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sexta-feira, 17 de junho de 2022

ROMANCE: VIAGENS NA MINHA TERRA - ALMEIDA GARRETT - COM GABARITO

 Romance: Viagens na minha terra

                  Almeida Garrett

CAPÍTULO II

[...]

        “Essas minhas interessantes viagens hão de ser uma obra prima, erudita, brilhante de pensamentos novos, uma coisa digna do século. Preciso de o dizer ao leitor, para que ele esteja prevenido; não cuide que são quaisquer dessas rabiscaduras da moda que, com o título de Impressões de Viagem, ou outro que tal, fatigam as imprensas da Europa sem nenhum proveito da ciência e do adiantamento da espécie.

        Primeiro que tudo, a minha obra é um símbolo... é um mito, palavra grega, e de moda germânica, que se mete hoje em tudo e com que se explica tudo... quanto se não sabe explicar.

        É um mito porque — porque... Já agora rasgo o véu, e declaro abertamente ao benévolo leitor a profunda ideia que está oculta debaixo desta ligeira aparência de uma viagenzinha que parece feita a brincar, e no fim de contas é uma coisa séria, grave, pensada como um livro novo da feira de Leipzig, não das tais brochurinhas dos boulevards de Paris.

        Houve aqui há anos um profundo e cavo filósofo de além Reno, que escreveu uma obra sobre a marcha da civilização, do intelecto — o que diríamos, para nos entenderem todos melhor, o Progresso. Descobriu ele que há dois princípios no mundo: o espiritualista, que marcha sem atender à parte material e terrena desta vida, com os olhos fitos em suas grandes e abstratas teorias, hirto, seco, duro, inflexível, e que pode bem personalizar-se, simbolizar-se pelo famoso mito do cavaleiro da mancha, D. Quixote; — o materialista, que, sem fazer caso nem cabedal dessas teorias, em que não crê, e cujas impossíveis aplicações declara todas utopias, pode bem representar-se pela rotunda e anafada presença do nosso amigo velho, Sancho Pança.

        Mas, como na história do malicioso Cervantes, estes dois princípios tão avessos, tão desencontrados, andam contudo juntos sempre, ora um mais atrás, ora outro mais adiante, empecendo-se muitas vezes, coadjuvando-se poucas, mas progredindo sempre.

        E aqui está o que é possível ao progresso humano.

        E eis aqui a crônica do passado, a história do presente, o programa do futuro.

        Hoje o mundo é uma vasta Barataria, em que domina el-rei Sancho.

        Depois há de vir D. Quixote.

        O senso comum virá para o milênio, reinado dos filhos de Deus! Está prometido nas divinas promessas — como el-rei de Prússia prometeu uma constituição; e não faltou ainda, porque, porque o contrato não tem dia; prometeu, mas não disse quando.

        Ora nesta minha viagem Tejo arriba está simbolizada a marcha do nosso progresso social: espero que o leitor entendesse agora. Tomarei cuidado de lho lembrar de vez em quando, porque receio muito que se esqueça.”

        [...].

               GARRETT, Almeida. Viagens na minha terra. São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1969. p. 151-2.

Fonte: Língua portuguesa 2 – Projeto ECO – Ensino médio – Editora Positivo – 1ª edição – Curitiba – 2010. p. 43.

Entendendo o romance:

01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:

·        Fatigam: importunam, enfastiam.

·        Benévolo: bondoso, que apresenta disposição favorável.

·        Hirto: teso, retesado.

·        Fazer cabedal: ligar a, dar importância a.

·        Utopias: fantasias, quimeras.

·        Rotunda: redonda.

·        Anafada: bem nutrida, gorda, luzidia.

·        Empecendo: dificultando, estorvando.

·        Arriba: parte mais elevada, acima.

02 – Logo no primeiro parágrafo do texto, o narrador tece uma série de autoelogios à própria obra. Destaque os adjetivos utilizados para isso.

      Interessantes, obra-prima, erudita, brilhante, [de pensamentos] novos, digna [do século].

03 – Esses adjetivos servem para elevar a obra diante de outras que, segundo o narrador, circulam pela Europa. Que obras seriam essas? O que as caracterizaria?

      Obras que trazem “impressões de viagem” e que se caracterizariam pelo fato de serem fatigantes, ou seja, cansativas, e não trazerem nenhum proveito científico ou contribuírem para a melhoria da espécie humana.

