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sexta-feira, 28 de março de 2025

CONTO: CONTO DE TODAS S CORES - MÁRIO QUINTANA - COM GABARITO

 Conto: Conto de todas as cores

           Mário Quintana

        Eu já escrevi um conto azul, vários até. Mas este é um conto de todas as cores. Porque era uma vez um menino azul, uma menina verde, um negrinho dourado e um cachorro com todos os tons e entretons do arco-íris.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjjOGpvNWGoqb-wWTBEQ05-D0E4uKzi658beSNewtXc3Mtipg2EicopHWttBO4y0uJWRAdlU3TM7kgdsKXNFgvBf7xZXWNEI1VjbMc3w7diQOi6XrLPnmEchxBr-Q1E-cvr6hM473Ql_01O5h4gzQ8MC1VN-34s3t1PHUrgVFvBK2hdxpNesY-NA5XvXO8/s1600/1469963_661473227238343_1256354448_n.jpg


        Até que apareceu uma Comissão de Doutores, os quais, por mais que esfregassem os nossos quatro amigos, viram que não adiantava... E perguntaram se aquilo era de nascença ou se... 

        -- Mas nós não nascemos – interrompeu o cachorro. – Nós fomos inventados!

QUINTANA, Mário. A Vaca e o Hipogrifo. 3. ed. Porto Alegre, L&PM, 1979. p. 34.

Fonte: Português. Série novo ensino médio. Volume único. Faraco & Moura – 1ª edição – 4ª impressão. Editora Ática – 2000. São Paulo. p. 33.

Entendendo o conto:

01 – Qual a característica peculiar dos personagens no conto de Mário Quintana?

      Os personagens possuem cores incomuns: um menino azul, uma menina verde, um negrinho dourado e um cachorro com todas as cores do arco-íris.

02 – Quem aparece para interagir com os personagens e qual a reação deles?

      Uma Comissão de Doutores aparece e tenta, sem sucesso, mudar as cores dos personagens.

03 – Qual a resposta inusitada do cachorro quando questionado sobre a origem das cores?

      O cachorro afirma que eles não nasceram, mas foram inventados.

04 – Qual a possível interpretação da presença da "Comissão de Doutores" na história?

      A Comissão de Doutores pode representar a sociedade e suas normas, que tentam padronizar e homogeneizar os indivíduos, desconsiderando a diversidade.

05 – Qual a principal mensagem que Mário Quintana transmite com este conto?

      A mensagem central do conto é uma celebração da diversidade e da individualidade, além de uma crítica à tentativa de padronização imposta pela sociedade.

CONTO: CAVALOS SELVAGENS - LYGIA FAGUNDES TELLES - COM GABARITO

 Conto: Cavalos selvagens

           Lygia Fagundes Telles

        O homem de grandes negócios fecha a pasta de zíper e tom o avião da tarde. O homem de negócios miúdos enche o bolso de miudezas e toma o ônibus da madrugada. A mulher elegante faz Cooper e sauna na quinta-feira. A mulher não elegante faz feira no sábado. A freira faz orações diariamente em horas certas. A prostituta faz o trottoir todos os dias em certas horas. O patriarca joga bridge e faz amor segundo o calendário. O operário joga bilhar e faz amor nos feriados. Homens, mulheres e crianças – todos com seus dias previstos e organizados: amanhã tem missa de sétimo dia, depois de amanhã tem casamento. Batizado na terça e, na quarta, macarronada, que a feijoada fica para sábado, comemoração prévia do futebol de domingo, vitória certa, ora sei!... As obedientes engrenagens da máquina funcionando com suas rodinhas ensinadas, umas de ouro, outras de aço, estas mais simples, mais complexas aquelas lá adiante, azeitadas para o movimento que é uma fatalidade, taque-taque taque-taque… Apáticos e não apáticos, convulsos e apaziguados, atentos e delirantes em pleno funcionamento num ritmo implacável.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiqW4pMBKTX_shbx8e65ecrB8dwWW8SDAD12NmiAdnOFjEUo0DQ38V_QAMsHVYGuE439d1PP6Y62weCNqyxDDrkFx7xzqk4xdB4Kcsq2uj_e6dCcY6A4e6Vqg6kSEGKGEqQexKGphdOO8Lg5W0KGdzYKdXT0J8faXBPiqvYR8P7RoKOtXGC5PYS7TWWwgE/s320/cavalosselvagens-240411195611-d94f9e7e-thumbnail.jpg


        Às vezes, por motivos obscuros ou claros, uma rodinha da engrenagem salta fora e fica desvairada além do tempo, do espaço – onde? A máquina prossegue no seu funcionamento que é uma condenação, apenas aquela rodinha já não faz parte dessa ordem. “É um desajustado” – diz o médico, o amigo íntimo, o primo, a mulher, a amante, o chefe. Há que readaptá-lo depressa à engrenagem familiar e social, apertar esses parafusos docemente frouxos. Se o desajustado é um adolescente, mais fácil reconduzi-lo com a ajuda psicólogos, analistas, padres, orientadores, educadores – mas por que ele ainda não está nos eixos? Por que tem que haver certas peças resistindo assim inconformadas? Não interessa curá-lo, mas neutralizá-lo, taque-taque taque-taque.

