quarta-feira, 29 de maio de 2019

TEXTO: A HISTÓRIA DE VICTOR FRANKENSTEIN -(FRAGMENTO) - MARY SHELLEY - COM GABARITO

Texto: A história de Victor Frankenstein
 

 Capitulo IV – O mistério é desvendado  (Fragmento)                                  

                          Mary Shelley
        [...]
        A partir de então as Ciências Naturais e particularmente a Química tornaram-se minha única ocupação. Lia aqueles livros com ardor e assistia a todas as aulas. O Prof. Waldman – esse era o seu nome – tornou-se um verdadeiro amigo. De mil maneiras facilitou, para mim, os estudos. Eu ganhava força e logo tornei-me tão ardente e ansioso por conhecimentos que, frequentemente, o dia amanhecia enquanto eu ainda estava trabalhando em meu laboratório.
        Dois anos passaram-se dessa maneira. Não fui nenhuma vez a Genebra; estava ocupado, de corpo e alma, na pesquisa de algumas descobertas que desejava fazer. Consegui desenvolver melhorias em alguns instrumentos química, o que me proporcionou grande estima e admiração na Universidade. Quando cheguei a esse ponto, tendo me tornado bem familiarizado com a teoria e prática das Ciências Naturais, minha permanência em Ingolstadt não era mais necessária; Pensei em retornar para meus amigos e minha cidade natal, quando um incidente retornou minha partida.
        Um dos fenômenos que, em especial, tinha atraído minha atenção era o da estrutura do corpo humano; na verdade, de qualquer animal. Sempre me perguntava se o princípio da vida tinha continuidade. Então apliquei-me mais especificamente àqueles ramos das Ciências Naturais que se relacionam com a Fisiologia. Dediquei-me à Anatomia e examinei a causa e o progresso da decadência e, portanto, da morte do corpo humano. Passava dias e noites envolvidos com minhas observações e pesquisas quando, do meio da escuridão uma súbita luz brilhou – tão radiosa e incrível e, no entanto, tão simples que, embora estonteado como tamanho da probabilidade que se abria, fiquei surpreso que, entre tantos homens de gênio que haviam dirigido seus estudos ao mesmo sentido, tenha sido somente eu o escolhido para descobrir um segredo tão maravilhoso.
        Depois de dias de trabalho e cansaço extremos, consegui descobrir a causa da geração e da vida. Aliás, mais que isso: tornei-me, eu mesmo, capaz de dar vida à matéria inanimada.
        Sei que todos esperariam ser informados desse segredo. Mas não pode ser. Quando eu chegar ao fim da minha história, será fácil perceber por que jamais revelarei essa descoberta; é por demais perigosa a aquisição de conhecimentos, e o homem que acredita que sua cidade natal é o mundo inteiro é muito mais feliz que aquele que aspira tornar-se maior do que sua natureza permite.
        Hesitei por um longo tempo em relação à maneira com que eu iria aplicar meu poder. Para preparar uma estrutura à qual eu fosse dar vida, com todas as suas fibras intrincadas, músculos e veias, teria de haver um trabalho de inconcebível dificuldade. No começo não sabia se iria tentar a criação de um ser como eu, ou de um animal com uma organização mais simples. Mas a minha imaginação estava por demais exaltada para permitir que eu duvidasse da minha habilidade de dar vida a uma criatura tão complexa e maravilhosa como o homem. Preparei-me para todo tipo de contratempos e dificuldades, mas acreditava que teria sucesso. Foi com essa disposição que iniciei a criação de um ser humano. Como as proporções diminutas de certas partes e órgãos seriam um obstáculo para mim, resolvi que o ser teria uma estatura gigantesca, dois metros e meio de altura. Depois de ter determinado seu tamanho e tendo gasto alguns meses coletando e organizando os materiais, comecei.
        Trabalhei com incansável ardor. Meu rosto tornou-se pálido de tanto estudo, e meu corpo emaciado pelo confinamento. Algumas vezes, à beira da certeza, eu falhava. Ainda assim, agarrava-me à esperança de que no dia seguinte ou na próxima hora eu conseguiria. Num quarto solitário, no alto da casa, separado dos outros apartamentos por um corredor e uma escada, eu tinha a minha oficina de terrível criação.
        Assim foram passando os meses de verão, enquanto eu me entregava, de corpo e alma ao meu projeto. Esqueci dos meus parentes e amigos, a que eu não via há tanto tempo. Sabia que meu silêncio os deixava inquietos, e lembrava-me das palavras do meu pai:
      --- Sei que enquanto você estiver satisfeito consigo, irá pensar em nós com afeição e nos mandará notícia regularmente. Penso que qualquer interrupção em sua correspondência seja uma prova de que você também está negligenciando seus outros deveres.
        Entretanto eu desejava, por assim dizer, adiar tudo o que estivesse relacionado aos meus sentimentos de afeto até que o grande objeto estivesse terminado. Hoje em dia estou convencido de que um ser humano deveria sempre preservar sua mente serena e em paz, nunca permitindo que uma paixão ou um desejo passageiro perturbe sua tranquilidade. Se algo que você faz, mesmo sendo um estudo, enfraquece seus afetos e destrói seu gosto pelos prazeres simples onde nada de mal pode haver, então essa sua atividade não é boa, não convém à mente humana.
        Meu pai não me repreendia em suas cartas; somente perguntava com mais insistência sobre minhas atividades. O inverno, a primavera e um novo verão passaram e eu continuava trabalhando, sem ao menos olhar para as folhas que brotavam e os botões que floresciam. Meu entusiasmo era reprimido pela minha ansiedade, e eu parecia mais alguém condenado à escravidão do que um artista ocupado com a sua obra favorita. Todas as noites eu tinha uma febre baixa e tornava-se extremamente nervoso. Uma folha que caísse de uma árvore me assustava e eu evitava as pessoas como se fosse culpado de um crime. Somente a energia de meu propósito me sustentava e eu acreditava que, assim que minha criação estivesse completa, exercício físico e divertimentos iriam afastar qualquer doença que eu tivesse adquirido.
                        Capítulo V – Nasce o monstro

