Mostrando postagens com marcador CONTO. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador CONTO. Mostrar todas as postagens

domingo, 10 de agosto de 2025

CONTO: O SONHO DE HABIB, FILHO DE HABIB - CONTO SUFI - COM GABARITO

 Conto: O sonho de Habib, filho de Habib

            Conto sufi

        Durante todo o dia, Habib, o tapeceiro, sentava-se diante de seu tear com os aprendizes à sua volta e tecia um lindo tapete. Mas seu filho, Habib, filho de Habib, quase nunca estava presente. Ele não se interessava por tapetes. Ele gostava de ir ao caravançará, onde se reuniam todas as caravanas de camelos no seu caminho para Samarkanda, para Bokara ou para as praias da Enseada Dourada.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiwdKGzRGGzGu2e6yTXZw9vVC9ERHY3J9DcMO92QJiwTEH2C6Y4GMQFuuZkzFe03JaGoXVVeTtidsMdOSUqrCXWh-zxumBAsxnlNy8eS0OYTmopHccHSN7TsAkM-wT3HN5PPCmJRIhz_ApQevRVqcDjchSjFe_nrkqibLQ6mskIbJaSTYy3aRPnXp-YIU0/s1600/images%20(1).jpg

 


        Um dia, enquanto olhava um cavalariço penteando a cauda prateada de um dos cavalos pertencentes a um mercador de Tabriz, Habib, filho de Habib, pensou consigo mesmo:

        “Ah, se eu pudesse seguir as caravanas.”

        – Por que você está tão interessado no lindo corcel do meu senhor? – perguntou o cavalariço. – Você, um menino empoeirado, deve estar muito mais acostumado com burros!

        – Um dia, quando for mercador – disse Habib, filho de Habib –, terei um cavalo como esse, também terei bolsas cheias de ouro e vou me casar com uma princesa.

        – Fora daqui, pequeno galo de briga! – gritou o cavalariço. – É melhor você sair de perto deste cavalo ou então vai levar um coice quando menos esperar.

        Então o menino foi embora, e chegou em casa bem na hora em que seu pai ia sair à sua procura com uma grande vara na mão.

        – Preguiçosa criatura! – gritou Habib. – Quando preciso de você para separar os fios de lã colorida você não está. Aonde você foi? Aposto que estava outra vez no caravançará. Volte ao trabalho ou vai levar uma surra.

        – Pai, se eu pudesse ir com as caravanas para algum lugar diferente poderia fazer fortuna, tenho certeza disto.

        – Sonhando acordado outra vez! – e Habib deu-lhe um tapa no pé do ouvido, levandoo, pela orelha, para dentro da loja.

        Nessa noite, Habib, filho de Habib, esgueirou-se para fora de casa sob a brilhante luz da lua, determinado a juntar-se à caravana que partiria ao amanhecer. Debaixo do braço levava um pequeno tapete, o mais velho da loja, do qual ninguém sentiria falta, ele tinha certeza, pois há muito tempo estava jogado num canto. Esperava que quando seu pai notasse a sua ausência ele já estivesse longe.

        No mercado, camelos com sinos em seus arreios estavam sendo carregados. Todos os mercadores arrumavam suas bolsas nas selas e suas cestas nas costas dos camelos.

        Habib, filho de Habib, aproximou-se de um velho homem de barba e disse:

        – Bondoso senhor, deixe-me acompanhá-lo, pois quero viajar e meu pai só quer que eu faça tapetes.

        – Vá embora – disse o mercador. – Não posso levá-lo comigo sem o consentimento de seu pai. Volte para falar com ele, e se ele permitir então pode ser que eu leve você comigo.

        Habib, filho de Habib, dirigiu-se a outro mercador:

        – Tomarei conta de seus camelos, deixe-me ir com você para lugares distantes.

        Mas o homem respondeu:

        – Você é muito pequeno e, de qualquer forma, já tenho dois meninos que cuidam dos meus camelos durante a viagem. Vá embora, volte para sua casa antes que notem a sua falta.

        Nesse momento os galos já começavam a cantar, e o dia estava nascendo. Os camelos se levantaram e logo iriam partir pelo portão da cidade em direção as terras estrangeiras.

        Quando o último camelo estava partindo o homem que o guiava disse a Habib, filho de Habib:

        – Quer seguir com a caravana, meu menino? Você parece estar sozinho e não ter ninguém para cuidar de você. Quer acompanhar-me no caminho de Samarkanda?

        Então o menino pulou de alegria e saiu correndo ao lado do último dos camelos. O homem, que era um mercador de lã, seguiu ao lado de seu camelo, que estava carregado demais, e ficou contente de ter o menino como companhia. Seu nome era Qadir e disse a Habib, filho de Habib, que lhe daria um dinar de prata por mês se ele o ajudasse a cuidar de seu camelo nos poços e fontes de água.

        Foram dias e noites de grande alegria para o menino enquanto ele viajava no final da enorme caravana de camelos, através de lugares montanhosos e desertos de areia, sob sol e chuva até que chegaram a Samarkanda.

        Habib, filho de Habib, ganhou seu primeiro dinar de prata e foi andar pelas ruas da cidade, procurando coisas para comprar. Comprou uma boina branca bordada com fios de seda e um colete verde de feltro revestido de algodão verde. Nessa noite não conseguiu dormir de tão feliz que estava. Sentou-se no tapete que havia trazido de casa e olhou para os brincos que havia comprado para sua mãe.

        – Gostaria de poder voar nesse tapete – disse baixinho, enquanto olhava à sua volta.

        Nem bem as palavras saíram de sua boca, ele já estava voando pelo ar sentado de pernas cruzadas sobre o tapete.

        – Um tapete mágico! – ele gritou. – Eu nunca soube disso durante todos estes anos.

        Então se dirigiu ao tapete e disse:

        – Leve-me ao palácio do rei deste país.