        Pronto, passou a crise? Todos concordam, ele está ótimo ou quase. Mas às vezes o olhar tem aquela expressão que ninguém alcança e volta o fervor antigo, cólera e gozo nos descompromissamentos e rupturas – aguda a lembrança violenta do cheiro de mato que recusa o asfalto, o elevador, a disciplina, ah! vontade de fugir sem olhar para trás, desatino e alegria de um cavalo selvagem, os fogosos cavalos de crina e narinas frementes, escapando do laço do caçador. Na história de Arthur Miller, eram os pobres cavalos selvagens destinados a uma fábrica que os transformaria num precioso produto enlatado. O instinto, só o instinto os advertia das armadilhas nas madrugadas. E fugiam galopando por montes, rios, vales – até quando?

        Inexperiência ou cansaço? Cavalos e homens acabam por voltar à engrenagem. Muitos esquecem mas alguns ainda se lembram e o olhar toma aquela expressão que ninguém entende, ânsia de liberdade. De paixão. Em fragmentos de tempo voltam a ser inabordáveis mas a máquina vigilante descobre os rebeldes e aciona o alarme, mais poderoso o apelo, taque-taque TAQUE-TAQUE! Inútil. Ei-los de novo desembestados: “Laçá-los é o mesmo que laçar um sonho”.

Lygia Fagundes Telles, A disciplina do amor. 2 ed. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1980. p. 131-2.

Fonte: Português. Série novo ensino médio. Volume único. Faraco & Moura – 1ª edição – 4ª impressão. Editora Ática – 2000. São Paulo. p. 13-14.

Entendendo o conto:

01 – Qual é a metáfora central utilizada no conto "Cavalos Selvagens" para descrever a sociedade?

      A sociedade é comparada a uma máquina com engrenagens, representando a rotina e a padronização da vida cotidiana.

02 – O que representam os "cavalos selvagens" no contexto do conto?

      Os cavalos selvagens simbolizam a liberdade, o desejo de romper com a rotina e a resistência à conformidade social.

03 – Qual é a atitude da sociedade em relação àqueles que se desviam da norma?

      A sociedade busca "readaptar" os "desajustados", neutralizando sua individualidade e reconduzindo-os à engrenagem social.

04 – Como o conto aborda a questão da liberdade individual versus a conformidade social?

      O conto explora a tensão entre o desejo de liberdade e a pressão para se conformar às normas sociais, mostrando a luta entre a individualidade e a padronização.

05 – Qual é o significado da frase "Laçá-los é o mesmo que laçar um sonho"?

      Essa frase destaca a dificuldade de aprisionar o desejo de liberdade e a natureza intangível dos sonhos e aspirações individuais.

06 – De que forma Lygia Fagundes Telles usa a linguagem para transmitir a sensação de opressão e desejo de liberdade?

      A autora utiliza uma linguagem concisa e direta para descrever a rotina opressiva, intercalando com passagens poéticas que evocam a beleza e a intensidade da liberdade.

07 – Qual é a mensagem principal que Lygia Fagundes Telles busca transmitir com o conto "Cavalos Selvagens"?

      A mensagem principal é uma reflexão sobre a natureza da liberdade individual e a luta contra as forças da conformidade social, além de instigar o leitor a questionar a própria relação com a rotina e os desejos de liberdade.

 

 

CONTO: SOLANGE, A NAMORADA - CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE - COM GABARITO

 Conto: Solange, a namorada

           Carlos Drummond de Andrade

        Todas as moças perdiam para Solange. Nenhuma podia competir com ela em matéria de namoro. Os rapazes da cidade só alimentavam uma aspiração: que Solange olhasse para eles. Desdenhavam todas as outras, ainda que fossem lindas, cheias de graça e boas de namorar. Namorar Solange, merecer o favor de seus olhos: que mais desejar na vida?

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj_MPWTAEj7PO3rySWg5UDh8CpTgWo-ZJkGz8wAjSDojuAD8tviO8qXdSYtiroFiOZkhq2HqfC9d-zzLaDT_o1QZBEy-RRivAIjVovvEbv8466vzQiImCAZBclFqQ4Ft60_33UlMLbd2XxMoPGjeUB8dRWVJfNxBzplf_jmBeJ_dneOAktjfjDysFsz-_k/s320/2756068-bela-jovem-mulher-com-sorvete-colorido-desenho-realistaial-ilustracao-de-pinturas-vetor.jpg


        A nenhum deles Solange namorava. Era uma torre, um silêncio, um abismo, uma nuvem. Sua família inquietava-se com isto e pedia-lhe que pelo amor de Deus escolhesse um rapaz e namorasse. O vigário exortou-a nesse sentido. O prefeito apelou para os seus bons sentimentos. Ninguém mais casava, a legião de tias era assustadora. Temia-se pela ordem social.

        O desaparecimento de Solange até hoje não foi explicado, mas dizem que em carta endereçada à família ela declarou que, para ser a namorada em potencial de todos, não podia ser namorada de um só, mesmo que sucessivamente trocasse de namorado. Estava certa de que exercia uma função de sonho, que a todos beneficiava. Mas se não era assim, e ninguém compreendia sua doação ideal a todos os moços, ela decidira sumir para sempre, e adeus.