04 – Levando-se em conta suas respostas as questões 2 e 3, é possível inferir que o autor de “Viagens na minha terra”:

I – Busca auto elogiar-se porque se considera o melhor escritor romântico português.

II – Acredita que sua obra trará uma contribuição positiva, não se caracterizando como mero entretenimento.

III – Afirma que toda leitura de relato de viagens é, necessariamente, fútil.

05 – Por que, segundo o narrador, sua obra seria “um mito”?

      Porque, por trás da aparência de uma mera viagem, haveria outros sentidos simbólicos na obra. Ela seria uma obra grave, pensada como uma obra filosófica (“um livro novo da feira de Leipzig”) e não uma “brochurinha dos boulevards de París.

06 – O narrador faz referência a um filósofo para quem haveria dois princípios de progresso: o espiritualista e o materialista. O que distinguiria ambos? Que figuras literárias são usadas para representar cada um desses princípios?

      Enquanto o espiritualista seguiria sem se importar com a parte terrena da vida, o materialista se deixaria guiar exclusivamente pela razão, pelos aspectos materiais da vida. O espiritualista seria representado por D. Quixote e seu idealismo, enquanto o materialista seria representado pelo pragmatismo de Sancho Pança.

07 – Para o narrador, qual desses princípios deveria prevalecer? E qual está prevalecendo naquele momento em Portugal?

      Segundo o narrador, os princípios, embora contraditórios, seriam complementares e, por isso, deveriam caminhar juntos. No entanto, Portugal estaria vivendo um momento marcado pelo materialismo e o narrador estaria aguardando a vinda de D. Quixote e de seu “espiritualismo”.

08 – Interprete o sentido do parágrafo final do trecho.

      Segundo o narrador, a narrativa de suas viagens seria simbólica da marcha do progresso social português e ele vai se esforçar por mostrar isso ao leitor para que este tenha clareza daquilo que o narrador acredita ser necessário transformar-se em sua terra para que esta alcance o progresso.

 

 

POEMA: QUANDO EU SONHAVA - ALMEIDA GARRETT - COM GABARITO

Poema: Quando Eu Sonhava

            Almeida Garrett

Quando eu sonhava, era assim
Que nos meus sonhos a via;
E era assim que me fugia,
Apenas eu despertava,
Essa imagem fugidia
Que nunca pude alcançar.
Agora, que estou desperto,
Agora a vejo fixar...
Para quê? – Quando era vaga,
Uma ideia, um pensamento,
Um raio de estrela incerto
No imenso firmamento,
Uma quimera, um vão sonho,
Eu sonhava – mas vivia:
Prazer não sabia o que era,
Mas dor, não na conhecia ...


Almeida Garrett. Folhas Caídas. Disponível em: http://biblioreynaldo.no.sapo.pt/folhascaidas.html. Acesso em: 24 fev. 2009.

Fonte: Língua portuguesa 2 – Projeto ECO – Ensino médio – Editora Positivo – 1ª edição – Curitiba – 2010. p. 42.

Entendendo o poema:

01 – Uma das marcas do Romantismo é a maior liberdade formal. O poema de Garrett apresenta versos de inspiração popular, típicos desse período romântico. Que versos são esses?

      Heptassílabos ou redondilhas maiores, versos de sete sílabas poéticas.

02 – O poema apresenta um esquema regular de rimas? Comente.

      O poema não apresenta um esquema regular de rimas. Alguns versos rimam entre si, como o 2°, o 3°, o 5°, o 14° e o 16°, com terminação –ia; o 7° e o 11° com terminação –erto e o 10° e o 12°, com terminação –mento. O poeta se dá a liberdade de se rimar alguns versos e deixar outros sem rima, brancos, o que é uma liberdade formal típica do Romantismo.

03 – Levando em conta o que respondeu nos itens 1 e 2, você diria que o poema privilegiou a temática ou a estrutura formal? Justifique sua resposta.

      O privilégio foi dado ao tema, porque a estrutura formal se apresenta bastante livre: uma única estrofe composta por 16 versos, alguns versos rimados, outros não e mesmo o uso das redondilhas maiores, versos sonoros e associados a quadras populares, sem, por exemplo, a elaboração formal que um soneto exige, normalmente escrito com versos decassílabos.

