, lançando novas luzes ao futuro.

        O narrador do conto narra em primeira pessoa, com a cumplicidade explícita de sua memória, uma das personagens principais dessa história, tentando também compreender os dilemas que envolvem a aproximação da morte.

        O narrador rosiano caminha como se estivesse perdido no labirinto de suas lembranças, encontrando as saídas após um árduo e doloroso esforço. Ao longo de sua odisseia, ele enfrenta a tensão entre a memória e o esquecimento, no resgate do passado, que não retorna em sua pureza original, mas é fruto de uma singular seleção dos fatos lembrados.

        O narrador faz um enorme esforço de memória, que tanto pode ser entendido com a recuperação de um sonho, ou uma regressão psicanalítica ou até terapia de vidas passadas.

        Tudo o que consegue relatar, de forma nebulosa, imprecisa e fragmentada, é que está de visita em uma casa, em que havia um moço e uma moça que se amavam. Havia também uma velha de idade tão avançada que nem havia mais noção de como chegara
ali. Essa ideia é o motivo dos dois jovens não poderem ficar juntos, pois a moça precisa cuidar dela.

        Desfeito o relacionamento, o menino é levado para sua casa pelo moço. O garoto vê o sofrimento do jovem. É um amor forte. Chegando a sua casa, o pai fala do muro novo que está sendo construído. A mãe está preocupada em ver se a roupa do
filho estava em ordem. O garoto, indignado, berra com os pais, dizendo que eles não sabiam nada do amor, preocupados que estavam com questões tão insignificantes. Percebeu que o pai e mãe se suportavam e tinham transformado seu casamento em
um desastre confortável.

        Do ponto de vista da composição, o conto “Nenhum, nenhuma” apresenta dois eixos bem distintos: o passado e o presente.

        Portanto, relembrando: neste conto, apresenta-se um narrador-personagem que se esforça em relembrar uma experiência de sua infância, mas que não consegue compor integralmente todas as cenas, os detalhes dessa vivência e, por isso, só tem contato
com elementos esgarçados de memória, o que cria uma atmosfera de imprecisão e de incertezas, próprias de quem se esforça por recuperar momentos longínquos do passado. Esse esforço determina dois planos na narrativa: o do passado (infância) e o do presente (memória) que são diferenciados inclusive tipograficamente, no texto impresso.

        Quando criança, o Menino estivera hospedado por vários dias numa fazenda e vira um casal de namorados ter que se separar porque a moça não podia abandonar uma velhinha que parecia teimar em viver, a despeito de sua velhice e doença. Observando
os olhares apaixonados desse casal, o garoto encanta-se com a beleza da moça, sentindo até mesmo raiva e ciúmes do namorado. Aquele amor tão intenso que percebia no jovem casal o fazia pensar que deveria ser perpetuado nas relações e não abrandado
pelas tarefas diárias, como parecia ter ocorrido com o amor que outrora unira os seus pais. Todas essas percepções contribuem para que o Menino descubra a diversidade do sentimento amoroso, ampliando pela experiência o seu conhecimento sobre a vida,
e promovem aprendizagem, amadurecimento.

Guimarães Rosa.

Entendendo o conto:

01 – Como o conto aborda a relação entre memória e tempo?

      O conto aborda a relação entre memória e tempo ao mostrar o narrador tentando recuperar as lembranças de sua infância, que se misturam à memória perdida, criando uma atmosfera de imprecisão e incerteza.

02 – Qual é a situação central que o narrador relembra da sua infância?

      O narrador relembra a situação em que ele estava hospedado em uma fazenda e observou um casal de namorados que teve que se separar devido à obrigação de cuidar de uma velha doente.

03 – Como o narrador reage ao amor intenso observado no casal de namorados na fazenda?

      O narrador se encanta com o amor intenso do casal e sente raiva e ciúmes do namorado. Ele reflete sobre a intensidade do amor e como isso contrasta com a apatia que ele percebeu em seu próprio relacionamento de seus pais.

04 – Como o conto aborda a dualidade entre passado e presente na narrativa?

      O conto diferencia o passado (infância) e o presente (memória) tipograficamente, mostrando como o narrador se esforça para recuperar cenas e detalhes do passado, criando uma atmosfera de imprecisão.