        Adeus? Ignora-se para onde foi Solange, mas aí é que se converteu em mito supremo, e nunca mais ninguém namorou na cidade. As moças envelheceram e morreram, a igreja fechou as portas, o comércio definhou e acabou, as casas tombaram em ruínas, tudo lá ficou uma tapera.

ANDRADE, Carlos Drummond de. Contos plausíveis. Rio de Janeiro, José Olympio, 191. p. 151.

Fonte: Português. Série novo ensino médio. Volume único. Faraco & Moura – 1ª edição – 4ª impressão. Editora Ática – 2000. São Paulo. p. 36.

Entendendo o conto:

01 – Qual a característica principal de Solange que a diferenciava das outras moças da cidade?

      Solange era incomparável em matéria de namoro, sendo o objeto de desejo de todos os rapazes da cidade.

02 – Como a família e a comunidade reagiram à recusa de Solange em namorar alguém?

      A família, o vigário e o prefeito pressionaram Solange para que ela escolhesse um rapaz, temendo as consequências sociais de sua recusa.

03 – Qual a explicação dada por Solange em sua carta para justificar seu desaparecimento?

      Solange explicou que, para ser a namorada em potencial de todos, não poderia se comprometer com um único rapaz, e que sua função era a de um sonho coletivo.

04 – Qual o impacto do desaparecimento de Solange na cidade?

      Após o desaparecimento de Solange, a cidade entrou em declínio, com o fim dos namoros, o envelhecimento das moças e a ruína do comércio e das casas.

05 – Qual o significado da transformação de Solange em "mito supremo"?

      A transformação de Solange em mito representa a idealização da figura feminina e a perda do ideal de namoro e romance na cidade.

06 – Como Carlos Drummond de Andrade utiliza a figura de Solange para criticar a idealização do amor romântico?

      Drummond utiliza a figura de Solange para satirizar a idealização do amor romântico, mostrando como a obsessão por um ideal inatingível pode levar à ruína e ao declínio social.

07 – Qual a mensagem principal do conto "Solange, a namorada"?

      A mensagem principal do conto é uma crítica à idealização excessiva do amor e do romance, mostrando como a obsessão por um ideal inatingível pode levar à frustração e ao declínio social.

 

 

 

CONTO: O ATENEU - CAP. IV - FRAGMENTO - RAUL POMPEIA - COM GABARITO

 Conto: O Ateneu cap. IV – Fragmento

            Raul Pompéia

        [...]

        Depois das horas do serão de estudo, quando se retiravam os estudantes para os dormitórios, fiquei com o Franco a trabalhar. Tive que suspender, ao fim de quatro páginas. Devorava-me o remorso como uma febre; aterrava-me a ideia do banho na manhã seguinte, os rapazes atirando-se à vingança pérfida, a água toldada de rubro. Impossível fazer mais uma linha. Deixei o companheiro e fugi para o salão dos médios.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEibM2aPu-oF7r4QY5VdwRMmlgo2wuH3V0PYANBzkeCU1Hq-yS-L2RF4NlvydMULSRMNci9TPkRmaucO4D4QUAQOfMy0AApSLTuCSDh7jFpfarIaLCM1Vt8njVE4H21hE9QPetAHzWel2KswIMJiTJ0dBVzWzr0wxGu-f_VfwvLUshw9WTGgeBG1sVBmhwM/s320/o-ateneu-.jpg


        A excitação recrudesceu; eu rolava na cama sobre um tormento de lascas cortantes. Que fazer? Denunciar o Franco de madrugada? Correr, às escuras, e abrir o escoadouro ao tanque? Prevenir aos colegas pedindo que espalhassem? A controvérsia avultava-me no crânio como uma inchação de meninges. Dar-se-ia caso que Franco, possuído de arrependimento, fosse apresentar cedinho aos inspetores a delação do próprio feito? Cheguei a tentar o engodo da consciência com a ponderação de que talvez não saltassem ao tanque muitos de uma vez, e o primeiro ferido salvaria os outros. Mas a febre vencia, com a perspectiva do sangue. Dez, vinte, trinta rapazes, à borda, gemendo, extraindo dificilmente da carne as lascas encravadas! E eu, cúmplice, que o permitira, e maior culpado, que me não cegava a razão, em suma, de justa desforra...

        Ergui-me da cama, e descalço nas tábuas frias, para ver se me acalmava o mal-estar, errei pelos salões adormecidos.

        Os colegas, tranquilos, na linha dos leitos, afundavam a face nas almofadas, palejante da anemia de um repouso sem sonhos. Alguns afetavam um esboço comovedor de sorriso ao lábio; alguns, a expressão desanimada dos falecidos, boca entreaberta, pálpebras entrecerradas, mostrando dentro a ternura embaciada da morte. De espaço a espaço, os lençóis alvos ondeavam do hausto mais forte do peito, aliviando-se depois por um desses longos suspiros da adolescência, gerados, no dormir da vigília inconsciente do coração. Os menores, mais crianças, conservavam uma das mãos ao peito, outra a pender da cama, guardando no abandono do descanso uma atitude ideal de voo. Os mais velhos, contorcidos no espasmo de aspirações precoces, vergavam a cabeça e envolviam o travesseiro num enlace de carícias. O ar de fora chegava pelas janelas abertas, fresco, temperado da exalação noturna das árvores; ouvia-se o grito compassado de um sapo, martelando os segundos, as horas, a pancadas de tanoeiro; outros e outros, mais longe. O gás, frouxamente, nas arandelas de vidro fosco, bracejando dos balões de asa de mosca, dispersava-se igual sobre as camas. doçura dispersa de um olhar de mãe.

