Mostrando postagens com marcador LUÍS FERNANDO VERÍSSIMO. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador LUÍS FERNANDO VERÍSSIMO. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2025

CRÔNICA: ADOLESCÊNCIA - (FRAGMENTO) - LUÍS FERNANDO VERÍSSIMO - COM GABARITO

 Crônica: Adolescência – Fragmento

               Luís Fernando Veríssimo

        O apelido dele era "cascão" e vinha da infância. Uma irmã mais velha descobrira uma mancha escura que subia pela sua perna e que a mãe, apreensiva, a princípio atribuiu a seguida descobriu que era sujeira mesmo.

        -- Você não toma banho, menino?

        -- Tomo, mãe.

        -- E não se esfrega?

        Aquilo já era pedir demais. E a verdade é que muitas vezes seus banhos eram representações. Ele fechava a porta do banheiro, ligava o chuveiro, forte, para que a mãe ouvisse o barulho, mas não entrava no chuveiro. Achava que dois banhos por semana era o máximo de que uma pessoa sensata precisava. Mais do que isso era mania.

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj-pcWIWXfoYSvUtkJHlKDekMOo5K15kHp6VogW2z5gSisd2XwrGzDXJeZ2v9AKb6gPRWsTCg_Qp5Igfccq436QKVFxheb4gJEuDEQoviU2dK1pNkaOeeoCY9dYpI0EZ_rqidpgPARkaisFhe61vrOdrHAuiDJUqL1SXQihyphenhypheneGRb9zvT1ZeCuJEuhQRHZk/s320/CASCAO.jpg

        O apelido pegou e, mesmo na sua adolescência, eram frequentes as alusões familiares à sua falta de banho. Ele as aguentava estoicamente. Caluniadores não mereciam resposta. Mas um dia reagiu.

        -- Sujo, não.

        -- Ah, é? – disse a irmã.

        -- E isto o que é?

        Com o dedo ela levantara do seu braço um filete de sujeira.

        -- Rosquinha não vale.

        -- Como não vale?

        -- Rosquinha, qualquer um.

        Entusiasmado com a própria tese, continuou:

        -- Desafio qualquer um nesta casa a fazer o teste da rosquinha! A irmã, que tomava dois banhos por dia, o que ele classificava de exibicionismo, aceitou o desafio.

        Ele advertiu que passar o dedo, só, não bastava. Tinha que passar com decisão. E, realmente, o dedo levantou, da dobra do braço da irmã, uma rosquinha, embora ínfima, de sujeira.

        -- Viu só – disse ele, triunfante. – E digo mais: ninguém no mundo está livre de uma rosquinha.

        -- Ah, essa não. No mundo? Manteve a tese.

        -- Ninguém.

        -- A rainha Juliana?

        -- Rosquinha. No pé. Batata.

        No dia seguinte, no entanto, a irmã estava preparada para derrubar a sua defesa.

        -- Cascão... – disse simplesmente. – A Catherine Deneuve. Ele hesitou. Pensou muito. Depois concedeu. A Catherine Deneuve, realmente, não.

        A irmã, sadicamente, ainda fingiu que queria ajudar.

        -- Quem sabe atrás da orelha?

        -- Não, não – disse o Cascão tristemente, renunciando à sua tese. – A Catherine Deneuve, nem atrás da orelha.

Luís Fernando Veríssimo. Comédias para se ler na escola. PDL – Projeto Democratização da Leitura. www.portaldetonando.com.br.

Entendendo a crônica:

01 – Qual é o apelido do personagem principal e qual a origem dele?

      O apelido do personagem principal é "Cascão". A origem do apelido vem da infância, quando sua irmã mais velha descobriu uma mancha escura em sua perna, que a mãe inicialmente pensou ser sujeira.

02 – Qual era o hábito de higiene do personagem na infância?

      O personagem não gostava de tomar banho e muitas vezes fingia que estava se banhando, ligando o chuveiro sem entrar embaixo d'água. Ele achava que dois banhos por semana eram suficientes.

03 – Como o personagem reagia às alusões familiares sobre sua falta de higiene?

      O personagem aguentava estoicamente as alusões familiares sobre sua falta de banho, considerando os caluniadores como não merecedores de resposta.

04 – Qual é o argumento do personagem sobre a sujeira?

      O personagem argumenta que ninguém no mundo está livre de ter um pouco de sujeira, usando o termo "rosquinha" para se referir a essa sujeira.

05 – Como a irmã do personagem tenta refutar seu argumento?