05 – Por que o casal de namorados na fazenda não pode ficar junto?

      O casal de namorados na fazenda não pode ficar junto porque a moça não pode abandonar a velhinha doente, que parece teimar em viver, apesar de sua velhice e doença.

06 – O que o narrador aprende com a experiência do casal de namorados na fazenda?

      O narrador aprende a diversidade do sentimento amoroso e amplia seu conhecimento sobre a vida ao observar o amor intenso do casal, o que o faz refletir sobre seu próprio relacionamento e as tarefas diárias que podem abrandar o amor.

 

CONTO: IDEIAS DO CANÁRIO - MACHADO DE ASSIS - COM GABARITO

 Conto: Ideias do Canário

             Machado de Assis

        Um homem dado a estudos de ornitologia, por nome Macedo, referiu a alguns amigos um caso tão extraordinário que ninguém lhe deu crédito. Alguns chegam a supor que Macedo virou o juízo. Eis aqui o resumo da narração.

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg5jPIAX1h6_H5q4ER0vd9c3FPvR1UM7QX8DocMACx9bXcPk27QooCgM9_mKHzg5IVgJfaoB3nUqUS96JajkkVjXLWQV_v27RHhxV8pBT2hO60GI3FhDiY7qeiBiPXJsiCs4ctmmgv2a6zosKzXX4Ah_kiLlUSzgBf4aSRUB5OPfwgqsqkRpuRfh13ZsBI/s1600/CAN%C3%81RIO.png


        No princípio do mês passado, — disse ele, — indo por uma rua, sucedeu que um tílburi à disparada, quase me atirou ao chão. Escapei saltando para dentro de urna loja de belchior. Nem o estrépito do cavalo e do veículo, nem a minha entrada fez levantar o dono do negócio, que cochilava ao fundo, sentado numa cadeira de abrir. Era um frangalho de homem, barba cor de palha suja, a cabeça enfiada em um gorro esfarrapado, que provavelmente não achara comprador. Não se adivinhava nele nenhuma história, como podiam ter alguns dos objetos que vendia, nem se lhe sentia a tristeza austera e desenganada das vidas que foram vidas.

        A loja era escura, atualhada das cousas velhas, tortas, rotas, enxovalhadas, enferrujadas que de ordinário se acham em tais casas, tudo naquela meia desordem própria do negócio. Essa mistura, posto que banal, era interessante. Panelas sem tampa, tampas sem panela, botões, sapatos, fechaduras, uma saia preta, chapéus de palha e de pelo, caixilhos, binóculos, meias casacas, um florete, um cão empalhado, um par de chinelas, luvas, vasos sem nome, dragonas, uma bolsa de veludo, dois cabides, um bodoque, um termômetro, cadeiras, um retrato litografado pelo finado Sisson, um gamão, duas máscaras de arame para o carnaval que há de vir, tudo isso e o mais que não vi ou não me ficou de memória, enchia a loja nas imediações da porta, encostado, pendurado ou exposto em caixas de vidro, igualmente velhas. Lá para dentro, havia outras cousas mais e muitas, e do mesmo aspecto, dominando os objetos grandes, cômodas, cadeiras, camas, uns por cima dos outros, perdidos na escuridão.

        Ia a sair, quando vi uma gaiola pendurada da porta. Tão velha como o resto, para ter o mesmo aspecto da desolação geral, faltava-lhe estar vazia. Não estava vazia. Dentro pulava um canário. A cor, a animação e a graça do passarinho davam àquele amontoado de destroços uma nota de vida e de mocidade. Era o último passageiro de algum naufrágio, que ali foi parar íntegro e alegre como dantes. Logo que olhei para ele, entrou a saltar mais abaixo e acima, de poleiro em poleiro, como se quisesse dizer que no meio daquele cemitério brincava um raio de sol. Não atribuo essa imagem ao canário, senão porque falo a gente retórica; em verdade, ele não pensou em cemitério nem sol, segundo me disse depois. Eu, de envolta com o prazer que me trouxe aquela vista, senti-me indignado do destino do pássaro, e murmurei baixinho palavras de azedume.

