domingo, 27 de novembro de 2022

FRAGMENTO DO LIVRO: O MISTÉRIO DO 5 ESTRELAS - MARCOS REY - COM GABARITO

 FRAGMENTO DO LIVRO: O MISTÉRIO DO 5 ESTRELAS

                                            Marcos Rey

                                    O 222

        Leo apertou a campainha do 222, recebera um chamado. Logo se abria um palmo de porta mostrando a cara e o sorriso largo do Barão. Embrulhado num robe azulão, ele parecia ainda mais gordo, mole e displicente.

        — Me traga os jornais de sempre — pediu o hóspede passando ao bellboy uma nota amassada.

        — Esse dinheiro não vai dar, senhor.

        — Tem razão. Um momento.

        Quando abriu o guarda-roupa para apanhar a carteira, Leo viu pelo espelho interno do móvel que o Barão tinha companhia: um homem pequeno, com pinta de índio vestindo roupas civilizadas, lavava concentradamente as mãos na pia do banheiro. Devia ser uma daquelas muitas pessoas que o Barão ajudava, pensou o rapaz.

         O volumoso hóspede do 222 demorava para encontrar a carteira nos bolsos de seus paletós, enquanto o bellboy aspirava vários cheiros do apartamento: o de charutos já fumados e amanhecidos, um mais agradável de lavanda e ainda outro de maçã, sempre vendo pelo espelho o tal homenzinho a lavar as mãos e a enxugá-las em toalhas de papel que ia jogando numa cesta. Depois, com o súbito receio de ser visto pelo espelho do guarda-roupa, fechou a porta do banheiro com uma cotovelada.

         Afinal o Barão reapareceu com mais dinheiro e um novo sorriso.

          — O troco é seu, meu filho. Leo disparou pelos corredores acarpetados do Emperor Park Hotel, esperou e apanhou o elevador e passou pela portaria. Novato ainda no emprego provava com a velocidade das pernas seu interesse pelo trabalho. À entrada do edifício, em seu belo uniforme branco com debruns dourados, viu o Guima (Guimarães), o porteiro, antigo amigo de sua família, a quem devia o salário, aquelas gorjetas todas e a nova profissão.  

          Ao entrar pela primeira vez com o Guima, há dois meses, no imenso e rico saguão do Park, como o chamavam simplesmente os funcionários, Leo ficou deslumbrado. No seu mundo da Bela Vista, o bairro do Bexiga, onde nascera e morava, jamais pisara num ambiente tão bonito, moderno e fofo. "Isso que é um cinco estrelas", explicou o porteiro com orgulho de proprietário. "Mas o que é um cinco estrelas?" Guima olhou-o como se sua ignorância lhe fizesse pena e disse que a qualidade dos hotéis é medida pela quantidade de estrelas que ostenta. Cinco é o máximo, só para estabelecimentos de nível internacional.

         Era uma sexta-feira; na segunda, já fardado e registrado, Leo começava a trabalhar no Emperor Park Hotel como bellboy, mensageiro, das 8 às 18 horas, quando voltava para casa, jantava às pressas e corria para a escola noturna. O horário era puxado e o serviço de cansar as pernas, mas as gratificações compensavam. Recebia gorjetas inclusive em dinheiro estrangeiro. Logo conheceu a cor do dólar, da libra, do peso, do franco, da peseta, que trocava por cruzeiros lá mesmo na casa de câmbio do Park.

         Leo precisou de um mês para percorrer os vinte e tantos andares do hotel, sem contar os subterrâneos destinados às garagens, lavanderia, depósito de gêneros alimentícios, adega, almoxarifados, um labirinto frio e deserto em muitas horas do dia.