      A irmã do personagem tenta refutar seu argumento mencionando a rainha Juliana e a atriz Catherine Deneuve como exemplos de pessoas que, segundo ela, não teriam "rosquinhas" de sujeira.

06 – Qual é a reação do personagem ao ser confrontado com o exemplo de Catherine Deneuve?

      O personagem hesita, pensa bastante e acaba concedendo que Catherine Deneuve realmente não teria "rosquinhas" de sujeira, nem mesmo atrás da orelha, renunciando à sua tese inicial.

07 – Qual é o tom geral da crônica de Luís Fernando Veríssimo?

      O tom geral da crônica é humorístico e irônico. Veríssimo utiliza uma situação cotidiana e familiar para fazer uma reflexão sobre hábitos de higiene, argumentos e a dificuldade de admitir quando estamos errados.

 

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2025

CRÔNICA: A CIDADE TRAÇADA - LUÍS FERNANDO VERÍSSIMO - COM GABARITO

 Crônica: A cidade traçada

              Luís Fernando Veríssimo

        Toda a cidade que tem um rio é bela. Porto Alegre exagera, esparrama-se ao longo de vários que, de lambuja, se transformam num lago imenso. Com toda essa lindeza, gosto de tomar nossa cidade como modelo e temática. Tenho desenhado como ela era, como ela é e como a desejo.

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjj-ryHhYm5mTC5cGtIpfkMRTD-tqTO_cOb5YEspgAG09B0Dqk5FjwKm6aSmpZeBTgzypdtu9A3sEYhdwI7rkBnYPQa3Yv3QZrIlPI9gj6gu1c1VOj1dUoExsKVPPOG4HTC9TMCKMGu7XCn1LhcXwVPJVPcCt1KCcV-mxPjUJ8yC8EyTX3542PrRpCKrP4/s320/PORTO%20ALEGRE.jpg


        Pode parecer estranho atribuir sexo a uma cidade. Porto Alegre, que tem alma, eu vejo feminina. Caprichosa e temperamental, é a um só tempo provinciana e avançadinha, mantendo hábitos recatados, porém sem nunca perder o compasso com o nosso tempo. Metrópole, é neurótica, opiniática e exigente. Também aldeia, é pudica, singela e dócil.

        Sensualmente lânguida, se deita estirada no seu sinuoso contorno fluvial. Dominadora e envolvente, avança voraz sobre os morros, pelos vales e pelas planuras. Impetuosa, lança-se ao alto em pontas de concreto. Fogosa, vibra entrelaçada por artérias dinâmicas e congestionadas. Carola, reza com fé na Festa dos Navegantes. Peleadora, trabalha feito louca nas oficinas do quarto distrito. Ciumenta, esconde com o muro seu perfil mais lindo.

        É faceira quando se veste com as flores do jacarandá, anunciando a primavera, e é manhosa ao se derreter nos dias tórridos de verão. Romântica, se pinta toda nos fins de tarde, no outono. Malvada, venta fria e cinzenta nas noites de inverno.

        Quando aqui cheguei, nos tempos do bonde, do rolo compressor e das balas esportivas, Porto Alegre ainda mantinha, ao menos no centro, um certo ar tradicional que lembrava Buenos Aires. Com o tempo, foi se tornando mais interesseira, substituindo seus cafés de esquina pelas agências financeiras. Além da inocência, perdeu nos últimos anos muito de sua identidade original. As matinês e as anedotas de rua, por exemplo, foram sumindo, dando lugar aos cômicos da tevê. Mas foi ganhando outras coisas que a fazem moderna, adulta e madura, como a Feira do Livro, espaços de cultura, museus, teatros, galerias de arte.

        Tanto o LFV [Luís Fernando Veríssimo] como eu conhecemos outras, é verdade. mas cada um na sua, elegemos este porto como nosso ponto de referência. Traça-la, para nós, é literalmente e graficamente um ato de amor.

VERÍSSIMO, Luís Fernando; FONSECA, Joaquim da. Traçando Porto Alegre. Porto Alegre: Artes e Ofícios, 1994, p. 7-8.

Fonte: livro Português: Língua e Cultura – Carlos Alberto Faraco – vol. único – Ensino Médio – 1ª edição – Base Editora – Curitiba, 2003. p. 366-367.

Entendendo a crônica:

01 – Qual a principal característica da cidade de Porto Alegre, segundo o autor?

      O autor destaca a beleza da cidade, com seus rios que se transformam em um lago imenso. Além disso, ele a descreve como feminina, caprichosa, temperamental, provinciana e avançadinha, capaz de ser metrópole e aldeia ao mesmo tempo.

