Poema: Só o
ter flores pela vista fora
Só o ter flores pela vista fora
Nas áleas largas dos jardins exatos
Basta
para podermos
Achar a
vida leve.
De todo o esforço seguremos quedas
As mãos, brincando, pra que nos não tome
Do pulso,
e nos arraste.
E vivamos
assim.
Buscando o mínimo de dor ou gozo,
Bebendo a goles os instantes frescos,
Translúcidos
como água
Em taças
detalhadas,
Da vida pálida levando apenas
As rosas breves, os sorrisos vagos,
E as
rápidas caricias
Dos
instantes volúveis.
Pouco tão pouco pesarei nos braços
Com que, exilados das supernas luzes,
Escolhermos
do que fomos
O melhor
pra lembrar
Quando, acabados pelas Parcas, formos,
Vultos solenes de repente antigos,
E cada
vez mais sombras,
Ao
encontro fatal
Do barco escuro no soturno rio,
E os nove abraços do horror estígio,
E o
regaço insaciável
Da pátria
de Plutão.
Odes de Ricardo Reis.
Fernando Pessoa. (Notas de João Gaspar Simões e
Luiz de Montalvor.)
Lisboa: Ática, 1946 (imp.1994). - 26.
Entendendo o poema:
01 – O poema apresenta um
conteúdo filosófico, desenvolvendo reflexões acerca de como viver. De acordo
com a concepção do eu lírico:
a)
De que forma deve ser o relacionamento com a
pessoa amada? Retire do poema um trecho que comprove sua resposta.
Não deve ser um envolvimento profundo. “Seguremos quedas / As mãos
brincando”; “E vivamos assim, / Buscando o mínimo de dor ou gozo”.
b)
O que se leva da vida? Retire do poema um
trecho que comprove sua resposta.
Levam-se as boas lembranças: “Escolhermos do que fomos / O melhor
pra lembrar”; “Levando apenas / As rosas breves, os sorrisos vagos”.
02 – Algumas das características
da poesia clássica são: racionalismo, universalismo, linguagem culta, mitologia
pagã, controle das emoções e rigor formal. Reconheça as presentes no texto.
·
Achar a vida fácil.
·
Buscando o mínimo de dor ou gozo.
·
Da vida pálida levamos apenas as
rosas breves, os sorrisos vagos.
·
Quando acabados pelas Parcas.
·
Do barco escuro no soturno rio.
·
Horror estígio.
03 – As três últimas
estrofes fazem referência à morte. Como o eu lírico se posiciona perante ela?
Ricardo Reis se
posiciona diante da morte como algo inevitável:
-- Tudo o que cessa é a morte.
-- A morte é nossa.
-- Com tudo quanto vô, se passa, passo.
04 – Ao refletir sobre a
avida, o eu lírico acaba por expressar também seu ponto de vista sobre a morte.
Qual é o significado da morte para o eu lírico?
A morte é vista
como algo natural, como se fosse determinação do destino. Sua filosofia de
“viver bem” pressupõe uma forma de “morrer bem”.
05 – O poema apresenta
várias características que podem ser relacionadas com a tradição da cultura
clássica greco-latina. Identifique, no poema, atitudes, trechos ou ideias que
exemplifiquem as seguintes características da tradição clássica.
a)
Racionalismo.
O controle das emoções e dos impulsos: “Buscando o mínimo de dor ou
gozo”.
b)
Universalismo.
Suas reflexões sobre vida e morte transcendem o plano individual; o
eu lírico defende uma concepção de vida e morte que diz respeito a todos, que é
universal.
c)
Mitologia pagã.
Referências à Estige, às Parcas e a Plutão.
06 – No plano das ideias,
como se vê, o poema se filia à tradição clássica. Observe-o agora no plano da
expressão: a estrofação, a métrica, o vocabulário e as construções sintáticas
dos versos. Esses aspectos formais estão em sintonia com o plano das ideias? Por
quê?
Sim, formalmente
o poema apresenta características da tradição clássica: estrofação rígida,
versos brancos e metrificados (dísticos de 10 e de 6 sílabas poéticas se
alternando), vocabulário e sintaxe cultos.
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