        Não era, porém, no proletário subsolo que o rapaz da Bela Vista encontrava satisfações e interesses. Gostava de vagar pelo saguão, sempre cheio de hóspedes que chegavam ou partiam, numa confusão de malas, rótulos e idiomas, de espiar a piscina, no quarto andar, com suas águas muito cloradas, dum verde para ricos, o restaurante, com seus odores caprichados, a luxuosa boate, o imponente salão de convenções, o tropical garden, pequena floresta onde serviam gelados e sanduíches, a sauna, que vendia calor e fumaça, a quadra de shopping, com suas lojas sofisticadas, e no alto, lá em cima, o belo bar-terraço, coisa de cinema, com pista de dança, solário e um mirante envidraçado para se ver São Paulo inteira, à luz do sol, elétrica ou de vela em jantares ou ocasiões especiais.

        A maioria dos hóspedes do Park também parecia ter cinco estrelas estampadas na testa: gente importante, preocupada com telefonemas internacionais, políticos, desportistas e artistas famosos que recebiam jornalistas ou deles fugiam, evitando fotos e entrevistas. Logo na primeira quinzena de Park Leo esteve a dois metros de distância de Vera Stuart, atriz do cinema norte-americano, carregou as malas dum automobilista francês de Fórmula 1, e levou uma garrafa de mineral ao apartamento de um dos reis do petróleo do Oriente Médio, vestido em trajes típicos.

         Havia, ainda, hóspedes que moravam no hotel: dona Balbina, viúva rica e solitária, Mister O'Hara, que embora muito idoso e doente dirigia uma grande empresa quase sem sair do apartamento, o anão Jujuba, ídolo infantil da televisão, e o Barão. Certamente Barão era apenas apelido do homem gordo que mandou Leo comprar jornais, conhecido benemérito, protetor de inúmeras instituições assistenciais.

         Leo voltou com os jornais e tocou a campainha do 222. Desta vez o hóspede não abriu de imediato a porta. Antes que o fizesse, o bellboy ouviu ruídos.

           — Quem é? — perguntou o Barão, o que nunca fazia.

           — Sou eu, o bellboy. Trouxe os jornais. A porta abriu pouco e lentamente, o suficiente apenas para mostrar o rosto do hóspede. O Barão muito pálido, como um doente, teimava em sorrir, mas não devia estar bem porque suas mãos, trêmulas, deixaram cair os jornais. Leo abaixou-se para apanhá-los quando viu, sob a cama, dois pés calçados, apontando para a porta. Pegou os jornais e ao levantar-se notou que havia uma mancha vermelha, provavelmente de sangue, no robe do gordo do 222.

          — Obrigado — disse o Barão, segurando confusamente os jornais e apressando-se em fechar a porta.

           Mesmo diante da porta fechada, Leo deteve-se ainda um momento para relembrar e fixar na memória a cena que acabara de ver. Daí por diante começariam seus problemas.

                      GUIMA, SABE O QUE EU VI?

            Leo desceu para o saguão desejando que ninguém o chamasse. Precisava contar ao Guima o que vira no 222. O porteiro, na rua, parava um táxi para um casal de hóspedes estrangeiros. Ele era bastante considerado pela gerência porque falava um pouco diversos idiomas, até japonês.

           Guima, assim que o viu, aproximou-se:

           — Diga a dona Iolanda que domingo passo lá pra filar macarronada.

            Leo estava agora mais assustado do que no momento em que vira os pés debaixo da cama.

             — Guima, sabe o que eu vi?

             O porteiro sentiu que o rapaz estava sob forte tensão e ficou muito preocupado. Para um bellboy não era interessante ver certas coisas. Aliás, o perfeito mensageiro não tem olhos nem ouvidos: apenas pernas e cortesia.

              — Alguma mulher sem roupa?

              — Não, acho que vi um cadáver.

              [...]

 Fonte: Maxi: ensino fundamental 2:multidisciplinar:6 º ao 9º ano/obra coletiva: Thais Ginicolo Cabral. 1.ed. São Paulo: Maxiprint,2019.7º ano Caderno 4 p.66 a 71.