        Que venturosa segurança naquele museu de sono! E amanhã, pobres colegas! o banho, a volta, pés ensanguentados, listrando de vestígios vermelhos o caminho!

        Voltei ao meu salão. Tirei da gaveta a imagem de Santa Rosália; beijei-a com lágrimas, pedi conselho como um filho. A inquietação não passava.

        [...].

POMPÉIA, Raul. O Ateneu. 20. ed. São Paulo, Ática, 1998. p. 61-62. (Série Bom Livro).

Fonte: Português. Série novo ensino médio. Volume único. Faraco & Moura – 1ª edição – 4ª impressão. Editora Ática – 2000. São Paulo. p. 230.

Entendendo o conto:

01 – Qual o sentimento que domina o narrador após o estudo com Franco?

      O narrador é dominado pelo remorso e pelo terror, antecipando o banho na manhã seguinte e a vingança dos colegas.

02 – Que opções o narrador considera para evitar a tragédia no banho?

      O narrador considera denunciar Franco, esvaziar o tanque ou alertar os colegas, mas nenhuma opção o tranquiliza completamente.

03 – Como o narrador descreve o sono dos colegas?

      O narrador descreve o sono dos colegas como tranquilo e vulnerável, com expressões de inocência e fragilidade.

04 – Que detalhes da descrição do dormitório contribuem para a atmosfera do fragmento?

      A descrição do silêncio, da luz fraca, dos suspiros e da brisa noturna cria uma atmosfera de calma e melancolia, contrastando com a angústia do narrador.

05 – Qual a reação do narrador diante da imagem de Santa Rosália?

      O narrador beija a imagem de Santa Rosália e pede conselho, buscando alívio para sua inquietação.

06 – Qual a importância do banho para o narrador?

      O banho representa um momento de violência iminente, que perturba profundamente o narrador e o leva a questionar sua própria culpa.

07 – Que temas o fragmento aborda?

      O fragmento aborda temas como culpa, medo, violência, inocência e a fragilidade da condição humana, explorando as complexidades da psicologia do narrador.

 

 

CONTO: A VIDA EM OBLIVION - (FRAGMENTO) - MONTEIRO LOBATO - COM GABARITO

 Conto: A VIDA EM OBLIVION – Fragmento

            Monteiro Lobato

        A cidadezinha onde moro lembra soldado que fraqueasse na marcha e, não podendo acompanhar o batalhão, à beira do caminho se deixasse ficar, exausto e só. Com os olhos saudosos pousados na nuvem de poeira erguida além.

        Desviou-se dela a civilização. O telégrafo não a põe à fala com o resto do mundo, nem as estradas de ferro se lembram de uni-la à rede por intermédio de humilde ramalzinho.

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjzfrjYV1K_Q-LefnkC963BvHZAQdeWZua8hulzWg9K-zDyb1mLOgN89bZi5SSkVdTCf13j-sZeaEOttr1Af2jU4H0KsIM_GYJVNXfTjI2Pe5I-LnrkdBEB3PUdJq6h80NTY2BToPfXBbZs3nB_oVzkedjnNkQD5u-LGEqKXTUTVZFQjFLCu_b90NCKcL4/s1600/OBLIVION.jpg


        O mundo esqueceu Oblivion, que já foi rica e lépida, como os homens esquecem a atriz famosa logo que se lhe desbota a mocidade. E sua vida de vovó entrevada, sem netos, sem esperanças, é humilde e quieta como a do urupê escondido no sombrio dos grotões.

        Trazem-lhe os jornais o rumor do mundo, e Oblivion comenta-o com discreto parecer. Mas como os jornais vêm apenas para meia dúzia de pessoas, formam estas a aristocracia mental da cidade. São “Os Que Sabem”. Lembra o primado dos Dez de Veneza, esta sabedoria dos Seis de Oblivion.

        Atraídos pelas terras novas, de feracidade sedutora, abandonaram-na seus filhos; só permaneceram os de vontade anemiada, débeis, faquirianos. “Mesmeiros”, que todos os dias dizem as mesmas coisas, dormem o mesmo sono, sonham os mesmos sonhos, comem as mesmas comidas, comentam os mesmos assuntos, esperam o mesmo correio, gabam a passada prosperidade, lamuriam do presente e pitam – pitam longos cigarrões de palha, matadores do tempo.

        [...].

LOBATO, Monteiro. Cidades mortas. 12. ed. São Paulo, Brasiliense, 1965. p. 9-10.

Fonte: Português. Série novo ensino médio. Volume único. Faraco & Moura – 1ª edição – 4ª impressão. Editora Ática – 2000. São Paulo. p. 293.

Entendendo o conto:

01 – Como o narrador descreve a cidade de Oblivion?

