quinta-feira, 23 de março de 2017

ARTIGO DE OPINIÃO:NOSSA LÍNGUA PORTUGUESA? REVISTA VEJA - COM GABARITO

ARTIGO DE OPINIÃO: NOSSA LÍNGUA PORTUGUESA?

          Academia Brasileira de Letras recria a Torre de Babel no novo vocabulário.
          A Academia Brasileira de Letras, além dos tradicionais chás com pasteizinhos de carne de todas as quintas-feiras, usou seu tempo nos últimos meses para elaborar o novo Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa. Um trabalho malfeito, pouco rigoroso, repleto de vícios. Pretendia-se atualizar o vernáculo e o que se fez foi encher o português de expressões exóticas. Aos mais de 340.000 vocábulos da edição anterior, de 1981, foram acrescidos outros 6.000, entre eles palavras de origem alienígena, como network, pessach, inro, tzedaká, colt,off-line e output. O pecado capital dessas inserções é que elas foram feitas sem nenhum critério sério. “Nossa equipe analisava cada caso, procurando ficar com os termos mais usados em dicionários, livros e meios de comunicação”, explica Antônio José Chediak, coordenador da comissão de dez pessoas que elaborou o léxico. “Quando havia dúvida se a palavra era realmente frequente, conversávamos até chegar a um consenso.”, diz. Ou seja, não se realizou nenhuma pesquisa para quantificar a ocorrência dos novos verbetes nas fontes estudadas.
          O resultado é um arbítrio só. Deverá ser ignorado pelos dicionaristas sérios, que sabem que a língua, como o conjunto de vocábulos e expressões usados por um povo, exige representatividade. Ninguém pode opor-se ao aportuguesamento de palavras estrangeiras e à sua inclusão no léxico quando o uso desses vocábulos se generaliza. Foi assim sempre. O português tomou emprestado do árabe as palavras alcachofra, alface, alforria. Do Francês vieram abajur e garçom. Do quimbundo, língua dos escravos vindos de Angola, os vocábulos moleque e quibebe. Do inglês, mais recentemente, uma série de vocábulos vinculados à área de computação, como e-mail, internet, mouse, joystick, modem ou deletar.
          São palavras que se impuseram aos usos e costumes nacionais. Mas, no caso do trabalho da comissão criada pela Academia, grande parte de todos os estrangeirismos recém-incorporados à língua veio do hebraico, língua familiar e religiosa de aproximadamente 110.000 pessoas no Brasil. Seria compreensível que palavras hebraicas passassem a fazer parte de uma lista como a feita pela Academia se tivessem sido colhidas por meio de um critério razoavelmente rigoroso. Não foi isso que aconteceu. “Recebemos a colaboração de um rabino e não tivemos tempo de consultar especialistas de línguas como o japonês e o italiano.”, diz Chediak. Assim, palavras nipônicas de uso corrente no Brasil, como sushi e sashimi, devido à popularidade dos restaurantes japoneses espalhados pelo país, não foram incluídas na lista. Em vez destas, o rol da Academia incorporou vocábulos como inro, que quer dizer, pasmem, porta-remédio em japonês. Entre as palavras hebraicas introduzidas contam-se verbetes como chanuká (uma festa judaica), chalá (um tipo de pão), chazan (o cantor da sinagoga), gefiltefish (bolinho de peixe), tzedaká (uma boa ação) e shofar (chifre de cabra usado como berrante em cerimônias judaicas).
          Outro membro da comissão, o ex-ministro da educação Eduardo Portella, justifica os esquecimentos e as inclusões de vocábulos pouco usados com um argumento que tem mais afinidade com as relações internacionais do país do que com as questões vernáculas. “O hebraico vem fazendo um esforço muito grande para se consolidar, enquanto o inglês já nem precisa mais fazer esforço algum”, diz Portella. Se em vez de fazer o novo Vocabulário a Academia Brasileira de Letras tivesse brincado de falar a língua do pê, seria igualmente inútil, mas, pelo menos, mais divertido.
                                          VEJA, Abril, São Paulo, p. 113, 16 set. 1998. Idioma.

1 – Esse texto foi retirado de uma revista de informações gerais que circula semanalmente em todo o país. Em geral, essa revista informa sobre os mais diferentes assuntos e também possui espaços reservados para opiniões de articulistas que assinam os textos que escrevem. O texto que você leu é predominantemente informativo ou opinativo? Converse como o professor a esse respeito.
Apesar de o texto não estar assinado e trazer uma informação no tópico frasal do primeiro parágrafo, é predominantemente opinativo. O autor trata, em todo o texto, de desenvolver argumentos para provar que o novo vocabulário divulgado pela Academia é inútil. O título e o subtítulo também endossam essa ideia.

2 – Qual é o perfil provável do interlocutor desse texto?
Como o artigo foi publicado em sua revista de informação geral, de periodicidade semanal, conclui-se que o texto foi escrito para uma pessoa de certo nível cultural, que procura informações atualizadas.

3 – Releia a primeira frase do primeiro parágrafo. Observe que a informação é sarcástica.
a)     No que consiste o sarcasmo?
Em dizer, nas entrelinhas, que a Academia não produz nada além de “chás com pasteizinhos de carne” às quintas-feiras.

b)    Com que intenção foi utilizada?
Desmerecer o trabalho da Academia Brasileira de Letras.

4 – Observe que os organizadores do novo vocabulário também foram ouvidos. De que forma o articulista usou essas declarações para endossar sua opinião?
“Nossa equipe analisava cada caso, procurando ficar com os termos mais usados em dicionários, livros e meios de comunicação. Quando havia dúvida se a palavra era realmente frequente, conversávamos até chegar a um consenso.”
O articulista usa essa declaração para provar que o critério de seleção de palavras não foi sério e uma pesquisa quantitativa não foi realizada.

“Recebemos a colaboração de um rabino e não tivemos tempo de consultar especialistas de línguas como o japonês e o italiano.”
O articulista tenta provar a falta de um critério rigoroso para a incorporação de palavras estrangeiras.

“O hebraico vem fazendo um esforço muito grande para se consolidar, enquanto o inglês já nem precisa mais fazer esforço algum.”
A declaração pode constituir um argumento para a incorporação de tantas palavras hebraicas, o articulista rebate dizendo que o argumento é inválido, pois nada tem a ver com questões vernáculas.

5 – Releia:
“O resultado é um arbítrio só. Deverá ser ignorado pelos dicionaristas sérios, que sabem que a língua, como o conjunto de vocábulos e expressões usadas por um povo, exige representatividade.”
a)     O que é arbítrio? Por que essa palavra foi usada para caracterizar o novo vocabulário?
Decisão que depende unicamente da vontade. Foi usada para mostrar que o novo vocabulário não é resultado de uma pesquisa, mas uma lista de palavras “escolhidas” por dez pessoas.

b)    Qual o significado de representatividade nesse trecho?
Significa que as palavras, para serem incorporadas, devem estar sendo realmente usadas, e não depender unicamente da vontade de alguns.

6 – Releia a última frase do texto:
“Se em vez de fazer o novo Vocabulário a Academia Brasileira de Letras tivesse brincado de falar a língua do pê, seria igualmente inútil, mas, pelo menos, mais divertido.”
a)     Qual é a função dessa última frase do texto?
Reforçar a ideia de inutilidade do trabalho da Academia Brasileira de Letras.


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