CONTO: Lisetta
Antônio de
Alcântara Machado
Quando
Lisetta subiu no metrô (um passageiro atencioso a ajudou), viu logo o urso. Felpudo,
felpudo e amarelo. Tão engraçadinho.
Dona
Mariana sentou-se, colocou a filha em pé diante dela.
Lisetta começou a namorar o bicho. Pôs o pirulito de coração,
na boca. Pôs, mas não chupou. Olhava o urso. O urso não ligava. Seus olhinhos
de vidro não diziam absolutamente nada. No colo da menina de pulseirinha de
ouro, vestido engomadinho e meias finas, parecia um urso
importante e feliz.
-Olha o ursinho que lindo, mamãe.

A menina rica viu o enlevo e a inveja de Lisetta deu a brincar com o urso. Mexeu-lhe com o toquinho do rabo: e a cabeça do bicho virou para a esquerda, depois para a direita, olhou para cima, depois para baixo. Lisetta acompanhava a manobra. Sorrindo fascinada. E com ardor nos olhos! O pirulito perdeu definitivamente toda a sua importância.
Agora são as pernas que sobem e descem, cumprimentam, se cruzam, batem umas nas outras.
-As patas também mexem, mamãe. Olha lá!
-Stai zitta!(Fique quieta!)
Lisetta sentia um desejo louco de tocar no ursinho. Jeitosamente procurou alcançá-lo. A menina rica percebeu, encarou a coitada com raiva, fez uma careta horrível e apertou contra o peito o bichinho que custara oitenta dólares na Disney.
-Deixa eu pegar, um pouquinho, um pouquinho só nele, deixa?
-Ah!
- Perdone, signora. Desculpe, por favor. A senhora sabe, essas crianças são muito arteiras. Scusi. Desculpe.
A mãe da menina rica não respondeu. Ajeitou a tiara de pérolas, no cabelo da filha, sorriu para o bicho, fez um carinho na cabeça dele, abriu a bolsa e pegou o celular.
Dona Mariana, escarlate de vergonha, murmurou no ouvido da filha:
-In casa me lo pagherai! (Em casa, você me paga!)
E pespegou-lhe por conta um belo beliscão no bracinho magro. Um beliscão daqueles.
Lisetta então perdeu toda a compostura de vez. Chorou. Soluçou. Chorou. Soluçou. Falando sempre.
- Hã! Hã! Hã! Eu que... ro o ur...so. O urso...! Ai, mamãe! Ai, mamãe! Eu que... ro o ur...so o...o...o... Hã! Hã!
-Stai ferma o ti amazzo, parola d’onore! (Pare ou eu te mato, palavra de honra!)
-Um pou...qui... nho... só! Hã! E...hã! Um pou...qui...
-Senti,Lisetta.Non ti porteró piú in cittá! Mai piú! .(Escute, Lisetta. Não te trarei mais à cidade. Nunca mais!)
Um escândalo. E logo, no banco da frente e dentro do metrô. O vagão inteiro testemunhou o feio que Lisetta fez.
O urso recomeçou a mexer a cabeça. Para cima e para baixo. Da esquerda para a direita, para cima e para baixo.
-Non piangere piú adesso! (Não chore mais
agora!)
Impossível.
O urso lá se fora nos braços da
dona. E a dona só de má, antes de entrar no prédio moderno e bem localizado,
voltou-se e agitou o bichinho no ar. Para Lisetta ver. E Lisetta viu.
O metrô deu um solavanco, sacudiu
os passageiros, deslizou, rolou e continuou a viagem.
Lisetta como compensação quis sentar-se no
banco. Dona Mariana (havia pago uma passagem só) opôs-se com energia e outro beliscão.
A entrada de Lisetta, em casa,
marcou época, na história dramática da família Garbone.
Logo na porta, um safanão.
Depois um tabefe. Outro no corredor. Intervalo de dois minutos.
Foi assim a vez das chineladas. Só para fechar. Que não acabava mais.
O resto da gurizada (narizes escorrendo, pernas
arranhadas) reunida, na sala de jantar, sapeava
de longe.