        Era uma noite de lua brilhante, tão clara como o dia, e ele viu que, lentamente, o tapete o levava para o terraço de um palácio de mármore, onde, à luz da lua, a princesa Flor Dourada brincava com bolinhas de gude. A princesa era da mesma idade que Habib e ficou tão contente de ter um companheiro para brincar que o chamou para perto dela. Ela o confundiu com o filho do aguadeiro do palácio. Deu-lhe uma bola de rubi e pegou uma de cristal, ordenando-lhe que tentasse vencê-la no jogo. Em alguns minutos várias bolinhas preciosas, um diamante, uma esmeralda e uma turquesa, estavam sendo espalhadas para todos os lados pelo rubi de Habib.

        A princesa Flor Dourada estava começando a arrumar uma outra linha de bolinhas quando se ouviu um grito. A ama da princesa vinha correndo na direção deles.

        – Princesa, princesa, volte para casa imediatamente! – ela gritou. – Que ousadia deste camponês empoeirado, vestido com um colete de feltro verde, vir brincar com a filha do rei!

        Nesse momento, Habib, filho de Habib, pulou no seu tapete mágico e ordenou que ele começasse a voar.

        – Leve-me de volta para minha própria casa! – disse. Imediatamente o tapete levantou voo, para surpresa da princesa e da velha ama.

        Houve um som de ventania, e tudo ficou escuro para Habib, filho de Habib. Ele começou a sentir-se tonto e seus olhos se fecharam. O tapete continuou a voar, e logo ele estava dormindo. Ele só acordou quando estava outra vez na casa de seu pai.

        Abriu os olhos e viu que estava na sua própria cama. Os galos cantavam e o dia amanhecia.

        – Acorde meu filho – disse o tapeceiro, sacudindo os ombros do filho. – Você gostaria de seguir a caravana e ver o mundo? Eu consegui que um mercador de Bagdá consentisse em levá-lo com ele na viagem.

        Habib, filho de Habib, olhou embevecido para seu pai. Então tudo tinha sido um sonho? Mas ele segurava na mão uma bolinha vermelha, de rubi. Entregou-a ao pai.

        – Veja, ganhei isto quando jogava com a princesa. Intrigado, o tapeceiro girava o rubi entre seus dedos.

        – Onde achou isto? Se vendermos este rubi ao joalheiro ficaremos ricos. Tem certeza de que não o roubou?

        – Eu o ganhei – insistiu o menino, e contou ao pai toda a história, do começo ao fim.

        – É magia – gritou Habib, e correu para contar tudo à mulher.

        Quando os dois foram falar com o menino, ele contou novamente a história, e eles acreditaram nele.

        – Onde está o tapete voador? – perguntou sua mãe. Mas o tapete não se encontrava em parte alguma. Então Habib, filho de Habib, pôs um pouco de comida num alforje e correu para o caravançará. Habib deu-lhe sua bênção e o mercador de Bagdá prometeu trazê-lo de volta depois de seis meses.

        Alguns anos mais tarde, quando cresceu o bastante, tornou-se mercador de tapetes e transportava a mercadoria de seu pai de país em país, e com isso conseguiu reunir grande riqueza. Então começou a se perguntar se existiria de fato uma princesa com o nome de Flor Dourada que ele conhecera no seu sonho e cujo rubi o colocou no caminho da fortuna. Durante as viagens perguntava a todos se a conheciam, até que chegou à terra de Sogdiana.

        – Qual é o nome da filha do rei? – perguntou a alguém na casa de chá em que se encontrava.

        – Princesa Flor Dourada – disseram.

        Então ele soube que sua busca terminara. Enviou valiosos presentes para o rei e pediu permissão para casar-se com sua filha.

        – Só se minha filha quiser – disse o rei.

        E arranjou para que Flor Dourada visse o jovem através de uma treliça secreta que havia na parede da câmara de audiências.

        Assim que a princesa pôs os olhos no jovem e belo mercador de tapetes se apaixonou por ele, e enviou uma mensagem a seu pai dizendo que se casaria com ele e com nenhum outro.

        – Que assim seja – disse o rei. – A felicidade de minha filha é mais importante do que qualquer título de nobreza. Que os ritos de casamento sejam realizados.

        Na festa de casamento, Habib, filho de Habib, colocou um rubi de raro valor incrustado em uma corrente de ouro em volta do pescoço de sua esposa.

        Eles viveram felizes para sempre, até que Allah mandou buscá-los finalmente.

Histórias da tradição sufi. Grupo Granada de Contadores de Histórias (seleção e tradução) e Nícia Grillo (coordenação). Dervish, Instituto Tarika, 1993.

Entendendo o conto:

01 – Qual era a ocupação do pai de Habib, e por que Habib, filho de Habib, não se interessava por ela?

      O pai de Habib era um tapeceiro, que tecia belos tapetes. Habib, filho de Habib, não se interessava por essa ocupação porque preferia ir ao caravançará, onde se reuniam as caravanas de camelos, sonhando em seguir viagem para lugares distantes como Samarkanda e Bokara.

02 – Que sonho Habib, filho de Habib, compartilha com o cavalariço, e como o cavalariço reage?

      Habib, filho de Habib, sonha em ser um mercador um dia, ter um cavalo tão bonito quanto o do senhor do cavalariço, bolsas cheias de ouro e casar-se com uma princesa. O cavalariço reage com desprezo, chamando-o de "pequeno galo de briga" e mandando-o embora, dizendo que ele estava mais acostumado com burros.

03 – O que Habib, filho de Habib, faz ao tentar fugir de casa, e o que ele leva consigo?

      Habib, filho de Habib, esgueira-se para fora de casa à noite, determinado a se juntar a uma caravana. Ele leva consigo um pequeno tapete, o mais velho da loja do pai, que ele achava que ninguém sentiria falta.

04 – Por que os primeiros mercadores recusam levar Habib com suas caravanas?

      Os primeiros mercadores recusam levá-lo porque não poderiam fazê-lo sem o consentimento de seu pai e, no caso de outro mercador, por ele ser muito pequeno e eles já terem cuidadores para os camelos.

05 – Quem é o mercador que finalmente aceita levar Habib, e qual é o combinado entre eles?