        — Quem seria o dono execrável deste bichinho, que teve ânimo de se desfazer dele por alguns pares de níqueis? Ou que mão indiferente, não querendo guardar esse companheiro de dono defunto, o deu de graça a algum pequeno, que o vendeu para ir jogar uma quiniela?

        E o canário, quedando-se em cima do poleiro, trilou isto:

        — Quem quer que sejas tu, certamente não estás em teu juízo.  Não tive dono execrável, nem fui dado a nenhum menino que me vendesse. São imaginações de pessoa doente; vai-te curar, amigo...

        — Como — interrompi eu, sem ter tempo de ficar espantado. Então o teu dono não te vendeu a esta casa? Não foi a miséria ou a ociosidade que te trouxe a este cemitério, como um raio de sol?

        — Não sei que seja sol nem cemitério. Se os canários que tens visto usam do primeiro desses nomes, tanto melhor, porque é bonito, mas estou que confundes.

        — Perdão, mas tu não vieste para aqui à toa, sem ninguém, salvo se o teu dono foi sempre aquele homem que ali está sentado.

        — Que dono? Esse homem que aí está é meu criado, dá-me água e comida todos os dias, com tal regularidade que eu, se devesse pagar-lhe os serviços, não seria com pouco; mas os canários não pagam criados. Em verdade, se o mundo é propriedade dos canários, seria extravagante que eles pagassem o que está no mundo.

        Pasmado das respostas, não sabia que mais admirar, se a linguagem, se as ideias. A linguagem, posto me entrasse pelo ouvido como de gente, saía do bicho em trilos engraçados. Olhei em volta de mim, para verificar se estava acordado; a rua era a mesma, a loja era a mesma loja escura, triste e úmida. O canário, movendo a um lado e outro, esperava que eu lhe falasse. Perguntei-lhe então se tinha saudades do espaço azul e infinito...

        — Mas, caro homem, trilou o canário, que quer dizer espaço azul e infinito?

        — Mas, perdão, que pensas deste mundo? Que cousa é o mundo?

        — O mundo, redarguiu o canário com certo ar de professor, o mundo é uma loja de belchior, com uma pequena gaiola de taquara, quadrilonga, pendente de um prego; o canário é senhor da gaiola que habita e da loja que o cerca. Fora daí, tudo é ilusão e mentira.

        Nisto acordou o velho, e veio a mim arrastando os pés. Perguntou-me se queria comprar o canário. Indaguei se o adquirira, como o resto dos objetos que vendia, e soube que sim, que o comprara a um barbeiro, acompanhado de uma coleção de navalhas.

        — As navalhas estão em muito bom uso, concluiu ele.

        — Quero só o canário.

        Paguei-lhe o preço, mandei comprar uma gaiola vasta, circular, de madeira e arame, pintada de branco, e ordenei que a pusessem na varanda da minha casa, donde o passarinho podia ver o jardim, o repuxo e um pouco do céu azul.

        Era meu intuito fazer um longo estudo do fenômeno, sem dizer nada a ninguém, até poder assombrar o século com a minha extraordinária descoberta. Comecei por alfabeto a língua do canário, por estudar-lhe a estrutura, as relações com a música, os sentimentos estéticos do bicho, as suas ideias e reminiscências. Feita essa análise filológica e psicológica, entrei propriamente na história dos canários, na origem deles, primeiros séculos, geologia e flora das ilhas Canárias, se ele tinha conhecimento da navegação, etc. Conversávamos longas horas, eu escrevendo as notas, ele esperando, saltando, trilando.

        Não tendo mais família que dois criados, ordenava-lhes que não me interrompessem, ainda por motivo de alguma carta ou telegrama urgente, ou visita de importância. Sabendo ambos das minhas ocupações científicas, acharam natural a ordem, e não suspeitaram que o canário e eu nos entendíamos.

        Não é mister dizer que dormia pouco, acordava duas e três vezes por noite, passeava à toa, sentia-me com febre. Afinal tornava ao trabalho, para reler, acrescentar, emendar. Retifiquei mais de uma observação, — ou por havê-la entendido mal, ou porque ele não a tivesse expresso claramente. A definição do mundo foi uma delas. Três semanas depois da entrada do canário em minha casa, pedi-lhe que me repetisse a definição do mundo.