02 – Que tipo de comparações e personificações o autor utiliza para descrever Porto Alegre?

      O autor utiliza diversas comparações e personificações para descrever a cidade. Ele a compara a uma mulher sensual e lânguida, que se deita em seu contorno fluvial, e a descreve como dominadora, envolvente, impetuosa, fogosa, carola, peleadora e ciumenta.

03 – Como Porto Alegre se transformou ao longo do tempo, de acordo com o autor?

      O autor relata que, quando chegou à cidade, ela ainda mantinha um ar tradicional que lembrava Buenos Aires. Com o tempo, Porto Alegre se tornou mais interesseira, substituindo seus cafés por agências financeiras e perdendo parte de sua identidade original, como as matinês e as anedotas de rua.

04 – O que a cidade ganhou com essa transformação, segundo o autor?

      Apesar de perder elementos de sua identidade original, Porto Alegre ganhou outras coisas que a tornaram moderna, adulta e madura, como a Feira do Livro, espaços de cultura, museus, teatros e galerias de arte.

05 – Qual o significado da expressão "traçá-la" no contexto da crônica?

      No contexto da crônica, "traçá-la" significa desenhar a cidade, tanto no sentido literal quanto no sentido figurado. Para o autor e o LFV, traçar Porto Alegre é um ato de amor, uma forma de expressar seu carinho e sua conexão com a cidade.

 

sexta-feira, 17 de janeiro de 2025

CRÔNICA: NATAL - FRAGMENTO - LUÍS FERNANDO VERÍSSIMO - COM GABARITO

 Crônica: NATAL – Fragmento

              Luís Fernando Veríssimo

Natal é uma época difícil para cronistas. Eles não podem ignorar a data e ao mesmo tempo não há mais maneiras originais de tratar do assunto. Os cronistas, principalmente os que estão no métier há tanto tempo, que ainda usam a palavra métier – já fizeram tudo que havia para fazer com o Natal. Já recontaram a história do nascimento de Jesus de todas as formas: versão moderna (Maria tem o bebê numa fila do SUS), versão coloquial (“Pô, cara, aí Herodes radicalizou e mandou apaga as pinta recém-nascida, baita mauca”), versão socialmente relevante (os três reis magos são detidos pela polícia a caminho da manjedoura, mas só o negro precisa explicar o que tem
no saco) versão on-line (
jotace@salvad.com.bel conta sua vida num chat site), etc.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjEoaItyMrl7Z2Ia3FGtIKpnYXDCh_672Je2b9Nv1CmvVpyD-Fn4C_m0wNN3Jut19ktEG6FHxMMEv_rGmObOVsadnufoIcUHr8flJTgWdxU7qticNaPvvg_gS2S0rkfR8E7K6ae_rAlpV7xBHwIf88JaO3MGC-qvat8crQtLDVI2rMaZ7QaC1qapmQZwWY/s320/aurora_boreal_papai_noel_capa-635x435.jpg


        Papai Noel, então, nem se fala. Eu mesmo já escrevi a história do casal moderno que flagra o Papai Noel deixando presentes sob a árvore de Natal, corre com o Papai Noel e não conta nada da sua visita para o filho porque querem criá-lo sem qualquer tipo de superstição várias vezes. Poucos cronistas estão inocentes de inventar cartas fictícias com pedidos para o Papai Noel: patéticas (paz para o mundo, bom senso para os governantes), políticas (“Só mais um mandato e eu juro que acerto, ass. Fernando”) ou práticas (“Algo novo para escrever sobre o Natal, por amor de Deus!”).

        Já fomos sentimentais, já fomos amargos, já fomos sarcásticos e blasfemos, já fomos simples, já fomos pretensiosos – não há mais nada a escrever sobre o Natal! Espera um pouquinho. Tive uma ideia. Uma reunião de noéis! Noel Rosa, Noel Coward e Papai Noel. Acho que sai alguma coisa. Noel Rosa, Noel Coward e Papai Noel estão reunidos… onde? Na mesa de um bar? Papai Noel não frequenta bares para não dar mau exemplo. Pelo menos não com a roupa de trabalho. No Polo Norte? Noel Coward, acostumado com o inverno de Londres, talvez aguentasse, mas Noel Rosa congelaria. Não interessa onde é o encontro. Uma das primeiras lições da
crônica é: não especifica. Noel Rosa, Noel Coward e Papai Noel estão reunidos em algum lugar.