      O mercador que finalmente aceita levar Habib é Qadir, um mercador de lã, que o guiava o último camelo de uma caravana. Qadir aceita levá-lo como companhia e lhe promete um dinar de prata por mês em troca de ajuda para cuidar do camelo nos poços e fontes de água.

06 – Como Habib descobre que o tapete que trouxe de casa é mágico?

      Habib descobre que o tapete é mágico quando, em Samarkanda, após ganhar seu primeiro dinar e comprar roupas e presentes, ele se senta no tapete e diz baixinho: "Gostaria de poder voar nesse tapete". Imediatamente, ele começa a voar pelo ar sobre o tapete, percebendo sua natureza mágica.

07 – Onde o tapete mágico leva Habib, e quem ele encontra nesse local?

      O tapete mágico leva Habib ao terraço de um palácio de mármore, onde ele encontra a princesa Flor Dourada, que tinha a mesma idade que ele.

08 – Qual a interação de Habib com a princesa Flor Dourada e como a ama da princesa reage a isso?

      Habib brinca com a princesa Flor Dourada, jogando bolinhas de gude. Ele ganha várias bolinhas preciosas dela, incluindo um rubi. A ama da princesa reage com indignação, gritando com a princesa e criticando a ousadia do "camponês empoeirado" de brincar com a filha do rei.

09 – O que acontece com Habib após a intervenção da ama, e o que ele encontra ao acordar?

      Após a intervenção da ama, Habib, filho de Habib, pula no tapete mágico e ordena que o leve de volta para casa. Ele sente-se tonto, desmaia e acorda em sua própria cama, ao amanhecer. Embora tudo pareça um sonho, ele encontra uma bolinha vermelha, de rubi, na mão, que provava a experiência.

10 – Qual é o desfecho da história para Habib, filho de Habib, e a princesa Flor Dourada?

      Habib, filho de Habib, usa o rubi como prova de sua história, o que leva seu pai a permitir que ele viaje. Ele se torna um mercador de tapetes bem-sucedido, acumulando riqueza. Anos mais tarde, ele encontra a princesa Flor Dourada na terra de Sogdiana, casa-se com ela (presenteando-a com o rubi incrustado em ouro) e eles vivem felizes para sempre, concretizando o sonho de sua infância.

 

CONTO: O SÁBIO DA EFELOGIA - MALBA TAHAN - COM GABARITO

 Conto: O SÁBIO DA EFELOGIA

          Malba Tahan

        Aqui é relatada a singular história de um pseudo-sábio que assombrava os seus ouvintes derramando uma erudição espantosa. No fim o leitor descobre que o herói do conto é um tipo semelhante a muitos outros que encontramos a cada passo na vida: verdadeiros sábios da Efelogia.

        Durante a última excursão que fiz a Marrocos, encontrei um dos tipos mais curiosos que tenho visto em minha vida.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhQm47xOumrzNq42GlqLkdqlMAKSkktkXbdkQ-VE0xb8pRjw9UPq5oLNSBKWb281AKdFPRBsoVRHPU9Q8X_qnGC7SYVqDcSGeTtSW3SYtEqImuVCp-rhUrl7-WRBWARo56no3EespKw8AwYMEwyeHe-LcJDV_Hi63y0zKUVyrDEYAJW1dE-11rMOl5Ms3I/s320/ruas-de-fez.jpg


        Conheci-o casualmente, no velho hotel de Yazid El-Kedim, em Marrakech. Era um homem alto, magro, de barbas pretas e olhos escuros; vestia sempre pesadíssimo casaco de astracã, com esquisita gola de peles que lhe chegava até às orelhas. Falava pouco; quando conversava casualmente com os outros hóspedes, não fazia a menor referência à sua vida ou ao seu passado. Deixava, porém, de vez em quando, escapar observações eruditas, denotadoras de grande e extraordinário saber.

        Além do nome — Vladimir Kolievich — pouco mais se conhecia dele. Entre os viajantes que se achavam em “El-Kedim”, constava que o misterioso cavalheiro era um antigo e notável professor da Universidade de Riga, que vivia foragido por ter tomado parte numa revolução contra o governo da Letônia.

        Uma noite, como de costume estávamos reunidos na sala de jantar, quando uma jovem escritora russa, Sônia Baliakine, que se entretinha com a leitura de um romance, me perguntou:

        — Sabe o senhor onde fica o rio Falgu?

        — O quê? Rio Falgu?

        Ao cabo de alguns momentos de baldada pesquisa nos escaninhos da memória, fui obrigado a confessar a minha ignorância, lamentável nesse ponto. Nunca tinha ouvido falar em semelhante rio, apesar de ter feito um curso completo e distinto na Universidade de Moscou.

        Com surpresa de todos, o misterioso Vladimir Kolievich, que fumava em silêncio a um canto, veio esclarecer a dúvida da encantadora excursionista russa:

        — O Rio Falgu fica nas proximidades da cidade de Gaya, na Índia. Para os budistas, o Falgu é um rio sagrado, pois foi junto a ele que Buda, fundador da grande religião, recebeu a inspiração de Deus.

        E diante da admiração geral dos hóspedes, aquele cavalheiro, habitualmente taciturno e concentrado, continuou:

        — É muito curioso o rio Falgu. O seu leito apresenta-se coberto de areia; parece eternamente seco, árido, como um deserto. O viajante que dele se aproxima não vê água nem ouve o menor rumor do líquido. Cavando-se, porém, alguns palmos na areia, encontra-se um lençol de água pura e límpida.

        E, Com a simplicidade e clareza peculiares aos grandes sábios, passou a contar-nos coisas curiosas, não só da Índia, como de várias outras partes do mundo. Falou-nos minuciosamente das “filazenes”, espécie de cadeiras em que se assentam, quando viajam, os habitantes de Madagáscar.

        — Que grande talento! Que invejável cultura científica! — segredou, a meu lado, um missionário católico, sinceramente admirado.

        A formosa Sônia afirmou que encontrara referências ao rio Falgu exatamente no livro que estava lendo, uma obra de Otávio Feuillet.