04 – Releia o poema e identifique seu tema. Transcreva do poema um verso ou conjunto de versos que confirme(m) sua resposta.

      O tema do poema é a comparação entre o antes – quando o sujeito poético sonhava com o amor da amada e depois – quando seu amor se transformou em realidade. O trecho que melhor corrobora essa resposta é o final do poema: Eu sonhava – mas vivia: / Prazer não sabia o que era, / Mas dor, não na conhecia...

05 – A temática do poema pode ser considerada característica do movimento romântico? Por quê?

      Sim, pode. A ideia de que amar é igual a sofrer, mas, mesmo assim, o sujeito poético insiste em amar, entregar-se ao amor, é uma das temáticas centrais do Romantismo.

 


sábado, 11 de julho de 2020

POESIA: BARCA BELA - ALMEIDA GARRETT - COM GABARITO

Poesia: Barca bela

              Almeida Garrett

Pescador da barca bela,

Onde vais pescar com ela,

Que é tão bela,

Ó pescador?

 

Não vês que a última estrela

No céu nublado se vela?

Colhe a vela,

Ó pescador! 


Deita o lanço com cautela.

Que a sereia canta bela...

Mas cautela,

Ó pescador!


Não se enrede a rede nela,

Que perdido é remo e vela,

Só de vê-la,

Ó pescador!

 

Pescador da barca bela,

Inda é tempo, foge dela,

Foge dela,

Ó pescador!

          De Camões a Pessoa. Douglas Tufano, org. Antologia escolar da poesia portuguesa. São Paulo, Moderna, 1994.

Fonte: Livro – Ler, entender, criar – Português – 6ª Série – Ed. Ática, 2007 – p. 232-3.

Entendendo a poesia:

01 – Almeida Garrett, poeta português, viveu entre os anos 1799 e 1854. Talvez por isso você estranhe algumas palavras que aparecem em seu poema, mas, se pensar um pouco a respeito delas, o sentido se tornará conhecido. Para isso, responda às questões que seguem:

a)   “Veja, a última estrela que estava visível não pode mais ser vista porque o céu está com muitas nuvens, que a escondem”. Copie os versos que expressam essa ideia.

          “Não vês que a última estrela / No céu nublado se vela?”

b)   Se já é noite e o céu está com muitas nuvens, é melhor o pescador não velejar. Copie os versos em que se diz ao pescador para que ele não saia para pescar.

“Colhe a vela, / Ó pescador”.

c)   Alguém poderia dizer a um pescador brasileiro: “Jogue a rede com cuidado”. Como isso está expresso na poesia?

“Deita o lanço com cautela”.

02 – Pense nas palavras enrede e rede e explique o sentido do verso em que elas estão.

      “Não se enrede a rede nela”. Deseja-se que o pescador não permita que sua rede envolva uma sereia.

03 – Existem muitos mitos sobre as sereias. Um deles afirma que, com seu canto, elas seduzem os pescadores, que em consequência ficam perdidos no mar. Considere esse mito e responda:

a)   Em quais versos da poesia esse mito está expresso?

“Que perdido é remo e vela / Só de vê-la”.

b)   Esse mito explica um pedido que é feito ao pescador. Qual é esse pedido?

O pedido para que o pescador fuja da sereia: “Inda é tempo, foge dela, / Foge dela, / Ó pescador!”.

04 – Ao ler a poesia, temos a impressão de que alguém fala com um pescador. Quais elementos da poesia confirmam essa impressão?

      Todos os verbos estão na 2ª pessoa do singular, a pessoa do discurso com quem se fala. Além disso, existe o vocativo (Ó pescador), termo que representa o interlocutor e que se repete ao longo da poesia.

05 – Fora os versos que apresentam um vocativo, isto é, um termo que representa a quem o poeta se dirige (“Ó pescador”), a poesia apresenta uma única rima. Que rima é essa?

      A rima existente entre as palavras que terminam com “ela”.

06 – Copie em seu caderno as consequências mais prováveis dessa rima única:

a)   Essa rima faz a poesia parecer uma canção popular.

b)   Essa rima possibilita que a poesia seja facilmente memorizado.

c)   Essa rima torna a poesia monótono e cansativo.