        Era uma hora da madrugada de uma lúgubre noite de novembro quando terminei meu trabalho. A chuva batia contra a vidraça e minha vela estava se extinguindo; minha ansiedade chegava à agonia no instante em que vi os baços olhos amarelos da criatura se abrirem. Respirava pesadamente e um movimento convulsivo agitava seus membros.
        Como posso descrever as minhas emoções diante dessa catástrofe, desse desgraçado que, com tanto cuidado e esforço eu tinha me empenhado em formar? Seus membros eram proporcionados e eu tinha selecionado seus traços para serem belos. Belos! Meu Deus! Sua pele amarela mal cobria a trama de músculos e artérias abaixo; seu cabelo era negro, lustroso, ondulado; seus dentes brancos perolados. Mas tudo isso somente formava um contraste mais horrível com seus olhos aguados, que pareciam quase da mesma cor que as órbitas brancas pardacentas nas quais estavam colocados, com sua pele enrugada e lábios negros retos.
        Eu havia trabalhado por quase dois anos, com o único propósito de dar vida a um corpo inanimado. Para isso, me privei de descanso e saúde. Mas, ao terminar, a beleza do sonho desaparecera e o horror e desgosto encheram meu coração. Incapaz de enfrentar o aspecto do ser que eu tinha criado, corri para fora do laboratório e fiquei por um longo tempo andando pelo meu quarto, sem conseguir acalmar minha mente para poder dormir.
      Quando, finalmente, peguei no sono, não consegui descansar. [...] Acordei sobressaltado, com um suor frio na testa, os dentes batendo, até que, à luz da lua, vi o monstro olhando fixamente para mim, em pé ao lado da minha cama. Seus maxilares abriram-se e ele articulou alguns sons incompreensíveis, com a face arreganhada em um estranho sorriso. Uma das suas mãos estava esticada, aparentemente querendo segurar-me, mas eu escapei e fugi pelas escadas. Escondi-me no quintal da casa onde morava, andando de um lado para o outro em grande agitação, escutando atentamente cada ruído que por acaso anunciasse a aproximação do cadáver demoníaco a que eu tinha, tão desgraçadamente, dado vida.
        Ah! Nenhum mortal poderia suportar o horror daquela fisionomia. Uma múmia que vivesse outra vez não seria tão medonha quanto aquele infeliz. Eu o tinha observado quando ainda inacabado. Era feio; mas quando aqueles músculos e articulações tornaram-se capazes de movimento, ficou tão medonho que nem mesmo Dante poderia tê-lo concebido.
        Alternando agitação externa com langor e fraqueza, passei a noite aterrorizado e sentindo a amargura do desapontamento. Os sonhos, que tinham sido meu alimento e meu descanso, eram agora o meu inferno.
        [...]  
 Mary Shelley. Frankenstein. Trad. Cláudia Lopes. São Paulo: Scipione, 1997. p. 23-28.

Entendendo o texto:
01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:
·        Emaciado: magro.
·        Negligenciando: descuidando.
·        Lúgubre: sinistro, fúnebre.
·        Baço: sem brilho.
·        Langor: moleza.

02 – Suas hipóteses sobre a criação de Victor Frankenstein se confirmaram?
      Resposta pessoal do aluno.

03 – O que você achou do texto? Que sensações ele despertou em você?
      Resposta pessoal do aluno.

04 – Como você imagina que essa história termina?
      Resposta pessoal do aluno.