        — Ah! Feuillet, o célebre romancista francês! — atalhou ainda o erudito cavalheiro do astracã. — Otávio Feuillet nasceu em 1821 e morreu em 1890. As suas obras, de um romantismo um pouco exagerado, são notáveis pela finura das observações e pela concisão e brilho do estilo.

        E, durante algum tempo, prendeu a atenção de todos, discorrendo sobre Otávio Feuillet, sobre a França e sobre os escritores franceses. Ao referir-se aos romances realistas, citou as obras de Gustavo Flaubert: “Salambô”, “Madame Bovary”, “Educação Sentimental”...

        — Não se limita a conhecer a Geografia — acrescentou, a meia-voz, o velho missionário. — Sabe também literatura a fundo!

        Realmente. A precisão com que o erudito Vladimir citava datas e nomes, e a segurança com que expunha os diversos assuntos, não deixavam dúvida alguma sobre a extensão de seu considerável saber.

        Nesse momento, começava uma forte ventania. As janelas e portas batem com violência. Alguns excursionistas que se achavam na sala mostraram-se assustados.

        — Não tenham medo — acudiu, bondoso, o extraordinário Kolievich. — Não há motivo para temores ou receios. Faye, o grande astrônomo, que estudou a teoria dos ciclones...

        E depois de discorer longamente sobre a obra de Faye, e depois passou a falar, com grande loquacidade, dos ciclones, avalanches, erupções e todos os flagelos da natureza.

        Senti-me seriamente intrigado. Quem seria, afinal, aquele homem tão sábio, de rara e copiosa erudição, que se deixava ficar modesto, incógnito, como simples aventureiro, numa velha e monótona cidade marroquina?

        No dia seguinte, ao regressar de fatigante excursão aos jardins de El-Menara, encontrei-o casualmente, sozinho, no pátio da linda mesquita de Kasb. Não me contive e fui ter com ele.

        — O senhor maravilhou-nos ontem com o seu saber — confessei, respeitoso. — Não podíamos imaginar, com franqueza, que fosse um homem de tão grande cultura. Na sua academia, com certeza...

        — Qual, meu amigo! — obtemperou ele, amável, batendo-me no ombro. — Não me considere um sábio, um acadêmico ou um professor. Eu pouco sei – ou melhor – eu nada sei. Não reparou nas palavras de que tratei? Falgu, filazenes, Feuillet, França, Flaubert, Faye, flagelo. Começam todas pela letra “F”. Eu só sei falar sobre palavras que começam pela letra “F”.

        Fiquei ainda mais admirado. Qual seria a razão de tão curiosa extravagância no saber?

        — Eu lhe explico — acudiu com bom humor o estranho viajante. — Sou natural de Petrogrado e vivo do comércio do fumo. Estive, porém, por motivos políticos, durante dez anos nas prisões da Sibéria. O condenado que me havia precedido, na cela em que me puseram, deixou-me como herança os restos de uma velha enciclopédia francesa. Eu conhecia um pouco esse idioma – e, como não tivesse em que me ocupar – li e reli centenas de vezes as páginas que possuía. Eram todas da letra “F”. Ao final, fiquei sabendo muita coisa; tudo, porém sem sair da letra “F”: fá, fabagela, fabela, fabiana, fabordão.

        Achei curiosa aquela conclusão da original história do inteligente Kolievich, o negociante de fumo. Ele era precisamente o contrário do famoso e venerado rio Falgu, da Índia. Parecia possuir uma corrente enorme, profunda e tumultuosa de saber; entretanto, sua erudição, que nos causara tanto assombro, não ia além dos vários capítulos decorados da letra “F” de uma velha enciclopédia.

        Era, inquestionavelmente, o homem que mais conhecia a ciência que ele próprio denominara “efelogia”!

Malba Tahan, Seleções – Os melhores contos – Conquista, Rio, 1963.

Entendendo o conto:

01 – Quem é o narrador do conto e onde ele conhece o personagem principal?

      O narrador é o próprio autor, Malba Tahan, que encontra o personagem principal, Vladimir Kolievich, casualmente no velho hotel de Yazid El-Kedim, em Marrakech, Marrocos, durante uma excursão.

02 – Quais eram as características físicas e de vestimenta de Vladimir Kolievich, e o que se dizia sobre seu passado?

      Vladimir Kolievich era um homem alto, magro, de barbas pretas e olhos escuros, que vestia sempre um pesadíssimo casaco de astracã com gola de peles. Constava que ele era um antigo e notável professor da Universidade de Riga, foragido por ter participado de uma revolução na Letônia.

03 – Qual foi a primeira demonstração de grande saber de Vladimir Kolievich que surpreendeu os hóspedes?

      A primeira demonstração de saber que surpreendeu a todos foi quando ele esclareceu a dúvida de uma jovem escritora russa sobre a localização do rio Falgu. Ele não apenas soube onde ficava, mas também forneceu detalhes sobre sua importância para os budistas e suas características geológicas.

04 – Além de geografia, sobre quais outros assuntos, Vladimir Kolievich, demonstrou grande conhecimento?

      Além de geografia (como o rio Falgu e Madagáscar), Vladimir Kolievich demonstrou conhecimento aprofundado em literatura, discorrendo sobre Otávio Feuillet e citando obras de Gustavo Flaubert, e também em meteorologia/astronomia, falando sobre a obra de Faye e os fenômenos naturais como ciclones e erupções.

05 – Qual é a revelação surpreendente de Vladimir Kolievich sobre a origem de seu vasto conhecimento?

      A revelação surpreendente é que seu vasto conhecimento se limita a palavras que começam com a letra "F". Ele explica que, durante dez anos na prisão na Sibéria, leu e releu centenas de vezes as páginas de uma velha enciclopédia francesa que haviam sido deixadas por um prisioneiro anterior, e todas essas páginas eram da letra "F".

06 – O que o narrador entende por "efelogia" no final do conto?

      No final do conto, o narrador entende "efelogia" como a ciência ou arte de saber tudo sobre palavras que começam com a letra "F". É a área de conhecimento peculiar e limitada de Vladimir Kolievich, que ele próprio denominou.

