Poesia: Passagem das horas – Fragmento
Álvaro de Campos
[...]
Multipliquei-me, para me
sentir,
Para me sentir, precisei
sentir tudo,
Transbordei, não fiz senão
extravasar-me,
Despi-me, entreguei-me,
E há em cada canto da minha
alma um altar a um deus diferente.
[...]

Cavalgada explosiva,
explodida, como uma bomba que rebenta,
Cavalgada rebentando para
todos os lados ao mesmo tempo,
Cavalgada por cima do espaço,
salto por cima do tempo,
Galga, cavalo eléctron-íon,
sistema solar resumido
Por dentro da ação dos
êmbolos, por fora do giro dos volantes.
Dentro dos êmbolos, tornado
velocidade abstrata e louca,
Ajo a ferro e velocidade,
vaivém, loucura, raiva contida,
Atado ao rasto de todos os
volantes giro assombrosas horas,
E todo o universo range,
estraleja e estropia-se em mim.
[...]
In: Fernando Pessoa.
Obra poética. Rio de Janeiro, Nova Aguilar, 1986.
Fonte: Português –
Novas Palavras – Ensino Médio – Emília Amaral; Mauro Ferreira; Ricardo Leite;
Severino Antônio – Vol. Único – FTD – São Paulo – 2ª edição. 2003. p. 271.
Entendendo a poesia:
01 – Qual é a principal
característica do eu lírico expressa no poema?
O eu lírico se
apresenta como uma figura que busca a totalidade da experiência,
multiplicando-se para sentir tudo. Ele transborda, se entrega e se torna um
receptáculo para diversas experiências, como expresso na metáfora dos altares
para diferentes deuses em sua alma.
02 – Como o poema descreve a
passagem do tempo e a sensação de velocidade?
A passagem do
tempo é descrita como uma "cavalgada explosiva, explodida", uma
imagem de movimento intenso e fragmentado. A velocidade é comparada a um
"cavalo eléctron-íon", uma metáfora que une elementos da modernidade
(eletricidade, íons) com a ideia de um sistema solar resumido, sugerindo uma
velocidade cósmica e incontrolável.
03 – Qual é a relação entre o
eu lírico e a máquina no poema?
O eu lírico se
funde com a máquina, incorporando seu ritmo e sua energia. Ele se vê
"dentro da ação dos êmbolos, por fora do giro dos volantes",
participando ativamente do movimento da máquina e transformando-se em
"velocidade abstrata e louca".
04 – Qual é a sensação final
do eu lírico em relação ao universo?
O eu lírico sente
que o universo inteiro "range, estraleja e estropia-se" dentro dele.
Essa imagem sugere uma experiência intensa e caótica, na qual o eu lírico se
torna o centro de um universo em constante transformação e destruição.
05 – Quais são as características
estilísticas marcantes do poema?
O poema apresenta
características típicas do Modernismo, como a valorização da velocidade, da
máquina e da fragmentação da experiência. A linguagem é rica em metáforas e
imagens fortes, que expressam a intensidade das sensações do eu lírico. O poema
também apresenta versos livres e uma estrutura fragmentada, que contribuem para
a sensação de caos e movimento constante.
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