        — O mundo, respondeu ele, é um jardim assaz largo com repuxo no meio, flores e arbustos, alguma grama, ar claro e um pouco de azul por cima; o canário, dono do mundo, habita uma gaiola vasta, branca e circular, donde mira o resto. Tudo o mais é ilusão e mentira.

        Também a linguagem sofreu algumas retificações, e certas conclusões, que me tinham parecido simples, vi que eram temerárias. Não podia ainda escrever a memória que havia de mandar ao Museu Nacional, ao Instituto Histórico e às universidades alemãs, não porque faltasse matéria, mas para acumular primeiro todas as observações e ratificá-las. Nos últimos dias, não saía de casa, não respondia a cartas, não quis saber de amigos nem parentes. Todo eu era canário. De manhã, um dos criados tinha a seu cargo limpar a gaiola e pôr lhe água e comida. O passarinho não lhe dizia nada, como se soubesse que a esse homem faltava qualquer preparo científico. Também o serviço era o mais sumário do mundo; o criado não era amador de pássaros.

        Um sábado amanheci enfermo, a cabeça e a espinha doíam-me. O médico ordenou absoluto repouso; era excesso de estudo, não devia ler nem pensar, não devia saber sequer o que se passava na cidade e no mundo. Assim fiquei cinco dias; no sexto levantei-me, e só então soube que o canário, estando o criado a tratar dele, fugira da gaiola. O meu primeiro gesto foi para esganar o criado; a indignação sufocou-me, caí na cadeira, sem voz, tonto. O culpado defendeu-se, jurou que tivera cuidado, o passarinho é que fugira por astuto...

        — Mas não o procuraram?

        — Procuramos, sim, senhor; a princípio trepou ao telhado, trepei também, ele fugiu, foi para uma árvore, depois escondeu-se não sei onde. Tenho indagado desde ontem, perguntei aos vizinhos, aos chacareiros, ninguém sabe nada.

        Padeci muito; felizmente, a fadiga estava passada, e com algumas horas pude sair à varanda e ao jardim. Nem sombra de canário. Indaguei, corri, anunciei, e nada. Tinha já recolhido as notas para compor a memória, ainda que truncada e incompleta, quando me sucedeu visitar um amigo, que ocupa uma das mais belas e grandes chácaras dos arrabaldes. Passeávamos nela antes de jantar, quando ouvi trilar esta pergunta:

        — Viva, Sr. Macedo, por onde tem andado que desapareceu?

        Era o canário; estava no galho de uma árvore. Imaginem como fiquei, e o que lhe disse. O meu amigo cuidou que eu estivesse dou do; mas que me importavam cuidados de amigos? Falei ao canário com ternura, pedi-lhe que viesse continuar a conversação, naquele nosso mundo composto de um jardim e repuxo, varanda e gaiola branca e circular...

        — Que jardim? que repuxo?

        — O mundo, meu querido.

        — Que mundo? Tu não perdes os maus costumes de professor.

        O mundo, concluiu solenemente, é um espaço infinito e azul, com o sol por cima.

        Indignado, retorqui-lhe que, se eu lhe desse crédito, o mundo era tudo; até já fora uma loja de belchior...

        — De belchior? trilou ele às bandeiras despregadas. Mas há mesmo lojas de belchior?

Machado de Assis.

Entendendo o conto:

01 – Qual é o nome do protagonista do conto?

      O protagonista do conto é Macedo.

02 – Onde Macedo se refugia após quase ser atropelado por um tílburi?

      Macedo se refugia em uma loja de belchior.

03 – Como é descrito o dono da loja de belchior?

      O dono da loja de belchior é descrito como um homem franzino, de barba cor de palha suja, usando um gorro esfarrapado.

04 – Qual objeto chama a atenção de Macedo na loja?

      Uma gaiola com um canário dentro chama a atenção de Macedo na loja.

05 – O que Macedo murmura ao ver o canário na gaiola?

      Macedo murmura palavras de azedume, expressando sua indignação pelo destino do pássaro.

06 – Como o canário responde a Macedo quando este o questiona sobre seu passado?