07 – Como o conto "O Sábio da Efelogia" critica a aparência de erudição superficial?

      O conto critica a aparência de erudição superficial ao apresentar um personagem que, à primeira vista, parece ter um saber universal e profundo, mas que, na realidade, possui um conhecimento vasto, porém limitado e específico a uma única letra. Isso sugere que o que parece ser sabedoria ilimitada pode ser, na verdade, uma memorização focada e enganosa, destacando a diferença entre o conhecimento genuíno e a mera ostentação de informações.

 

 

CONTO: O PESCADOR E O GÊNIO - CONTO ÁRABE - COM GABARITO

 Conto: O pescador e o gênio – Conto árabe

        Há muito, muito tempo um velho pescador morava com a esposa perto do mar. Todo dia ele lançava sua rede quatro vezes, nem mais nem menos – ganhando a vida com o que tirava do mar. Um dia a má sorte o perseguiu. Na primeira vez em que jogou a rede, pescou um asno morto; na segunda, uma urna cheia de areia e, na terceira, apenas cacos de cerâmica. Desesperado, rezou a Alá, pedindo melhor sorte na sua última tentativa. E realmente, quando puxou a rede, viu nela emaranhada uma pequena ânfora de cobre.

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjhF7LAJceDh9v03yhRqsg3D6OKaDN85o_2ERtVmBQQgJrNkuobWNDaNLuHN0TY8pSdr-HhAXE9CO2rMUpjZ0AMabKNyG5JZ-n_ke_L3Lp3wg6NOq8JKV3LAiA4skZPhJoWoS2Up7BIPT3_QzTN0yKangYAL8BaZShmoElvmA2TttXMxkXcbO_us-lOqs4/s320/sddefault.jpg


        O objeto estava selado e em sua tampa estavam gravados textos sagrados. Por mera curiosidade, o velho abriu a ânfora. Nada encontrou dentro dela mas, no instante seguinte, começou a vazar fumaça e um gênio horrível se materializou. O monstro curvou-se ante o pescador e disse: – Poderoso Salomão, eu vos saúdo e agradeço por me terdes libertado de minha prisão!

        O pescador tremia aterrorizado. – Eu não sou Salomão – disse –, o grande rei está morto há milhares de anos!

        O gênio parou e depois riu. – Neste caso, prepare-se para morrer, homenzinho!

        O pescador estava apavorado. – Mas eu o libertei da ânfora! – ele gritou. – Que gratidão é essa?

        – Salomão me prendeu nesta ânfora porque me rebelei contra ele – o gênio explicou – e então, durante os primeiros cem anos, fiz o voto de tornar a quem me libertasse mais rico do que se possa sonhar. Mas não apareceu ninguém. Nos cem anos seguintes, prometi conceder três pedidos ao meu libertador. Mas, de novo, não apareceu ninguém. Então fiquei zangado e fiz um juramento solene: que mataria, no ato, o homem que me libertasse. Portanto, mortal, prepare-se para morrer!

        O pescador implorou em vão pela própria vida. Então pensou depressa e disse finalmente: – Muito bem, você pode me matar, monstro ingrato! Mas, invocando o Mais Terrível Nome de Alá, pelo menos me diga a verdade. – O gênio tremeu ao ouvir o nome de Alá. – Como pôde um gênio grande como você caber numa ânfora tão pequena? – O pescador perguntou. – Você deve ter vindo de um outro lugar.

        O gênio se sentiu insultado. – Homem tolo – vociferou –, você não acredita em mim? Vou lhe mostrar o poder da minha magia e depois matá-lo! – Dizendo isso, o gênio transformou-se numa nuvem de fumaça e entrou de novo na ânfora. Imediatamente, o velho pescador fechou a tampa. Uma voz metálica partiu do objeto. – Deixe-me sair! – o gênio gritava.

        – Jamais! Respondeu o pescador.

        Então o gênio falou com mais delicadeza. – Eu o recompensarei generosamente, se você me soltar! – ele prometeu.

        – Você é um assassino – retrucou o pescador – e eu vou jogar sua ânfora no mar, construir minha casa neste lugar como um aviso às pessoas para que nunca mais pesquem aqui.

        – Não, não! – implorou o gênio. – Eu só o estava testando! Agora que sei que você é um homem temente a Alá, vou recompensá-lo!

        – Você me toma por algum tolo? – o pescador disse rindo. Acendeu o cachimbo, sentou-se na areia e então sorriu. – Isto me lembra a história do “Rei ingrato” – o velho ponderou.

        – Eu não conheço essa história – disse o gênio. – Por favor, conte-a para mim! Porém não posso ouvir bem, dentro desta ânfora, por isso você precisa, primeiro, abrir a tampa.

        – Eu não vou libertá-lo – disse o pescador rindo –, mas vou contar-lhe a história. – E assim ele contou a história de um rei que fora vitimado por uma horrível doença, pior que a lepra. Nenhum de seus médicos e magos o puderam curar até que, um dia, passou por lá um médico que diagnosticou o mal… Esse médico o tratou e o rei, em sinal de gratidão, distinguiu-o com honrarias que jamais concedera a nenhum homem em seus domínios. Isso suscitou a inveja do vizir, que segredou aos ouvidos do rei sobre a facilidade com que o médico poderia envenená-lo. O tolo rei atentou à mentira do vizir e atirou o médico à prisão. Todos os rogos do bom homem foram vãos e o rei condenou-o à morte. Antes de morrer, ele fez menção a um livro que possuía e que continha toda a sabedoria do mundo. Então, o rei apossou-se do livro do defunto e folheou-o simplesmente para descobrir que o volume não trazia uma palavra escrita. Pelo contrário, suas páginas estavam envenenadas e logo depois o rei morreu, em agonia. – Da mesma forma, Alá se vingaria de você, se você me tivesse matado! – o pescador concluiu.

        – Mas nosso caso não tem nada que ver com essa história – protestou o gênio. – É mais parecida com a história do “Príncipe e o Ogre”.

        – Ah! – murmurou o pescador. – Essa eu não conheço. Conte-a para mim.