        [...]

        Noel Coward e Papai Noel se entreolham. Papai Noel cofia a barba. Ninguém sabe, exatamente, o que é “cofiar”, mas é o que Papai Noel faz, enquanto Noel Coward olha em volta com evidente desgosto por estar em algum lugar. Preferia estar em outro. Ninguém encontra o que dizer, nem eu.

        [...]

        Esquece. Não há mais nada a escrever sobre o Natal.

        [...].

Correio Braziliense, Brasília, 19/12/99.

Fonte: livro Português: Língua e Cultura – Carlos Alberto Faraco – vol. único – Ensino Médio – 1ª edição – Base Editora – Curitiba, 2003. p. 21.

Entendendo a crônica:

01 – Qual a principal dificuldade enfrentada pelos cronistas ao escrever sobre o Natal, segundo Veríssimo?

      A principal dificuldade é a falta de originalidade. Os temas natalinos já foram explorados exaustivamente, tornando difícil encontrar novas perspectivas ou abordagens.

02 – Que tipos de abordagens sobre o Natal já foram exploradas pelos cronistas, de acordo com o texto? Cite alguns exemplos.

      Veríssimo cita diversas abordagens, como: versões modernas e coloquiais da história de Jesus, críticas sociais, humor sarcástico e blasfemo, sentimentalismo, e até mesmo o uso de cartas fictícias ao Papai Noel.

03 – Qual a ideia original que Veríssimo apresenta para fugir do lugar-comum sobre o Natal?

      A ideia original é reunir três figuras históricas com o nome "Noel" em um mesmo lugar: Noel Rosa, Noel Coward e Papai Noel. A intenção é criar uma situação inusitada e gerar um diálogo improvável entre esses personagens.

04 – Por que a ideia da reunião entre os três Noéis não funciona, segundo o autor?

      A ideia não funciona porque os personagens são muito diferentes e não há um contexto natural para a reunião. Além disso, o autor reconhece que não consegue encontrar diálogos e situações interessantes para essa cena.

05 – Qual a conclusão a que Veríssimo chega sobre a possibilidade de escrever algo novo sobre o Natal?

      Veríssimo conclui que, após explorar todas as possibilidades e perceber as dificuldades de criar algo original, não há mais nada a escrever sobre o Natal.

 



quarta-feira, 11 de dezembro de 2024

CRÔNICA: UMA DAS MARIAS - LUÍS FERNANDO VERÍSSIMO - COM GABARITO

 CRÔNICA: UMA DAS MARIAS

                   Luís Fernando Veríssimo

        Um dia, Maria chegou em casa da escola, muito triste.

       — O que foi? — perguntou a mãe de Maria.

       Mas Maria nem quis conversa. Foi direto para o seu quarto, pegou o seu Snoopy e se atirou na cama, onde ficou deitada, emburrada.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhYmKfPYcCeH5nhDzAKYOYHAqxf70Tw4LcD5FjHKYT__uI6g5kmljnfNEWfDjV23Pei7EckxhzEnWAnRCG-MbZ9HlEWJCYKMj1ksrkh-Gbe0iv4aHIkRAZp-mRZC9IH7jizlv4CfgbpwSzSVeQMZVHWZjC1-ToexhvATEU2GA2WMAw1fKS42AEmabyufww/s320/MARIA.jpg


       A mãe de Maria foi ver se Maria estava com febre. Não estava. Perguntou se estava sentindo alguma coisa. Não estava. Perguntou se estava com fome. Não estava. Perguntou o que era, então.

       — Nada — disse Maria.

        A mãe resolveu não insistir. Deixou Maria deitada na cama, abraçada com o seu Snoopy, emburrada. Quando o pai de Maria chegou do trabalho, em casa, a mãe de Maria avisou:

       — Melhor nem falar com ela...

       Maria estava com cara de poucos amigos. Pior. Estava com cara de amigo nenhum.

       Na mesa do jantar, Maria de repente falou:

       — Eu não valo nada.

       O pai de Maria disse:

       — Em primeiro lugar, não se diz “eu não valo nada”. É “eu não valho nada”. Em segundo lugar, não é verdade. Você valhe muito. Quer dizer, vale muito.

       — Não valho.

       — Mas o que é isso? — disse a mãe de Maria. — Você é a nossa querida. Todos gostam de você. A mamãe, o papai, a vovó, os tios, as tias. Para nós, você é uma preciosidade.

       Mas Maria não se convenceu. Disse que era igual a mil outras pessoas. Há milhões de outras pessoas.

