terça-feira, 30 de abril de 2024

CRÔNICA: VÍTIMA DAS EMBALAGENS - WALCYR CARRASCO - COM GABARITO

 Crônica: Vítima das Embalagens

                 Walcyr Carrasco

 Entro no chuveiro. Relaxo na água quentinha. Pego o xampu. É novo. Tento virar a tampa. Não cede. Aproximo meus olhos míopes. Está envolta em um plástico duro, transparente. Puxo. Minhas unhas curtas resvalam. A batalha demora alguns instantes. Minhas investidas não produzem resultado algum. Tenho cabelos oleosos. Sem um bom xampu, fico tão charmoso quanto um tapete de pele de carneiro. Ataco a tampa a mordidas. Meus dentes rangem. Mal arranco uma lasquinha. O xampu cai da minha mão. Abaixo-me. Tropeço. Caio sentado. O frasco continua invicto.

Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgn2BnLNAuonn2soRgBl5AuR-fwsba7VSZdhiAJhARbtxUCpc6AyZ5mpN3KFfmBefhS_rnO4N1KxFxxhpJb7PDKT3VmnBojrSMIksSJPwLVeVfc-kfsefZXFV2CrnomUz-YzX_LabnnboY7jns404-LmVXpe4pp0BmDdIyTYKH8RAHOC7_fOGOJjz3bZrI/s1600/CHAVINHA.jpg


Recentemente, também fui vítima de uma lata de patê de fígado. Era daquele tipo que vem com uma chavinha. O segredo é enrolar a chavinha bem devagar em torno do topo, até que a parte de cima se solte. Teoricamente. Como sempre, fiquei com a chavinha inútil numa mão e a lata fechada na outra. Os amigos bebiam cerveja na sala. Quis enfiar a chavinha de novo. Impossível. Tentei com o abridor. Não havia ângulo para apoiar. Peguei uma faca e um martelo. Fui esfaqueando a lata pela parte de cima. Cavava um buraco, em seguida outro do lado, e assim por diante. Quando achei que dava, puxei. Abri.

Mas a lata, cheia de pontas metálicas, bateu na minha mão.

Espalhei patê pelo piso. Eu me cortei. Um cortezinho ridículo, mas corte. Os amigos vieram correndo. Falaram em tétano e pronto-socorro. Jurei nunca mais comprar patê de fígado com chavinha. -

Frascos, latas e semelhantes levam qualquer ser humano à beira da loucura. Remédios e vitaminas são hors-concours. Só provam uma coisa: quem conseguir abrir está perfeitamente saudável. As aspirinas têm vindo com uma tampa na qual há uma setinha minúscula em relevo. A tal setinha tem de encaixar com outra marquinha. Algo tão minucioso quanto abrir um cofre sem o segredo. Para quem está estalando de dor de cabeça, uma delícia. Alguns sucos vêm em embalagens de papelão com um recorte picotado. "Aperte aqui", diz um aviso. Aperto e não acontece nada. Depois de inúmeras tentativas, arrebento o papelão no lugar errado. O suco esguicha para o copo pelo lado. Um horror.

Engoli derrotas até de embalagens de produtos de limpeza. Algumas vêm com uma tampa simples. Aberta, descobre-se uma nova tampa. O lugar onde devia haver um furinho está tapado com plástico resistente. Tudo bem. E uma medida natural do fabricante para impedir que o detergente alague o caminhão de entrega. Mas a tampa é planejada numa medida tal que nada consegue fazer o furinho. A ponta das facas não penetra. Nem a da tesoura de cozinha. Tento com um garfo. A dimensão é perfeita. Quase consigo. Empurro um dente do garfo no plástico. Entorta para o lado, mas não faz o furinho. Fico com o garfo destruído e a embalagem fechada. Paro alguns segundos. Tomo um café. Cravo chaves de fenda de tamanhos variados. Nenhuma serve. Lembro-me do abridor de vinhos. Tenho um superchique, de design italiano, que reservo para os dias de visita. Quase acabo com o abridor, mas consigo. Furinho feito, vou lavar os pratos. Espremo a embalagem e o produto sai por todos os lados. As várias tentativas criaram pequenas aberturas. Espirra até no armário da cozinha. Minha orelha fica cheia de detergente.