      O canário nega ter sido vendido por um dono execrável ou dado a um menino, afirmando que tais ideias são fruto da imaginação de uma pessoa doente.

07 – Como o canário descreve o mundo?

      O canário descreve o mundo como um jardim espaçoso com um repuxo no meio, flores, arbustos, grama, ar claro e um pouco de azul por cima. Ele afirma que o canário é o dono desse mundo.

08 – O que acontece com o canário na narrativa?

      O canário foge de sua gaiola na casa de Macedo.

09 – Como o canário responde quando Macedo tenta convencê-lo de que o mundo é mais do que ele descreve?

      O canário trila que o mundo é um espaço infinito e azul com o sol por cima, rejeitando a descrição de Macedo sobre o mundo.

 

 

CONTO: NAS ASAS DO CONDOR - MILTON HATOUM - COM GABARITO

 Conto: Nas asas do condor

            Milton Hatoum

        Quase morri de medo nas asas do Condor. Voei, voei muito alto, mas a verdade é que renasci...

        -- Quando?

        Faz muito tempo, mas me lembro do dia, mês e ano: 7 de setembro de 1958. Lembro-me também do lugar, pois há lugares da infância que ficam bem guardados na memória. Naquela época, na manhã do dia da Independência, eu estava na beira do rio Xapuri, lá no Acre, brincando com meus amigos... Nós cavávamos buracos na areia a fim de encontrar ovos de tracajá. Em cada buraco havia dezenas de ovos que as nossas mãos transformavam em pequenas pirâmides e colinas brancas... Suávamos sob o calor inclemente, e, de vez em quando, a gente mergulhava no rio, nadava e voltava para a praia à procura de ovos... Quando terminei de construir a terceira pirâmide, tive minha primeira crise de asma. Senti falta de ar, e abri a boca para tentar respirar...

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi8vlV3A8umUmFar7z6fmX5eJW-8aWGnGQKz4ROlYCuDq_DbzpSx6iN30I5cYf3R-7JfWVMQVD9Xny10aJlM9TAONHzN4eTBHfvRVd-OwEtMdMmEJc2bcsOnCWC5LG7SoFPbSxN7wJAwl1jVh3aS5UBUXlzn2dQDph0RvoBYudBg1n0ANUTKTUCyiYXeLc/s1600/ASAS%20DO%20CONDOR.jpg


        Não há nada pior do que sentir falta de ar, porque, sem ar, eu, você e o mundo inteiro não podemos viver. Meus amigos, assustados, correram à minha casa e viram minha tia Leila limpando um peixe na varanda. Apontaram para a beira do rio e um deles disse que meu rosto estava estufado e vermelho. Tia Leila, a mais dramática de minhas tias, pensou que eu tinha me afogado no rio e correu para avisar a minha mãe, que correu para o rio e entrou nas águas do Xapuri. Estava tão nervosa que não me viu na beira do rio e, é claro, não me veria nas águas do rio. Quando voltou para a praia, seu vestido azul colado no corpo e seus cabelos longos escorridos lhe davam um ar engraçado. Assim, vi minha mãe e tive vontade de rir, mas, se eu mal conseguia respirar, imagine se podia rir.
Minha mãe, atônita, correu para avisar a meu pai e, no meio do caminho, ela se lembrou de que meu pai não estava em casa, nem na cidade. Meu pai estava viajando num barco. Ele descia e subia o rio Acre, vendendo tecidos e roupas ou trocando tecidos e roupas por pelas de borracha e sacos de castanha. Nossa casa ficava na praça Plácido de Castro, a menos de cem metros da prefeitura da cidade.
Minha mãe se lembrou de que havia um médico em Xapuri, o doutor Monte, um médico de Rio Branco que a cada dois meses visitava a cidade. Mas o doutor Monte tinha ido atender a um doente em Brasiléia, lá na fronteira com a Bolívia. Então, apavorada, ela se dirigiu à prefeitura, pois o prefeito era primo de meu pai. O prefeito correu para a praia e me viu estendido na areia, cercado por pirâmides e colinas de ovos de tracajá. Meu rosto devia estar vermelho que nem melancia, porque o prefeito olhou para mim e disse:

        -- Por Deus, o menino tá sufocado!