      — Só na minha aula tem sete Marias!

      — Querida... — começou a dizer a mãe. Mas o pai interrompeu.

      — Maria — disse o pai — você sabe por que um diamante vale tanto dinheiro?

      — Porque é raro. Um pedaço de vidro também é bonito. Mas o vidro se encontra em toda parte. Um diamante é difícil de encontrar. Quanto mais rara é uma coisa, mais ela vale. Você sabe por que o ouro vale tanto?

      — Por quê?

      — Porque tem pouquíssimo ouro no mundo. Se o ouro fosse como areia, a gente ia caminhar no ouro, ia rolar no ouro, depois ia chegar em casa e lavar o ouro do corpo para não ficar suja. Agora, imagina se em todo o mundo só existisse uma pepita de ouro.

       — Ia ser a coisa mais valiosa do mundo.                                           

       — Pois é. E em todo o mundo só existe uma Maria.

       — Só na minha aula são sete.

       — Mas são outras Marias.

       — São iguais a mim. Dois olhos, um nariz...

       —Mas esta pintinha aqui nenhuma delas tem.

       — É...

       — Você já se deu conta que em todo mundo só existe uma, você?

       — Mas pai...

       — Só uma. Você é uma raridade. Podem existir outras parecidas. Mas você, você mesmo, só existe uma. Se algum dia aparecer outra você na sua frente, você pode dizer: é falsa.

       — Então eu sou a coisa mais valiosa do mundo.

       — Olha, você deve estar valendo aí uns três trilhões...

        Naquela noite, a mãe de Maria passou perto do quarto dela e ouviu Maria falando com o Snoopy:

        — Sabe um diamante?

                                                    Luís Fernando Veríssimo

Entendendo o texto

01-Assinale (V) para efeitos de sentido que forem pertinentes ao texto-discurso e (F) para os que não forem pertinentes:

     a- ( V ) Percebe-se o discurso de que, muitas vezes, o ser humano não conhece o valor próprio;     

      b-(  V ) Percebe-se o discurso de que muitas pessoas têm baixa autoestima;

      c-(  F ) Percebe-se o discurso de que todas as pessoas estão descontentes consigo mesmas;

      d-(  V ) Percebe-se o discurso de que para elevar a autoestima de alguém, basta demonstrar-lhe afetividade;           

     e-(  F ) Percebe-se o discurso de que baixa autoestima é “coisa de quem não tem o que fazer”;

     f-(  F ) Percebe-se o discurso de que as pessoas estão felizes, na maior parte do tempo.

02- O texto é uma narrativa e contém vários diálogos. Que sinal de pontuação foi usado para introduzi-los?

      a- travessão;

      b- hífen;

      c- vírgula;

     d- reticências

03- No enunciado “Você já se deu conta que em todo mundo só existe uma, você?”, substitua a expressão grifada pelo verbo que mais se aproxime do seu significado:

     a- encontrou;

     b- percebeu;

     c- achou;

     d- buscou.

04- Na linha 11, o narrador diz que Maria estava com cara de poucos amigos, isso significa que a menina estava:

     a- bastante motivada;

     b- mal humorada;

     c- extremamente feliz;

     d- tão triste

05- Quais substantivos foram usados pelo pai, na conversa com Maria, para que a menina compreendesse o seu valor:

     a- bonito, precioso;

     b- raro, ouro;

     c- diamante, único;

     d- ouro, diamante.

06- Como ficaria o argumento A gente ia caminhar no ouro”, se a expressão a gente fosse substituída pelo pronome nós?

      a- Nós iríamos caminhar;  

      b- Nós iremos caminhar;

      c- Nós íamos caminhar;   

      d- Nós vamos caminhar.

07- No relato “— Mas o que é isso? — disse a mãe de Maria. — Você é a nossa querida. Todos gostam de você. A mamãe, o papai, a vovó, os tios, as tias. Para nós, você é uma preciosidade. Mas Maria não se convenceu. Disse que era igual a mil outras pessoas. Há milhões de outras pessoas.”, quais palavras foram substituídas pelo pronome grifado nós?

      a- Milhões de pessoas;

      b- Mil outras pessoas;

      c- O papai, a mamãe, o vovô, os tios;

      d- A mamãe, o papai, a vovó, os tios, as tias.

