ARTIGO DE OPINIÃO: UM ARGUMENTO CÍNICO
João Batista Villela
Certamente nunca terá faltado aos sonegadores de todos os tempos e lugares o confortável pretexto de que o seu dinheiro não deve ir parar nas mãos de administradores incompetentes e desonestos. Como pretexto, a invocação é insuperável e tem mesmo a cor e os traços do mais acendrado civismo. Como argumento,
no entanto, é cínica e improcedente. Cínica porque a sonegação, que nesse caso se pratica, não é compensada por
qualquer sacrifício ou contribuição que atenda à necessidade de recursos imanente a todos os
erários, sejam eles bem ou mal administrados. Ora, sem recursos obtidos da
comunidade não há policiamento, não há escolas ou hospitais. E sem serviços públicos essenciais, não há Estado e não pode haver sociedade
política. Improcedentes porque a sonegação, longe de fazer melhores os maus
governos, estimula-os à prepotência e ao arbítrio, além de agravar a carga tributária dos que não querem e dos que, mesmo querendo, não têm como dela fugir –
os que vivem de salário, por exemplo. Antes, é preciso pagar, até mesmo para que não faltem legitimidade e força moral às denúncias de malversação. É muito cômodo, mas não deixa de ser, no fundo, uma hipocrisia, reclamar
contra o mau dos dinheiros
públicos para cuja formação não tenhamos colaborado. Ou não tenhamos colaborado
na proporção da nossa renda.
VILLELA, João Batista. Veja, 25 set. 1985 (in. Platão & Fiorin, 2003).
Entendendo o texto
01.O
conectivo no entanto, no
terceiro período do texto, tem a função de:
a. Introduzir uma
argumentação contrária, dizendo que a justificativa é cínica e improcedente.
b. Admitir
como pretexto a justificativa dos sonegadores.
c. Dar
início a uma argumentação contrária à ideia de que o Estado possa sobreviver
sem arrecadar impostos e sem se prover de recursos.
d. Dizer a
causa pela qual considera cínico o argumento dos sonegadores.
e. Admitir
como pretexto a justificativa dos sonegadores.
02.Assinale
a alternativa CORRETA de acordo com
a leitura do texto:
a) Os sonegadores de impostos não os pagam
sob a alegação de que os administradores do dinheiro público são competentes e
honestos.
b) O argumento utilizado pelos sonegadores de
impostos é desautorizado ao ser considerado um confortável pretexto para eles.
c) A justificativa para sonegar impostos é
procedente porque a sonegação contribui para melhorar os maus governos,
estimulando-os à prepotência e ao arbítrio.
d) Nenhuma das alternativas.
03. No contexto do período, o termo ―”imanente” é sinônimo de:
a)
Intrínseco.
b)
Obrigatório.
c)
Análogo.
d)
Nenhuma das alternativas.
04.O autor do texto procura derrubar um
argumento.
a) Qual ideia se está querendo derrubar no texto acima? Quem possui
tal ideia a ser derrubada?
A ideia de
que o dinheiro dos impostos não deve ir parar nas mãos de administradores
incompetentes e desonestos.
Os sonegadores possuem tal ideia.
b) Separando o texto por períodos, observaremos que:
1º período: expõe o argumento usado pelos sonegadores. Por seleção lexical, o
autor do texto mostra-se contrário a tal argumento ao usar a expressão
“confortável pretexto”, isto é, uma falsa justificativa utilizada em proveito
próprio;
2º período: o enunciador admite a força do argumento e a sua aparência de elevado espírito cívico.
3º período: coesão por conexão - o conectivo "no entanto" (adversativo) inicia uma argumentação contrária ao exposto no período anterior. Os adjetivos em seguida confirmam o teor negativo da informação.
4º período: coesão por conexão - o conectivo "porque" indica a causa pela qual considera o argumento cínico.
5º período: o conectivo “Ora” confirma a ideia contrária anterior, introduzindo ideia conclusiva a respeito;
6º período: o conectivo “e” adiciona, reforça o argumento introduzido pela palavra “Ora” anteriormente;
7º período: após mostrar que o argumento é cínico (pesquisar no dicionário o que significa “cínico”), agora o autor vai demonstrar porque ele é improcedente (sendo coerente com a sequência de ideias expostas acima). A conjunção causal “porque” inicia a afirmação ao mostrar o motivo: a sonegação, ao invés de contribuir para melhorar os maus governos, estimula-os à prepotência e ao arbítrio. o conectivo “além de” introduz mais um argumento a favor da improcedência: o agravamento da carga tributária sobre os assalariados que não têm como fugir dela;
8º período: o conectivo “Antes” (sinônimo de “ao contrário”) introduz um argumento a favor do pagamento de impostos. “Até mesmo” inicia argumento que reforça essa ideia;
9º período: o conectivo “mas” relaciona duas ideias, mostrando contrariedade: é muito cômodo reclamar contra o mau uso do dinheiro público x isso é hipocrisia quando não se colaborou com a arrecadação desse dinheiro;
10º período: o conectivo “ou” introduz alternativa ao raciocínio hipócrita,
indicando contribuição abaixo daquilo que deveria ser.