        – Não consigo lembrar-me dela dentro desta ânfora – disse o gênio. – Solte-me e tenho certeza de que a relembrarei melhor.

        – Outros milhares de anos no fundo do mar refrescarão talvez a sua memória? – perguntou o pescador.

        – Não, não – respondeu o gênio. – Agora me lembro dela.

        – E então ele contou a história, que era, por sinal, maravilhosa. Quando o gênio terminou, o pescador sorriu.

        – Essa foi uma bela história – disse –, mas não tão boa quanto esta aqui… – E assim os dois passaram a tarde trocando histórias, até que o pescador notou a hora avançada. – Preciso deixá-lo em breve, meu amigo – ele disse ao gênio.

        – Por favor, me liberte! – o gênio insistiu. – Prometo que não lhe farei nenhum mal e que o ajudarei. Diante do Mais Terrível Nome, eu juro! – A ânfora sacudiu-se toda quando o gênio tremeu lá dentro.

        O pescador fez uma pausa e depois disse: – Muito bem, eu vou libertá-lo.

        O velho tirou a tampa e o gênio reapareceu. No mesmo instante, com um pontapé, jogou a ânfora ao mar. – Lembre-se do seu juramento! – balbuciou o pescador, cujos joelhos começaram a tremer.

        O gênio franziu o sobrolho e depois ordenou mal-humorado: – Siga-me.

        O gênio conduziu o velho ao mais profundo seio da floresta e pararam junto a um lindo lago rodeado por quatro montanhas. Nas águas nadavam peixes de quatro cores – vermelhos, amarelos, azuis e brancos. – Lance a sua rede aqui – o gênio disse ao velho –, mas somente uma vez por dia. Depois leve ao sultão o que pescar. – Com isso, o gênio bateu o pé no chão, a terra se abriu e ele desapareceu.

        O pescador lançou a rede no lago e pescou imediatamente quatro peixes, um de cada cor. Eram a coisa mais bonita que já vira, de forma que ele correu ao palácio do sultão e os deu de presente ao monarca. O sultão ficou encantado com a beleza dos peixes e recompensou o velho regiamente. Depois entregou-os a um cozinheiro para que os fritasse. Quando este os colocou sobre o fogão, a parede da cozinha rompeu-se com violência e dos escombros saiu uma mulher. – Vocês foram fiéis a seus compromissos? – perguntou aos peixes, e todas as criaturas responderam sim, e a mulher e os peixes desapareceram.

        O cozinheiro relatou o fato ao sultão, mas ele não acreditou. De forma que pediu ao pescador que trouxesse no dia seguinte mais quatro peixes, o que o velho fez. Porém, aconteceu o mesmo: no momento em que o cozinheiro estava prestes a fritar os peixes, a mulher saiu de dentro da parede, dirigiu-se às criaturas e depois desapareceu juntamente com elas. O sultão decidiu constatar o estranho fato por si mesmo, de forma que pediu ao pescador que trouxesse mais quatro peixes, e o velho novamente atendeu. Dessa vez o sultão ficou observando, enquanto o cozinheiro se aprestava para fritá-los. A parede se escancarou e um negro surgiu, perguntando aos peixes: – Vocês foram fiéis aos seus compromissos? – Todos responderam: – Sim – e depois desapareceram juntamente com o estranho.

        – Aqui tem magia! – o sultão falou. Então chamou o pescador ao palácio e perguntou: – Onde você pesca seus peixes? – O velho guiou o sultão até o lago rodeado pelas quatro montanhas. – Acho – pensou o sultão – que vou explorar esta área pessoalmente.

        Nessa noite o sultão enveredou pessoalmente pelas encostas das montanhas até que, afinal, chegou a um castelo. Aventurou-se por aquele lugar sombrio onde não havia viva alma. Então ouviu alguém gemer e, seguindo o som, chegou a um jovem cuja cintura e pernas estavam petrificadas e que se contorcia de dor!

        – Alá tenha piedade! – o sultão exclamou. – O que aconteceu com você? – O jovem espantou-se ao ver um rosto humano no castelo encantado, mas logo lhe contou a história de sua desdita. Ele era o príncipe da Ilhas Ocidentais, explicou, e havia desposado uma mulher maravilhosa. Porém, sua esposa era, na verdade, uma terrível feiticeira, e, pior ainda, amava um outro homem. – Quando soube desse caso maldito – o príncipe continuou – saquei a espada e golpeei o vilão. – Em vingança, a bruxa transformara metade de seu corpo em pedra e enfeitiçara todo o seu reino. Suas ilhas se converteram em montanhas, o mar, num deserto e seu povo querido, nos peixes do lago – rubis, amarelos, azuis e brancos, devido aos quatro compromissos assumidos pelo reino.

        O infeliz príncipe contou que toda noite a feiticeira aparecia e o açoitava; que em algum lugar do palácio jazia seu amante, nem morto nem curado de seu ferimento. – Você precisa partir depressa, antes que a bruxa o encontre aqui! – o príncipe concluiu.

        – Não – respondeu o Sultão –, se puder vou ajudá-lo.

        Estudou a situação e arquitetou um plano. Vasculhou todo o castelo até que descobriu o amante da bruxa, semi-adormecido, em um quarto escuro. O vilão tomou o sultão pela feiticeira e sussurrou por alguns minutos. O sultão ouviu atentamente e depois matou o desgraçado, afastou o infame cadáver e deitou-se na cama, puxando o cortinado. Logo depois a bruxa chegou.

        O sultão imitou a voz de seu amante: – Querida do meu coração – ele disse –, agora, enquanto dormia, soube em sonhos por que não saro de meu sofrimento. É porque todas as noites você atormenta o moço e não ficarei bom até que você o liberte!

        A malvada regozijou-se e correu a libertar o jovem do feitiço. Voltou depois para junto do amado. O sultão sussurrou em voz mais audível: – Sinto que as forças estão me voltando, mas ainda não estou curado. O povo que você transformou em peixe, todas as noites clama a Alá e até que você não o liberte desse sofrimento, Alá não terá compaixão de mim.