08- No enunciado ”...Naquela noite, a mãe de Maria passou perto do quarto dela...”, a expressão sublinhada indica:

      a- lugar;

      b- companhia;

      c- instrumento;

      d- tempo

09- No enunciado ”...Se algum dia aparecer outra você na sua frente, você pode dizer: é falsa.”, a conjunção destacada indica circunstância de:

      a- tempo;

      b- consequência;

      c- causa;

      d- hipótese/condição.

10- No enunciado ”...Maria foi direto para o seu quarto, pegou o seu Snoopy e se atirou na cama..”, a conjunção sublinhada indica relação de:

      a- adversidade;

      b- alternância;

      c- conclusão;

      d- adição.

11- No enunciado ”...A mãe começou a dizer à Maria, mas  o pai a interrompeu...”, a conjunção sublinhada indica relação de:

     a- adversidade;

     b- alternância;

     c- conclusão;

     d- adição

12- No enunciado ”...O ouro vale muito porque tem pouquíssimo ouro no mundo...”, a conjunção sublinhada sugere:

     a- consequência;

     b- condição;

     c- explicação;

     d- comparação.

13- No enunciado ”...Em primeiro lugar, não se diz “eu não valo nada”, a expressão destacada pode ser substituída, sem prejuízo à compreensão, por:

     a- para início de conversa;

     b- para terminar o diálogo;

     c- para pontuar o assunto;

     d- para melhor compreender

14- Substitua as palavras sublinhadas, no texto-discurso, por outras de sentido semelhante.

emburrada: triste, de mau humor

preciosidade: tesouro, jóia

rara: escassa, difícil de achar

pepita: pedrinha

falsa: imitação

15-Qual o argumento da personagem Maria que não representa ausência de autoestima?

     a- — Eu não valo nada.

     b- — Só na minha aula tem sete Marias!

     c- — São iguais a mim. Dois olhos, um nariz...

     d-  — Sabe um diamante?

16-Qual enunciado possui conjugação verbal coloquial do verbo valer?

      a- “eu não valo nada”.

      b- “eu não valho nada”

      c- Quer dizer, vale muito.

      d- –Não valho.

17- Qual único argumento não representa atribuição de valor pela raridade do objeto?

      a- Um diamante é difícil de encontrar.

      b- Agora, imagina se em todo o mundo só existisse uma pepita de ouro.

      c- Um pedaço de vidro também é bonito. Mas o vidro se encontra em toda parte.

      d- Mas você, você mesmo, só existe uma.

18-Produza um texto-discurso, tentando convencer um amigo(a) a valorizar a si mesmo(a).

"Ei, você! Já parou para pensar em tudo o que você é capaz? Assim como um diamante é único e valioso, você também é! Cada um de nós tem qualidades e talentos especiais que nos tornam únicos. Não se compare com os outros, pois ninguém no mundo é igual a você. Você tem uma história de vida particular, sonhos e aspirações que te fazem especial. Acredite em si mesmo e valorize tudo o que você é. Afinal, você é uma obra de arte, um presente único para o mundo!"

segunda-feira, 21 de outubro de 2024

CRÔNICA: COMPLÔ - LUÍS FERNANDO VERÍSSIMO - COM GABARITO

 Crônica: Complô  

              Luís Fernando Veríssimo

        Mal chegou no céu, o gaúcho pediu para falar com Deus. Queria fazer uma queixa. Deus estava em reunião e o gaúcho foi encaminhado a São Pedro. São Pedro estava na sala de comando meteorológico. Era ali, cercado por sua equipe à frente de painéis sofisticadíssimos, que São Pedro dirigia o tempo do mundo.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi7xv4MRmnsxUtNkpM99aYZNMNeAs5fiAMcEOT9x02Kopx2z5HiOsyUwmH25yFQiWUbOkiu-n1tOvqupO7YiTCSJBqqR2lYFttORXiR6UPJIfGgK03hHTHENiO-cjSE8LUEYj8Xu84PS4Xrr9SWufDApeD7gwkMKiENjVoG5O9_O1fsQXC3bwZPZBJU7a0/s1600/PEDRO.jpg


        ― O que é? Disse São Pedro, sem olhar para o gaúcho. Prestava atenção numa tela à sua frente.

        ― Estão contra nós ― queixou-se o gaúcho.

        ― Quem?

        ― Todo mundo.

        ― Bobagem.

        ― Verdade. Veja só o que tem nos acontecido.

        E, seguindo São Pedro pela sala enquanto este ajustava controles e checava mostradores, o gaúcho contou tudo que tinha feito ao Rio Grande do Sul nos últimos tempos. Tudo. Concluiu dizendo que aquilo só podia ser uma campanha organizada. Um complô contra o Rio Grande!