      O narrador compara Oblivion a um soldado exausto, deixado para trás pela civilização, isolado e esquecido pelo mundo.

02 – Quais as características da vida em Oblivion?

      A vida em Oblivion é descrita como quieta, humilde e estagnada, comparada à de um "urupê escondido no sombrio dos grotões". Os habitantes vivem em uma rotina monótona, repetindo os mesmos hábitos e conversas.

03 – Quem são "Os Que Sabem" em Oblivion?

      "Os Que Sabem" são um pequeno grupo de pessoas que têm acesso aos jornais e, portanto, ao "rumor do mundo". Eles formam a aristocracia intelectual da cidade.

04 – Por que os jovens deixaram Oblivion?

      Os jovens foram atraídos pelas "terras novas, de feracidade sedutora", buscando prosperidade e oportunidades em outros lugares.

05 – Quem permaneceu em Oblivion?

      Permaneceram em Oblivion aqueles com "vontade anemiada, débeis, faquirianos", ou seja, pessoas sem ambição ou energia para buscar uma vida melhor.

06 – Qual a principal atividade dos habitantes de Oblivion?

      Os habitantes de Oblivion passam o tempo fumando longos cigarrões de palha, "matadores do tempo", enquanto lamentam o passado e esperam o correio.

07 – Qual o tema central do conto?

      O conto aborda o tema do isolamento, da estagnação e da decadência de uma cidade que foi esquecida pelo progresso e pela civilização, retratando a vida de seus habitantes presos a um ciclo de mesmice e nostalgia.

 

CONTO: A HISTÓRIA DA ARTE - (FRAGMENTO) - ERNEST H. GOMBRICH - COM GABARITO

 Conto: A história da arte – Fragmento

           Gombrich

        [...]

        Todos nós somos inclinados a aceitar formas ou cores convencionais como as únicas corretas. Por vezes, as crianças pensam que as estrelas devem ter o formato estelar, embora não o tenham naturalmente. As pessoas que insistem em que, num quadro, o céu deve ser azul e a grama verde, não são muito diferentes dessas crianças. Indignam-se se veem outras cores num quadro, mas se tentarmos esquecer tudo o que ouvimos a respeito de grama verde e céu azul, e olharmos o mundo como se tivéssemos acabado de chegar de outro planeta numa viagem de descoberta e o víssemos pela primeira vez, talvez concluíssemos que as coisas são suscetíveis de apresentar as cores mais surpreendentes.

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiajZK0WliMvDYET-gG5dfFwlJ9aiQUzIMrD0hB0urr51boKd67kCh2WbaHzkOtr-0rQqOpCClHNpDZWxdCSImR3rk4qCr6PsGhL_Zb1ZDRNl_YTDh8Pkx3SeKLhW4JAWfFnSF85y0x6Od_bC5BadYgg7n_K6vlxSuZ-01I2MQeSzEc3yUa05peeocZABQ/s320/Historiadaarte.jpg


        Ora, os pintores sentem, às vezes, como se estivessem empreendendo tal viagem de descoberta. Querem ver o mundo como se fosse uma novidade e rejeitar todas as noções aceitas e todos os preconceitos sobre a carne ser rosada e as maçãs amarelas ou vermelhas. Não é fácil libertarmo-nos dessas ideias preconcebidas, mas os artistas que melhor conseguem fazê-lo produzem frequentemente as obras mais excitantes. São eles quem nos ensinam a ver na natureza novas belezas de cuja existência nunca havíamos sonhado. Se os acompanharmos e aprendermos através deles, até mesmo um relance de olhos para fora de nossa própria janela poderá converter-se numa aventura emocionante.

 GOMBRICH, Ernest H. A história da Arte. Trad. Álvaro Cabral. 16. ed. Rio de Janeiro, Livros Técnicos e Científicos, 1999. p. 29.

Fonte: Português. Série novo ensino médio. Volume único. Faraco & Moura – 1ª edição – 4ª impressão. Editora Ática – 2000. São Paulo. p. 420-421.

Entendendo o conto:

01 – Qual a tendência comum que o autor identifica em relação à percepção das cores?

      O autor observa que as pessoas tendem a aceitar cores convencionais como as únicas corretas, como o céu azul e a grama verde, sem questionar a variedade de cores presentes na natureza.

02 – Como o autor compara a visão das crianças com a de algumas pessoas em relação à arte?

      O autor compara a crença infantil de que as estrelas têm formato estelar com a insistência de algumas pessoas em que a arte deve representar o mundo de forma realista, com cores convencionais.

03 – Qual a proposta do autor para uma nova forma de observar o mundo?

      O autor sugere que devemos olhar o mundo como se o víssemos pela primeira vez, livres de preconceitos e noções pré-concebidas, para perceber as cores surpreendentes da natureza.

04 – Qual o papel dos artistas na nossa percepção da natureza, segundo o autor?

      Segundo o autor, os artistas nos ensinam a ver novas belezas na natureza, mostrando-nos aspectos que antes não percebíamos, e transformando nossa visão do mundo.

05 – Qual o impacto da arte na nossa vida cotidiana, de acordo com o autor?

      O autor afirma que, ao aprendermos a ver o mundo através dos olhos dos artistas, até mesmo a paisagem da nossa janela pode se tornar uma aventura emocionante.

