Música (Atividades): Geleia
Geral
Gilberto
Gil
Um poeta desfolha a bandeira
E a manhã tropical se inicia
Resplandente, cadente, fagueira
Num calor girassol com alegria
Na geleia geral brasileira
Que o Jornal do Brasil anuncia
Ê, bumba-yê-yê-boi
Ano que vem, mês que foi
Ê, bumba-yê-yê-yê
É a mesma dança, meu boi
Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi_FO9h_G09wjcLDkm8hyphenhyphenMclmkkWjxY9fDMopeGiCAt0OkhRmn7RQgr6xdsnp2eMLu8QhdqlUgb_OBwB0fFqhRI9pZLH_m0fbPqI-xTeKEzQyZL8JhhPzJuJThUNZsrUpogkm4Twg0IMhKMYSadeWXRaQymqjp99-bSefOdDXA8HhP8kIJJWMHVMDujbPc/s320/unnamed.png
A alegria é a prova dos nove
E a tristeza é teu porto seguro
Minha terra é onde o Sol é mais limpo
E Mangueira é onde o samba é mais puro
Tumbadora na selva-selvagem
Pindorama, país do futuro
Ê, bumba-yê-yê-boi
Ano que vem, mês que foi
Ê, bumba-yê-yê-yê
É a mesma dança, meu boi
É a mesma dança na sala
No Canecão, na TV
E quem não dança não fala
Assiste a tudo e se cala
Não vê no meio da sala
As relíquias do Brasil
Doce mulata malvada
Um LP de Sinatra
Maracujá, mês de abril
Santo barroco baiano
Superpoder de paisano
Formiplac e céu de anil
Três destaques da Portela
Carne-seca na janela
Alguém que chora por mim
Um carnaval de verdade
Hospitaleira amizade
Brutalidade jardim
Ê, bumba-yê-yê-boi
Ano que vem, mês que foi
Ê, bumba-yê-yê-yê
É a mesma dança, meu boi
Plurialva, contente e brejeira
Miss linda Brasil diz: Bom dia
E outra moça também Carolina
Da janela examina a folia
Salve o lindo pendão dos seus olhos
E a saúde que o olhar irradia
Ê, bumba-yê-yê-boi
Ano que vem, mês que foi
Ê, bumba-yê-yê-yê
É a mesma dança, meu boi
Um poeta desfolha a bandeira
E eu me sinto melhor colorido
Pego um jato, viajo, arrebento
Com o roteiro do sexto sentido
Voz do morro, pilão de concreto
Tropicália, bananas ao vento
Ê, bumba-yê-yê-boi
Ano que vem, mês que foi
Ê, bumba-yê-yê-yê
É a mesma dança, meu boi.
Composição: Gilberto
Gil / Torquato Neto. Tropicália ou panis et circencis. Philips, 1968.
Fonte: Arte em
Interação – Hugo B. Bozzano; Perla Frenda; Tatiane Cristina Gusmão – volume
único – Ensino médio – IBEP – 1ª edição – São Paulo, 2013. p. 314-315.
Entendendo a música:
01 – Qual é o significado da
expressão "Geleia Geral Brasileira" no contexto da música?
A expressão
"Geleia Geral Brasileira" é central para a música e representa a
fusão caótica, mas vibrante, de elementos díspares que compõem a cultura e a
realidade do Brasil. Gilberto Gil a utiliza para descrever a mistura de
tradições antigas e modernidade, o popular e o erudito, o belo e o brutal, o
nacional e o estrangeiro. A "geleia" sugere uma mistura densa e
heterogênea, onde tudo se entrelaça sem uma ordem aparente, refletindo a
complexidade e a diversidade do país, que é anunciada, ironicamente ou não,
pelo "Jornal do Brasil". É a coexistência de contrastes que define a
identidade brasileira.
02 – De que forma a música
explora a dualidade entre otimismo e pessimismo na realidade brasileira?
A música explora
a dualidade entre otimismo e pessimismo de várias maneiras. Por um lado, há uma
clara exaltação da alegria e da beleza do Brasil, com versos como "a manhã
tropical se inicia / Resplandente, cadente, fagueira / Num calor girassol com
alegria" e "Minha terra é onde o Sol é mais limpo / E Mangueira é
onde o samba é mais puro". A "alegria é a prova dos nove",
sugerindo sua força e resiliência. Por outro lado, há a menção de que "a
tristeza é teu porto seguro", reconhecendo a presença constante da
melancolia e das dificuldades. A coexistência de "Hospitaleira
amizade" e "Brutalidade jardim" também ilustra essa dualidade,
mostrando que a beleza e a cordialidade podem coexistir com aspectos mais
ásperos da realidade brasileira. A música, portanto, não nega os desafios, mas
celebra a capacidade de encontrar alegria e resiliência neles.
03 – Quais elementos da
cultura e do cotidiano brasileiros são citados na letra e o que essa variedade
sugere?