 INTERAGINDO COM O TEXTO

01. Em geral, as histórias de detetive apresentam ao leitor algumas informações relacionadas ao espaço da narrativa.

a)   Identifique, no texto, o espaço em que os fatos narrados acontecem. Faça uma breve descrição desse espaço.

Os fatos narrados acontecem no Emperor Park Hotel, um cinco estrelas bonito, moderno e requintado.

b)   Há outros espaços mencionados na história. Identifique-os e explique por que eles são citados.

A Bela Vista, no bairro do Bixiga, é mencionada por ser o lugar onde Leo nasceu e morava.

c)   Você já ouviu falar sobre esses lugares? Esses lugares são fictícios, ou seja, foram inventados pelo autor? Justifique sua resposta.

Resposta pessoal.

Sugestão: Esses lugares não são fictícios. Bela Vista é um distrito situado na região central da cidade de São Paulo, onde fica localizado o bairro conhecido como Bixiga.

02. A descrição é um recurso que permite melhor visualização dos elementos que compõem a narrativa. Assim, aponte características que descrevem:

a)   o Hotel Emperor Park:

O saguão do hotel estava sempre cheio de hóspedes, a piscina tinha um verde para ricos, a boate era luxuosa, havia um imponente salão de convenções, quadra de shopping com lojas sofisticadas, um belo terraço-bar, etc.

b)   a maioria dos hóspedes do hotel:

Os hóspedes eram pessoas importantes, como atrizes de cinema, automobilistas, reis do petróleo, etc.

c)   os hóspedes que moravam no hotel:

Uma viúva rica e solitária; um idoso, que era diretor de uma grande empresa; um anão, ídolo infantil da televisão, etc.

03. Entre os personagens comuns nas narrativas de detetive estão a vítima, o(s) suspeito(s) e o detetive, ou alguém que desempenha o papel de esclarecer o mistério.

a)   É possível identificar esses personagens no trecho que você leu? Explique sua resposta.

Sim, provavelmente, o homem que Leo viu pelo reflexo do espelho é a vítima, o Barão e o suspeito e Leo é o personagem encarregado de esclarecer o mistério.

b)   Como esses personagens são caracterizados no texto?

O homem que Leo viu refletido no espelho era pequeno, tinha a aparência de índio vestindo roupas civilizadas; o Barão é descrito como gordo, mole e displicente, prestava assistência a inúmeras instituições; Leo nasceu e morava no Bela Vista, trabalhava como mensageiro no hotel das 8h às 18h e estudava à noite, demonstrava interesse pelo trabalho.

c)   O autor de histórias de detetive costuma deixar traços e pistas ao longo da história a fim de fazer revelações ou confundir o leitor, conduzindo a narrativa a um final quase sempre surpreendente. Que informações no texto permitiram que você identificasse esses personagens? Explique sua resposta.

Quando Leo bate à porta, atendendo ao chamado do Barão, é recebido com um sorriso largo, e o homem pequeno com aparência de índio, pelo reflexo do espelho, fecha a porta do banheiro com uma cotovelada, com receio de ser visto. Quando Leo bate à porta novamente para entregar os jornais, o Barão pergunta quem é, o que nunca fazia, demora para atende-lo e, ao abrir a porta, o que faz pouco e lentamente, mostra-se pálido, teimando em sorrir. Não parecia bem, pois suas mãos estavam trêmulas, deixando cair os jornais. Leo, então, abaixa-se para apanhá-los, quando vê, sob a cama, dois pés calçados apontando para a porta, pega os jornais e, ao se levantar, nota que havia uma mancha vermelha no robe do Barão, provavelmente de sangue.

04. Outro elemento que caracteriza as histórias de detetive é um crime ou um mistério a ser desvendado. Identifique esse elemento no trecho lido.

O enigma a ser desvendado é se os pés visto sob a cama eram do homem visto anteriormente no quarto, descobrir se ele realmente está morto e, em caso afirmativo, descobrir onde está o corpo e provar quem o matou.

 

 

 

 

 

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