05 – Qual era o objetivo do Dr. Victor Frankenstein?
      Criar um ser humano perfeito a partir de matéria inanimada.

06 – Qual conflito desequilibra o desenvolvimento da narrativa?
      O ser criado pelo Dr. Victor Frankenstein não era belo, nem perfeito.

07 – É possível perceber no texto que Victor passou boa parte de sua vida estudando e se aprimorando em diversas áreas do conhecimento, a fim de concretizar seu objetivo.
a)   Essa atitude de dedicação exclusiva e persistência teve algumas implicações em sua vida pessoal. Que implicações foram essas?
Sua saúde ficou debilitada. Além disso, ele se distanciou dos amigos e familiares.

b)   Ele se arrependeu de ter se dedicado à realização de seus objetivos? Identifique um trecho que comprove sua resposta.
Sim. “Mas, ao terminar, a beleza do sonho desaparecera e horror e desgosto encheram meu coração.”

08 – O cientista conseguiu a realização de algo jamais conquistado por um ser humano.
a)   Qual foi a grande realização de Victor?
Dar vida à matéria inanimada.

b)   Que conhecimentos foram necessários para que o cientista realizasse seus objetivos?
Ter domínio sobre determinadas áreas do conhecimento, como as Ciências Naturais, a Fisiologia e a Anatomia.

c)   Após concretizar seus objetivos, o cientista se mostra decepcionado com sua criação. Explique quais foram os fatores que o levaram a ter esse sentimento.
A criação do cientista não correspondia ao modelo ideal almejado por ele: um ser humano belo e perfeito. Ao contrário disso, o ser criado por Victor era grotesco, repugnante e, portanto, o cientista o associou a algo ruim. Esse resultado provocou um choque imediato em Victor.

09 – Releia este trecho: “[...] é por demais perigosa a aquisição de conhecimentos, e o homem que acredita que sua cidade natal é o mundo inteiro é muito mais feliz que aquele que aspira tornar-se maior do que sua natureza permite.”. Em sua opinião, o que esse trecho revela em relação às buscas do ser humano?
      Revela que, muitas vezes, o ser humano, ao se apropriar de determinados conhecimentos, pode usá-los de forma negativa, criando algo que seja nocivo a sua própria espécie e ao mundo em que vive.

10 – O cientista se concentrou exclusivamente em seu projeto de criar um ser perfeito e dar vida a ele. No entanto, ao finalizá-lo percebeu que todo o seu trabalho tinha resultado em algumas consequências imediatas. Quais foram elas?
      O ser criado pelo cientista ganhou proporções não previstas por ele, o que fez com que a situação fugisse de seu controle. A criatura versus seu criador.

11 – Victor Frankenstein decidiu fazer algo inusitado: criar um ser humano. A criação humana é algo que sempre intrigou a humanidade. A ciência sempre buscou explicar a origem da vida.
a)   Por que você acha que as pessoas necessitam buscar respostas para o desconhecido?
Resposta pessoal do aluno. Sugestão: A curiosidade e o espírito investigativo são características inerentes ao ser humano. Além disso, o desconhecimento é algo que fascina, encanta e desperta o interesse de todos.

b)   Em sua opinião, quais são as possíveis consequências positivas e negativas dessas ações do ser humano?
Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Positiva: muitas vezes, a busca incessante por desvendar o desconhecido pode levar o ser humano a ultrapassar seus limites. Negativa: a ganância pode leva-lo a agir de forma a trazer prejuízos ao próprio ser humano.

12 – No primeiro parágrafo do texto, há algumas palavras grafadas em letra maiúscula. Identifique-as e explique por que isso ocorreu.
      Ciências Naturais (área do conhecimento); Química (área do conhecimento) e Prof. Waldman (nome próprio).

13 – Releia o seguinte trecho d texto: “O Prof. Waldman – era esse o seu nome – tornou-se um verdadeiro amigo”.
a)   Que função o travessão exerce nesse trecho?
A função de indicar o aposto explicativo.

b)   Com que intenção essa informação é acrescentada ao texto?
Para explicar ao leitor que Waldman era o nome do professor que havia se tornado amigo de Victor Frankenstein.

14 – Ao observar sua criação, Victor descreve-a. Essa descrição é física ou psicológica? Explique.
      Física. Pois apresenta os aspectos visíveis do ser criado por Victor.

15 – No trecho: “De mil maneiras facilitou, para mim, os estudos.”, há uma figura de linguagem. Identifique-a e explique em que ela consiste.
      Hipérbole. Que consiste em um exagero da ideia que se pretende expressar. Nesse caso, mil maneiras enfatiza que foram várias, diversas.

Um comentário:

  1. é possível afirmar que as personagens teria Arnfeld, texto 1, e Vitor Frankenstein, texto 2, apresentam a mesma confiança no poder da ciência de transformar e resolver os problemas do homem? justifique

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