        Ele olhou para o céu e disse para minha mãe e tia Leila:

        -- Fiquem aqui, eu vou cuidar desse menino.

        Ele me pegou pelos braços. Carregou-me como se eu fosse um boneco de pano e me levou até o carro dele, um Ford velho e enferrujado que nunca saía da cidade, porque não havia estrada de Xapuri a nenhum lugar, nem de nenhum lugar a Xapuri.
Mas havia uma estrada de barro que cortava a floresta e terminava numa pista de cascalho que devia ter uns duzentos metros.
Não sabia para onde o prefeito me levava. Então eu ouvi a voz dele:

        -- Lá está ele, lá está o bonitão!

        E quem era ele, o bonitão?

        O Condor...

        Nos braços do prefeito eu entrei no Condor. Era um avião verde e prateado, um bimotor alemão que passava por Xapuri a cada quinze dias e fazia uma viagem impressionante para São Paulo.
O Condor escalava em seis cidades (duas da Bolívia e quatro do Brasil) antes de aterrizar na capital paulista. O prefeito, que sabia pilotar, disse ao dono do Condor que ia dar uma volta comigo. Além da falta de ar, comecei a sentir medo. Nunca viajara de avião, e agora estava numa aviãozinho que parecia um sapo metálico. Tremia de medo, e, com medo e falta de ar, sentado na cabina, percebi que o avião corria na pista de cascalho. Fechei os olhos...

        Minha primeira aventura: voar com falta de ar aos 10 anos de idade. Quando abri os olhos, a cidade parecia uma maquete, uma cidade de brinquedo. Vi os dois rios, o Acre e o Xapuri, como se fossem duas cobras amarelas. O Condor ainda chacoalhava, o barulho dos motores era infernal e o vento que entrava pela janelinha da cabina tinha a força de um furacão. Aos poucos, fui me acostumando com aquela ideia louca de voar. Estava nervoso, mas no ar. Era um milagre... e também uma alegria, pois navegando no espaço, não sei por que comecei a respirar melhor...
Já não sentia a angústia de estar perdendo o fôlego, de abocanhar em vão um punhado de ar.

        Voltava a ser como você, que respira pelo nariz, normalmente, sem ânsia, sem sufoco. O prefeito-piloto, ao notar minha melhora, sorriu. Logo depois ele riu e disse:

        -- Agora vamos conhecer as nuvens.

        Ele puxou um pouquinho o manche, o Condor começou a subir, subir... E subimos tanto que entramos nas nuvens, essas nuvens que lá de baixo parecem enormes blocos de mármore, que nem esculturas aéreas flutuando no céu azul da Amazônia.
Nuvens de todos os tamanhos e formas: nuvem-dragão, nuvem-serpente, nuvem-tartaruga, nuvens que são formas do céu da minha infância. Depois começamos a baixar, e sobrevoamos o rio Acre, sinuoso, barrento, como uma cobra-d'água sem fim. Vi um barquinho navegando perto de uma vila, imaginei que podia ser o barco de meu pai e dei um adeus na janelinha da cabina. Depois o Condor baixou ainda mais. O piloto apontou para uma árvore e disse: uma sumaumeira. Outras árvores: a castanheira, a seringueira, árvores enormes que eu via do alto. No meio da floresta, vi uma cortina esverdeada, com tons de amarelo. O piloto me disse que era um bambuzal.

        Vi o barracão de um seringal, o Soledad, e canoas que pareciam de papel pardo, pequeninas e frágeis. Em 20 de voo vi coisas que só podia imaginar.

        Hoje, quase 40 anos depois desse voo, penso que escrever uma história se parece com isso: voar, ver o que nunca vimos... imaginar.

        Aterrissamos na pista de cascalho. No galpãozinho à beira da pista, minha mãe e tia Leila estavam ao lado do dono do avião.
Minha mãe xingou o prefeito-piloto de louco e irresponsável; tia Leila, de cara emburrada, mal falou com ele. Mas, quando me viram são e salvo, respirando como uma criança sadia, ficaram aliviadas.