A letra de
"Geleia Geral" cita uma vasta gama de elementos da cultura e do
cotidiano brasileiros, misturando o popular e o erudito, o tradicional e o
moderno:
Elementos
culturais e geográficos: "Mangueira", "Pindorama",
"Santo barroco baiano", "Portela", "carnaval de
verdade".
Objetos
e costumes: "bandeira", "Tumbadora", "LP de Sinatra",
"Maracujá", "carne-seca na janela".
Sensações
e conceitos: "calor girassol", "alegria",
"tristeza", "sexto sentido", "voz do morro",
"Tropicália", "bananas ao vento".
Personagens
e mídias: "poeta", "Jornal do Brasil", "Miss linda
Brasil", "Carolina", "Canecão", "TV". Essa
variedade sugere a diversidade e a complexidade da identidade brasileira,
reforçando a ideia da "geleia geral". É um mosaico de referências que
não se limita a um único aspecto, mas abraça a totalidade da experiência brasileira,
com suas contradições, belezas e particularidades.
04 – Como o refrão "Ê,
bumba-yê-yê-boi / Ano que vem, mês que foi / Ê, bumba-yê-yê-yê / É a mesma
dança, meu boi" contribui para o sentido da música?
O refrão "Ê,
bumba-yê-yê-boi / Ano que vem, mês que foi / Ê, bumba-yê-yê-yê / É a mesma
dança, meu boi" é fundamental para o sentido da música, pois ele evoca a
circularidade do tempo e a persistência das tradições. A referência ao
"bumba-meu-boi" conecta a música a uma manifestação cultural popular
e ancestral, que se repete ciclicamente. As expressões "Ano que vem, mês
que foi" e "É a mesma dança, meu boi" reforçam a ideia de que,
apesar das mudanças e da passagem do tempo, certas essências e ritmos da vida
brasileira permanecem, marcados por uma repetição quase ritualística. O refrão,
portanto, serve como um elo entre o passado e o presente, e uma celebração da
continuidade cultural em meio à "geleia geral" de transformações.
05 – Qual o papel da figura do
"poeta desfolha a bandeira" na abertura e no encerramento da música?
A figura do
"poeta desfolha a bandeira" no início e no final da música é
simbólica e multifacetada. Ao "desfolhar a bandeira", o poeta pode
estar realizando um ato de desconstrução da identidade nacional oficial,
revelando as múltiplas camadas e realidades por trás dos símbolos patrióticos.
É como se ele estivesse abrindo a bandeira para expor as contradições e a
riqueza da "geleia geral". No final, quando o eu-lírico afirma
"Um poeta desfolha a bandeira / E eu me sinto melhor colorido", há
uma sugestão de que essa desconstrução e a exposição da complexidade brasileira
levam a uma maior compreensão e a um sentimento de pertencimento mais profundo
e autêntico. O poeta, assim, atua como um mediador entre a realidade multifacetada
e a percepção do indivíduo.
06 – Como a música aborda a
relação entre o observador (aquele que "não dança") e a "Geleia
Geral"?
A música aborda a
relação entre o observador e a "Geleia Geral" de forma crítica e
sugestiva na estrofe: "E quem não dança não fala / Assiste a tudo e se
cala / Não vê no meio da sala / As relíquias do Brasil". Aqui, a ação de
"dançar" é uma metáfora para a participação ativa na vida e na
cultura brasileira, enquanto "não dançar" representa a passividade, a
alienação ou a incapacidade de se engajar com a complexidade do país. Quem não
participa ("não dança") é incapaz de expressar-se ("não
fala") e apenas observa passivamente ("Assiste a tudo e se
cala"). Mais crucialmente, essa passividade impede que o observador
perceba as "relíquias do Brasil" – os elementos ricos e valiosos que
compõem a identidade nacional, que estão "no meio da sala", visíveis
para quem se permite interagir. A crítica é àqueles que se afastam ou se
recusam a imergir na diversidade cultural.
07 – Que papel a
"Tropicália" desempenha na mensagem final da música, especialmente
quando mencionada em conjunto com "bananas ao vento"?
A menção de
"Tropicália" no final da música, em conjunto com "bananas ao
vento", é crucial para a mensagem. A Tropicália foi um movimento artístico
e cultural do qual Gilberto Gil foi um dos principais expoentes, caracterizado
justamente pela fusão de elementos diversos, nacionais e estrangeiros,
tradicionais e modernos, em uma estética de apropriação e ressignificação. "Bananas
ao vento" é uma imagem icônica do Tropicalismo, remetendo à antropofagia
cultural (devorar e digerir influências) e a um certo exotismo e autoafirmação
tropical. Ao citar esses elementos, a música reforça sua própria identidade
como uma manifestação da Tropicália, celebrando a liberdade criativa, a mistura
e a capacidade do Brasil de reinventar-se a partir de suas próprias
particularidades. É um manifesto final sobre a vitalidade e a originalidade da
cultura brasileira, que se expressa nessa "geleia geral".