 

 


sábado, 4 de março de 2017

POEMA: ESTE INFERNO DE AMAR - ALMEIDA GARRETT - COM GABARITO

       POEMA:  ESTE INFERNO DE AMAR
ALMEIDA GARRETT

Este inferno d amar – como eu amo!
Quem mo pôs aqui n´alma... quem foi?
Esta chama que alenta e consome,
Que é a vida – e que a vida destrói –
Como é que se veio a atear,
Quando – ai quando se há de ela apagar?
                                                                                   Versos de Almeida Garrett.

 01-    Nos versos acima de Garrett, como em toda poesia, predomina a função poética da linguagem. Ao lado dela, destaca-se a função:

a)     Metalinguística da linguagem, com extrema valorização da subjetividade no jogo entre o espiritual e o profano.
b)    Apelativa da linguagem, num jogo de sentido pelo qual o poeta transmite uma forma idealizada de amor.
c)     Referencial da linguagem, privilegiando-se a expressão de forma nacional.
d)    Emotiva da linguagem, marcada pela não contenção dos sentimentos e pelo subjetivismo.
e)     Fática da linguagem, utilizada para expressar as ideias de forma evasiva, como sugestões.


RESOLUÇÃO: O eu lírico extravasa seus sentimentos e emoções, representados graficamente pela exclamação, as reticências e a interjeição “ai” no último verso. O subjetivismo também é marcado pela escolha lexical – “inferno de amar”, “que a vida destrói”, “atear” -, que denota descomedimento na expressão do sofrimento amoroso. Resposta: D

02 – Qual é o tempo verbal predominante na primeira estrofe e o que ele caracteriza? Justifique com exemplos do texto.
     É o presente, caracterizando um tempo de sofrimento: “inferno”, “consome”, “destrói”.

03 – Aos poucos, o poeta volta ao passado e o relembra. Descreva esse tempo. Em que contrasta com o presente?
     O passado era um tempo de sonho, de paz, de serenidade. Contrasta com o presente tormentoso, em que falta harmonia.

04 – Apesar de o passado ser pacífico e o presente tormentoso, qual dos dois tempos é mais sedutor? Por quê?
     O presente, porque o amor é a vida.

05 – A atmosfera do poema baseia-se na situação amorosa “que alenta e consome”. Explique essa situação e relacione-a ao título do texto.
     Na verdade, o par “amor / sofrimento” é a base do Romantismo. Em Este inferno de amar faz-se menção ao sofrimento causado pelo amor, que é, porém, razão de viver.

06 – A que episódio da biografia de Garrett parece estar associado o poema?
      O poema parece estar ligado ao caso amoroso de Garrett com a Viscondessa da Luz.

07 – A qual característica romântica corresponde a associação entre biografia e obra?
      Corresponde ao confessionalismo, à preocupação em produzir uma obra lírica que seja a expressão sincera dos sentimentos do autor.

08 – O poema exprime a confusão dos sentimentos do amante.
a)   Comente, a este respeito, o título do poema.
O título já exprime as contradições do sentimento, que é o tema do poema: O amor, condição de felicidade, é causa de sofrimentos, é um verdadeiro inferno para o sujeito lírico.

b)   Localize na primeira estrofe dois oximoros (paradoxos) que exprimem a confusão dos sentimentos.
“Esta chama que alenta e consome” e “Que é a vida – e que a vida destrói –”.

09 – O tom emotivo – como se o sujeito lírico não se contivesse e explodisse em confidências confusas, ou como se falasse sozinho, procurando entender seus sentimentos – motivou a pontuação excessiva do texto. Localize e transcreva:
a)   Uma frase exclamativa que exprime constatação perplexa de um sentimento.
“Como eu amo!”

b)   Uma frase interrogativa que exprime essa mesma perplexidade.
“Quem mo pôs aqui n’alma... quem foi?”

c)   Uma frase reticente que exprime a dúvida.
“Era um sonho talvez... – foi um sonho –”.

10 – O sujeito lírico evoca o tempo em que o amor era apenas um sonho. Os olhos de uma mulher despertaram-no, tornando o sonho realidade.
a)   Qual a diferença entre o sonho e a realidade do amor?
O sonho era doce e nele havia a paz; a realidade é o sofrimento, o “inferno”.

b)   Apesar dessa diferença, o poema termina com uma defesa do amor. Explique.
Apesar dos sofrimentos que causa, o amor é a condição da vida; o sujeito lírico afirma que só começou a viver quando o amor o despertou.