        Olhei para o avião na pista, e me despedi daquele sapo metálico que me havia curado. Enfim, agradeci aos céus, mas nunca perdi o medo de voar. Anos depois, iria voar muito, e em aviões ainda menores que o Condor. Mas aquele voo foi inesquecível.

        Até hoje me lembro daquela manhã em que voei no Condor e vi lá do alto o mundo da minha infância.

Fonte: Era uma vez um conto. São Paulo: Companhia das Letrinhas, 2002.

Entendendo o conto:

01 – Qual foi a data em que o protagonista teve sua primeira experiência de voar no Condor?

      A primeira experiência de voar no Condor ocorreu em 7 de setembro de 1958.

02 – Onde o protagonista estava quando teve sua primeira crise de asma?

      O protagonista estava na beira do rio Xapuri, no Acre, brincando com seus amigos.

03 – Como o prefeito de Xapuri reagiu quando viu o protagonista com falta de ar na praia?

      O prefeito ficou preocupado e disse: "Por Deus, o menino tá sufocado!"

04 – Por que o protagonista foi levado para o avião Condor?

      O prefeito, que sabia pilotar o avião, decidiu dar uma volta com o protagonista para ajudá-lo a respirar melhor.

05 – Como o protagonista se sentiu durante sua primeira experiência de voo no Condor?

      Inicialmente, o protagonista sentiu medo e falta de ar, mas gradualmente se acostumou com a ideia de voar e começou a respirar melhor.

06 – O que o prefeito-piloto disse ao protagonista quando o avião entrou nas nuvens?

      O piloto disse: "Agora vamos conhecer as nuvens."

07 – O que o protagonista viu quando sobrevoou a floresta na aeronave Condor?

      O protagonista viu várias árvores, incluindo sumaumeira, castanheira, seringueira e um bambuzal.

08 – Como o protagonista descreve a sensação de escrever uma história no final do conto?

      O protagonista compara a sensação de escrever uma história a voar e ver coisas que nunca viu, a uma experiência de imaginação.

09 – Como a mãe do protagonista reagiu quando o viu a salvo após o voo?

      A mãe do protagonista xingou o prefeito-piloto de louco e irresponsável, mas ficou aliviada ao ver o protagonista são e salvo.

10 – O que o protagonista agradeceu no final do conto?

      O protagonista agradeceu aos céus pela experiência de voar no Condor que o havia curado, mas ele nunca perdeu o medo de voar.

 

ARTIGO DE OPINIÃO: NA TRASEIRA DO CAMINHÃO - DRAUZIO VARELLA - COM GABARITO

 Artigo: NA TRASEIRA DO CAMINHÃO

          Drauzio Varella

        Na minha infância era moda na minha rua chocar caminhão: pendurar-se na traseira do veículo e saltar na virada da esquina. Veja artigo do dr. Drauzio.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj6e3oDYVQRqVK0UG__yyQysviVteIl2brff5XWzRM4yDn-oDentm4VDsLu1WM8efi3_tN0TV2-ty_hXGG6ICt7LTSCQ0lIO2VPnZsC7Zs-KnqWHrOjTq-6pM_zdVmufP2ZRb2MAy2P44yrzIFUbHYt71ccaaHKRRvZkIvyZUjBZFY_uLgrDfiI2tVPOuU/s1600/TRASEIRA.jpg


        Quando eu tinha 7, 8 anos, virou moda na minha rua chocar caminhão: pendurar-se na traseira do veículo e saltar na virada da esquina. Uma vez, choquei o caminhão de lixo e quando pulei na frente de casa, meu pai, que chegava do trabalho, estava parado no portão com cara de quem não gostou da gracinha. Recebi o mais detestável dos castigos: domingo inteiro de pijama na cama.

        Cabeça-dura, repeti a façanha outras vezes, até que decidi chocar a caminhonete do seu Germano, o alemão da fábrica em frente, só para me exibir para os meninos, que morriam de medo dele. Sentei na calçada ao lado da caminhonete. Dois operários puseram umas caixas na carroceria. Seu Germano, saindo para o almoço, deu a partida. Eu pendurado atrás. Infelizmente, na esquina, em vez de diminuir a velocidade ele acelerou, e me faltou coragem para pular.