Estou consciente de que os fabricantes têm sólidas razões para me torturar dessa maneira. Proteger o produto é uma delas. Impedir que crianças abram frascos indevidos é outra. Nesse último caso, trata-se de pura ilusão. Petiscos em saquinhos metálicos indevassáveis e bugigangas eletrônicas treinaram a meninada. Para minha humilhação, qualquer garotinho abre uma embalagem complexa em segundos. Eu me sinto como se fosse um alienígena, ainda não adaptado para conviver com os progressos da civilização. Tenho saudade das embalagens do passado. Quando bastava um pouco de firmeza para torcer tampas ou usar o abridor de latas. Força, só para estourar a rolha da garrafa de champanhe. Mas, aí, sempre valia a pena, por conta da comemoração.

Entendendo o texto

01. O que o autor faz ao entrar no chuveiro e tentar usar o novo xampu?

a. Ele escorrega no chão molhado.

b. Ele consegue abrir facilmente a embalagem.

c. Ele luta para remover o plástico que envolve a tampa.

d. Ele decide tomar um banho quente.

   02. Qual foi o resultado da tentativa do autor de abrir uma lata de patê de fígado com uma chavinha?

         a. Ele conseguiu abrir facilmente.

         b. Ele derramou o patê no chão.

         c. Ele cortou a mão.

         d. Ele compartilhou o patê com os amigos.

   03. Qual é a conclusão irônica do autor sobre frascos, latas e embalagens?

        a. Eles são muito fáceis de abrir.

        b. Eles indicam a saúde do consumidor.

        c. Eles são projetados para serem resistentes.

        d. Eles revelam a habilidade manual das pessoas.

   04. Que dificuldade o autor enfrenta ao tentar abrir embalagens de remédios e vitaminas?

         a. As embalagens têm uma seta minúscula que precisa ser alinhada.

          b. As embalagens estão seladas com plástico resistente.

          c. As embalagens exigem uma força excessiva para abrir.

          d. As embalagens têm instruções confusas.

     05. Qual é a experiência frustrante do autor ao tentar abrir embalagens de suco em papelão?

          a. Ele acaba rasgando o papelão no lugar errado.

          b. Ele não consegue encontrar o local para apertar.

          c. Ele derrama o suco fora do copo.

          d. Ele engole o suco acidentalmente.

      06. Por que o autor enfrenta dificuldades ao abrir embalagens de produtos de limpeza?

          a. As embalagens são muito grandes.

          b. As tampas estão seladas com plástico resistente.

          c. As embalagens estão danificadas.

          d. As embalagens são muito leves.

      07. Qual é o motivo citado pelo autor para a complexidade das embalagens?

          a. Proteger o produto.

          b. Facilitar a abertura para crianças.

          c. Impedir o uso indevido do produto.

          d. Atender às necessidades dos adultos.

        08. Como o autor se sente em relação à habilidade das crianças em abrir embalagens complexas?

       a. Surpreso.

       b. Orgulhoso.

       c.  Humilhado.

       d.  Aliviado.

     09. O que o autor expressa sentir falta no final da crônica?

       a. Embalagens modernas.

       b. Rolhas de garrafas de champanhe.

       c. Comemorações especiais.

       d.  Embalagens simples do passado.

   10. Qual é a mensagem principal transmitida pelo autor na crônica "Vítima das Embalagens"?

       a. A necessidade de inovação nas embalagens.

       b. O desejo de preservar as tradições antigas.

      c. A frustração causada por embalagens modernas complexas.

      d. A importância de cuidar da saúde ao consumir produtos.

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