        ― Paranoia ― sentenciou São Pedro.

        ― Fazem pouco de nós. Nós...

        Mas São Pedro o interrompeu com um gesto. Apontou para uma tela.

        ― Veja. Por coincidência, vamos programar o tempo no Rio Grande do Sul para as próximas horas.

        E São Pedro passou a dar ordens a seus comandados.

        ― Grandes nuvens negras!

        ― Grandes nuvens negras ― confirmou o encarregado do setor.

        ― Relâmpagos espetaculares.

        ― Relâmpagos espetaculares.

        ― Trovões retumbantes!

        ― Trovões retumbantes.

        O gaúcho entusiasmado chegou a ficar na ponta dos pés, de tão ansioso, esperando a ordem final de São Pedro. ― E atenção ― disse São Pedro.

        Todos esperavam a ordem. São Pedro fechou os olhos, como que buscando inspiração, e ficou assim por uns instantes. Depois decretou:

        ― Chuviscos.

        Houve risadas generalizadas da equipe.

        Quando saía da sala, o gaúcho viu, com o rabo dos olhos, São Pedro tapar a boca para não rir também. O complô era mais amplo do que se imaginava.

VERISSIMO, L. F. Mais comédias para ler na escola. Rio de Janeiro: Objetiva, 2020. p. 73 – 74.

Fonte: Maxi: Séries Finais. Caderno 1. Língua Portuguesa – 7º ano. 1.ed. São Paulo: Somos Sistemas de Ensino, 2021. Ensino Fundamental 2. p. 08 – 09.

Entendendo a crônica:

01 – Qual a principal queixa do gaúcho ao chegar ao céu?

      A principal queixa do gaúcho é que existe um complô contra o Rio Grande do Sul, pois as condições climáticas adversas que têm atingido o estado são, em sua opinião, intencionais e não mera obra do acaso. Ele acredita que há uma força externa agindo contra o estado.

02 – Qual a reação inicial de São Pedro à queixa do gaúcho?

      Inicialmente, São Pedro demonstra descaso e até mesmo certa irritação com a queixa do gaúcho, atribuindo suas alegações à paranoia. Ele atribui as condições climáticas a eventos naturais e aleatórios, negando a existência de qualquer complô.

03 – Como São Pedro tenta convencer o gaúcho de que não há nenhum complô?

      Para demonstrar ao gaúcho que não há nenhum complô, São Pedro o convida a acompanhar o processo de programação do clima para o Rio Grande do Sul. Ele mostra como as decisões sobre as condições climáticas são tomadas de forma aparentemente aleatória e não com a intenção de prejudicar o estado.

04 – Qual a reação do gaúcho ao ver como São Pedro programa o clima?

      Inicialmente, o gaúcho fica entusiasmado com a ideia de que São Pedro poderia finalmente proporcionar um clima favorável ao Rio Grande do Sul. No entanto, ao ouvir a ordem final de São Pedro por "chuviscos", ele se decepciona e percebe que o complô parece ser ainda mais amplo do que imaginava.

05 – Qual a ironia presente na crônica?

      A ironia da crônica reside no fato de que o gaúcho, ao buscar uma explicação para as adversidades que o Rio Grande do Sul enfrenta, atribui tudo a um complô. No entanto, a verdade é ainda mais simples e banal: as condições climáticas são resultado de processos naturais e das decisões, muitas vezes arbitrárias, de São Pedro. A crônica satiriza a tendência humana de buscar explicações complexas para eventos simples e de acreditar em conspirações.

06 – Qual a mensagem principal da crônica?

      A mensagem principal da crônica é que, muitas vezes, atribuímos intenções maldosas e conspirações a eventos que são, na verdade, resultado do acaso ou de decisões arbitrárias. A crônica nos convida a questionar nossas próprias crenças e a não buscar culpados para todos os problemas que enfrentamos.

07 – Qual o papel do humor na crônica?

      O humor desempenha um papel fundamental na crônica, tornando a leitura mais leve e agradável. A situação absurda do gaúcho que acredita em um complô climático e a reação irônica de São Pedro geram um efeito cômico que ajuda a transmitir a mensagem da crônica de forma mais eficaz. O humor também serve para criticar a tendência humana de buscar explicações conspiratórias para os eventos do mundo.

 

sábado, 15 de junho de 2024

CRÔNICA: A NOVATA - LUÍS FERNANDO VERÍSSIMO - COM GABARITO

 Crônica: A Novata

                 Luís Fernando Veríssimo

     Sandrinha nunca esqueceu o seu primeiro dia na redação.