Mas o Hugo chegou da oficina.
-Você assim machuca a menina,
mamãe! Coitadinha dela!.
Também Lisetta já não aguentava mais.
-Toma
pra você, mas não se ache
Lisetta deu um pulo de
contente. Pequenino. Pequenino e de lata. Do tamanho de um passarinho. Mas
urso.
Os irmãos chegaram para ver. Pasqualino quis
logo pegar no bichinho. Quis mesmo tomá-lo à força. Lisetta berrou como uma
desesperada:
-Ele é meu! O Hugo me deu!
Correu para o quarto e fechou-se
por dentro.
(MACHADO, Antônio de Alcântara. Modernizado de “Lisetta”- Brás, Bexiga e Barra Funda. Belo Horizonte. Notícias de São Paulo. Belo Horizonte: Itatiaia, 2001.p.48-50)
Entendendo
o texto
01-
Assinale (V) para aquilo que for pertinente e (F) para aquilo que não for
pertinente ao texto-discurso:
a-(
V )
Percebe-se a prática social do egoísmo, uma vez que a personagem - menina rica
- não deixou sequer que a personagem - Lisetta
- tocasse seu ursinho;
b-(
V ) Percebe-se a enorme distância existente
entre as classes sociais, no país;
c-( F ) Percebe-se o discurso de que a família de
classe média não estimula as crianças a dividirem o que têm;
d-(
F ) Percebe-se a prática social da caridade por
parte da personagem (mãe da menina rica);
e-( V ) Percebe-se o discurso de que o castigo mal
aplicado não educa a criança;
f-(
F ) Percebe-se o discurso de que as crianças não
devem ser corrigidas nunca;
g-(
F ) Percebe-se a prática social da partilha;
h-( V )
Percebe-se que a ideologia da posse contamina ricos e pobres, visto que as
meninas, tanto a rica, quanto a pobre, não deixavam outras crianças mexerem nos
seus ursos;
i-( F ) Percebe-se o discurso de que as pessoas empobrecidas
não impõem limites às crianças;
j-( F ) Percebe-se o discurso de que as crianças
pobres são mal-educadas e invejosas.
02-Substitua
as palavras sublinhadas e negritadas por outras sem alterar o sentido do
texto-discurso.
Felpudo, felpudo: macio, macio
Engomadinho: bem passado
Stai zitta!: Fique quieta!
Scusi: Desculpe
Signora: Senhora
In casa me lo pagherai!: Em casa, você
me paga!
Stai ferma o ti amazzo, parola d’onore!:
Pare ou eu te mato, palavra de honra!
Senti,Lisetta.Non ti porteró piú in cittá!
Mai piú!: Escute, Lisetta. Não te trarei mais à cidade. Nunca mais!
Safanão: tapa
Tabefe: bofetada
03-Identifique,
na narrativa, a instalação do primeiro conflito:
a- Quando a personagem – Lisetta – subiu
ao metrô e deparou-se com o ursinho de pelúcia;
b- Quando a personagem – a mãe de Lisetta
– dá-lhe um beliscão;
c- Quando a personagem -
menina rica - exibe o ursinho de pelúcia à personagem – Lisetta;
d- Quando a personagem - menina rica –
desce do metrô e sacode o ursinho de pelúcia.
04-O
clímax da narrativa acontece, quando:
a- A personagem – mãe da menina rica – afaga
a cabeça do usinho ;
b- A personagem – a mãe de Lisetta – pede
desculpas à personagem - mãe da menina rica;
c- A personagem – Lisetta
– leva um beliscão da mãe e faz um escândalo para pegar o usinho de pelúcia;
d- A personagem - menina rica – desce do
metrô e sacode o ursinho de pelúcia.
05-O
desfecho da narrativa acontece quando:
a- A personagem (a mãe de Lisetta) dá-
lhe uma surra grande ;
b- A personagem –
Lisetta – leva uma tremenda surra da
mãe, por conta do comportamento que tivera, no metrô, mas ganha um ursinho;
c- A personagem – Lisetta – é salva pelo
personagem Hugo;
d- A personagem – Lisetta – entra, no
quarto.