        Fomos na direção do largo Santo Antônio, cada vez mais depressa, eu com os ossos batendo na lataria, morto de medo de cair. Ao chegar no largo, duas senhoras me viram naquela velocidade e gritaram para parar. Seu Germano nem ouviu. Com os braços cansados, fiz um esforço para saltar para dentro da carroceria, mas a caminhonete pulava feito cavalo bravo nos paralelepípedos da rua e eu não consegui. Tentei de novo e não deu. Mais uma vez, pior ainda. Então, fiquei apavorado. Achei que ia morrer e que meu pai ia ficar muito triste, porque ele sempre dizia: “Deus me livre, perder um de vocês”.

        Talvez o medo da morte tenha me dado força na quarta tentativa: esfolei a canela inteira, mas consegui passar a perna e impulsionar o corpo para dentro. Caí no meio das caixas, com o coração disparado, e chorei. Quando a caminhonete parou na porta do seu Germano, achei melhor ficar quietinho entre as caixas, até ele voltar para a fábrica depois do almoço. Também não deu certo: ele resolveu descarregar a caminhonete e me encontrou escondido. Tomou um susto tão grande que até pulou para trás:

        — Menino dos infernos! Como veio parar aqui?

        No caminho, ele me deu conselhos e me contou do pai. Achei que os castigos do pai dele eram muito piores. O meu nunca tinha me trancado no guarda-roupa a noite inteira.

        Expliquei que só queria chocar até a esquina, mas a velocidade tinha sido tanta… Ele ficou enfezado e disse que ia contar para o meu pai. Pedi para não fazer isso porque eu ia apanhar, mas ele não se importou, falou que era merecido até. Mostrei as pernas esfoladas, ele não se comoveu. Por fim, contei dos domingos de castigo na cama. Nesse momento, brilhou um instante de compaixão no olhar dele:

        — Seu pai deixa você de pijama, deitado o domingo inteiro?

        — Só quando eu desobedeço muito.

        — Está louco! Teu pai é severo como o meu, na Alemanha. Entre na caminhonete que eu te levo de volta.

        No caminho, ele me deu conselhos e me contou do pai. Achei que os castigos do pai dele eram muito piores. O meu nunca tinha me trancado no guarda-roupa a noite inteira. Seu Germano concordou em manter segredo, desde que eu prometesse nunca mais chocar veículo nenhum. Desde então, apesar do jeito bravo, ele ficou meu amigo. Quando me encontrava, às vezes dizia:

        — Não vá esquecer: menino que cumpre a palavra merece respeito.

Drauzio Varella. 16 de maio de 2011. Revisado em 6 de março de 2018.

Entendendo o artigo:

01 – O que o autor fazia na sua infância que era moda na sua rua?

      Na sua infância, o autor costumava pendurar-se na traseira de caminhões e saltar na virada da esquina.

02 – Qual foi a reação do pai do autor quando ele chocou o caminhão de lixo?

      O pai do autor não gostou da gracinha e o castigou com um domingo inteiro de pijama na cama.

03 – Por que o autor decidiu chocar a caminhonete de seu Germano?

      O autor decidiu chocar a caminhonete de seu Germano para se exibir para os meninos que tinham medo dele.

04 – O que aconteceu quando o autor tentou pular da caminhonete do seu Germano na esquina?

      Na tentativa de pular da caminhonete do seu Germano na esquina, o autor não conseguiu devido à velocidade do veículo e ao medo de cair.

05 – Por que o autor ficou apavorado durante essa experiência?

      O autor ficou apavorado porque pensou que poderia morrer e que seu pai ficaria triste, já que costumava dizer: "Deus me livre, perder um de vocês".

06 – Qual foi a reação de seu Germano ao encontrar o autor na caminhonete?

      Seu Germano ficou surpreso e chocado ao encontrar o autor na caminhonete e afirmou: "Menino dos infernos! Como veio parar aqui?"

07 – Como a relação entre o autor e seu Germano mudou após esse incidente?

      Apesar do susto inicial, seu Germano concordou em manter segredo e se tornou amigo do autor, aconselhando-o a cumprir sua palavra e a não chocar mais veículos.