        Os olhares que recebeu quando se encaminhou para a mesa do editor. De curiosidade. De superioridade. Ou apenas de indiferença. Do editor não recebeu olhar algum.

        — Quem é você? — ele perguntou, sem levantar a cabeça. Sandrinha se identificou.

        — Ah, a novata — disse ele. — Você deve ser das boas.

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiB5gxXNOZpZE_uIT10pzHZoVOQrhmL14g-KHtMlXM1gKrKA0Qsby2CDpdwvNfnycYe3rEe6_tbKC1TNpjwhUU_6Es_er0_CZNH1ZzBGAzf0xC83Joj6xsPNLA7QW30V3LFjzc0WPq6t3aMEnWNnypM-FHvYRnRSi0ukEzNI97B4kgcIJmlis_AcgMmsWg/s320/NOVATA.jpg


        Recém-formada e já botaram a trabalhar comigo. Você sabe o que a espera?

        — Bem, eu...

        — Esqueça tudo o que aprendeu na escola. Isto aqui é a linha de frente do jornalismo moderno. Aqui você tem que ter coragem. Garra. Instinto. Você acha que tem tudo isso?

        — Acho que sim.

        Ele a olhou pela primeira vez. Seu sorriso era cruel.

        — É o que veremos — disse. — Já vi muita gente quebrar a cara aqui. Desistir e pedir transferência para a crônica policial. É preciso ter estômago. Você tem estômago?

    — Tenho.

        Ele gritou:

    — Dalva!

    Uma mulher aproximou-se da mesa. Tinha a cara de quem já viu tudo na vida e gostou de muito pouco. O editor perguntou:

     — Você já pegou o Rudi?

     — Estou indo agora.

     — Leve ela.

    Dalva olhou para Sandra como se tivesse acabado de tirá-la do nariz. Voltou a olhar para o editor.

    — Não sei, chefe. O Rudi...

    — Quero ver do que ela é feita.

   — Está bem.

Luís Fernando Veríssimo. In: Comédias para se ler na escola, Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.

Entendendo o texto

01. O que Sandrinha nunca esqueceu?

       a. O seu primeiro dia na escola.

      b. O seu primeiro dia na redação.

      c. O seu primeiro dia na faculdade.

      d. O seu primeiro dia de férias.

 02. Como eram os olhares que Sandrinha recebeu ao se encaminhar para a mesa do editor?

       a. De admiração.

       b. De inveja.

       c. De curiosidade, superioridade ou indiferença.

       d. De medo.

03. Qual foi a reação do editor ao conhecer Sandrinha?

      a. Ele sorriu e a cumprimentou.

      b. Ele a ignorou completamente.

      c. Ele perguntou "Quem é você?" sem levantar a cabeça.

      d. Ele a elogiou imediatamente.

04. O que o editor disse para Sandrinha esquecer?

       a. Tudo o que aprendeu na escola.

       b. Seus medos e inseguranças.

       c. Suas expectativas de sucesso.

       d. Seu trabalho anterior.

 05. Quais são as qualidades que o editor mencionou serem necessárias para trabalhar lá?

      a. Inteligência, paciência e criatividade.

      b. Coragem, garra e instinto.

      c. Organização, pontualidade e ética.

      d. Honestidade, lealdade e dedicação.

 06. O que o editor quis verificar sobre Sandrinha?

      a. Se ela tinha um bom currículo.

      b. Se ela tinha coragem e estômago.

      c. Se ela conhecia bem a redação.

      d. Se ela sabia trabalhar em equipe.

 07.  Quem é Dalva na crônica?

      a. Uma secretária.

      b. Uma jornalista veterana.

      c. Uma amiga de Sandrinha.

      d. A chefe de Sandrinha.

08.  Como Dalva reagiu ao ser chamada pelo editor?

     a. Com entusiasmo.

     b. Com indiferença.

     c. Com uma expressão de quem já viu tudo na vida e gostou de muito pouco.

    d. Com um sorriso.

  09.  O que o editor perguntou a Dalva sobre Rudi?

       a. Se ela já tinha terminado um relatório.

     b. Se ela já tinha pegado o Rudi.

     c. Se ela conhecia o Rudi.

     d. Se ela sabia onde estava o Rudi.

10. Como Dalva olhou para Sandrinha após o pedido do editor?

      a. Com carinho e compreensão.

      b. Como se tivesse acabado de tirá-la do nariz.

     c. Com admiração.

     d. Com desaprovação.