06-No
enunciado”Correu para o quarto e fechou-se por dentro...”, a
expressão grifada sugere que:
a- A personagem Lisetta
desejava esconder dos irmãozinhos o
presente que havia ganhado;
b- A personagem Lisetta queria
esconder-se da mãe, pois estava com raiva dela;
c- A personagem Lisetta precisava
analisar melhor o ursinho de lata;
d- A personagem Lisetta adentrou, em um
mundo particular,onde seus sonhos infantis eram plenamente realizados.
07-O
enunciado ”Pare ou eu te mato, palavra
de honra...” revela:
a- Uma ameaça sobre o que a personagem –
mãe de Lisetta – seria capaz de fazer, caso ela não parasse de chorar;
b-
Um desejo da ´personagem – mãe de
Lisetta - naquele momento ;
c- Uma hipérbole, pois
mostrava um exagero da mãe, para demonstrar à Lisetta o quanto estava
contrariada com aquela situação vexatória, na concepção dela;
d-O medo que a personagem - mãe de
Lisetta – sentia pela mãe da menina rica.
08-
No enunciado ”Perdone, signora. Desculpe,
por favor. A senhora sabe, essas crianças são muito arteiras. Scusi. Desculpe. A
mãe da menina rica não respondeu..”, o fato da personagem ( mãe da menina
rica) não ter respondido à mãe da personagem Lisetta revela:
a- compreensão pelo comportamento da
personagem Lisetta;
b- fingimento com a mãe de Lisetta;
c- medo de que a personagem Lisetta
tomasse o bichinho de sua filha;
d- desprezo tanto pelo sentimento da personagem Lisetta,
quanto pela mãe dela.
09-No enunciado ”Deixa
eu pegar, um pouquinho, um
pouquinho só nele, deixa?...”,
o uso do diminutivo nos advérbios destacados acentua:
a- o medo de Lisetta;
b- a dúvida de Lisetta;
c- a súplica de Lisetta;
d- a
certeza de Lisetta.
10- No enunciado ”Pare ou eu te
mato...”, a conjunção ou estabelece
relação de:
a-
adição;
b-
conclusão;
c-
adversidade;
d- alternância.
11- No enunciado ”Pôs o pirulito de coração, na boca. Pôs, mas não chupou...” A conjunção mas estabelece relação de:
a-
adição;
b-
conclusão;
c-adversidade;
d-
alternância.
12- No enunciado ”Abriu a bolsa e pegou o celular...”, a
conjunção e estabelece
relação de:
a- adição;
b-
conclusão;
c-
adversidade;
d-
alternância.
13- No enunciado ”E a dona só de má...”,
a locução adverbial sublinhada pode ser trocada por:
a- de
bondade;
b- de
ingenuidade;
c- de
saudade;
d- de maldade
14-No enunciado ”O
urso lá se fora nos braços da dona. E a dona só
de má...”, a palavra grifada possui sentido semelhante ao
empregado em:
a- A
menininha ficou só, depois
daquilo tudo.
b-
Chapeuzinho Vermelho caminhava só
pela floresta.
c- “Dizei uma palavra só
e serei salva.”
d- Eles
estão sós.
15- No que se refere ao enunciado “Lisetta sentia um desejo louco
de tocar no ursinho”, assinale (V) para verdade e (F) para falso:
a- ( V )Ao se usar o adjetivo destacado, sugeriu-se, ao
leitor e à leitora, a sofreguidão da personagem Lisetta pelo toque ou pela posse
daquele ursinho.
b- ( F) O adjetivo destacado qualifica positivamente o
desejo da personagem Lisetta, segundo o contexto.
c- ( F) O adjetivo destacado qualifica negativamente o
desejo da personagem Lisetta, segundo o contexto.
d-( F) Ao se usar o adjetivo destacado, sugeriu-se, ao
leitor e à leitora, que o desejo da personagem Lisetta era forte, porém podia ser controlado.
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