Crônica: Dois amigos e um chato
Stanislaw Ponte
Preta
Os dois estavam tomando um cafezinho no
boteco da esquina, antes de partirem para as suas respectivas repartições. Um
tinha um nome fácil: era o Zé. O outro tinha um nome desses de dar cãibra em
língua de crioulo: era o Flaudemíglio.
Acabado o café o Zé perguntou: — Vais
pra cidade?
— Vou — respondeu Flaudemíglio,
acrescentando:
— Mas vou pegar o 434, que vai pela Lapa. Eu tenho que entregar
uma urinazinha de minha mulher no laboratório da Associação, que é ali na Mem
de Sá.
Zé acendeu um cigarro e olhou para a
fila do 474, que ia direto pro centro e, por isso, era a fila mais piruada.
Tinha gente às pampas.
— Vens comigo? — quis saber
Flaudemíglio.
— Não — disse o Zé: — Eu estou atrasado
e vou pegar um direto ao centro.
— Então tá — concordou Flaudemíglio,
olhando para a outra esquina e, vendo que já vinha o que passava pela Lapa: —
Chi! Lá vem o meu… — e correu para o ponto de parada, fazendo sinal para o
ônibus parar.
Foi aí que, segurando o guarda-chuva,
um embrulho e mais o vidrinho da urinazinha (como ele carinhosamente chamava o
material recolhido pela mulher na véspera para o exame de laboratório…), foi aí
que o Flaudemíglio se atrapalhou e deixou cair algo no chão.
O motorista, com aquela delicadeza
peculiar à classe, já ia botando o carro em movimento, não dando tempo ao
passageiro para apanhar o que caíra. Flaudemíglio só teve tempo de berrar para
o amigo: — Zé, caiu minha carteira de identidade. Apanha e me entrega logo
mais.
O 434 seguiu e Zé atravessou a rua,
para apanhar a carteira do outro. Já estava chegando perto quando um cidadão
magrela e antipático e, ainda por cima, com sorriso de Juraci Magalhães,
apanhou a carteira de Flaudemíglio.
— Por favor, cavalheiro, esta carteira
é de um amigo meu —disse o Zé estendendo a mão.
Mas o que tinha sorriso de Juraci não
entregou. Examinou a carteira e depois perguntou: — Como é o nome do seu amigo?
— Flaudemíglio — respondeu o Zé.
— Flaudemíglio de quê? — insistiu o
chato.
Mas o Zé deu-lhe um safanão e tomou-lhe
a carteira, dizendo: — Ora, seu cretino, quem acerta Flaudemíglio não precisa
acertar mais nada!
Stanislaw Ponte Preta
Entendendo a crônica:
01 – O que nos diz o
narrador sobre o nome de cada um dos amigos?
Um tinha o nome
fácil: era Zé. O outro tinha um nome desses de dar cãibra em língua de crioulo:
era Flaudemíglio.
02 – Por que os dois amigos
não pegaram o mesmo ônibus?
Porque
Flaudemíglio tinha que entregar a urinazinha da mulher no laboratório.
03 – Retire do texto a
passagem em que, ironicamente, o narrador se refere ao comportamento do
motorista do 434.
“O motorista, com
aquela delicadeza peculiar à classe, já ia botando o carro em movimento, não
dando tempo ao passageiro para apanhar o que caíra.”
04 – É possível, pelo texto,
descobrir o sentido da expressão “mais piruado”?
Resposta pessoal
do aluno. Sugestão: mais cheia de gente.
05 – Como o narrador
caracteriza o chato que surge na crônica?
Como cidadão
magrela e antipático e, ainda por cima, com sorriso de Juraci Magalhães.
06 – Qual a razão apresentada
pelo Zé para pôr fim à chatice do cidadão magrela?
“— Ora, seu
cretino, quem acerta Flaudemíglio não precisa acertar mais nada!”
07 – Você já passou por um
apuro semelhante ao narrado nesse texto? O que aconteceu?
Resposta pessoal
do aluno.
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