        A feiticeira correu para o lago. Pronunciou umas palavras mágicas e, no mesmo instante, as montanhas se transformaram em ilhas, o deserto, em mar, o lago em cidade e, em lugar dos peixes, surgiram todos os súditos. A bruxa correu ao encontro de seu amado e o sultão a matou.

        No momento seguinte, o castelo sombrio converteu-se em um palácio cheio de fontes e de flores. O príncipe e toda a sua corte apressaram-se em agradecer ao sultão por libertá-los e entoaram louvores à sua inteligência e bravura. O sultão, porém, era um homem honesto e justo, de forma que mandou chamar o velho pescador. – Este é o homem a quem devemos homenagear – declarou. O sultão não era casado e quando conheceu a filha mais velha do pescador, apaixonou-se e casou-se com ela, fazendo-a sua rainha. Depois, o príncipe conheceu a filha mais moça do pescador, apaixonou-se e casou-se com ela. Finalmente, o sultão concedeu ao pescador uma túnica de honra e uma riqueza fabulosa.

        – Você nunca mais precisará pescar – declarou o sultão. E assim o velho e sua esposa passaram o resto de seus dias cercados de conforto e honrarias. O velho, porém, ia frequentemente pescar – para matar as saudades.

Resumo do conto “O pescador e o gênio”, extraído de R. Burton, Tales from the Arabian Nigths. Nova York, Avenel, 1978.

Entendendo o conto:

01 – Qual era a rotina diária do velho pescador e o que aconteceu em um dia de má sorte?

      O velho pescador lançava sua rede quatro vezes ao dia, nem mais nem menos, para ganhar a vida. Em um dia de má sorte, ele pescou um asno morto, uma urna cheia de areia e apenas cacos de cerâmica nas três primeiras tentativas.

02 – O que o pescador encontrou na sua última tentativa e qual foi a sua reação inicial ao abri-lo?

      Na última tentativa, o pescador encontrou uma pequena ânfora de cobre selada com textos sagrados. Ao abri-la por curiosidade, uma nuvem de fumaça vazou e um gênio horrível se materializou, deixando o pescador aterrorizado.

03 – Qual foi a promessa original do gênio para seu libertador nos primeiros cem anos e o que mudou depois?

      Nos primeiros cem anos de prisão, o gênio prometeu tornar quem o libertasse mais rico do que se possa sonhar. Como ninguém apareceu, nos cem anos seguintes ele prometeu conceder três pedidos. Por fim, zangado pela espera, ele jurou matar quem o libertasse.

04 – Como o pescador conseguiu enganar o gênio para que ele retornasse à ânfora?

      O pescador usou de astúcia, questionando a capacidade do gênio de caber numa ânfora tão pequena, sugerindo que ele "deve ter vindo de um outro lugar". Sentindo-se insultado e para provar seu poder, o gênio se transformou em fumaça e voltou para dentro da ânfora, momento em que o pescador rapidamente a fechou.

05 – Que história o pescador conta ao gênio enquanto ele está preso na ânfora, e qual é a moral dessa história?

      O pescador conta a história do "Rei Ingrato". A moral da história é que a ingratidão e a falta de ética podem levar a consequências desastrosas e à própria ruína, como aconteceu com o rei que, por inveja de seu vizir, matou o médico que o curou e acabou envenenado pelo próprio livro do médico.

06 – Como o gênio finalmente consegue ser libertado da ânfora?

      O gênio consegue ser libertado ao insistir e jurar diante do "Mais Terrível Nome" de Alá que não faria mal ao pescador e o ajudaria. O pescador, após uma pausa, decide confiar e remove a tampa da ânfora.

07 – Para onde o gênio leva o pescador após ser libertado e o que ele o instrui a fazer?

      O gênio leva o pescador ao mais profundo seio da floresta, onde encontram um lindo lago rodeado por quatro montanhas. O gênio instrui o pescador a lançar sua rede ali somente uma vez por dia e a levar o que pescar ao sultão.

08 – Qual é o mistério dos peixes coloridos e o que acontece quando o cozinheiro tenta fritá-los?

      Os peixes são de quatro cores: vermelhos, amarelos, azuis e brancos. Quando o cozinheiro tenta fritá-los, a parede da cozinha se rompe, e uma mulher ou um negro (dependendo da vez) emerge, pergunta aos peixes se foram fiéis aos seus compromissos, e então desaparece com eles.

09 – Quem é o jovem petrificado encontrado pelo sultão no castelo encantado e qual é a causa de sua maldição?

      O jovem petrificado é o príncipe das Ilhas Ocidentais, cuja cintura e pernas foram transformadas em pedra. Sua maldição foi causada por sua esposa, uma terrível feiticeira, que o amava e, em vingança por ele ter golpeado seu amante, o petrificou e enfeitiçou todo o seu reino, transformando-o em montanhas, o mar em deserto, e seu povo em peixes coloridos.

10 – Como o sultão consegue reverter o feitiço e quais são as recompensas para o pescador e sua família?

      O sultão arquitetou um plano, descobriu o amante da bruxa, o matou e se passou por ele. Ele enganou a feiticeira fazendo-a libertar primeiro o príncipe e depois o povo transformado em peixes, usando o nome de Alá. Após a libertação, o sultão mata a bruxa, e o castelo se transforma. O sultão casa-se com a filha mais velha do pescador, o príncipe casa-se com a filha mais moça, e o pescador recebe uma túnica de honra e uma riqueza fabulosa, nunca mais precisando pescar.