 

domingo, 23 de março de 2025

CONTO: CORAÇÕES SOLITÁRIOS - FRAGMENTO - RUBEM FONSECA - COM GABARITO

 Conto: Corações Solitários – Fragmento

            Rubem Fonseca

        Eu trabalhava em um jornal popular como repórter de polícia. Há muito tempo não acontecia na cidade um crime interessante envolvendo uma rica e linda jovem da sociedade, mortes, desaparecimentos, corrupção, mentiras, sexo, ambição, dinheiro, violência, escândalo.

        Crime assim nem em Roma, Paris, Nova York, dizia o editor do jornal, estamos numa fase ruim.

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEimuzZ9DHXFmoco4P5eHklzVMpeH54nsb-DC4W6MEKPfs1cSnA679EtDKiX8juE7u-aDnqZupz6c9J5KG-L9mdpQAXoAnZJcgreOt8__nGVQywoMqEDJMTl0DruLgU5POCduOTQeJJTYtsK8yH3OS0CwO7ATWv-k_j914VlyGVOGq4-SoK_Mxlbx-5FYhg/s320/POLICIAL.png


        Mas daqui a pouco isso vira. A coisa é cíclica, quando a gente menos espera estoura um daqueles escândalos que dá matéria para um ano. Está tudo podre, no ponto, é só esperar.

        Antes de estourar me mandaram embora.

        Só tem pequeno comerciante matando sócio, pequeno bandido matando pequeno comerciante, polícia matando pequeno bandido. Coisas pequenas, eu disse a Oswaldo Peçanha, editor-chefe e proprietário do jornal Mulher.

        Tem também meningite, esquistossomose, doença de Chagas, disse Peçanha.

        Mas fora da minha área, eu disse.

        Você já leu Mulher? Peçanha perguntou.

        Admiti que não. Gosto mais de ler livros.

        Peçanha tirou uma caixa de charutos de dentro da gaveta e me ofereceu um. Acendemos os charutos. Em pouco tempo o ambiente ficou irrespirável. Os charutos eram ordinários, estávamos no verão, de janelas fechadas, e o aparelho de ar condicionado não funcionava bem.

        -- Mulher não é uma dessas publicações coloridas para burguesas que fazem regime. E feita para a mulher da classe C, que come arroz com feijão e se ficar gorda azar o dela. Dá uma olhada.

        Peçanha jogou na minha frente um exemplar do jornal. Formato de tablóide, manchetes em azul, algumas fotos fora de foco. Fotonovela, horóscopo, entrevistas com artistas da televisão, corte-e-costura.

        -- Você acha que poderia fazer a seção De Mulher para Mulher, O nosso consultório sentimental? O cara que fazia se despediu.

        De Mulher para Mulher era assinado por uma tal Elisa Gabriela. Querida Elisa Gabriela, meu marido chega toda noite embriagado e...

        -- Acho que posso, eu disse.

        -- Ótimo. Começa hoje. Que nome você quer usar? Pensei um pouco.

        -- Nathanael Lessa.

        [...]

        Peçanha deu duas baforadas no charuto, irritado.

        -- Primeiro, não é um nome como outro qualquer. Segundo, não é nome da Classe C. Aqui só usamos nomes do agrado da Classe C, nomes bonitos. Terceiro, o jornal só homenageia quem eu quero e eu não conheço nenhum Nathanael Lessa e finalmente a irritação de Peçanha aumentara gradativamente, como se ele estivesse tirando um certo proveito dela – aqui, ninguém, nem mesmo eu, usa pseudônimo masculino. Meu nome é Maria de Lourdes!

        [...]

Fonseca, Rubem. “Corações solitários”. In: Feliz ano novo. Rio de Janeiro, Artenova, 1975.

Fonte: Português. Série novo ensino médio. Volume único. João Domingues Maia – Editora Ática – 2000. São Paulo. p. 59.

Entendendo o conto:

01 – Qual é a profissão do narrador no início do conto?

      O narrador trabalha como repórter de polícia em um jornal popular.

02 – Qual é a queixa do editor do jornal sobre as notícias recentes?

      O editor reclama que não há crimes interessantes ou escandalosos acontecendo na cidade, apenas "coisas pequenas".

03 – Por que o narrador é demitido do jornal?

      O narrador é demitido porque não há crimes de grande repercussão para ele cobrir, e o jornal está em uma "fase ruim".

04 – Qual é a nova proposta de trabalho oferecida ao narrador?

      O narrador é convidado a escrever a seção "De Mulher para Mulher, O nosso consultório sentimental" no jornal Mulher, assinando com um pseudônimo feminino.

05 – Qual é a reação do editor quando o narrador sugere o pseudônimo "Nathanael Lessa"?

      O editor, Oswaldo Peçanha, fica irritado e rejeita o nome, afirmando que o jornal só usa nomes "do agrado da Classe C" e que ninguém usa pseudônimo masculino ali.

06 – Qual é o nome verdadeiro do editor do jornal Mulher?

      O nome verdadeiro do editor é Maria de Lourdes.

07 – Quais temas são abordados neste fragmento do conto?

      O fragmento aborda temas como a busca por histórias sensacionalistas na imprensa, a natureza cíclica dos escândalos, a precariedade do trabalho jornalístico e as convenções de gênero na sociedade.

 

terça-feira, 18 de março de 2025

CONTO: O VERGALHO - CAPÍTULO LXVIII - MACHADO DE ASSIS - COM GABARITO

 Conto: O VergalhoCapítulo LXVIII

           Machado de Assis

        Tais eram as reflexões que eu vinha fazendo, por aquele Valongo fora, logo depois de ver e ajustar a casa. Interrompeu mas um ajuntamento; era um preto que vergalhava outro na praça. O outro não se atrevia a fugir; gemia somente estas únicas palavras:

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjpPsaEOwfiOIUKezRyjOw0MqEwkhqHPhVk1hC8Oxk7s-K-HQJ9CeA4pI_U8GLQWcTl7SOZTpeniZ4oBm9DImxHB3kFwCuAwPFm6QH5ijFnKqZD0s4Ya-bJpFGX_BDLyBjITnzjnCxAc5Z6xmDJg-NSIFDF0Jo04_e2UPlQwarAcQCBMwpUWJEDmFSIt1s/s1600/o%20vergalho-crop%203.png


        – “Não, perdão, meu senhor; meu senhor, perdão!” Mas o primeiro não fazia caso, e, a cada súplica, respondia com uma vergalhada nova.

        – Toma, diabo! dizia ele; toma mais perdão, bêbado!

        – Meu senhor! gemia o outro.

        – Cala a boca, besta! replicava o vergalho.

        Parei, olhei... Justos céus! Quem havia de ser o do vergalho? Nada menos que o meu moleque Prudêncio, – o que meu pai libertara alguns anos antes. Cheguei-me; ele deteve-se logo e pediu-me a bênção; perguntei-lhe se aquele preto era escravo dele.

        – É, sim, nhonhô.

        – Fez-te alguma coisa?

        – É um vadio e um bêbado muito grande. Ainda hoje deixei ele na quitanda, enquanto eu ia lá embaixo na cidade, e ele deixou a quitanda para ir na venda beber.

        – Está bom, perdoa-lhe, disse eu.

        – Pois não, nhonhô. Nhonhô manda, não pede. Entra para casa, bêbado!

        Saí do grupo, que me olhava espantado e cochichava as suas conjeturas. Segui caminho, a desfiar uma infinidade de reflexões, que sinto haver inteiramente perdido; aliás, seria matéria para um bom capítulo, e talvez alegre. Eu gosto dos capítulos alegres; é o meu fraco. Exteriormente, era torvo o episódio do Valongo; mas só exteriormente. Logo que meti mais dentro a faca do raciocínio achei-lhe um miolo gaiato, fino, e até profundo. Era um modo que o Prudêncio tinha de se desfazer das pancadas recebidas, – transmitindo-as a outro. Eu, em criança, montava-o, punha-lhe um freio na boca, e desancava-o sem compaixão; ele gemia e sofria. Agora, porém, que era livre, dispunha de si mesmo, dos braços, das pernas, podia trabalhar, folgar, dormir, desagrilhoado da antiga condição, agora é que ele se desbancava: comprou um escravo, e ia-lhe pagando, com alto juro, as quantias que de mim recebera. Vejam as sutilezas do maroto!

Machado de Assis. Memórias póstumas de Brás Cubas. São Paulo: Ática, 1995. p. 100-101.

Fonte: Lições de texto. Leitura e redação. José Luiz Fiorin / Francisco Platão Savioli. Editora Ática – 4ª edição – 3ª impressão – 2001 – São Paulo. p. 21.

Entendendo o conto:

01 – Qual a situação presenciada pelo narrador no início do capítulo?

      O narrador se depara com um homem negro chicoteando outro em plena praça pública. O homem chicoteado implora por perdão, mas o agressor ignora seus apelos e continua a castigá-lo.

02 – Quem é o agressor e qual a sua relação com o narrador?

      O agressor é Prudêncio, um ex-escravo que pertenceu ao pai do narrador. Prudêncio foi libertado anos antes e agora possui seu próprio escravo.

03 – Qual o motivo da agressão?

      Prudêncio explica que o escravo é um vadio e bêbado. Ele o havia deixado na quitanda enquanto foi à cidade, mas o escravo desobedeceu e foi beber em uma venda.

04 – Qual a reação do narrador diante da cena?

      O narrador, inicialmente, sente-se chocado com a violência da cena. No entanto, logo em seguida, ele começa a refletir sobre a ironia da situação e a natureza humana.

05 – Qual a interpretação do narrador sobre o comportamento de Prudêncio?

      O narrador percebe que Prudêncio está apenas repetindo o ciclo de violência que sofreu quando era escravo. Ele está, de certa forma, "descontando" no seu escravo as humilhações e os maus-tratos que sofreu no passado.

06 – Qual o significado do título do capítulo: "O Vergalho"?

      O título faz referência ao instrumento de tortura utilizado por Prudêncio para castigar seu escravo. O vergalho simboliza a violência e a opressão presentes na sociedade escravocrata.

07 – Qual a crítica social presente no conto?