CONTO: O HOMEM DA FAVELA - MANOEL LOBATO - COM GABARITO

 Conto: O HOMEM DA FAVELA

             Manoel Lobato

        Doutor Levi dá plantão no Hospital dos Operários, que fica perto de uma favela. Ele é meio conhecido na favela porque sobe o morro de vez em quando, em visita médica à Associação dos Deficientes Visuais. Mesmo assim, já foi assaltado nove vezes, sempre de manhã, quando está saindo do pátio em seu carro. Por causa disso, Dr. Levi anda prevenido. Não compra revólver, mas, ao deixar o plantão, já vem com a chave do carro na mão, passos rápidos, abre a porta, entra depressa, liga o motor, engrena a marcha, acelera e dispara. Não se preocupa com os malandros que tentam abordá-lo na estrada.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgeFm5DgFdqVxJQT8pRF2rdJtU-PM4U7PPNJ3l2r-khkSKpYqNwvzEwvNWpKZHA9TYTDzB5jMMMozQDKtZWAEi_gFZ1So4Cd7aiS8AD-DYCnhGglU0wjFsnHyYjKPWMxVETbkUs55aJRIkLJj_lqsnXmKTB_cqVmrhXwKiRkmjw8GP5orAbCTp7OEQTntg/s320/hospital-do-trabalhador-970x550.jpg


        A neblina prejudica a visão do médico nessa manhã de inverno. Ele aperta o dispositivo de água, liga o limpador que faz o semicírculo com seu rastro no para-brisa. Vê no meio da estrada, ainda distante, um pedestre que finge embriaguez. O marginal está um tanto desnorteado, meio aéreo, andando sem rumo, em ziguezague. Parece trazer um porrete na mão.

        Dr. Levi será obrigado a diminuir a aceleração e reduzir a marcha. Se o mau elemento continuar na pista, terá de frear. Se parar, poderá ser assaltado pela décima vez. O carro se aproxima do malandro. Ele usa boné com o bico puxado para a frente, cobrindo-lhe a testa. Óculos escuros para disfarce, ensaia os cambaleios, tomba um pouco a cabeça, olha um pouco para cima, procura o Sol que está aparecendo, sem pressa, com má vontade.

        O médico, habituado a salvar vidas, tem ímpetos de matar. Acelera mais, joga o farol alto na cara do pilantra, buzina repetidas vezes. O mau-caráter faz que procura o acostamento, mas permanece na pista.

        O carro vai atropelar o velhaco. Talvez até passe por cima dele se continuar fingindo que está bêbado. Menos um pra atrapalhar a vida de gente séria.

        O esperto pressente o perigo, deve ter adivinhado que o automóvel não vai desviar-se dele, ouve de novo a buzina, o barulho do motor cada vez mais acelerado. De fato, o carro não se desvia de seu intento. Obstinado, segue seu rumo. Vai tirar um fino.

        O vivaldino é atingido de raspão, cambaleia agora de verdade, cai de lado. O cirurgião ouve o baque, sente o impacto do esbarro. Vê pelo retrovisor externo a vítima caída à beira da estrada. O vidro de trás está embaçado, mas permite distinguir o vulto, imagem refratada. Gotas de água escorrem pelo vidro, não como lágrimas e sim como bagas de suor pelo esforço da corrida. Não há piedade, há cansaço.

        Dr. Levi nota que o retrovisor externo está torto, danificado. Diminui a marcha, abaixa o vidro lateral, tateia o retrovisor do lado de fora. O espelho está partido, sujo de sangue. O profissional se sente vingado, satisfeito, vitorioso, como se estivesse saindo do bloco cirúrgico, após delicada operação, na qual fica provada sua frieza, competência, habilidade. O dom de salvar o semelhante e também salvar-se.

        No dia seguinte, ao cair da tarde, chega o plantonista ao Hospital dos Operários. Toma conhecimento do acidente. O paciente – algumas fraturas, escoriações – está fora de perigo. Deu entrada ontem de manhã, mal havia chegado o substituto do Dr. Levi.

        Na ficha, anotações sobre a vítima: funcionário da Associação. Seus pertences: recibos das mensalidades, uns trocados, óculos e bengala. Cego.

LOBATO, Manoel. "O homem da favela". In: LEITE, Alcione Ribeiro (Org.). O fino do Conto. Belo Horizonte. Editora RHJ, 1989.

Fonte: Língua Portuguesa: Singular & Plural. Laura de Figueiredo; Marisa Balthasar e Shirley Goulart – 6º ano – Moderna. 2ª edição, São Paulo, 2015. p. 248-249.

Entendendo o conto:

01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras baixo:

·        Ímpeto: impulso.

·        Obstinado: persistente, firme.

·        Vivaldino: pessoa muito esperta, que age com malandragem.

·        Refratada: refletida.

02 – Qual a profissão e o local de trabalho do Dr. Levi?

      O Dr. Levi é um médico que trabalha de plantão no Hospital dos Operários, localizado próximo a uma favela.

03 – Por que o Dr. Levi adota uma atitude de precaução ao sair do hospital?

      O Dr. Levi adota essa atitude porque já foi assaltado nove vezes ao sair do pátio do hospital, sempre pela manhã. Por isso, ele age rapidamente ao entrar no carro, ligar o motor e sair em disparada para evitar um novo assalto.

04 – Como o "pedestre" na estrada se apresenta inicialmente e o que ele parece ter na mão?

      O pedestre se apresenta fingindo embriaguez, andando de forma desnorteada e em ziguezague no meio da estrada. Ele parece trazer um porrete na mão.

05 – Qual a reação inicial do Dr. Levi ao ver o homem na estrada e o que ele faz para tentar afastá-lo?

      Apesar de ser médico e ter o hábito de salvar vidas, o Dr. Levi sente "ímpetos de matar". Ele acelera o carro, joga o farol alto na cara do homem e buzina repetidamente para tentar afastá-lo da pista.

06 – O que acontece com o homem após o Dr. Levi não desviar o carro?

      O homem é atingido de raspão, cambaleia de verdade, cai de lado e fica à beira da estrada.

07 – Qual a reação do Dr. Levi ao perceber o dano no retrovisor e o que isso significa para ele?

      O Dr. Levi nota que o retrovisor externo está torto e com sangue. Ele se sente vingado, satisfeito e vitorioso, comparando a situação a uma cirurgia delicada onde prova sua frieza, competência e habilidade.

08 – Qual a revelação chocante sobre a identidade do homem atropelado no final do conto?

      A revelação chocante é que o homem atropelado era um funcionário da Associação dos Deficientes Visuais, onde o Dr. Levi fazia visitas médicas, e ele era cego.