      Machado de Assis utiliza a figura de Prudêncio para criticar a perpetuação da violência e da opressão. O conto revela como as vítimas de um sistema opressor podem se tornar opressoras quando alcançam o poder. Além disso, o autor critica a falsa ideia de liberdade concedida aos escravos, mostrando que, mesmo libertos, eles continuam presos a um ciclo de violência e exploração.

 

CONTO: O CURURU - (FRAGMENTO) - JORGE DELIMA - COM GABARITO

 Conto: O Cururu – Fragmento

           Jorge de Lima

        Tudo quieto, o primeiro cururu surgiu na margem, molhado, reluzente na semiescuridão. Engoliu um mosquito; baixou a cabeçorra; tragou um cascudinho; mergulhou de novo, e bum-bum! Soou uma nota soturna do concerto interrompido. Em poucos instantes, o barreiro ficou sonoro, como um convento de frades. Vozes roucas, foi-não-foi, tãs-tãs, bum-buns, choros, esguelamentos finos de rãs, acompanhamentos profundos de sapos, respondiam-se.

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjLTMFpDgkNCR6fgA2iENHx5OvE8NauyfdWaH4ZREGjspR4HR4TfcyLkTH4xBkIaPYEw-TGPOeGfWXow4_PALfkSRYGV8myRdywiU0xy_yFmiFHnLfABXcbGSH-Tbu8OxE0gVK5BnD-H9t_kiS-vC-0G2JEPIdO09uScYmceO1BTcQx8EPY08anlt6lH2I/s320/Sapo-B-arenarum-Itapeva-1024x768.jpg


        Os bichos apareciam, mergulhavam, arrastavam-se nas margens, abriam grandes círculos na flor d’água. (…) Daí a pouco, da bruta escuridão, surgiram dois olhos luminosos, fosforescentes, como dois vagalumes. Um sapo cururu grelou-os e ficou deslumbrado, com os dois olhos esbugalhados, presos naquela boniteza luminosa. Os dois olhos fosforescentes aproximavam-se mais e mais, como dois pequenos holofotes na cabeça triangular da serpente. O sapo não se movia, fascinado. Sem dúvida queria fugir; previa o perigo, porque emudecera; mas já não podia andar, imobilizado; os olhos feiíssimos, agarrados aos olhos luminosos e bonitos como um pecado. Num bote a cabeça triangular abocanhou a boca imunda do batráquio. Ele não podia fugir àquele beijo. A boca fina do réptil arreganhou-se desmesuradamente; envolveu o sapo até os olhos. Ele se baixava dócil entregando-se à morte tentadora, apenas agitando as patas sem provocar nenhuma reação ao sacrifício. A barriga disforme e negra desapareceu na goela dilatada da cobra. E, num minuto, as perninhas do cururu lá se foram, ainda vivas, para as entranhas famélicas. O coro imenso continuava sem dar fé do que acontecia a um de seus cantores.

Jorge de Lima. Calunga; O anjo. 3. ed. Rio de Janeiro: Agir, 1959. p. 160-161.

Fonte: Lições de texto. Leitura e redação. José Luiz Fiorin / Francisco Platão Savioli. Editora Ática – 4ª edição – 3ª impressão – 2001 – São Paulo. p. 93.

Entendendo o conto:

01 – Qual é a atmosfera inicial do conto?

      O conto começa com uma atmosfera de quietude e semiescuridão, quebrada pelo surgimento do primeiro cururu na margem do barreiro. A descrição detalhada do ambiente e dos sons cria uma sensação de imersão na natureza.

02 – Como o autor descreve o som produzido pelos animais no barreiro?

      O autor utiliza uma linguagem rica em onomatopeias para descrever os sons dos animais: "bum-bum", "tãs-tãs", "choros", "esguelamentos finos de rãs", "acompanhamentos profundos de sapos". Esses sons criam um "concerto interrompido" e transformam o barreiro em um "convento de frades", sugerindo uma atmosfera ritualística.

03 – Qual é a reação do sapo cururu ao avistar os olhos luminosos na escuridão?

      O sapo cururu fica deslumbrado e fascinado pelos olhos luminosos, que o hipnotizam e o imobilizam. Ele é incapaz de fugir, mesmo pressentindo o perigo iminente.

04 – Como a serpente ataca o sapo cururu?

      A serpente se aproxima lentamente, como "dois pequenos holofotes", e abocanha o sapo cururu com um bote rápido. A boca da serpente se dilata para engolir o sapo por inteiro, em um ato de violência e voracidade.

05 – Qual é o significado da frase "Ele não podia fugir àquele beijo"?

      Essa frase utiliza uma metáfora para descrever a morte do sapo cururu. O "beijo" representa o ataque fatal da serpente, que é irresistível e inevitável.

06 – Como o autor descreve a morte do sapo cururu?

      A morte do sapo cururu é descrita de forma crua e brutal. Ele é engolido vivo pela serpente, com suas perninhas ainda se debatendo nas entranhas do predador.

07 – Qual é o contraste entre a morte do sapo cururu e o coro dos outros animais?

      Enquanto o sapo cururu é devorado pela serpente, o "coro imenso" dos outros animais continua cantando, alheio ao que aconteceu. Esse contraste destaca a indiferença da natureza diante da morte individual e a continuidade do ciclo da vida.